O centro pode aguentar

Uma análise da vitória de Emmanuel Macron, a situação da luta política francesa em perspectiva histórica e a resiliência do “centro” neoliberal europeu.

Perry Anderson 27 nov 2017, 12:11

A primavera francesa

A França, geográfica e politicamente a dobradiça da União Europeia, onde o norte e o sul do continente se juntam, tem experimentado uma mudança mais drástica de posição dentro do bloco que qualquer outro Estado-membro. A Alemanha, já com a maior economia e população antes da unificação, tornou-se – novamente – o poder dominante do continente e, conforme seus espíritos mais francos que não guardam segredo, hegemônica na Comunidade. A Espanha, bastante marginalizada pela pobreza e pela ditadura, vivenciou seu ingresso na Comunidade como uma promoção de status rumo à prosperidade e respeitabilidade europeias. Esses países têm razão para sentir satisfação com a UE. A Itália tem uma satisfação menor; sua derrapagem econômica sob a moeda única, todavia, não alterou substancialmente o que sempre foi um papel mais de apoio do que de liderança dentro da Comunidade. A França, por outro lado, esteve na primeira fileira entre os seis membros fundadores – capaz, sob De Gaulle, de fazer os outros cinco se curvarem ante sua vontade, língua e burocracia – ocupando o primeiro escalão de influência dentro da Comissão. Até a virada da década de 1980 ainda era o principal parceiro diplomático da Alemanha, mas viu uma queda inexorável de suas antigas alturas. Em parte, isso foi uma inevitável consequência da reunificação alemã, que automaticamente deu à República Federal uma maior vantagem econômica e demográfica. Mas, em maior medida, as causas de seu enfraquecimento foram endógenas.

Os índices de perda de posição do país, a maioria deles divulgada nos debates nativos, são inúmeros. Muitos remetem à década de 1990, mas ganharam maior proeminência a partir da crise de 2008. Economicamente, o crescimento arrastou-se, perfazendo uma média menor que 1% por ano; o desemprego aumentou para 10% (25% entre os jovens1); o orçamento, que nunca esteve no vermelho nos últimos 40 anos, vê agora a dívida pública crescer para 96% do PIB; a renda per capita mal se moveu. Diplomaticamente, Paris tem cada vez mais acatado as opiniões de Berlim na Europa e de Washington no restante do mundo; suas elites carecem de significativa independência em qualquer arena. Culturalmente, o inglês tornou-se a língua franca da União, tanto do ponto de vista oficial quanto popular. Socialmente, nenhum outro grande país na Zona do Euro viu semelhantes níveis de distúrbios sociais e raciais, ou expressões consistentes de insatisfação popular com a situação nacional. Há anos, com os mais breves intervalos, a morosité [“morosidade”] tornou-se o espírito estabelecido.

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Politicamente a V República criada por e para De Gaulle, com uma concentração única do Poder Executivo na Presidência e um Legislativo manipulado para excluir os desordeiros, funcionou mais ou menos suavemente por trinta anos após sua morte, até o fim da época de Miterrand no Élysée. Até então, a era do crescimento acelerado e de rápida elevação dos padrões de vida que sustentavam seu sucesso original tinha acabado desde quando os efeitos do declínio global da metade dos anos 70 começaram a contar. A guinada brusca de Mitterrand em 1983, abandonando o gasto público para impulsionar a economia pela via da austeridade e da estabilização da moeda, trocando o discurso socialista pela retórica de disciplina fiscal, foi amplamente saudado como a colocação do sistema político sobre uma base mais sólida. Ao neutralizar o comunismo francês como um cúmplice menor e impotente frente esta mudança, e ao desacreditar a tensão revolucionária perniciosa na cultura do país, Miterrand lançou as fundações de uma estável República de centro: não mais dependente do carisma individual de um herói nacional que desconfiava dos partidos, mas agora solidamente ancorada no consenso ideológico entre os principais partidos de que o capitalismo era a única forma sensível de organizar a vida moderna. Com o PCF finalmente eliminado enquanto presença séria da cena política, a França poderia aguardar o tipo de alternância entre a centro-esquerda e a centro-direita, que difeririam nos detalhes, mas concordariam no essencial. Tal era o certificado de uma democracia liberal.

De fato, na superfície, isso aconteceu. No Élysée, Mitterrand primeiro foi sucedido por Chirac e este pelo seu infiel ministro Sarkozy, ao qual, por sua vez, se seguiria Hollande: 19 anos de presidência para a centro-esquerda, 19 anos para a centro-direita. Até 2002, quando o mandato presidencial foi abreviado de sete para cinco anos, coincidindo as eleições para o Executivo com o Legislativo, havia ainda a alternância dentro da alternância – “coabitação” –, quando algum lado capturava o posto de Primeiro-ministro com uma maioria na Assembleia Nacional, enquanto o outro continuava a ocupar a Presidência. Assim foi com Chirac e Balladur sob Mitterrand e com Jospin sob Chirac. Mas abaixo da superfície, por razões culturais profundas, o equilíbrio era sempre menos estável do que parecia. A partir dos anos 80, como em outros lugares do Ocidente, o imperativo contínuo do tempo era a radicalização neoliberal das operações do capitalismo: desregulamentação, privatização, flexibilização. Na França, essa era uma agenda calculada para provocar tensões no interior tanto do eleitorado de centro-direita e quanto do eleitorado de centro-esquerda2.

O Gaullismo, do qual a centro-direita apresentou-se como herdeira – embora cada mais fictícia – nunca tentou desmontar a versão local do Estado de Bem-Estar do Pós-Guerra, caso houvesse aumento de receitas fiscais, além de sempre assegurar ao menos um terço dos votos da classe trabalhadora, ao mesmo tempo em que os bastiões tradicionais do conservadorismo nas zonas rurais e nas pequenas cidades resistiam às modernas elites tecnocráticas e empresariais nos movimentos do capitalismo francês. O liberalismo nunca foi muito mais do que uma palavra de ordem na França do Pós-Guerra, onde foi tipicamente associado a um laissez-faire desenfreado. A chegada do neoliberalismo – o prefixo “neo” nem sequer era necessário para arrepiar os cabelos – abriu de modo previsível uma falha tectônica no bloco de centro-direita: de um lado, seus componentes empresariais, burocráticos e profissionais, cada vez mais ansiosos para se beneficiar do fim dos grilhões antiquados na busca do lucro; de outro, seus notáveis provincianos, escrivães ou artesãos pequeno-burgueses, para não falar dos trabalhadores, que sofreram ou foram marginalizados por aqueles. Tensões similares cresceram quando numa fase subsequente se acrescentaram aos problemas econômicos as polêmicas morais. Deveria haver um mercado de direitos reprodutivos? Deveria o casamento ser neutro em relação ao gênero?

Inevitavelmente, o advento do neoliberalismo também dividiu o eleitorado de centro-esquerda. Aquelas habilidades de Miterrand tinham levado o Partido Socialista ao quase completo comando da situação, com o remanescente Partido Comunista obrigado a segui-lo no segundo turno do sistema eleitoral. A maioria dos eleitores de centro-esquerda vinha da extremidade baixa da pirâmide de rendimentos: trabalhadores, professores de nível básico, assalariados e funcionários públicos mal remunerados. Acima deles, os profissionais em melhores situações, tais como administradores e semidiretores estatais, respaldados pelo grande e bem-dotado establishment midiático-intelectual do PS. A doutrina de Hayek tinha pouco a oferecer aos primeiros, mas exercia uma crescente atração para estes últimos, persuadidos cada vez mais de que os condutores básicos de uma necessária modernização da sociedade francesa somente poderiam ser a empresa e o mercado. A fissura na centro-direita foi, portanto, reproduzida na centro-esquerda. De cada lado, a camada dominante do bloco se comprometeu a avançar no giro neoliberal que Miterrand havia colocado em movimento no começo dos anos 80. Mas, como ambos precisavam vencer eleições para conquistar o poder, nenhum poderia se arriscar a perder os eleitores essenciais (encampando tão abertamente uma agenda neoliberal) e a provocar reações sociais violentas (perseguindo tão radicalmente os movimentos de contestação). O resultado foi uma sequência insatisfatória de meias medidas, que foram alvo de críticas de todos os órgãos da opinião liberal de mentalidade direitista no estrangeiro – o Financial Times, o Economist, o Frankfurter Allgemeine. O gasto público permanecia alto; o Estado de Bem-Estar Social não era rebaixado a um tamanho decente; negócios não se estabeleciam adequadamente livres; os orçamentos não alcançavam superávits; sindicatos não foram destruídos; os correios, as prisões e tudo o mais permaneciam nas mãos do Estado. Em sua timidez, a centro-direita e a centro-esquerda compartilhavam a responsabilidade pelo fracasso da França em abraçar a modernidade.

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De fato, a simetria era incompleta. Havia uma diferença significativa nos problemas que o neoliberalismo colocava para cada coalizão e nas maneiras com que cada lado os enfrentava3. Para a centro-esquerda, o segmento de sua base eleitoral que poderiam colocar mais a perder, caso implementassem uma versão francesa das proezas de Thatcher ou Blair, era mais amplo e socialmente mais vulnerável que o segmento correspondente na base de apoio da centro-direita. Para enfrentar essa dificuldade, o PS necessitou de uma blindagem ideológica de seu curso mais afirmativa, capaz de embelezar e distrair seus objetivos. Este foi o legado de Miterrand: o ideal inspirador da Europa. Era a seu serviço que os franceses foram chamados a se liberalizar e a se modernizar. Em particular, Miterrand – mais sincero que seus sucessores – sabia o que isso significava, visto que confidenciou a seu parente Jacques Attali logo no início: “Estou dividido entre duas ambições: a construção da Europa ou a justiça social. O Sistema Monetário Europeu é uma condição para o sucesso da primeira, porém limita minha liberdade no que diz respeito à segunda”[4]. Uma vez que a UE estava em vigor, toda iniciativa pró-mercado poderia ser exaltada ou justificada como necessária para a solidariedade com Bruxelas. Frequentemente, a centro-direita também encontrou nisso uma oportunidade conveniente, mas ela nunca poderia recorrer à Europa como um trunfo ideológico universal sem renunciar suas reivindicações a alguma memória do Gaullismo. E nem precisava disso. As metas neoliberais caíram mais naturalmente para a maioria do seu eleitorado, exigindo menos adornos.

Entretanto, dos dois blocos, a centro-esquerda era melhor equipada para introduzir as reformas neoliberais. A resistência a estas sempre foi mais provável de vir das classes populares, nas quais estava a maior parte de sua própria base social, em particular – embora não exclusivamente – os sindicatos. De todos estes, somente o colaboracionista CFDT (Confederação Francesa Democrática do Trabalho) era suficientemente confiável para engolir qualquer coisa. Para a centro-direita, provocar um conflito frontal com os trabalhadores ou movimentos estudantis, sem falar das camadas populares simpáticas a segmentos, era um convite à derrota, como descobriram Juppé em 1995 e De Villepin em 2006. De modo contrário, alegando ainda representar os pobres e oprimidos e interpretar seus melhores interesses, o PS estava numa posição mais favorável para neutralizar tal oposição, como mostrou o sucesso de Valls ao fazer tramitar uma lei trabalhista que agradou aos empresários em 2016. Tampouco foi casualidade que ao longo dos anos a centro-esquerda privatizou muito mais empresas públicas que a centro-direita.

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Inevitavelmente, as dificuldades de longa data, que remontam aos anos 80, no caminho de uma reforma neoliberal do capitalismo francês se intensificaram quando a crise financeira de 2008-09 atingiu o país. A condição deteriorante da economia, à medida que o crescimento caía e o desemprego aumentava, tornou os duros remédios do mercado ainda menos toleráveis aos que sofrem na base da sociedade, porém ainda mais urgentes – para que a França voltasse a ser competitiva de novo, a única rota para a prosperidade geral – aos olhos dos que estão no topo. A crise atingiu a França sob Sarkozy, que se equilibrou o melhor que pôde entre a necessidade de reformas e a necessidade de reeleição, ficando no final sem nenhuma das opções. Com a centro-direita travada, a alternância funcionou uma vez mais, colocando a centro-esquerda no gabinete. Mas se a presidência de Sarkozy foi uma decepção para a centro-direita, Hollande provou-se um desastre para a centro-esquerda, alongando até o ponto de ruptura sua já esgarçada corda bamba entre a promessa eleitoral e a performance política. Depois de fazer campanha com uma retórica mais radical que seus predecessores, anunciando que “meu inimigo é o setor financeiro” e prometendo a revisão do Pacto de Estabilidade escrito por Berlim e Bruxelas, além da taxação dos ricos e ajuda aos pobres, Hollande logo presidia um governo mais conspicuamente atado aos negócios e ligado a Berlim do que Sarkozy, além de confiar ainda mais nas aventuras militares na África e no Oriente Médio como injeções temporárias de adrenalina na nação. O crescimento não conseguiu acelerar, nem o orçamento conseguiu se equilibrar; a renda per capita continuou estagnada; o número de desempregados, ao invés de cair, aumentou.

Um ano depois de sua eleição Hollande já era o presidente mais impopular da história da V República. Sarkozy foi rejeitado por sua arrogância e desapontou as expectativas de seu governo. Mas quando ele concorreu para a reeleição, ele ainda pôde reunir 48,4% dos votos. Hollande, ao contrário, foi desprezado por suas indecências, indignando e perdendo ruidosamente o apoio da vasta maioria dos que votaram nele. Com menos de 12 meses de mandato, os seus índices nas pesquisas caíram para o patamar de apenas um dígito. Um colapso assim na popularidade não tinha precedentes. Parecia certo que a corda bamba estava prestes a romper, precipitando sua queda. No entanto, o senso de autoestima de Hollande era tal que a seis meses do início da disputa eleitoral de 2017, ele ainda cogitava concorrer à reeleição, calculando que poderia usar a autoridade do governo para conservar o apoio do PS e com isso ter uma boa chance de manter a centro-esquerda no poder. Ao menos ele tinha uma razão para estar confiante: era improvável que o partido impedisse um presidente em exercício de ser candidato. Todos esses cálculos foram destroçados pela publicação em outono de um livro de 650 páginas no qual dois jornalistas do Le Monde relataram suas conversas com ele ao longo de cinco anos, de 2011 a 2016. Uma coleção suicida de rancores e vaidades fúteis – incrivelmente não ocultada, mas autopromovida 5 –, cujo efeito foi uma versão francesa das gravações de Nixon. O que permanecia de sua reputação foi destruído. Finalmente, percebendo que sua candidatura não tinha mais esperanças, ele se retirou em seguida da disputa presidencial.

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Com as pesquisas lhe indicando uma ampla vantagem, a centro-direita parecia caminhar para uma vitória fácil e a França se preparava para a costumeira alternância. Na esteira da autodestruição de Hollande, o partido de Sarkozy, renomeado Os Republicanos, promoveu uma primária de dois turnos para escolher o candidato à presidência. Para surpresa geral, nem Sarkozy nem Juppé, o favorito, emergiram vitoriosos. Ao invés disso, o ex-primeiro ministro de Sarkozy, François Fillon, foi quem alterou o quadro, aplicando uma mistura heterodoxa de Gaullismo e Thachterismo – um programa socioeconômico mais radicalmente neoliberal do que já fora apresentado antes na França, em ruptura com os compromissos consensuais do ‘Welfare State’, combinado com uma política externa mais independente que qualquer um dos campos já se atreveu a imaginar desde De Gaulle, em ruptura com os tabus dos EUA e da UE em relação à Rússia e ao Oriente Médio. Com uma folgada liderança nas pesquisas nacionais – no começo de dezembro, alcançava 30% das preferências eleitorais do primeiro turno – parecia quase certo que ele seria o próximo presidente, dado o impulso automático dos partidos em apoiar qualquer um que enfrentasse sua desafiante mais próxima, Marine Le Pen, 7 pontos percentuais atrás dele, mas virtualmente garantida no segundo turno, no qual mais de 60% do eleitorado expressava a intenção de votar no adversário dela, seja lá quem fosse.

Seis semanas depois, um raio dificultou tal perspectiva. Em 24 de janeiro, Le Canard Enchaîne revelou que Fillon por anos usava as verbas de seu gabinete parlamentar na Assembleia Nacional para pagar sua esposa, e mais tarde também seus filhos, em troca de serviços imaginários. Imediatamente colocado sob investigação judicial – situação que durante as primárias Fillon havia dito coincidentemente que desqualificava qualquer postulante à presidência, num ataque escassamente velado a Sarkozy, bastante ameaçado por investigações – sua posição nas pesquisas entrou em colapso. Uma semana mais tarde ele despencou para o terceiro lugar e nunca mais se recuperou. A centro-direita, incapaz de forçá-lo a desistir, estava de repente fora do jogo.

Ao eliminar Fillon, Le Canard Enchaîne tornou-se o ‘Grande Eleitor’ do país; sua intervenção efetivamente decidiu a corrida presidencial, cujo resultado era previsível desde o início. A natureza espetacular de seu furo jornalístico praticamente não despertou nenhuma curiosidade quanto a sua origem. No entanto, aí certamente repousa a chave para o desenlace. As malversações de Fillon não estavam de nenhum modo fora do que é comum na classe política francesa. Uma estimativa indica que por volta de cem deputados da Assembleia Nacional usaram suas verbas de gabinete de forma semelhante – talvez, haja mais amantes do que esposas na lista de pagamento. As somas de dinheiro envolvido, consideráveis para os padrões das pessoas comuns, eram pequenas quantias no alto escalão da corrupção política na França – pouco mais do que um ‘furto’, como disse um crítico mordaz.

Evidências, entretanto, que requerem acesso a contas bancárias, declarações fiscais e similares, eram mais difíceis de encontrar. Como o Canard adquiriu tudo isso, em um momento tão estratégico? O semanário, reputado como a publicação dos maiores escândalos da França, pode ser comparado ao Private Eye na Grã-Bretanha, com ambos oferecendo uma mistura de sátira e relato. Se o humor elefantino da versão francesa faz sua contraparte britânica parecer sagaz, a principal diferença reside na maior intimidade do Canard com o tenebroso mundo das manobras de bastidores da classe política e as operações manipulatórias dos serviços de inteligência franceses, aos quais serviu mais de uma vez como um solícito instrumento6. O momento de sua exposição sobre Fillon foi uma indicação inequívoca de que aquilo não era fruto de meses de investigação paciente e independente, mas simplesmente um pacote – consoante com a orientação política da publicação – entregue a ela por grupos interessados no aparato estatal. Esses poderiam ter sido funcionários indicados pelo PS no Ministério das Finanças, agindo para prejudicar o provável vencedor do campo da oposição; homens de confiança de Sarkozy, dos quais ainda há muitos na polícia, exercendo uma vingança contra Fillon por este ter feito o seu melhor para levantar suspeitas sobre seu rival no caso Jouyet 7; ou o complexo de segurança diplomático-militar, movendo-se para destruir uma ameaça à unidade franco-germânica na Crimeia e às sanções ocidentais sobre a Rússia, da mesma maneira que seus homólogos americanos puseram em xeque a inclinação de Trump para aproximar-se de Moscou. Seja qual for a fonte do dossiê, seu efeito na eleição foi maior que a combinação de todos os discursos de campanha dos diferentes candidatos.

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O Canard publicou sua história dois dias depois do primeiro turno da primária no Partido Socialista ter revelado toda a extensão da desordem na centro-esquerda. Logo que Hollande desistiu, seu primeiro-ministro Manuel Valls, que há muito estava de olho na oportunidade, anunciou que concorreria à presidência. Admirador mais conhecido de Blair na França, Valls nunca foi popular dentro partido, sendo tão musculoso quanto direitista, a ponto de clamar abertamente para que se abandonasse qualquer pretensão de socialismo. Ele esperava, entretanto, capitalizar sua posição à frente do governo com a imagem de um inimigo atroz do terrorismo. A aguda inclinação neoliberal e autoritária de seu último ano no cargo, no entanto, provocou bastante revolta na base do partido a ponto de desmontá-lo. Bem à frente no primeiro turno e um vencedor acachapante no segundo turno das primárias foi outro ministro de Hollande, Benoît Hamon, que se demitiu do governo no final de 2014 para concorrer como um candidato da esquerda do partido. Uma figura pálida, desfrutando de pouco ou nenhum apoio do establishment do PS e com escasso apelo para fora do reduzido perímetro de sua base, sua vitória simplesmente anunciou a condição a qual o PS tinha se reduzido: esvaziado e dividido. Valls ainda se recusou a votar nele. Sua investidura como candidato, selada somente depois que Fillon estava efetivamente nocauteado no ringue, levou a centro-esquerda tão claramente para fora do jogo como havia ocorrido com a centro-direita cinco dias antes. Em abril, Hamon conseguiria alcançar apenas 6% do eleitorado.

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Na segunda semana de fevereiro, com a remoção de ambos os polos de alternância, estava claro quem seria o próximo presidente. Em outubro, Emmanuel Macron, ministro da Economia de Hollande, demitiu-se de seu posto para concorrer contra seu patrão. Em abril de 2016, ele criou um movimento batizado com seu próprio monograma, En Marche! (EM), com a óbvia intenção de testar suas possibilidades de capturar o Élysée. Em novembro, ele anunciou devidamente que estava no páreo. Um produto típico das camadas superiores da classe política, uma cria da École nationale d’administration (ENA) – um énarque, portanto – movendo-se sem muito esforço entre o serviço público e o enriquecimento privado, de Inspetor das Finanças a milionário repentino em parceria com Rothschild, ele se juntou ao PS em 2006, retirando-se dele em 2009, para depois fazer as conexões que o alçariam à entourage pessoal de Hollande em 2012, do qual se tornou vice-chefe de gabinete e rapidamente, aos 36 anos, uma liderança ministerial no governo. Seduzido por esse enfant choyé [“rapaz mimado”], Hollande viu nele uma versão mais jovem dele próprio, adornando seu regime com um toque de glamour juvenil. “Macron, c’est moi”, ele disse a seus jornalistas8. No que diz respeito à política, ele não estava errado: pouco ou nada os dividia – como assegurava o histórico de Macron, ele seria um ícone amigável ao mercado para encampar a política de desregulamentação da forma como queria Hollande. Dificilmente importava que ele não fosse mais formalmente um membro do PS, já que privadamente Hollande admitia que o partido era algo do passado. Mas Hollande se enganou ao pensar que Macron seria um príncipe leal, uma vez que este lhe devia sua própria ascensão. De perto, Macron podia ver o provável destino de seu governo e no momento exato não hesitou em afundá-lo em benefício de suas próprias ambições. No momento em que anunciou sua candidatura, ele já tinha reunido em abundância apoiadores nos círculos empresariais, burocráticos, profissionais e intelectuais. Juntamente com um adequado orçamento de guerra e uma ampla cobertura midiática, ele pôde progredir como a encarnação de tudo o que era dinâmico e avançado na França.

Ideologicamente, desde o início, Macron lançou o En Marche! como um movimento que transcendia a ultrapassada oposição entre direita e esquerda na França rumo à criação de uma nova e refrescada política de centro, liberal na economia e social na sensibilidade. Esse era, com certeza, por si só um apelo desgastado, oferecido repetidamente por diversos políticos e correspondente a uma demanda real no meio do espectro da opinião pública, mas que nunca conseguiu acabar de modo bem-sucedido com a dicotomia de esquerda e direita. Em parte por causa da lógica polarizante do sistema eleitoral e, em parte, por causa do fato de que a oposição dominante se dava entre dois blocos em que cada qual poderia legitimamente reivindicar o mesmo prefixo: centro-esquerda e centro-direita. Entretanto, no momento em que ambos estavam desativados, um centro autodeclarado ‘puro’ poderia pela primeira vez comandar o palco. Ao projetar sua construção, Macron teve que lidar com o último pretendente ao papel, o político católico François Bayrou, que concorreu à presidência em todas as eleições desde 2002 (conquistando uma alta pontuação de 18,57% em 2007), e que poderia subtrair eleitores de Macron caso concorresse novamente. O partido político do qual ele provinha, a UDF, foi uma criação de Giscard nos anos 70, e em suas subsequentes metamorfoses (agora se chama UDI), serviu como um tradicional, quando não invariável, aliado do maior partido de extração originalmente gaullista liderado por Chirac – de quem Bayrou tinha sido ministro – e Sarkozy9. A UDI sempre foi um componente mais significante do bloco da centro-direita do que qualquer elemento homólogo na centro-esquerda. Como Macron teria dificuldades em esconder sua passagem pelo PS, era ainda mais importante assegurar o apoio de Bayrou, para certificar que sua candidatura tivesse visível endosso no campo oposto, onde a bandeira do centro sempre crescia de modo consistente. Em 22 de fevereiro, Bayrou embarcou sem desnecessária tergiversação. Macron ganhou imediatamente 5 pontos nas pesquisas. O centro agora era verdadeiramente sua propriedade. Bem à frente de Fillon, com um abatido Hamon muito atrás, Macron bloqueou a Presidência.

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Tal não foi, entretanto, a narrativa em francês, e muito menos na mídia internacional. Lá, a eleição apresentou-se como um drama, até mesmo uma disputa nervosa, dominada pela ameaça da Frente Nacional – fascismo levemente dissimulado ou populismo raivosamente tóxico, de acordo com o gosto – chegar ao poder num pesadelo “versão gálica” da vitória de Trump nos EUA. Em parte, a lógica típica da imprensa e da televisão ditou isso. Notícia não é notícia se for algo previsível: excitar frissons de medo vende melhor do que garantias chatas de conforto. Mas também, muito mais importante para os propósitos do segundo turno, era a lógica padrão da ordem estabelecida: quanto mais sensacionalista o perigo da extrema-direita, mais esmagadora a necessidade de todos os cidadãos decentes seguirem atrás do campeão da democracia, cuja identidade poderia com tato ser deixada em branco num primeiro momento, antes de se tornar, para alívio geral, um jovem e encantador banqueiro.

A presente realidade da FN pouco tem a ver com tudo isso. Formada no início dos anos de 1970 pelo ex-paraquedista Jean-Marie Le Pen, foi originalmente um pequeno partido de extrema-direita, de perspectiva antissemítica e anticomunista clássica, que uma década mais tarde conquistou seu primeiro, ainda que modesto, avanço eleitoral (9,65%), arrebatando votos da classe trabalhadora desiludidos com o giro de Miterrand à austeridade. Ideologicamente, a FN permaneceu – e isso não foi tão comum para os partidos de extrema-direita do período – militantemente pró-Europeu e antiestatista, a favor do livre-mercado10. Depois de Maastricht, arrefeceu seu entusiasmo pela Europa e gradualmente aumentou sua audiência popular, como o único partido que não estava implicado na visível corrosão do sistema político e na deterioração das condições de vida da população sob tal regime. Em 2002, foi um choque para o establishment quando Le Pen conseguiu passar para o segundo turno da eleição presidencial, antes de ser esmagado pelos incontestáveis 82% de Chirac11, e cinco anos depois reduziu-se para um décimo do eleitorado. Na sequência desse revés, Le Pen retirou-se, e sua filha Marine assumiu a liderança do partido. Posteriormente, a combinação da Grande Recessão com as habilidades políticas muito maiores de Marine e a queda livre do governo de Hollande, jogou vento em suas velas. Crucial para seu sucesso vindouro foi o reposicionamento de Marine como não apenas um martelo contra a UE, mas também – outra transformação de 180 graus – uma campeã da proteção do Estado de Bem-Estar e da intervenção estatal, contra as devastações do neoliberalismo. Em 2014, a FN chegou ao primeiro lugar nas eleições europeias realizadas na França, com um quarto dos votos.

Sociologicamente, esse crescimento deveu-se à conquista de votos da FN entre a classe trabalhadora, onde o partido veio a ocupar o espaço vago deixado pelo comunismo francês. Não se tratava do proletariado das fábricas sindicalizado de antigamente, largamente destruído pela desindustrialização, mas de seus sucessores atomizados, que trabalham duro em uma sobrevivência precária com contratos de curto prazo em pequenas firmas, geracionalmente separados de seus predecessores na experiência diária e cultura circundante. A FN não conta com professores e funcionários públicos, como o PCF, mas com pequenos empresários, profissionais autônomos ou artesãos. Unidas pela hostilidade aos políticos e tecnocratas da parte de cima e aos imigrantes e vagabundos na parte de baixo, as contradições desse bloco não foram objetivamente menores que as dos dois campos competidores do establishment. Mas eles não foram submetidos ao mesmo teste subjetivo: uma vez que a Frente Nacional foi excluída do sistema político, ela não poderia ser culpada por seus crimes – entre todas as forças organizadas, era a única claramente inocente e também frequentemente a única que parecia falar a verdade.

Com Marine, a FN se tornou o primeiro partido da classe trabalhadora francesa. No primeiro turno das eleições desse ano, o número de trabalhadores (37%) que votaram nela esteve muito à frente de qualquer outro partido. No segundo turno, uma maioria de 56%. À medida que a desigualdade de renda e a insegurança empregatícia aumentaram constantemente sob o sistema de alternância em conluio, assim também ocorreu com os que estavam dispostos a votar na FN: 4,8 milhões de votos na eleição presidencial de 2002, 6,8 milhões de votos nas eleições regionais de 2015, 7,7 milhões de votos no primeiro turno em 2017, 10,6 milhões de votos no segundo turno – a última cifra aparece, entretanto, como um produto das distorções impostas pela corrida de duas voltas. Seu real nível de apoio é por volta de um quinto do eleitorado, menos do que aqueles – principalmente trabalhadores também – que se abstêm, votam em branco ou anulam suas cédulas 12. Nunca houve a mínima chance de Marine vencer a disputa pela presidência. Longe de ser uma mortal ameaça para o sistema em curso, a FN é uma parte eminentemente funcional ao mesmo, juntando toda a opinião respeitável, que de outra forma poderia hesitar ou questioná-la, em uma ansiosa ou autojustificada defesa do status quo: o espantalho ideal de uma república neoliberal.

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Por fora do sistema, no flanco oposto, estava a recente criação de La France insoumise, liderada por Jean-Luc Mélenchon. Mais jovem por uma geração que [Tony] Benn e uma dezena de anos mais novo que [Oskar] Lafontaine, Mélenchon foi a última figura principal dos partidos europeus da Internacional Socialista a se virar – tardiamente, em sua carreira – bruscamente para a esquerda, apesar de descartar o rótulo como demasiado limitante. De um família pied-noir [“pé-negro”, franceses que viviam nas ex-colônias francesas] que se mudou do Marrocos para a França em 1962, depois de uma formação inicial no ramo lambertista do trotskismo francês que produziu muitos quadros do PS, ele se tornou um ardente admirador de Miterrand. Crescendo rapidamente no interior do Partido Socialista, aos 35 anos, tornou-se o senador mais jovem da V República. Ativo nos argumentos internos e nas disputas do partido à esquerda dele, por mais de três décadas permaneceu leal a sua liderança, defendendo a conversão de Miterrand à austeridade, votando por Maastricht, tornando-se um ministro de Jospin e aprovando sua ruinosa mudança para a Constituição.

Em 2005, entretanto, ele se virou contra a proposta da Constituição Europeia, esmagadoramente apoiada pelo PS e rejeitada por uma longa maioria no referendo subsequente. Três anos depois, ele abandonou o partido para criar à esquerda deste uma pequena formação, com a qual negociou uma aliança junto ao PCF para disputar as eleições de 2012, em uma frente de esquerda, a Front de Gauche, concorrendo ele próprio como seu candidato presidencial. A experiência não foi um sucesso: Mélenchon obteve 11% dos votos, uma pontuação um pouco maior do que a combinação de várias pequenas organizações de esquerda em 2002 e a FG atingiu somente 7% nas eleições legislativas. Mélenchon esperava que a Front unisse socialistas desiludidos e comunistas residuais em uma versão francesa do Die Linke na Alemanha (Lafontaine esteve presente em sua fundação); mas o PCF, agarrado em seus acordos locais de longa data com o PS, não tinha a intenção de se unir dessa forma, e nada disso aconteceu.

Alterando a tática, quatro anos mais tarde, Mélenchon criou um movimento inteiramente novo, La France insoumise, para concorrer à presidência novamente, desta vez independente de qualquer outra força. A mudança foi mais do que meramente organizacional. Fascinado por algum tempo pelo sucesso dos governos heterodoxos na América Latina, Mélenchon extraiu uma inspiração particular do exemplo de Rafael Correa no Equador, assim como ele um ex-ministro de um partido social-democrata, pioneiro na ideia de uma “revolução cidadã”, que reescreveu a Constituição, redistribuiu riqueza e protegeu o meio ambiente. Esse era o caminho a seguir para abandonar os esquemas exaustos da tradicional esquerda europeia rumo a um populismo radicalmente progressista, convocando o povo a lutar contra as elites no controle de um sistema econômico e político falido. Impressionado com a visão estratégica de Ernesto Laclau e Chantal Mouffe, com quem se encontrou na Argentina em 2013, Mélenchon começou a aplicar suas lições em casa13. Com uma plataforma não muito diferente de Correa – a primeira de suas demandas foi o chamado pela VI República, a ser fundada por uma Assembleia Constituinte que acabe com a “monarquia presidencial” e o sistema eleitoral manipulado, criando uma democracia parlamentar equitativa com direito de recall e referendos14 – La France insoumise substituiu as bandeiras vermelhas e o hino da Internationale pela bandeira tricolor e a Marseillaise em seus comícios, apelando a todos os patriotas, independente de classe ou idade, a se levantar contra a ordem decadente da V República. Tomando emprestado o grito que derrubou Ben Ali na Tunísia, “Dégagez!” – “Saia!” – tornou-se o leitmotiv da campanha. Amplamente reconhecido como vitorioso nos debates televisivos, com uma verve retórica incomparável em comícios massivos, projetado de cidade a cidade por hologramas, Mélenchon conquistou o maior crescimento – cerca de 7% – entre os candidatos nas semanas finais da campanha.

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Foi um feito impressionante. A votação final para o primeiro turno viu os quatro candidatos à frente proximamente agrupados: Macron com uma clara liderança de 24%; os outros três separados por uma margem um pouco maior que um ponto percentual, Le Pen 21,3%, Fillon 20,01%, Mélenchon 19.58%[15]. A virada populista da France insoumise foi recompensada. Mélenchon ultrapassou Le Pen em sua posição de longa data de política mais popular entre os jovens da nação, conquistando 30% do grupo de idade 18-24 anos, e entre os desempregados, obtendo 31%, com um forte grau de apoio também entre os jovens imigrantes nas banlieues suburbanas. Em quatro das dez maiores cidades da França – Marseille, Toulouse, Montpellier, Lille – ele ficou em primeiro. Com uma porcentagem um pouco abaixo do que conquistou Podemos na Espanha no verão anterior (21%), fazendo campanha com um programa muito mais radical, reduziu Hamon para um patamar um pouco acima dos 6%. La France insoumise conquistou aquilo que o movimento espanhol buscava e não conseguiu fazer, derrotar o Partido Socialista nas urnas16. Mas não conseguiu ultrapassar a FN, uma vez que Marine manteve uma grande vantagem entre os trabalhadores manuais e não-manuais, e nos dois estratos de menor renda. Somando as duas formações, a FN e a LFI conquistaram 40% dos que escolheram um nome na cédula em abril de 2017. Outros 24% se abstiveram ou votaram em branco17. Nenhum outro país da Europa Ocidental tinha assistido à tamanha rejeição radical da ordem estabelecida. Dois de cada cinco eleitores, para estremecimento dos comentaristas mainstream, estavam aparentemente prontos para embarcar em qualquer aventura “insensata”18. Onde isso pode terminar?

Na realidade, as duas forças antissistêmicas, ao invés de se agregarem em uma insurgência populista comum, se anulam mutuamente. Por mais semelhantes que sejam as críticas ao sistema social e econômico, as diferenças morais e ideológicas insuperáveis ​​sobre a imigração os separam em extremos opostos do espectro político, onde cada um demoniza livremente o outro19. Enquanto a FN tem a vantagem na competição entre os dois, ela fornece o fantasma necessário para a unidade ritual em torno da Quinta República, realizando na segunda rodada da eleição presidencial o mesmo serviço que quinze anos antes. Desta vez, no entanto, o apelo por uma união sagrada foi menor. Mélenchon recusou-se a incentivar seus eleitores a seguir um vitorioso tão desagradável para eles, que não necessitava de seu apoio. E dois quintos não o fizeram, engrossando o maior nível de abstenções em quase cinquenta anos. Macron cruzou a linha de chegada com uma enorme margem, praticamente o dobro da votação de Le Pen – se nacionalmente não atingiu o nível de Chirac, alcançou-o em Paris, com um pontuação usbeque de 90%, gratificante o suficiente. Para um eleitorado total de 47,5 milhões, Macron ganhou 20,7 milhões, 16,2 milhões se abstiveram ou votaram em branco e 10,6 milhões optaram por Le Pen.

O que os números deixaram claro foi a origem política e o contexto social do apoio a Macron. No primeiro turno, ele levou 47% dos que votaram em Hollande em 2012 e 43% dos votos de quem votou em Bayrou, em cada caso praticamente o dobro de qualquer outro candidato, contra apenas modestos 17% dos que votaram em Sarkozy. No segundo turno, de longe o seu maior resultado, 71% estavam entre os que votaram em Hamon. Socialmente, ele liderou nas duas categorias de renda mais altas no primeiro turno 20. Em outras palavras, o grosso de seu apoio foi uma versão reciclada do bloco de centro-esquerda que colocou Hollande no poder. Não exatamente o mesmo, porque, desta vez, parte desertou para Mélenchon e um pequena parcela permaneceu fiel a Hamon. Tais perdas foram compensadas por eleitores de Bayrou que tinham migrado em números similares para Sarkozy em 2012 e por cerca de um terço da UDF, que depois de abandonada por Bayrou, permaneceu com a centro-direita. O peso relativo dos dois componentes no campo vitorioso, portanto, mudou: a coalizão de Macron fica mais ao centro. Mas, dentro dela, não há dúvida quanto ao partido que ofereceu a maior parte de pessoal-chave e de software político – organizacional ao novo governante. O pequeno círculo político em torno dele derivou da equipe reunida por Strauss-Kahn, antes de sua desgraça na corrida presidencial de 2012, e de ex-assessores do Ministério da Economia de um governo do PS. Paradoxalmente, as contingências de vaidade e o jornalismo escandalizante – Le Monde e Le Canard entre eles – produziram o mais irônico de todos os resultados: o presidente menos popular na memória vivente, dirigindo a administração mais desacreditada, resultou em uma sucessão encabeçada por um figura vinda da mesma estrebaria, que ele criou e imaginou como seu Doppelgänger [Lenda germânica de um monstro que tem a capacidade de representar uma cópia idêntica de uma pessoa que ele escolhe ou que passa a acompanhar] . Ele iria se arrepender de sua confiança em “Macron, c’est moi”, mas o grau de continuidade política entre os dois está lá para todos verem.

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Com luzes de neon hype de uma jubilante imprensa internacional e uma sicofanta imprensa doméstica, Macron é apresentado como a versão francesa de Trudeau, Obama e (ou para os que têm memórias seletivas) Blair. As similaridades de ideologia e imagem são reais. Mas há diferenças significativas. Pessoalmente, embora muito tenha sido feito de seu charme, metade do país tem se provado imune a ele: na véspera do primeiro turno, 46% da população expressava sua aversão por ele, já que sua campanha deixara entre muitos uma impressão de arrogância, pretensão e estridência. Arrogância: um énarque dos énarques, exalando dinheiro e desdém pelos peixes menores, cercado por gente de seu tipo – cinco de cada sete membros de seu círculo também se formaram na ENA. Pretensão: seu manifesto banal de campanha autointitulou-se nada menos que Révolution — um confete sobre si mesmo, inconsciente da ridicularização de suas alegações de intimidade com a mais fina flor da literatura e filosofia nacionais (“Eu sou muito Camusiano”), misturadas com torturantes pronunciamentos de grandiloquência patriotard21. Estridência: a vibração de um tele-evangelista, braços levantados elevando a sua voz ao volume máximo durante os comícios. Uma vez investidas na dignidade da presidência, estas deficiências estarão certamente sob um controle maior.

Atrás dele, conforme atestam as evidências disponíveis, há uma implacável vontade e uma inteligência política que superam seus análogos atlânticos. Nenhum deles chegou ao poder com tanta velocidade, com tantas bravatas e com tão pouco lastro. E nem é a única vantagem de Macron sobre eles. Tanto o escritório que ele capturou, quanto o campo em que ele confronta lhe oferecem uma maior liberdade de manobra. Os poderes da presidência francesa, sem os constrangimentos de eleições de meio-termo ao Congresso ou uma Suprema Corte refratária, ultrapassam os poderes dos presidentes americanos e são imunes à rebelião da oposição parlamentar britânica: a designação dos franceses como presidentes “reais” não é pura metáfora. Além dessas prerrogativas familiares, há uma clareira excepcional aberta antes dele. Por mais de três décadas, as reformas neoliberais da França foram uma sequência de passos difíceis na direção desejada (que nunca poderia ganhar um impulso conclusivo por causa da alternância entre centro-direita e centro-esquerda, cada lado se esforçando o máximo possível para avançar, cada um impedido por parte significativa de sua base constituinte) e bloqueada pelo sistema eleitoral caracterizado pela competição bipolar. Em 2017, com o derretimento do PS e a extenuação de seu rival, há repentinamente toda a chance para esse impasse ser quebrado.

Historicamente, nenhum presidente recém-eleito da V República conseguiu ganhar uma maioria na Assembleia Nacional, e pouco deles venceram de modo tão esmagador. Mas a maioria sempre foi uma construção partidária, composta por deputados representando um partido pré-existente ou uma coalizão de partidos, e desde os anos 80, sujeita a pressões contraditórias ou demandas de seu eleitorado. Macron, alcançando dois terços dos votos no segundo turno, poderia estar confiante quanto a sua governabilidade – deliberadamente reforçada pela mudança constitucional de 2001 – visto que na esteira da vitória um ingressante no Executivo pode confiar na varredura do Legislativo também. Mas, ao contrário de seus antecessores, ele só pode produzir uma Assembleia a seu gosto praticamente do nada, guarnecida com novatos e trânsfugas de sua máquina recém-nascida, La République en marche, tão dependente de seu criador como uma vez foram os membros da Forza Italia de Berlusconi. Se o núcleo inicial dessa construção vem do PS, reforçado com contribuições do MoDem de Bayrou e algumas lantejoulas da ‘sociedade civil’, o objetivo estratégico é se ampliar com a cooptação de lideranças da direita. Encorajados pela escolha antecipada de um companheiro seu como primeiro-ministro (Édouard Philippe, outro énarque), e outro, Bruno Le Maire, como ministro das Finanças, um bom número de deputados já está ansioso para saltar dentro de seu barco e, certamente, mais deverão fazê-lo. Logicamente, o resultado deveria ser um centro hegemônico com uma super-maioria, capaz afinal de realizar a modernização da França de acordo com suas melhores prescrições.

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Com este sistema eleitoral excludente ainda em vigência, no plano institucional há pouco o que se possa fazer para detê-lo. Em 1958, com 20,4% dos votos, De Gaulle assegurou 198 deputados, enquanto o PCF com 19,2% obteve apenas 10 deputados. Na primeira semana de junho, o resultado na Assembleia tornou-se tão previsível que no primeiro turno das eleições legislativas, mais da metade do eleitorado sequer se preocupou em votar – 51,29% se abstiveram com outros 2,23% votando em branco ou rasurando suas cédulas: um número sem precedente não somente na França, mas em qualquer país da Europa Ocidental desde a II Guerra Mundial. Com o apoio de apenas 15,39% do eleitorado La République en marche terá certamente o domínio sobre 80% do legislativo, a maior avalanche partidária da história da V República22. Os Republicanos, desmoralizados pela desgraça de Fillon e enfraquecidos pelas deserções, estão sem ânimo ou posição para causar maiores problemas. Nas ruas, os sindicados – à exceção da CFDT – tentarão resistir, mas, tendo provado incapacidade para bloquear a legislação trabalhista El Khomri sob Hollande, é improvável que eles façam algo melhor com Macron, ao menos no início, no período de lua de mel de um novo governo. Domesticamente, Macron colherá os benefícios do atual crescimento do ciclo econômico, e não há dúvidas de que seja capaz de impulsionar a maior parte de seu programa, uma versão francesa da agenda de Schröder em 2010 – desregulamentação do mercado de trabalho, corte nos gastos públicos, prioridade para as start-ups, redução dos impostos corporativos, simplificação do sistema de bem-estar social – sem excessiva dificuldade. Ele será cuidadoso em fazer isso, procurando ser mais uma variante compensatória do que disciplinadora do neoliberalismo, com alguns pagamentos paralelos aos menos favorecidos. Com uma dívida doméstica ainda bastante baixa – 57% do PIB, contra 53% da Alemanha e 88% da Grã-Bretanha – há muito espaço para uma bolha de crédito. Animado por um governante que é um dos seus, o espírito animal do capital poderá ser reavivado, elevando os investimentos.

Se os resultados corresponderão às expectativas é outro assunto. O boom exportador da Alemanha, que fez o país retornar a um crescimento moderado e diminuiu o desemprego, foi viabilizado pela repressão salarial, não pela Agenda 2010, cuja contribuição para a recuperação foi mínima. Além disso, houve aumento da desigualdade e da precarização – em comparação com a França, mais que o dobro da porcentagem de trabalhadores ganha menos que dois terços do salário médio. Uma cultura política Biedermeier e a comparação com os vizinhos menos afortunados deixaram o país socialmente sedado. Não há condições que possam prontamente ser replicadas na França. Um competitivo superávit nas exportações aos moldes germânicos está fora de cogitação, um falácia de composição. A cultura política francesa, por mais que os últimos trinta anos ingloriosos a tenham diluído ou dopado, ainda é terreno potencialmente mais explosivo que as tranquilas paisagens do outro lado do Reno. Se o crescimento e o emprego aumentassem mais rapidamente, uma atmosfera de Segundo Império poderia se instalar no país uma vez mais. Mas isso está longe de ser garantido.

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Crucial para o sucesso de tal perspectiva é o mais importante lado da agenda de Macron, para a qual a reforma doméstica é concebida como um adiantamento. A maior aposta em vista é o futuro da Eurozona. Há muito tempo o consenso em Paris é que a união monetária em sua presente forma não só causou problemas para as economias mais fracas do cinturão mediterrâneo, como também dificuldades para o crescimento francês: a imposição de um limite máximo de 3% para qualquer déficit só é tolerável porque é contornável com a cumplicidade de Bruxelas23. Na disputa à presidência, a proposta mais marcante, citando uma opinião respeitável, para lidar com essa dor de cabeça de longo prazo veio do campo de Hamon, onde Thomas Piketty e outros espíritos esboçaram um projeto de “Tratado para a Democratização da Zona do Euro” – 22 artigos, com uma buliçosa apresentação. O T-Dem, como eles o batizaram, criaria um Parlamento da Zona do Euro composto por deputados de cada parlamento nacional, escolhidos por cada partido na proporção de seu respectivo peso nele (preenchido com uma pequena parcela, similar a Estrasburgo), que votaria impostos para um orçamento comum na Zona do Euro a fim de servir ao “crescimento duradouro, coesão social e convergência econômica”, mutualizar todas as dívidas públicas acima de 60% do PIB e eleger um ministro das Finanças da Eurozona, que administraria o orçamento resultante. Para afiançar aos eleitores do residual PS de que esse pacote seria de seu agrado, Piketty e seus co-autores explicaram, números na mão, que em tal parlamento da Zona do Euro, a esquerda poderia contar com uma sólida maioria24. A ingenuidade política do esquema – como se, além de todas as outras disposições, cada uma menos aceitável que a outra para a opinião alemã, esse cálculo se tornasse mais palatável para os social-cristãos bávaros ou os liberais holandeses – não precisa de muita ênfase.

A versão de Macron era prudentemente mais vaga, pedindo por um parlamento da Zona do Euro – ainda menos realista, composto apenas por todos os “membros de cada parlamento nacional”, um corpo que se desdobraria em milhares, reunindo uma vez por mês – e um ministro das Finanças da Zona do Euro que lançasse um atrevido plano de investimentos, sem especificar de onde viriam os recursos para algo assim25. Para o Ministro das Finanças em Berlim, essa visão poderia provavelmente ser esquecida como uma promessa de campanha que não devesse ser levada muito a sério. A classe política alemã está bem consciente de que Macron é seu interlocutor ideal, que provavelmente será aperfeiçoado, e fará todo o possível para fortalecê-lo – Schäuble mesmo declarou durante as eleições que “faria de tudo para ajudar”. Assim, alguma concessão sobre a Zona do Euro está praticamente assegurada. Mas é provável que essa concessão seja bastante cosmética, muito aquém de outra assembleia impotente, ou ministro manda-chuva, duplicando as estruturas existentes na União. Como as coisas estão, qualquer coisa mais séria enfrentaria firme oposição não somente da República Federal, mas dos parlamentos holandeses, filandeses, etc. O equilíbrio de forças em um sistema de poder neoliberal, mas ainda não neofederal, milita contra mudanças dramáticas.

Às margens do sistema, podem ser encontradas respostas mais radicais ao que a União se tornou. Na França, a moeda única não é apreciada pelo populismo, de esquerda ou de direita, embora a direita tenha levado algum tempo para mostrar uma posição contrária mais clara que a esquerda. Na campanha eleitoral, Mélenchon chegou a se aproximar do passado para enfrentar uma saída, mas tanto ele como Le Pen – cientes de que a perspectiva assusta muitos eleitores, especialmente os mais velhos – negaram qualquer intenção de rompimento unilateral. O que então? Apenas Mélenchon colocou a questão em seu quadro apropriado. O problema da reformulação da união monetária não é uma questão técnica, como tipicamente foi retratada, mas uma questão geopolítica. A França teria peso demográfico e econômico, se tivesse vontade política, para provocar um inexplicável Banco Central Europeu – a verdadeira ferida, não o euro – a agendar e compelir a Alemanha, uma sociedade envelhecida que não tem tanta força como parece, a aceitar a democratização social e política da União, sob pena de rompê-la[26]. Era a relação de forças que deveria em última instância importar. A França, junto com a Europa, pode permanecer à mercê das elites burocráticas e financeiras até que recupere seus nervos. Nenhuma linguagem poderia ser mais estranha ao novo governante do país. Por que lutar com a Alemanha, quando é tudo o que a França e a Europa deveriam ser?

Artigo originalmente publicado no site da New Left Review. Tradução de Charles Rosa para  Revista Movimento.


Notas

1 Dois quintos dos desempregados são desempregados de longa duração; 86% dos novos empregos em 2016 eram temporários, quatro quintos deles em contratos de menos de um mês: “The economy that France’s next president will inherit”, Financial Times, 8 de maio de 2017.

2 Para uma análise mais aguçada, ver Bruno Amable e Stefano Palombarini, L’illusion du bloc bourgeois. Alliances sociales et avenir du modèle français, Paris, 2017.

3 O excelente relato de Amable e Palombarini presta suficiente atenção nisso.

4 Attali, Verbatim I, Paris 1993, p. 399.

5 Em outubro de 2015, ele ainda considerava um segundo mandato como garantido. Foram especialmente prejudiciais seus ataques ao judiciário (“covardes”), a seus ministros (“inaudíveis”, “diáfanos”, “não-indentificáveis”), ao mundo da cultura (“difícil e ingrato”), para não falar da lamentável imagem que ficou quando a conversa tratou de suas duas amantes: [ver o livro de] Gérard Davet e Fabrice Lhomme, “Un Président ne devrait pas dire ça . . . “, Paris: Stock, 2016, pp. 155, 388–9, 81–95, 125, 129 ff.

6 Para abundante documentação sobre a interpenetração de pessoal e a conivência da revista com o PS sob Miterrand, pelo qual seus editores eram apaixonados, e seu papel particularmente odioso como uma engrenagem para os esforços de seu governo em ocultar sua responsabilidade pelo afundamento de Rainbow Warrior e o assassinato de um ativista de Greenpeace na Nova Zelândia, nos quais Le Canard trabalhou zelosamente para atribuir aos britânicos mais do que aos serviços secretos franceses, ver o registro pouco apetitoso em Karl Laske e Laurent Valdiguié, Le vrai Canard. Les dessous du Canard enchaîné, Paris 2008, pp. 245–347.

7Ver Davet e Lhomme, ‘Un Président . . . ’, pp. 445–56.

8 Davet e Lhomme, ‘Un Président . . . ’, p. 357: “mais tarde, essa pérola: ‘Emmanuel Macron é um ser que não é dual’”, p. 366.

9 Depois de sua performance na eleição de 2007, Bayrou saiu da UDF para criar seu próprio partido, MoDem, com o objetivo de oferecer uma marca menos conservadora de centrismo.

10 Jornalistas estrangeiros, encantados que Macron conseguisse tocar a ‘Ode to Joy’ de Beethoven, adotado pela UE como seu hino oficial, poderiam ter se surpreendido ao aprender que no final dos anos 80 o mesmo kitsch musical ressoou através dos amplificadores dos comícios de Jean-Marie Le Pen para a FN.

11 Para os bastidores da eleição, manipulação constitucional de Jospin, seu fiasco nas urnas, e a degradação inútil da esquerda no segundo turno de 2002, ver The New Old World, London and New York 2009, pp. 174–7.

12 Antes de 2017, estimou-se que menos de um em cada sete trabalhadores na realidade votam pela FN, tão extensa era a abstenção proletária: Patrick Lehingue, ‘“L’électorat” du Front National. Retour sur deux ou trois “idées reçues”’, in Gérard Mauger e Willy Pelletier, eds, Les classes populaires et le FN, Paris 2016, pp. 33–7, que reconhece, entretanto, que mais da metade do eleitorado da FN é a classe trabalhadora de um tipo ou outro, e que mais trabalhadores estão representados em listas eleitorais do que em qualquer partido. Esta camada de apoio concentra-se no Norte e Nordeste; no extremo-Sul, há mais conservadores, vindos de uma pequena burguesia bastante influenciada pelo catolicismo.

13 Veja seu próprio relato em Jean-Luc Mélenchon, Le choix de l’insoumission, Paris 2016, pp. 310–6. “Em suma, Chávez, Correa, Mujica, Laclau e Mouffe libertaram minha linguagem e minha imaginação política. O capítulo latino-americano de sua experiência foi o que me permitiu, antes de outros, substituir a velha fixação nos assalariados organizados. Na Espanha, Podemos fez a mesma tentativa. Todos os seus líderes aprenderam da América Latina revolucionária. Tanto na França quanto na Europa, quantos participaram nessa agitação em conjunto de ideias? Pouquíssimos! A maioria ainda está presa nos velhos esquemas da tradicional esquerda europeia, apesar do evidente fracasso de métodos”: pp. 315–6. Chantal Mouffe seria uma presença proeminente nas plataformas de Mélenchon.

14 Detalhado em Mélenchon, L’Avenir en commun. Le programme de la France insoumise et son candidat, Paris 2016, pp. 23–7.

15 No último mês da campanha, Fillon subiu nas pesquisas, sem no entanto se aproximar de Macron, ao mobilizar o neo-consevadorismo católico que nos anos recentes tem mostrado surpreendente crescimento entre os jovens educados, fornecendo boa parte da energia para seu triunfo nas primárias da centro-direita.

16Sua tarefa foi, certamente, mais fácil: na Espanha, o PSOE era mais oposição ao governo de centro-direita do que comparativamente desacreditado por uma debacle da centro-esqueda.

17Para os dados completos, ver o Ipsos Report, Premier tour. Sociologie des électorats et profils des abstentionnistes, 23 April 2017.

18Para uma típica reação de explosão, ver a versão francesa da antiga Elizabeth Drew, ou do atual Philip Stephens: Alain Duhamel, “La tentation de l’aventu”’, Libération, 20 April 2017.

19Não é em igual medida: onde o incêndio da FN foi dirigido de maneira esmagadora para a porta giratória dos partidos principais, ridicularizados por Marine como uma indistiguível UMPS, Mélenchon freqüentemente tomou a FN como seu principal alvo. Houve também uma assimetria na questão central que os dividia: onde a FN propôs soluções claramente xenofóbicas para a imigração, a FI – como a maioria da esquerda europeia em geral – desprovida de respostas comparativamente específicas – tenta evitar o assunto completamente. L’Avenir en Commun, seu programa para as eleições de 2017, contém 83 tópicos: a imigração mundial não é encontrada em qualquer um deles.

20Para esses dados, ver Ipsos Report, Deuxième tour. Sociologie des électorats et profil des abstentionnistes, 7 May, 2017.

21Os voos da mostra: “Eu aprendi de Colette o que era uma flor, de Giono um vento frio em Provença e a verdade dos personagens. Gide e Cocteau eram meus companheiros insubstituíveis”; “Tomei o caminho de caracteres em Flaubert, Hugo. Estava consumido pela ambição dos jovens sangues de Balzac”; ‘Andre Breton, que amava Paris tão bem, chegou um dia por casualidade no sertão do Lot e gritou: deixei de querer estar em outro lugar. Nunca me cansarei de contemplar a imóvel e fugitiva alma da França’; ‘no espírito da França há uma aspiração ao universal que é ao mesmo tempo uma indignação incessante ante a injustiça e a opressão, e uma determinação para dizer aos demais que nós pensamos no mundo, aqui, agora e em nome de todos. O espírito dos enciclopedistas dirigidos por Diderot oferece a quintessência desta louca ambição, embora a ambição seja nossa” Emmanuel Macron, Révolution, Paris 2016, pp. 14, 19, 45, 51–2. Em todos os lugares, numa publicação gerida por um verterano do Le Monde, Balibar, Ricoeur, Deleuze, Bourdieu são colocados a serviço de maneira similar, como naturalmente Camus, Chateaubriand, Char, etc. Macron par Macron, Paris 2017, pp. 18–22, 31, 41, 46, 84–5, 91. Depois de tudo, “Política é um estilo, uma magia”, explica a seu interlocutor.

22 Dos votos emitidos, LREM-MoDem levou cerca de 32%, Les Républicains 16%, FN 13%, La France Insoumise 11 %, PS 7%. Com 3% a mais de votos que a FN, Les Républicains poderia ter dez vez mais deputados. Pouco menos que uma farsa são essas figuras que reclamam que a FN é antidemocrática.

23 Para o imperturbável cinismo mútuo da Comissão e de Hollande em demandar e aceitar o teto, ambos sabendo perfeitamente bem que a França não respeitaria isso, meramente com o objetivo de desencorajar outros Estados-membro de descumpri-lo, ver o intercâmbio de Hollande com seus entrevistadores chateados: Davet e Lhomme, ‘Un Président . . . ’, pp. 516–7. A única regra do império da lei ritualmente sustentada pela União é a de que leis pode ser ignoradas quando for necessário.

24 Stéphanie Hennette, Thomas Piketty, Guillaume Sacriste e Antoine Vauchez, Pour un traité de démocratisation de l’Europe, Paris 2017, pp. 61–2, 74–5, 31–8.

25 Révolution, pp. 235–6.

26 Le choix de l’insoumission, pp. 381–3.


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