A escolha de Feder para o MEC pode significar o fim da escola presencial e a convenção do ensino remoto no pós-pandemia!

Novo ministro é assumidamente um empresário do ramo da educação e compreende a escola como mercadoria.

Felipe Duque 3 jul 2020, 14:41

Numa pandemia que vem matando milhares de pessoas no Brasil, a partir da inércia promovida por setores anti-cientificistas e sintonizados a lógica neoliberal, o país segue avançando para um colapso humanitário sem precedentes na história. A flexibilização do isolamento, incentivados pelo presidente Jair Bolsonaro, encontra eco em diversos estados e prefeituras do Brasil, logicamente, como demanda da sinergia intelectual de Guedes-Olavo de Carvalho, onde um discurso falacioso de pró-emprego e a despreocupação com a gravidade do Covid-19 são acionados para legitimar tais ações culminando em aglomerações em bares e restaurantes em todo o território nacional. Além de todo esse cenário pavoroso, o Brasil vive uma indecisão referente aos seus quase 50 milhões de estudantes e seus 3,2 milhões de profissionais da educação após os instáveis mandatos dos ministros Ricardo Vélez, Wentraub e Decotelli (que sequer chegou a assumir), onde a núcleo de suas ações orbitavam em torno do olavismo e o espectro do anti-comunismo e que os levou, consequentemente, a queda diante da pressão de estudantes e profissionais da educação em todo o Brasil.

O hiato de uma política concreta para a educação, seja num horizonte acerca do calendário ou de uma definição transparente sobre horas/aulas, tem culminado num “autoritarismo” de patrões e governos em várias redes educacionais regionais (incluindo o setor privado) que agem descompassadamente, mas que convergem num lastro: promover a instabilidade da saúde mental de estudantes, responsáveis e, principalmente, profissionais da educação. Na rede privada paira o medo de demissão dos profissionais (a partir de um “terrorismo” estabelecido pelos patrões com demissões caso se acentue evasões de alunos), acompanhado do impulsionamento por parte do empresariado da educação (em sintonia com governos) em relação ao retorno às aulas, mesmo num contexto adverso (no setor público, o exemplo mais evidenciado é o de Doria em São Paulo e Crivella no Rio de Janeiro). A condição do ensino remoto é um outro elemento que vem promovendo uma série de problemáticas a professores (expostos em suas imagens e pouco familiarizados com tais tecnologias, afinal não há uma formação anterior) e estudantes (onde menos de 50% tem um computador em casa – pra se ter uma ideia, menos de 30% dos alunos na rede estadual do Rio de Janeiro tem conseguido acessar o ensino remoto via plataforma Google Classroom).

Tal indecisão retoma um novo capítulo com a escolha do novo Ministro da Educação, o ex-secretário de Educação do Paraná, Renato Feder. Estado, a propósito, que tem péssimas recomendações do novo ocupante da pasta federal, ligado ao chamado ao “centrão” (numa nova movimentação de Bolsonaro). Um entusiasta do neoliberalismo e intelectual orgânico desse paradigma no campo da educação (formado pela FGV), Feder escreveu a obra “Carregando Elefantes” (2008) onde defende o sistema de vouchers e a privatização do ensino público, algo que se materializou parcialamente em sua curta passagem no governo do estado do Paraná, quando extinguiu diversas atividades meios na escolas públicas da região (incitando a terceirização), apoiou a política do governador Ratinho Jr. de congelamento dos servidores e no contexto pandêmico desenvolveu um questionável contrato para com uma empresa afiliada da Record para transmissão de vídeos-aulas (metade da população era negligenciado o acesso a da população, afinal trata-se de uma emissora restrita a algumas regiões do Estado do Paraná).

Porém, diferente dos ministros anteriores (que davam ênfase ao olavismo e sua discussão ideológica junto as escolas), Feder é assumidamente um empresário do ramo da educação e compreende a escola como mercadoria, ou seja, sem qualquer função social ou emancipatória. O que permeia suas ações é a lógica do lucro, das cifras, portanto, resquícios democratizantes nas escolas públicas (ainda presentes na LDB) ou garantias trabalhistas dos profissionais da educação, são empecilhos para a execução de uma política que contemple a demanda do empresariado da educação.

O novo ministro é sócio da famosa empresa de tecnologia Multilaser (onde responde processo por sonegação fiscal) que detêm faturamento de R$2 bilhões de reais ao ano. Uma franquia da família Ostrowiecki que se inicia no final dos anos 1980 com a venda de cartuchos reciclados e logo amplia seus tentáculos de oferta para outros acessórios da computação, conforme essa área crescia no Brasil (fones de ouvido, mouses, aparelhos de mp3, câmeras digitais, tablets, celulares dentre outros). Sua ampliação se dá com a compra de outras empresas menores a colocando como uma gigante nesse setor, se estendendo, inclusive, para a criação da Multikids (segmento voltado a crianças que incluem desde ursinhos de pelúcia até jogos de tabuleiro).  

Essa relação do novo ministro com a área de tecnologia e o discurso neoliberal para a educação emerge um terreno arenoso para a área da educação brasileira comprometida com os ideários emancipatórios nos aspectos pedagógicos e em defesa do público (principalmente, na manutenção dos direitos dos profissionais da educação). Se abre um horizonte de ataques a função social da escola (afinal, para Feder, educação é mercadoria) e, possivelmente, a consolidação do ensino remoto. Este último se evidencia já na trajetória de Feder na área tecnológica e suas experiências iniciais no Paraná com as afiliadas da Record (emissora porta-voz e parceira principal de Bolsonaro). Tal condição pode se vislumbrar na efetividade de uma tendência a muito debatida nos círculos educacionais de frações da classe dominante, a convenção do ensino remoto como principal instrumento educacional (cabe ressaltar que o Bando Mundial, OCDE e UNESCO tem estabelecido diretrizes concisas para o ensino remoto, principalmente, para os países periféricos. No Brasil ocorreu um encontro destes organismos em abril com o CNE, organizado pelo movimento neoliberal “Todos pela Educação”).

Nesse sentido, cabe aos profissionais da educação de todo o Brasil observarem com atenção as novas movimentações do novo Ministro com o empresariado das tecnologias da educação a distância, assim como reiterar a discussão que envolva a função social da escola em sua plenitude, numa ação conjunta com estudantes e responsáveis, e uma resposta imediata sobre calendário no pós-pandemia que contemple os reais interessados que são os trabalhadores da educação e pais de estudantes. Um contexto pandêmico que deveria ser utilizado para repensar o aprofundamento do caráter emancipatório da escola e sua função social, pode agora ser protagonizado por sujeitos que tem como norte a busca inveterada do lucro e, consequentemente, a extinção das unidades escolares integral ou parcialmente para a convenção do, que deveria ser, provisório: o ensino remoto.


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