A educação como nossa arma para vencer

Uma análise das manifestações da juventude em 15 e 20 de maio contra os cortes na educação.

Camila Souza 23 jul 2019, 16:31

Quando este artigo era concluído estávamos às vésperas do 57º Congresso da União Nacional dos Estudantes. Exatos 40 anos após a reconstrução da UNE, os estudantes realizam seu Congresso com um grande ato da educação em Brasília depois de semanas de fortes atos em luta contra os cortes. No dias 15 e 30 de maio e no dia 14 de junho centenas de cidades foram tomadas por mobilizações protagonizadas pelos estudantes em conjunto com os setores da educação e da classe trabalhadora. Podemos afirmar que está em marcha no país uma luta de fôlego que polariza nossos livros versus o governo das armas, os estudantes versus Bolsonaro e Weintraub.  

Nos seis meses iniciais de governo, a pasta da educação foi bastante agitada. Já tivemos um Ministro da Educação demitido, exoneração de dezenas de pessoas de diversos cargos internos do MEC, atraso no envio da lista dos estudantes do FIES para as universidades, carta de orientação às diretorias para a gravação de vídeos nas escolas com o uso do slogan político da campanha eleitoral do atual Presidente, atraso na elaboração da prova do ENEM, demissão do Presidente do INEP, ataques aos cursos de humanas como Sociologia e Filosofia, acusação das universidades promoverem balbúrdia, tudo isso coroado com um corte de 30% no recurso de toda a rede federal, universidades, institutos e colégios, a CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), fundação ligada ao MEC responsável pela expansão e consolidação da pós-graduação, também foi atingida.

A universidade onde faço Mestrado em Sociologia e Antropologia, a UFRJ, é uma universidade de excelência acadêmica e completa no ano que vem, em 2020, cem anos. Recentemente recebeu o prêmio de universidade mais inovadora do país, segundo o Ranking Universitário Folha 2018. Em que pese tudo isso, a Reitoria já emitiu nota afirmando que a abertura e funcionamento a partir de julho está em risco caso os cortes não sejam revertidos. Ou seja, a UFRJ pode ficar de portas fechadas no segundo semestre. E este não é um exemplo isolado, é apenas mais um que se soma para ilustrar a gravidade da situação que vivemos. Estamos diante de uma política acelerada de desmonte de um dos principais patrimônios do Brasil: nossas universidades e institutos públicos. Mas como demonstramos nas ruas, eles não contarão com nosso silêncio e passividade. Há luta!

Um levante dos livros

Darcy Ribeiro já nos dizia que “a crise da educação no Brasil, não é uma crise, é um projeto”. Assim, para lograr êxito em seu projeto autoritário e reacionário, Bolsonaro precisa atacar e asfixiar a educação pública. Se retomarmos com atenção a história veremos que  governos autocráticos e ditatoriais têm sempre medo da liberdade das ideias e do debate que em geral são suscitados sobretudo na universidade.

Por isso não é coincidência que a ascensão de governos de extrema direita surgem junto de movimentos que colocam o professor como o inimigo da nação, que questionam a produção científica, e que promovem a perseguição política ao pensamento divergente de suas ideias. Nos últimos anos o questionamento às ciências humanas e aos estudos de gênero têm sido recorrentes e fazem parte desse processo de reação obscurantista. O caso da Turquia e da Hungria são exemplos importantes. Erdoğan e Viktor Orbán, respectivamente presidente da Turquia e Primeiro – Ministro da Hungria, têm censurado eventos acadêmicos que abordam temas destoantes de suas opiniões, cortado recursos, privatizado universidades e promovido demissões em massa de acadêmicos.

No caso do Brasil, podemos refletir que os cortes não representam apenas uma busca por um “equilíbrio orçamentário”, ao lado desse projeto privatizante e de retirada de direitos, está o combate a uma concepção de universidade e de educação. Atacar a universidade como balbúrdia, qualificar os estudantes como idiotas úteis, questionar a legitimidade e utilidade das pesquisas tem razões profundamente políticas e ideológicas. Para um governo de lunáticos defensores do terraplanismo a universidade está na contramão de seu projeto obscurantista. Afinal, é a diversidade de saberes o oxigênio para uma universidade de excelência. O confronto de ideias, a liberdade e a autonomia são dinâmicas que produzem tensões e mudanças de pensamento entre gerações. E é para frear e alterar isso que o governo atua.  

“O conhecimento destrói mitos”. Essa frase bastante simbólica estava escrita em um cartaz nas últimas manifestações. Para completá-la podemos retomar a frase de Paulo Freire quando dizia que “a educação não transforma o mundo. A educação muda pessoas. Pessoas transformam o mundo.” Para um governo de milicianos que se elegeu ufanista do passado de censura e tortura da ditadura militar, é necessário quebrar a universidade, porque nela sobrevive através da luta de gerações, espaços de reflexão crítica e luta por transformação da sociedade.

Este artigo faz parte da edição n. 13 da Revista Movimento. Para ler o texto completo, compre a revista aqui!


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