Ganhar maioria social contra o desmonte da previdência pública

As manifestações de 1º de maio são um primeiro passo para ganhar maioria social contra a reforma da previdência.

Israel Dutra e Thiago Aguiar 29 abr 2019, 20:55

Na semana em que se celebra o 1º de Maio, dia internacional da classe trabalhadora, o governo joga suas fichas para aprovar o principal ataque contra o povo nos últimos anos. A aprovação, na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, da admissibilidade do projeto de reforma da previdência foi uma vitória parcial do governo, uma vez que a demora de 62 dias é um sintoma de sua desarticulação parlamentar. Como comparação, pode-se relembrar que o governo Temer aprovou sua proposta de reforma na CCJ em apenas duas semanas. Agora, a pauta vai para a chamada comissão especial, que discutirá o mérito da proposta e, depois, vai sugerir o voto em plenário.

Ao mesmo tempo, o governo segue sua sanha de ataques contra os trabalhadores, a juventude e as liberdades democráticas. O anúncio de congelamento do salário mínimo só prejudica as condições de vida já desfavoráveis do povo. As estimativas de crescimento da economia nacional seguem sendo revistas para baixo e as estatísticas oficiais demonstram que há mais de 13 milhões de desempregados. Talvez por isso, as pesquisas de opinião que avaliaram os primeiros cem dias de Bolsonaro apresentam uma tendência de enfraquecimento do governo: apenas 35% dos entrevistados consideram o governo ótimo/bom, 31% consideram-no regular e 27% ruim ou péssimo. É a pior avaliação de um governo em primeiro mandato no primeiro trimestre.

Em meio a turbulências na economia mundial – com a Argentina aparecendo como elo débil da reorganização neoliberal –, as apostas do governo são aprovar a reforma da previdência, propagandeando para o capital financeiro transnacional uma economia de R$ 1 trilhão em gastos públicos, e avançar o ajuste com privatizações e retirada de direitos. Alinhado internacionalmente com Trump e seus satélites, Bolsonaro oferece um cardápio neoliberal que prevê o fim do sistema de previdência pública, a ampliação das concessões para o patronato superexplorar os trabalhadores e uma nova rodada de isenção de impostos para empresas e bilionários. Esse modelo é o que está levando a vizinha Argentina, uma vez mais, para a beira do abismo.

Um governo com tantas contradições precisa saldar seus compromissos com o mercado e aprovar a reforma da previdência. Para isso, em meio à crise no andar de cima, a burguesia aposta na coordenação de Rodrigo Maia para superar as dificuldades de operação do bolsonarismo. Diante desse cenário, ganha importância fundamental a entrada em cena da classe trabalhadora. É possível girar o pêndulo para o lado do movimento de massas e enfrentar o ajuste antinacional, antipopular e antidemocrático de Bolsonaro e Guedes.

As manobras de um governo que precisa acelerar a guerra contra o povo

Nas últimas semanas, a ofensiva do governo para sair do pântano parlamentar na CCJ envolveu uma operação múltipla. Sob a questionada articulação de Onyx Lorenzoni, o governo declarou sigilo dos dados que baseiam a proposta inicial de Paulo Guedes e prometeu distribuir R$ 40 milhões em emendas para cada parlamentar que votar favoravelmente à reforma. Um setor importante da burguesia, por sua vez, fez um apelo pelo fim dos conflitos entre Bolsonaro e seus filhos contra o vice Mourão.  As divisões internas no governo e no PSL presidencial explicam o fortalecimento de Rodrigo Maia e a nomeação do “centrão” para presidir a comissão especial, com o PSDB assumindo sua relatoria. Ao mesmo tempo, o governo conseguiu desarmar, ao menos por ora, a bomba-relógio que significaria uma nova greve de caminhoneiros, evitando a deflagração de uma mobilização de consequências imprevisíveis.

Com a tramitação na comissão especial, inicia-se uma nova fase de enfrentamento à reforma. É preciso derrotar os múltiplos ataques do governo, como o corte nos valores do BPC e da aposentadoria rural; o aumento no tempo de contribuição de professores; e os ataques às mulheres, com o aumento da idade mínima. Cresce também o questionamento ao modelo da capitalização, responsável pela miséria de amplos contingentes de idosos no Chile, onde a ditadura de Pinochet impôs este modelo previdenciário, numa espécie de laboratório neoliberal dos anos 1980, com consequências funestas para os trabalhadores na atualidade.

Apesar da ordem unida da burguesia e da mídia, os prazos jogam contra Bolsonaro. Fala-se abertamente no irrealismo de uma aprovação no primeiro semestre da reforma.  Com o passar dos meses e a crescente perda de popularidade do bolsonarismo diante do desemprego, do pântano econômico e da inoperância de um governo envolvido em disputas internas, os parlamentares começam a sentir-se pressionados, em suas bases eleitorais, para promover uma “desidratação” da reforma. Conforme se aproximem as primeiras costuras para as eleições municipais de 2020, partidos e parlamentares podem especular posições mais independentes da agenda de Bolsonaro. O movimento de massas pode incidir sobre estas tendências e este é o grande temor da burguesia, que pressiona por uma aprovação rápida, impedindo a repetição do fracasso de Temer – em meio a acusações de corrupção, mobilizações de rua e descrédito popular – em sua tentativa de liquidar a previdência.

Ganhar as ruas para dialogar com a população

Por tudo isso, é preciso ganhar maioria social, dialogando com o povo e mostrando a gravidade da reforma da previdência. Apesar da queda de popularidade de Bolsonaro, sobretudo nas capitais, o movimento de massas ainda não conseguiu dar uma resposta à altura dos ataques. Acreditamos que é preciso estimular uma ampla frente única com todos os setores que queiram se comprometer com a luta contra a reforma, exigindo das direções das centrais e dos partidos do campo da oposição empenho para desenvolver um plano de lutas. Mas é preciso ir além: a própria esquerda e o PSOL devem tomar em suas mãos a tarefa de uma agitação sistemática contra a reforma por meio de cartilhas, panfletos e usando o exemplo dos comitês domésticos, que se espalham pelo país. Impulsionada pelos mandatos de Sâmia Bomfim, Fernanda Melchionna, Marcelo Freixo e outros parlamentares do PSOL, a iniciativa ganhou força, movendo pequenas reuniões em todo o país para discutir o tema.

Além da agitação necessária para ampliar a adesão popular à luta contra a reforma, é preciso destravar o movimento social. Os sindicatos, que enfrentam dificuldades, podem se fortalecer e retomar a iniciativa, respondendo em suas bases aos ataques do governo. Na educação, por exemplo, isto é fundamental: abundam ataques aos professores em sala de aula, estimulados por um governo que corta verbas para pesquisa e universidades, além de ameaçar áreas do conhecimento como a Sociologia e a Filosofia. Ao mesmo tempo, é hora de somar forças com a luta geral. O acampamento Terra Livre, que ocupou a Esplanada dos Ministérios, mostrou a resistência dos povos indígenas. Este exemplo se repetirá conforme aumentam os ataques do bolsonarismo ao povo.

1º de Maio: ponto de apoio para construir o calendário de lutas

No dia 1º de maio, o dia internacional das trabalhadoras e trabalhadores, haverá uma oportunidade de dar passos para construir a necessária frente única para derrotar a reforma. Haverá um ato inédito em unidade de todas as centrais sindicais, com mais força em São Paulo, onde se esperam reunir dezenas de milhares de trabalhadores, além da presença de artistas. Os atos pelo país devem servir para colocar centro na preparação das mobilizações do dia 15 de maio e no impulso para a greve geral que as centrais cogitam fazer em 14 de junho

Este calendário deve ser apoiado e precisa ser construído com força pelas organizações sindicais e políticas de esquerda e de oposição ao governo. Já há processos de mobilização em desenvolvimento, como os educadores do Amazonas, metrô de São Paulo e garis no Rio, que mostram a possibilidade de unificação das lutas. O PSOL deve estar na linha de frente, participando com suas forças das manifestações e apoiando a organização dos trabalhadores. Com seus mandatos, deve vocalizar a resistência à reforma, como fará nossa companheira Sâmia Bomfim, representante do partido na comissão especial da reforma na Câmara. À luta!


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Pedro Micussi