A dinastia Alckmin: herdeiros da ditadura

Sobre as relações da família do candidato com a política e o regime militar.

Norberto Liberator 4 out 2018, 13:51

Parte I – Quem é quem no clã Alckmin

Não é raro Geraldo Alckmin dizer que “não é fruto de dinastia política” e que “nasceu do povo”. Não poderia ser mais falso. A história da família Alkmin ou Alckmin (a grafia varia, mas é o mesmo sobrenome) como uma poderosa oligarquia vem de longa data e começa com o folclórico político mineiro José Maria Alkmin, um descendente de imigrantes árabes que decidiu fazer da política seu novo negócio após a decadência de seu pai, que era proprietário de terras.

Agregado ao clã Kubitschek (casou-se com Maria Kubitschek da Fonseca), aproximou-se de Juscelino, de quem foi secretário de Finanças no governo de Minas e, mais tarde, ministro da Fazenda no governo federal. No entanto, traiu o antigo amigo e apoiou o golpe de 1964, que veio a cassar JK e seus aliados políticos. Assim, tornou-se vice-presidente da República no governo do general golpista Humberto Castello Branco.

Seus sobrinhos paulistas eram membros influentes do partido de extrema-direita UDN (União Democrática Nacional), que “denunciava” uma suposta “infiltração comunista” no Brasil. André Alckmin foi duas vezes vereador em Guaratinguetá pela legenda, e Geraldo José Alckmin era um conhecido militante do mesmo partido, embora nunca tenha se candidatado a cargos públicos.

Após o fim da presidência de Castello Branco, Alkmin emendou várias candidaturas ao Congresso pela Arena (Aliança Renovadora Nacional), o partido pró-regime militar. Não satisfeito individualmente com a carreira política, também usou de sua influência para que o general Emílio Garrastazu Médici, o mais sanguinário dos ditadores militares do Brasil, nomeasse outro sobrinho, José Geraldo Rodrigues de Alckmin como ministro do STF em 1972.

O filho de José Geraldo é Eduardo Rangel Alckmin, um influente jurista e proprietário da Alckmin Advogados, com sede em Brasília. Foi ministro do TSE entre 1996 e 2001. É herdeiro do capital jurídico do pai e seu escritório cobra altas quantias por serviço, o que em si não é algo imoral, mas contraria totalmente a falácia de Geraldo, de que não pertenceria a uma oligarquia.

Parte II – Geraldinho

Nascido em Pindamonhangaba em 1952, o sobrinho de José Geraldo leva o nome do pai, Geraldo José. Geraldinho, como é chamado carinhosamente, dividiu os estudos em Medicina com seu primeiro mandato como vereador, com apenas 19 anos, em cuja eleição obteve recorde de votos. Muito estranho para alguém que, segundo ele, não tinha influência política (quem leu até aqui, sabe que tinha e muita).

Ainda foi eleito presidente da Câmara municipal e, em 1976, prefeito da cidade. Empossado, nomeou como chefe de gabinete ninguém menos que Geraldo José Alckmin, seu próprio pai. Em 1982, aos 30 anos, é eleito deputado estadual e, quatro anos depois, como federal. Todas essas candidaturas foram pelo MDB, em uma possível jogada de “limpar” o nome da família, ligada ao regime militar. Apesar disso, Geraldo não escondia seu apreço pelos generais-presidentes.

Em carta ao tirano Médici, em 1973, ele afirma que “justa seria a providência do 3º Governo Revolucionário em favor dos funcionários civis e militares de todo o Brasil, nos âmbitos federal, estadual e municipal, em mais um ato do ínclito Presidente Médici, que tem se mostrado sensível aos problemas sociais, trabalhistas e previdenciários dos que trabalham para a grandeza do Brasil”.

Parte III – Misticismo e Opus Dei

Vira e mexe, fala-se da relação de Alckmin com a seita católica de extrema-direita Opus Dei. É sabido que ele já abriu as portas do Palácio dos Bandeirantes para palestras da organização e tem em Carlos Alberto Di Franco, membro oficial da mesma, um de seus conselheiros. Mas a ligação é ainda mais profunda do que se pode pensar.

A família Alckmin é profundamente ligada à Opus Dei, cuja fundação se deu pelo fascista espanhol José Maria Escrivá, o qual era um notório apoiador do ditador Francisco Franco. Escrivá ganhou de Geraldo uma homenagem com o batismo de uma rua em Pindamonhangaba, durante seu mandato como prefeito. “Caminho”, de autoria do religioso europeu, é o livro de cabeceira de Alckmin. O ensinamento “acostuma-te a dizer que não” é um dos favoritos do governador licenciado.

Sua prima Maria Lúcia Alckmin é numerária (nomenclatura dada a filiados) da seita, que exige, entre outras coisas, o celibato e a autoflagelação. Além dos numerários, há os supernumerários, membros não oficiais que têm como meta divulgar e colocar em prática os ideais da Opus Dei. Geraldinho nunca se declarou como supernumerário publicamente, mas todos os indícios fazem com que a constatação seja óbvia.

Maria é constantemente procurada pelos familiares para dar conselhos em suas vidas. Há rumores, não confirmados, de que Geraldo Alckmin usou de sua influência na ordem para interceder junto ao Vaticano, para que anulassem o primeiro casamento de sua esposa Lúcia. Em entrevista à Revista Época, o ex-numerário José Geraldo Alckmin, que é primo do tucano, afirmou que Lu “descobriu que o antigo marido vivia em uma comunidade hippie” e por isso o abandonou. “Foi aí que entrou o Opus Dei”, disse.

Não encontrei registros na internet que confirmem o parentesco com Neila Alckmin, vidente favorita de Juscelino Kubitschek e Tancredo Neves. No entanto, o fato de ser mineira e próxima aos políticos daquele estado levantam “suspeita”. Não deixa de ser irônico que Neila tenha começado a cair no ostracismo após errar a previsão de quem seria eleito presidente em 1989, quando as urnas deram vitória a Collor de Mello. Segundo Neila, o vencedor seria Guilherme Afif, que décadas depois veio a ser vice de Alckmin no governo paulista!

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