Eleições gerais adiantadas: os desafios para a esquerda

Desafio é ganhar o caminho às representações sindicais e sociais que apostam pela mudança e são vítimas do modelo de uma ou outra maneira.

Tito Prado 3 ago 2019, 16:02

A proposta de adiantar as eleições gerais formulada pelo presidente Vizcarra ante o boicote da maioria congressual à reforma política, busca se sintonizar com o clamor cidadão pelo “fechamento do Congresso” e dar uma saída para a crise política. A iniciativa presidencial foi saudada massivamente pelo público durante a parada de 29 de julho e desde distintos setores políticos, salvo por essa maioria congressual mafiosa e seus novos aliados que resistem à perder seus privilégios.

Desde Novo Peru formulamos essa saída quando Vizcarra assumiu o governo em rejeição ao ex-presidente PPK. Seu governo, dissemos, deve ser um governo de transição e convocar eleições gerais no menor tempo possível. A realidade nos deu razão, a crise é de tal profundidade que não se resolve mudando nomes. É uma crise de regime, portanto, é preciso mudar o regime com uma nova constituição e imediatamente mudar de governo com novas eleições e com novas regras para que a disputa eleitoral permita a renovação política. Do contrário, seguirão os mesmos de sempre.

Certamente, o propósito mais estratégico de Vizcarra é salvar o modelo com uma nova representação política em gestação dada a crise na qual estão inseridos os partidos que ocuparam o governo nos últimos 20 anos. É assim que assume como próprio o plano econômico da CONFIEP, mas no imediato se vê na necessidade de tomar a bandeira de luta contra a corrupção porque é a única maneira de sobreviver ao embate da máfia laranja, que busca por todos os meios deter os processos que envolvem seus líderes, incluindo os funcionários e empresários corruptos.

Se a Força Popular, o APRA e os seus aliados recentes se opõem à reforma constitucional que torna viável a convocatória de eleições gerais adiantadas, não resta outra alternativa que apelar à moção de confiança e fechar o Congresso. Ainda nesse cenário, a convocatória de eleições gerais deve ir a um referendo para que se valide ante a cidadania essa saída política. Às manobras dos que pretendem evitar o que está por vir, é preciso se opor com a mobilização cidadã, nos cabe realizar muitos protestos numa só direção “¡que se vayan todos!“.

A mudança de governo é uma necessidade peremptória, pois é a única maneira de devolver o poder soberano ao povo que foi traído por uma máfia que, com 26% do voto em 2016, ficou com 71 cadeiras, ou seja mais de 55% dos congressistas graças às regras perversas que forma impostas pelo fujimorismo para assegurar seu domínio nos poderes do estado. Essa maioria usou esse poder distorcido para travar qualquer investigação que ameaçasse seus domínios e com isso atraiu a repulsa cidadã, a ponto de o Congresso atualmente contar somente com 12% de aprovação e 82% de rechaço.

Da mesma forma que em 2000, depois da fuga de Fujimori, o adiantamento das eleições gerais é uma saída excepcional e demanda também regras excepcionais que permitam democratizar a disputa eleitoral. Não pode ser possível que uma força política como Novo Peru que conta com 10 congressistas e cuja líder encabeça as pesquisas tenha o caminho fechado para sua inscrição, isso é algo que deve ser considerado e resolvido aplanando o caminho para uma maior abertura. Serão as eleições primárias em definitivo as quais determinarão quais seguirão na disputa.

Desde Novo Peru, não renunciamos a nosso direito de contar com uma inscrição como partido político e junto com isso seguir construindo a mais ampla unidade popular e cidadã ao redor de um programa democrático e anti-neoliberal que postule um Novo Estado e uma Nova República, para o qual será indispensável a convocatória de uma Assembleia Constituinte. Esta é a tarefa que ficou pendente desde 2000 quando a direita soube capitalizar a luta democrática e limitá-la a uma mudança de governo sem mudar a constituição. Um setor da esquerda se dobrou a isso e conviveu com os distintos governos neoliberais desde então. Não queremos repetir a história.

Por isso, desde “Voces del Cambio” se colocou em pé um processo que não exclui outras vertentes, mas que ao mesmo tempo busca fazer possível essa unidade à esquerda e sem ir para o centro. Já sabemos como termina essa proposta que busca ganhar votos em troca de rebaixar o programa. Isso não deve significar sustentar uma proposta sectária e excludente, mas ao contrário é preciso ir ao encontro das camadas médias, das mulheres e jovens, dos setores marginalizados ou discriminados pelo sistema, dos movimentos ecologistas e ambientalistas, dos produtores vítimas dos tratados comerciais com as grandes potências. Temos que conter todos eles e mais, mas com um claro programa de ruptura com o modelo e o regime que o sustenta.

O que está em jogo não é ter mais ou menos congressistas, o que está em jogo, é que pela primeira vez na história uma força de esquerda chegue a ser governo. O de Ollanta Humala foi uma experiência fracassada, além disso ele nunca se definiu de esquerda mas de baixo e terminou servindo os de cima. Por isso nunca quis construir um partido verdadeiramente democrático e menos organizar o povo. Ainda assim, deixa valiosas lições do que não deve se fazer caso se queira de verdade uma mudança de fundo e não limitar-se ao assistencialismo social.

O maior desafio é ganhar o caminho às representações sindicais e sociais que apostam pela mudança e são vítimas do modelo de uma ou outra maneira. Não será a direita tradicional nem a direita emergente a que ofereça as mudanças de fundo que o país requer. Todas essas variantes conservadoras ou liberais têm em comum a defesa da constituição de 93 e do modelo econômico que busca impor projetos como o de Tía María. Estamos ante uma oportunidade inédita para mudar a história do Peru. Objetivamente tudo está a favor da mudança, falta o fator subjetivo ainda em construção e tempos pouco tempo. Temos que conseguir ser o instrumento de uma maioria social capaz de disputar o governo e o poder com as forças retardatárias que pretendem nos manter como país primário exportador.

Para isso temos que juntar forças e ir ao movimento social e suas lutas, pois elas serão determinantes em como se fecha em definitivo esta crise política, com mudança de rumo ou mais do mesmo. Não há tempo que perder, mãos à obra.

Fonte: https://portaldelaizquierda.com/pt_br/2019/08/eleicoes-gerais-adiantadas-os-desafios-para-a-esquerda/


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