O eleitoral e o político

No aniversário de morte do maior sociólogo brasileiro, publicamos artigo publicado em 94 sobre a essência dos processos eleitorais no Brasil.

Florestan Fernandes 10 ago 2018, 15:36

O direito político fundamental em uma sociedade democrática moderna é a soberania popular. Os meios pelos quais esse direito se exerce são o sufrágio universal e o voto direto e secreto. Nossa Constituição estipula: “com valor igual para todos” e “nos termos da lei”. Todavia, o valor do voto depende de outras premissas históricas e da cultura cívica, realidades que exorbitam a esfera constitucional. E o voto direto e secreto continua sujeito a pressões externas à liberdade do eleitor.

Há um hiato na Constituição. Ela não esclarece as conexões entre o sufrágio universal, o voto direto e secreto e os partidos políticos. O significado e as atribuições que eles devem assumir são omitidos. A “lei civil” adquire uma elasticidade indeterminada e transcendente.

O que importa, no momento, diz respeito ao processo eleitoral. Ele se descola, na prática, do contexto constitucional e das determinações legais. A pobreza das premissas históricas, tão acentuada, e a inexistência de cultura cívica, em formação incipiente, atropelam os princípios referentes à soberania popular, ao sufrágio universal e ao voto direto e secreto.

Esse não é um fenômeno peculiar ao Brasil. É espantoso o que ocorre, por exemplo, nos Estados Unidos, graças à evasão eleitoral. Em nosso país, só o Poder Judiciário tenta introduzir algumas regulamentações que visam a normalidade puramente formal do processo eleitoral. O Poder Legislativo e, de maneira tão engenhosa quanto for possível, o Poder Executivo resguardam seus interesses e objetivos que convenham ao governo e aos que mandam. A correção judiciária ou emerge tardiamente ou perde eficácia, por causa de vários tipos de obstáculos.

A consequência direta das anomalias desse complexo institucional como um todo corporifica-se na deterioração do processo eleitoral. Ele se “politiza” de modo negativo. Acaba infestado, conforme a frase objetiva e cínica de Getúlio Vargas: “A lei, ora a lei…”
Essa situação produz efeitos que solapam a democracia. Embora esteja aqui seu ponto de partida, a soberania popular, o sufrágio universal e o voto direto e secreto não ultrapassam a farsa, quando e enquanto o político interfere sobre o eleitoral com impacto negativo incontrolável.

As eleições submetem-se a uma técnica social, que exige um mínimo de racionalização na cabeça, nas escolhas e nos comportamentos do eleitor. Em suma, atêm-se à manipulação dos partidos políticos. O elemento político é inevitavelmente deformado, como sabemos por experiência crônica.

O cruzamento do processo eleitoral e do processo político, precisa submeter-se a uma interação transparente entre meios e fins. Ao nascer deturpada, a votação serve à fisiologia, ao clientelismo e à exacerbação de interferências plutocráticas. Quaisquer que sejam as aparências de legitimidade e de modernidade da técnica social, a “democracia” concretiza-se segundo algum dos modelos de oligarquia.

Artigo originalmente publicado em 29 de agosto de 1994 na Folha de S.Paulo.


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Camila Souza