“Chave da derrota da extrema-direita passa por mobilização das mulheres”

Em entrevista ao Sul21, a deputada federal eleita trata das perspectivas de seu mandato.

Fernanda Melchionna 21 jan 2019, 17:56

Em dez anos como vereadora de Porto Alegre, Fernanda Melchionna (PSOL) se tornou uma das mais conhecidas políticas na cidade e no Estado, protagonizando na Câmara Municipal discussões relacionadas a direitos humanos, moradia, transporte público, direitos das mulheres e das pessoas LGBTs, entre outros. Em 2016, foi a vereadora mais votada da cidade; em 2018, foi a única vereadora da capital gaúcha a eleger-se deputada federal – a mais votada dentre as mulheres – e se muda para Brasília no início de fevereiro para encarar o desafio de ser uma parlamentar na capital federal fazendo enfrentamento direto ao governo de Jair Bolsonaro (PSL).

Para tal, ela aposta em seguir com o estilo que a consagrou enquanto vereadora, pensando em seu mandato como um “megafone” para as lutas do povo, sempre em defesa daqueles “que a sociedade considera invisível”. Ela menciona, para além do exercício parlamentar, a importância das mobilizações populares como forma de se pressionar contra medidas que prejudicam os trabalhadores, das quais sempre participou e onde iniciou sua trajetória política. “Se é verdade que existe um avanço da extrema-direita, também existe um avanço da luta das mulheres no mundo inteiro e nós precisamos ocupar as ruas e não sair delas nesse momento político que o Brasil nos bota”, aponta.

Nesta segunda-feira (21), Fernanda embarca com outras parlamentares do PSOL para os Estados Unidos, onde participa, em Nova York, de reunião com Julia Salazar, jovem recém eleita senadora no país; segue para Washington, onde se encontrará com o secretário-executivo da Comissão Interamericana de Direitos Humanos para tratar de temas de direitos humanos e da execução de Marielle Franco. Depois, cumpre agenda na Universidade de Berkeley  sobre a onda feminista e o momento político do Brasil. Na semana seguinte, retorna direto a Brasília.

Em entrevista ao Sul21 em seus últimos dias em Porto Alegre antes de assumir o mandato como deputada, Fernanda faz uma avaliação dos desafios que tem pela frente, do crescimento do PSOL diante do cenário de avanço da extrema-direita, dos motivos que levaram à eleição de Bolsonaro, e elabora estratégias para se resistir nos próximos anos. Confira a entrevista completa:

Sul21 – Como está sendo o processo de se mudar para Brasília, a expectativa de ir para uma Câmara maior, enfrentar esses novos desafios?

Melchionna – É mais do que uma Câmara maior, é uma Câmara marcada pelo crescimento da extrema-direita. Obviamente, muito dessa luta política que estamos vendo na sociedade, que a gente tentou fomentar – e fomentou na verdade – contra o avanço dessa extrema-direita vai estar pautada também na Câmara em Brasília. A gente tem uma tarefa central de ter um mandato que consiga ser a representação política da luta das mulheres, dos trabalhadores, de todas essas lutas fundamentais em um país tão racista e machista quanto o Brasil. Levando em conta o racismo estrutural e todo preconceito que vemos contra a comunidade LGBT, potencializado por esses discursos de ódio que lamentavelmente cresceram no último período e se fortaleceram com a eleição de um presidente que consegue sintetizar a combinação de uma agenda extremamente anti-povo no que diz respeito às políticas econômicas e extremamente reacionário no que diz respeito aos costumes.

Fernanda com cartaz da campanha que lançou contra o assédio no transporte público | Foto: Leonardo Contursi/CMPA

Então é fundamental o nosso mandato ser uma trincheira, um megafone das lutas sociais, das demandas populares e históricas e, ao mesmo tempo, ajudar na alteração da correlação de forças, usar o mandato como um instrumento de lutas em Porto Alegre, no interior e no Brasil inteiro para que esse momento político lamentável termine o mais rápido possível.

O PSOL aumentou sua bancada de seis para dez deputados na Câmara, colocando tu e outras mulheres jovens, como a Sâmia Bomfim (SP), a Áurea Carolina (BH) e a Talíria Petrone (RJ), no Congresso. A que tu atribui esse crescimento e o sucesso das candidaturas de vocês?

A gente teve uma vitória eleitoral importante, o PSOL conseguiu com todas as dificuldades atingir os dez deputados federais para vencer a cláusula de barreira, essa lei antidemocrática que foi feita pelo Eduardo Cunha e obviamente tenta restringir a intervenção de partidos com ideologias como a nossa. Isso foi um salto enorme, ter essa representação política da bancada que unifica várias tradições de lutas, e também como tu mencionaste ter a eleição de mulheres jovens, mulheres identificadas com a luta feminista, negras, trabalhadoras, mulheres com trajetórias distintas, mas que todas partem de uma ascensão da luta das mulheres por mais direitos e contra o Bolsonaro, o “ele não” foi a forma mais explícita disso.

Isso é uma vitória eleitoral importante diante de uma derrota política geral que foi a eleição do Bolsonaro. Porque não é apenas uma eleição, isso pode significar uma mudança no regime político brasileiro, de tentar reverter direitos, criminalizar os movimentos sociais populares, aprofundar uma agenda de perseguição. Eu digo sempre que para mim parece macarthismo* do século 21 essa agenda que eles tentam impor contra os professores, com ‘escola com mordaça’, contra os estudantes, essa ideologização do MEC (Ministério da Educação) e do INEP, já é a demonstração de que estamos diante de um governo com sérios riscos de retrocessos civilizatórios nas mais variadas escalas, inclusive do ponto de vista do conhecimento científico. Tem um elemento de obscurantismo no pensamento de vários ministros e do núcleo duro do governo Bolsonaro. Quando a gente vê o ministro de Relações Exteriores falando é um negócio que parece anterior à revolução francesa a concepção política que está posta ali. Então não é um momento qualquer que estamos passando na história política do país. Por isso mesmo, foi uma vitória eleitoral muito importante do partido numa situação muito difícil para o país.

Deputada eleita menciona “falência brutal do sistema político” brasileiro | Foto: Guilherme Santos/Sul21

Ao mesmo tempo, como tu mencionaste, houve um aumento das forças conservadoras tanto no Legislativo quanto no Executivo, em todo o país. A que tu atribui esse momento político que estamos vivendo?

São vários fatores. Claro que tem o avanço da extrema-direita no mundo, mas primeiro tem a crise econômica brutal que começou em 2008 nos Estados Unidos e que se espalhou pelo mundo e fez deteriorar a vida do povo, com aumento do desemprego e ao mesmo tempo da riqueza nas mãos das elites econômicas. Mas nesse processo de crise econômica, houve também uma falência aos olhos do povo do sistema político construído até então, que tem sido de manutenção dos interesses das elites. A eleição do Donald Trump nos EUA talvez seja o ponto mais avançado disso no mundo, o mais emblemático desses processos, e o Brasil entrou nessa rota internacional com a eleição do Bolsonaro, não só por condições político-econômicas, mas também por essa articulação da extrema-direita, que passou pelas mãos do Steve Bannon, das táticas que eles têm, estratégias de aproveitar esse momento de desesperança do povo, de desemprego, de pioras na vida e de usar estratégias graves como uso de fake news, utilizações de WhatsApp que vimos aqui.

Acho que tem no Brasil uma falência brutal do sistema político, a crise entrou com tudo aqui em 2013, 2014 e foi se retroalimentando por uma crise política profunda que tem a ver com esse modelo de nova república construída pela ditadura militar, esse modelo de toma lá da cá, as relações promíscuas entre o público e o privado, as investigações da corrupção. Em determinado momento, as elites econômicas queriam que a Dilma ajustasse com mais força um governo já estava débil frente ao povo justamente por já ter começado a implementar o programa do Levy, pelas denúncias de corrupção e tudo levou ao golpe parlamentar que a gente viu e fez suas medidas como a PEC 95. Tem um desgaste do modelo político. E o partido que por muito tempo foi uma esperança de mudança governou pelos mesmos métodos e de alguma forma com o modus operandi do regime tradicional.

Então tem o elemento crise econômica, na qual a direita neofascista cresce, assim como uma esquerda que deixou de lado as bandeiras de esquerda. Acho que a experiência com os governos petistas também foi importante para uma parcela do povo enxergar na figura do Bolsonaro um político anti-sistema. O PSDB, PT, PMDB foram vistos como os partidos de sistema e o Bolsonaro disse que não era do sistema, que ia acabar com a corrupção. Quando a gente sabe que ele é uma das expressões mais apodrecidas desse regime podre e ao mesmo tempo com mais violência, mais repressão. Mas digo isso porque mesmo entre os 55 milhões de votos que o Bolsonaro teve, temos que lutar para que boa parte desses que não são fascistas e votaram achando que era anti-sistema, que era anti-corrupção, façam esse aprendizado político e estejam junto conosco lutando contra a reforma da previdência, contra os retrocessos e essas medidas que já estamos vendo que a agenda do Bolsonaro e do Paulo Guedes querem impor.

Diante desse cenário, de que forma o PSOL está se articulando para disputar pautas no Congresso? É possível garantir a permanência de direitos de grupos vulneráveis, que são alvo do novo governo?

Sem dúvidas. A gente acha que é um tempo de fazer muita mobilização no sentido de não aceitar os retrocessos e tentar fazer com que acha uma mudança na correlação de forças em defesa dos direitos construídos. Achamos que uma das primeiras batalhas vai ser o tema da Reforma da Previdência, que eles estão se inspirando no modelo chileno, que é um modelo brutal de aumento da idade mínima e de capitalização da previdência. Fazendo com que os trabalhadores tenham a contribuição definida, mas não tenham o benefício definido. No Chile, esse modelo faz com que os idosos recebam 40% do salário que recebiam na ativa, um verdadeiro saque ao direito dos trabalhadores. Mas os indígenas já foram atacados com a MP 870, que retira o poder de demarcação das terras indígenas da Funai e passa para o Ministério da Agricultura, o Consea – Conselho Nacional de Segurança Alimentar – e todas as políticas de segurança alimentar estão na berlinda também. Tem uma série de coisas que já estão demonstrando esses ataques brutais no governo Bolsonaro.

Nas eleições de 2016, Fernanda foi a vereadora mais votada de Porto Alegre | Foto: Maia Rubim/Sul21

No sentido da intervenção parlamentar, acreditamos que seria fundamental uma frente democrática de defesa da constituição e de batalha por uma independência política diante da agenda do governo no Congresso e na sociedade. Mas infelizmente a aliança do Rodrigo Maia com o PSL e o apoio de alguns partidos que poderiam estar na frente contra ele já mostra a situação. É extremamente grave que não se tenha um candidato único para fazer frente a essa agenda neoliberal e colocar uma alternativa à presidência na Câmara dos Deputados. Nós apresentamos o nome do Freixo e vamos seguir batalhando até dia 1o de fevereiro, mas já vimos a adesão das bancadas tanto do PCdoB e do PDT ao Rodrigo Maia. E isso acaba fortalecendo a agenda do Bolsonaro na Câmara. Claro, a gente enfraquece essa agenda fazendo luta, com organização do povo, cobrança, mas também enfraquece não tramitando, não dando velocidade a ela e o que estamos vendo é um movimento contrário, de apoio de algumas siglas a essa candidatura.

Por outro lado, também vamos ter que ter muita organização, pensar em termos de calendário, ter organização para fazer mobilizações com programa, unitárias, democráticas contra a agenda do Bolsonaro. A primeira delas é o 8 de março, precisamos transformar a rebeldia do “ele não” também em luta das mulheres contra o machismo, por igualdade salarial, contra a violência doméstica e contra as políticas da extrema-direita de atacar direitos. Se é verdade que existe um avanço da extrema-direita, também existe um avanço da luta das mulheres no mundo inteiro e nós precisamos ocupar as ruas e não sair delas nesse momento político que o Brasil nos bota. E o 14 de março é o dia de um ano da morte da Mari [Marielle Franco, vereadora carioca do PSOL assassinada ano passado] e um ano que lutamos por justiça sem respostas. Além de respostas para nós e para a família, elucidar o assassinato da Mari é não dar um salvo conduto para o assassinato e o aumento de crimes políticos, de perseguições, como já vimos ameaças ao Freixo, o ataque à deputada Martha Rocha (PDT) no Rio.

Diante dessa conjuntura e com esse apoio de partidos teoricamente mais à esquerda ao Rodrigo Maia, somado a todo o desgaste da imagem do PT, de que forma o PSOL pode se fortalecer diante de partidos de esquerda mais tradicionais, se apresentar para o país como essa alternativa da esquerda?

M[filósofo Antonio] Gramsci tinha uma definição de que onde o velho ainda não morreu, mas está morrendo, e o novo ainda não nasceu, tem um momento em que os elementos mórbidos aparecem na sociedade. Acho que é um pouco o que estamos vivendo, esse interregno, e o Bolsonaro é esses setores mortos que aparecem na realidade. É claro que o PSOL já está bem conhecido, onde o PSOL teve a oportunidade de mostrar seu trabalho, ele cresceu. Onde temos trabalho mais orgânico, mais força, conseguimos vencer essas regras eleitorais, que não querem que pessoas vinculadas a movimentos consigam concorrer em pés de igualdade com os partidos do regime. Mesmo assim conseguimos mostrar que o PSOL é diferente, uma alternativa de luta dos trabalhadores, que luta contra a corrupção e em defesa dos direitos do povo.

Mas ainda foram experiências localizadas, no sentido de que é preciso uma alternativa de massas para o povo no Brasil. E esse é um pouco o nosso desafio no próximo período, além de fazer frente contra o Bolsonaro e fazer mobilização com todos os setores dispostos a fazer frente a essa agenda contrária ao povo, mas sem perder independência política do PSOL para postular uma nova esquerda alternativa. Porque também precisamos ter um referente que seja verdadeiramente antissistema, anticorrupção, a qual é inerente ao sistema capitalista brasileiro. Sempre, em todos os momentos da história econômica do país sabemos que o Estado foi fundamental para financiar os interesses e negócios privados. Não foi o PT que criou esse modelo, o problema é que o PT, ao invés de mudar esse modelo, decidiu governar e ser gerente desse modelo. E nós estamos nessa construção, esse é o grande desafio do momento, e sabemos que esse vazio que ficou na política tem a ver com a necessidade de construir uma alternativa de esquerda com peso de massas.

Em protesto contra o aumento da tarifa do Trensurb na Estação do Mercado, em fevereiro de 2018 | Foto: Joana Berwanger/Sul21

Tu vês como um horizonte possível o crescimento da esquerda como resposta ao governo Bolsonaro, a exemplo do que ocorreu nos Estados Unidos recentemente nas eleições de mid-terms? Isso pode se refletir já nas próximas eleições municipais?

MEu acho que sem dúvida vai ter muita gente querendo organizar a resistência, querendo entender. Já tem uma procura de entender esse fenômeno Bolsonaro inclusive para enfrenta-lo. A gente tem feito debates sobre isso e tem reunido bastante gente, é procura por palestras, convite para ir para outras cidades. Acho que tem a possibilidade de mais gente, na medida em que eles nos atacam, querer conhecer verdadeiramente a ideologia, a elaboração da esquerda, quem sabe estudar o marxismo que acho que é muito necessário.

Eles atacam tanto a esquerda, socialismo e marxismo e tentam associar a experiência que houve no Brasil com socialismo, quando o Brasil não teve nada de socialismo, foi foi o contrário. O governo do PT foi um governo que jogou conforme as regras dos partidos burgueses e das elites econômicas na composição e na forma. O Brasil nunca chegou perto do socialismo. Mas eles combatem tanto porque sabem que a única ideologia capaz de combater esse sistema político podre, de construir uma nova democracia, construir a ideia da vida acima do lucro, da defesa do meio-ambiente, enfim, do fim da exploração, é a socialista. Eles têm medo do nosso crescimento.

Então eu acho que tem a possibilidade da gente estudar, fazer mais formação, mais pessoas se aproximarem das ideias da esquerda. E nós vamos apostar nessa construção. Porque sabemos que só uma leitura concreta da situação politica vigente, só o estudo, só o aprendizado… Não acho que seja o mesmo fascismo da década de 1930, acho que é um neofascismo no mundo, que não é uma caracterização do governo, mas dessas ideias. E nós temos que aprender com os exemplos internacionais, com exemplos anteriores, com a História, com a história da luta de classes. Tem muito para estudar, discutir, lutar. Então é aquilo, a coragem não é a ausência de medo, é enfrentar o medo. E a melhor forma de enfrentar o medo é coletivamente, a auto-organização é muito importante.

Voltando à questão da tua eleição e de outras mulheres jovens do PSOL, qual a importância de se eleger cada vez mais mulheres, de se ter pessoas jovens fazendo política? Tu te consideras uma inspiração para outras jovens que queiram seguir a carreira política?

MEu acho que sempre tem questão da representatividade. Quando a gente vê mulheres que lutam, que enfrentam, ocupando espaços tradicionalmente masculinos, seja na política institucional, nas várias formas de fazer política, acho que sempre inspira. Eu acho que a nossa eleição é fruto da ascensão das mulheres, que estão mais empoderadas na luta por direitos, mais cientes da necessidade de enfrentar o machismo. O início de ano já demonstrou, quantas de nós já foram assassinadas? Então as mulheres estão cada vez mais conscientes da necessidade histórica de enfrentar o machismo e isso também nos permitiu ser uma expressão eleitoral desse ascenso das mulheres, acho que a nossa eleição é um pouco fruto disso. E muitas jovens se inspiram no sentido de ‘não estamos sozinhas nessa luta, temos representação’.

Fernanda destaca o papel das mulheres: “nossa resistência é determinante para derrotá-los” | Foto: Guilherme Santos/Sul21

É uma situação confusa e contraditória, mas se tem alguma coisa positiva em todo esse cenário é que as mulheres têm sido a linha de frente contra a extrema-direita em todo o mundo, temos exemplos recentes disso na Hungria e nos EUA. Tivemos a greve internacional das mulheres em 2017, mobilizações enormes em 2018 e vamos ter que seguir assim em 2019. Porque a chave da derrota da extrema-direita passa por essa mobilização das mulheres. Sabe que eu tenho uma ideia, uma definição política que me acompanha todos esses anos, de que para uma sociedade capitalista, a exploração, para essa lógica do status quo desse modelo político apodrecido, o machismo e patriarcado são estruturais. Querer devolver a mulher para as tarefas domésticas, manter a super-exploração do trabalho feminino, querer relegar a mulher a uma segunda categoria, são questões determinantes também para esse projeto político econômico das elites da extrema direita. E a nossa resistência é determinante para derrotá-los.

Por último, tu agora te despedes da Câmara de Porto Alegre, teria como fazer um breve balanço desses três mandatos, desses anos de luta aqui na capital?

 Nossa, foram tantos anos né, 10 anos, três mandatos. Eu tive a honra de ser da primeira bancada do PSOL com o Pedro Ruas, na eleição de 2010, em que a Luciana Genro concorreu à prefeita e a gente conseguiu essa eleição dupla. O Ruas foi o segundo mais votado e eu entrei lá ainda pouco conhecida, com muitos votos do movimento estudantil, dos jovens que tinham lutado junto comigo na universidade e queriam ser representados na política. Primeiro mandato foi um desafio, para mim um mandato é um megafone da luta social, as lutas que apareciam por lá a gente poder vocalizar é muito importante, ajudar a auto-organizar o povo, identificar as demandas legítimas do povo e transformar em luta social para tentar ter conquistas.

Estive sempre vinculada com os movimentos sociais organizados, a gente teve o exemplo da luta da passagem, que eu lutei toda a vida como estudante contra os aumentos abusivos da passagem, e daí como vereadora, junto com os jovens que lutaram nas ruas, conseguimos em 2013 barrar o aumento. É motivo de orgulho, assim como a luta dos movimentos de ocupação, feminismo, direitos humanos, que fui presidente duas vezes da Comissão sobre esse tema. Sempre tentando dar voz para aqueles que são tratados como os invisíveis na sociedade, como as pessoas em situação de rua, a luta dos LGBTs, idosos, crianças, foram experiências muito ricas e lutas muito arreigadas na nossa cidade. Assim como a luta em defesa dos servidores municipais que estão sendo muito atacados pelo [prefeito Nelson] Marchezan Jr.

Claro que teve muitas vitórias e teve derrotas, e uma das mais emblemáticas talvez tenha sido a retirada da discussão de gênero e sexualidade do Plano Municipal de Educação, assim como a alíquota de 11% para 14%. Mas nós perdemos lutando e eu digo sempre que não queria estar nunca do lado dos que venceram, das vozes reacionárias que querem reagir ao nosso avanço. Eu aprendi muito, acho que essa bagagem toda levo para Brasília e sei que esse acúmulo da nossa cidade também vai seguir. Vou estar lá por quatro dias e vou vir para Porto Alegre e meu mandato de deputada vai estar a serviço das lutas daqui e de mudar essa correlação de forças, que nesse momento está pendendo para o interesse das classes dominantes, mas que a luta de classes sempre foi o motor da história e vai seguir sendo. A gente só vai derrotar o governo Bolsonaro se essas lutas do povo se fortalecerem.

Entrevista realizada e publicada pelo portal Sul21.


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Pedro Micussi