PSOL em movimento: socialista, independente e enraizado junto ao povo

Tese assinada por MES, TLS, Barulho, “Construção pela base”, “Coletivo Direito para quem” e independentes para o VII Congresso Nacional do PSOL.

Vários Militantes do PSOL 1 fev 2020, 13:00

Veja na versão em PDF a lista de 5.306 pessoas de 20 estados que assinam essa tese para o VII Congresso Nacional do PSOL.

Derrotar Bolsonaro e construir uma alternativa

Esta é uma tese do MES, TLS, Barulho, “Construção pela base”, “Coletivo Direito para quem” e independentes para o VII Congresso Nacional do PSOL, que será decisivo, num contexto internacional no qual vemos o avanço de uma guerra contra os povos, ao mesmo tempo em que surgem novas resistências. O período de crise sistêmica do capitalismo gera destruição de direitos, de liberdades e da própria vida, mas para enfrentar tais projetos, há resistência. 

O PSOL, em seus mais de 15 anos, se afirmou como uma referência para parcelas importantes do povo. O desafio é ser parte da organização da resistência para derrotar Bolsonaro, afirmando uma esquerda atualizada com as necessidades dos novos tempos, radical e libertária para construir uma nova alternativa para o impasse estratégico que vive o Brasil. Com essa tese, convidamos as filiadas e filiados do PSOL a ser parte dessa batalha política. 

Por uma nova orientação para o PSOL 

Nossa prioridade é derrotar o governo Bolsonaro e seu projeto autoritário e ultra neoliberal. Entretanto, precisamos mudar a orientação partidária quando se trata da combinação de duas tarefas: estimular e ser parte do enfrentamento amplo ao bolsonarismo; e construir uma alternativa independente com traços antissistêmicos para disputar as massas, combatendo a frustração e a desesperança.

Em teoria todos se dirão a favor dessas duas táticas, o problema está em como elas se combinam na prática. A linha expressa nas últimas eleições e defendida até aqui por alguns setores transforma a unidade de ação ou a necessidade de frente única numa política permanente, jamais existindo qualquer diferenciação com o PT. O problema não está em fazer unidade, ela é cada vez mais necessária. Mas é um erro se unir somente ao PT e fazer essa unidade sem afirmar o PSOL como uma ferramenta independente. Defendemos que o PSOL tenha uma postulação não subordinada para construir um projeto que dispute a hegemonia da esquerda. 

A necessidade de uma nova orientação no Partido é também para deixarmos de falar em “frente única” no abstrato ou em reuniões e passarmos a dar exemplos concretos, como os movimentos “Ele Não”, “Vira Voto” e “Tsunami da Educação” – que unificaram diferentes bandeiras e setores para ir às ruas contra o projeto de Bolsonaro.

Nossas tarefas devem ser práticas e efetivas: apoiar as greves e ocupações; estimular e ser parte do movimento estudantil; apoiar os servidores; fortalecer a política para os militares e policiais; prestar solidariedade ativa às lutas do MST, da FNL e do MLST; denunciar os assassinatos de quilombolas, indígenas e camponeses; apoio à APIB; ser parte ativa das lutas LGBT, das mulheres e da negritude, combinando-as com uma política para a classe trabalhadora; incorporar o ecossocialismo como elaboração e prática militante; atuar dentro de espaços plurais como o dos religiosos progressistas;   permanecer em campanha por justiça para Marielle. 

O PSOL precisa fortalecer-se como vetor da reorganização da esquerda, ampliando e diversificando suas lideranças; democratizando seu funcionamento,  enraizando-se entre o povo pobre e trabalhador; não abrindo mão da luta contra a corrupção e apresentando  um programa nacional de emergência. 

Capitalismo em crise: guerra social contra os povos

Parte da elaboração desta seção baseia-se em informes e debates com o camarada Éric Toussaint, da IV Internacional, em seminários e fóruns recentes.

Seguimos num período de interregno. Ao mesmo tempo em que a crise do capitalismo se aprofunda, não existe um modelo alternativo aos atuais padrões do capitalismo, o que configura um grave impasse internacional. As principais economias capitalistas estão ou em recessão ou em desaceleração. Existe um aumento enorme das dívidas privadas das grandes corporações, o que provoca a explosão das dívidas públicas. Neste contexto, o receituário seguido pela maioria dos governos é o da guerra social: retirada de direitos, redução de salários e ataque às conquistas, agravando a precarização das condições de vida e conformando uma classe ainda mais pulverizada pelo desemprego, pelo subemprego e pela informalidade. 

Há uma crise ecológica que está se acelerando e se revelando cada vez mais grave, como nos casos das queimadas na Amazônia e na Austrália, que ilustram a hecatombe predatória imperialista que precisa ser combatida com uma posição ecossocialista militante. 

Há uma crise profunda de regime. Nos países centrais, existem dificuldades para se estabilizar um padrão de dominação, que são reveladas, por exemplo, através da impossibilidade de formar maioria em inúmeros governos, através de regimes instáveis, que, em muitos casos, evoluem para regimes autoritários e muito mais repressivos. Trump segue a velha receita de forjar guerras para tentar reverter sua impopularidade. 

Ainda assim, há um nível muito alto de mobilização social e política. Em pouco mais de um ano, começando pela Nicarágua em abril/2018, houve fortes movimentos de massas no Equador, Haiti, Bolívia, Chile, Sudão, Líbano, França, Catalunha, Argélia, Hong Kong,  Guiné e outros. 

A resistência se amplia e se radicaliza

Há um auge das mobilizações de massa sobre o tema do clima, encabeçadas pela juventude. O chamado de Greta Thunberg levou milhões às ruas na greve climática, em mais de cinco mil cidades ao redor do planeta. Deve-se acrescentar que há um novo auge do movimento feminista e da participação feminina.  

Deve-se ressaltar o recente ascenso das mobilizações na América Latina.  A rebelião liderada pela CONAIE, que liquidou o pacote neoliberal de Moreno no Equador, abriu uma nova situação regional. O ápice foi a rebelião de massas no Chile, sob um governo de extrema-direita. Na direção oposta, um golpe de caráter racista e reacionário derrubou Evo Morales, agudizando as contradições do processo latino-americano. 

Deve-se reconhecer que existe uma crise do programa alternativo ao capitalismo. Há dúvidas, ainda não superadas, inclusive no seio das esquerdas radicais, em relação às perspectivas socialistas, herdadas das experiências traumatizantes do século XX. Em alguns casos de chegada ao poder, setores da esquerda radical hesitaram, por exemplo, sobre a expropriação do grande capital, aplicando políticas profundamente adaptacionistas e moderadas. As pressões parlamentares atuam sobre a esquerda. 

O PSOL deve ter um diagnóstico da crise global e estar atento aos processos de luta internacionais, oferecendo sua solidariedade ativa. O internacionalismo militante é uma tarefa fundamental. Tanto que uma parte dos que assinam essa tese constroem a IV Internacional. Apostamos, através de nossa localização na Secretaria de Relações Internacionais do PSOL, no fortalecimento do internacionalismo junto ao conjunto do Partido. 

O Brasil é parte da crise do capitalismo 

O bolsonarismo é um projeto que alia autoritarismo (com elementos neofascistas) na política e ultraliberalismo na economia. Queremos construir um caminho alternativo para responder às duas tarefas mais importantes deste período: ampliar a resistência ao projeto de Bolsonaro e forjar uma alternativa que tenha como estratégia mudar por completo o regime e o sistema. 

A chegada ao poder da extrema-direita é o ponto culminante da crise do regime da Nova República. É possível afirmar que o país passa por uma “crise orgânica” na qual – usando a definição de Antonio Gramsci – há uma “ruptura entre as classes sociais e as representações tradicionais”. É característica desse tipo de crise a falência total ou parcial do sistema político-partidário. Bolsonaro é resultante da grave crise do capitalismo. 

Retomamos a necessidade da disputa das ruas durante as Jornadas de Junho, onde a entrada em cena das massas, com centro na juventude, colocou o Brasil na rota dos movimentos de indignação popular.

A tarefa primordial daquele período era disputar e dar consequência programática para esse acontecimento. Porém, nos anos de 2015-2016 surgiu um movimento articulado pela grande mídia e por setores atrasados das camadas médias, dentre eles MBL e Vem Pra Rua, que cumpriu o papel, como “simulacro”, de disputar a insatisfação social, assentando as bases para o golpe parlamentar que retirou Dilma e empossou Temer. 

Foi a partir daí que Bolsonaro alçou-se para o centro do poder. A política dos governos petistas de coexistência com as alas golpistas da cúpula militar e das bancadas evangélicas de direita fermentou o que mais tarde elegeria Bolsonaro. Com a manipulação eleitoral que tirou Lula do páreo eleitoral e a máquina das fake news galvanizada pelo clã bolsonarista, a extrema-direita chegou ao poder.

É possível derrotar Bolsonaro 

Bolsonaro, em seu primeiro ano de mandato, deu inúmeras demonstrações de sua disposição de aprofundar a guerra social contra a classe trabalhadora, ao mesmo tempo em que favoreceu enormemente a lógica rentista na economia. O maior risco desse novo cenário é a normalização do domínio burguês sob comando bolsonarista, o que poderia facilitar a transição para um novo regime, ainda mais autoritário, sustentado na espoliação generalizada e permanente da maioria do povo. As declarações de Skaf e dos banqueiros em apoio ao governo apontam esse risco. Ao mesmo tempo, as profundas contradições ainda existentes no terreno político e econômico revelam que existem grandes obstáculos para aqueles que buscam essa normalização. 

Dados recentes  informam que há 14 anos o país não cria postos de trabalho com rendimento acima de dois salários mínimos. O aumento da população em situação de rua, o retorno de doenças consideradas extintas e o incremento da violência urbana são alguns sinais de degradação da situação social do país. É neste cenário que Bolsonaro declara guerra contra a força de trabalho (através das reformas trabalhista, da previdência e administrativa); contra a natureza e a biodiversidade; contra o conhecimento, a ciência e a educação; a saúde dos trabalhadores; contra a juventude, em especial negra e periférica; contra as mulheres, com uma epidemia de feminicídios; contra as LGBTs; contra os povos indígenas; contra os direitos democráticos historicamente conquistados; contra a cultura.

Naturaliza-se a violência policial como instrumento de repressão em territórios abandonados pelo Estado, incrementando a necropolítica e aprofundando o processo de genocídio da juventude negra nas favelas e periferias. Doria e Witzel tentam disputar o espaço à extrema-direita, adotando uma política de extermínio pelas polícias militares, como mostraram o assassinato de Ágatha, no Rio de Janeiro, e o massacre de Paraisópolis, em São Paulo. 

O governo também contraria todo seu discurso moralista ao abafar notórios casos de corrupção, como o envolvimento de Flávio Bolsonaro e Fabrício Queiroz com milicianos, denúncias de desvio e lavagem de dinheiro oriundo de seu gabinete parlamentar, além do escândalo das candidaturas “laranjas” do PSL. 

O presidente busca recrudescer os traços autoritários do governo: a criação da “Aliança pelo Brasil”, partido neofascista liderado por Bolsonaro, é uma sinalização da prioridade conferida à organização da extrema-direita, mesmo num contexto de dificuldades de articulação política do governo no Congresso.

O apontamento de uma saída política ao governo Bolsonaro coloca-se aos poucos na ordem do dia, apesar de suas dificuldades. Nesse caminho, o “Fora Bolsonaro” procura dialogar com esta situação, ainda não como uma agitação para a ação, mas como uma palavra de ordem unificadora, que dá sentido comum às lutas contra as distintas medidas do governo. O PSOL deve buscar todos os esforços para ampliar estas lutas, apostando na organização de atividades de rua, devendo atuar em todas suas esferas para se colocar a serviço do povo. 

A responsabilidade do PSOL: apresentar um programa de ação contra o bolsonarismo

Para derrotar Bolsonaro é preciso sistematizar e apresentar um programa alternativo, que promova o diálogo com o crescente espírito de indignação, ampliando a mobilização e a resistência, além de propor medidas econômicas contra a desigualdade.

A defesa das liberdades democráticas é um ponto central. A escalada antidemocrática representa risco à organização não só da esquerda, mas de setores liberais pequeno-burgueses e mesmo de um pequeno setor da burguesia que tem muito a perder caso a barbárie se instaure. Por isso, a defesa das liberdades democráticas deve buscar todo o diálogo possível, não se restringindo apenas ao campo que compôs o governo petista. O ano de 2019 apresentou muitas lutas nesse terreno, como o enfrentamento da perseguição a Glenn e o combate ao atentado fascista contra o “Porta dos Fundos”. Destaca-se ainda a luta pela resolução do assassinato de Marielle e Anderson, que representa um marco na escalada de violência política operada no país nos últimos anos.

Devemos desenvolver um programa econômico capaz de combater a profunda desigualdade no país, tanto como forma de responder à crise social quanto apresentando palavras de ordem que apontem para uma ruptura com o capitalismo. Citamos, por exemplo, a necessidade de retomarmos com força uma proposta radical de Reforma Agrária. Neste ponto, a política petista contribuiu para o arrefecimento das lutas camponesas por meio de cooptação de lideranças dos movimentos populares, e também disseminou a ideia falsa de que a desapropriação do latifúndio e a distribuição de terras não seriam mais o problema central, transferindo o centro de sua política para o estímulo ao agronegócio. A ausência de uma Reforma Agrária radical capaz de transformar o modelo produtivo perverso e ambientalmente predatório ampliou a massa de marginalizados, reforçando as relações de clientelismo e patrimonialismo e impedindo que avancemos para um modelo de segurança e soberania alimentar. Uma Reforma Agrária deve ter como objetivo democratizar a propriedade da terra, das florestas e da água, com regularização e demarcação das terras indígenas e quilombolas, desapropriação do latifúndio (improdutivo e escravista), priorizando a agricultura familiar, social e ambientalmente sustentável.

Enfrentar o capital financeiro

O PSOL deve enfrentar, em sua agitação, os interesses do capital financeiro transnacional que hegemonizam a política econômica do país. A este respeito, citamos aqui a antropóloga Rosana Pinheiro-Machado que, de forma brilhante, vincula o sofrimento popular à maximização dos lucros dos bancos em artigo de dezembro de 2019, “enquanto bancos têm lucro recorde, pessoas adoecem tentando pagar boletos. Em 2019, o lucro acumulado do Bradesco, Itaú Unibanco, Santander e Banco do Brasil foi de R$ 59,7 bilhões, o maior desde 2006”. O PSOL deve ter a marca antibanqueiros, apresentando e debatendo o tema da dívida para ampla vanguarda no país.

O Partido não pode mais vacilar, como na campanha presidencial de 2018, em enfrentar temas como a auditoria e a suspensão dos pagamentos da dívida pública, uma bandeira histórica do PSOL e da esquerda socialista. É fundamental que o VII Congresso recoloque esse tema na ordem do dia. 

Ainda no terreno de respostas econômicas à crise reivindicamos as boas experiências que remontam à fundação do PSOL, suas primeiras campanhas presidenciais (como a de Plinio de Arruda Sampaio e Luciana Genro em 2014) e as inúmeras proposições políticas de nossos parlamentares. Sobre essa base, estamos propondo a discussão de um programa que tenha como eixos: o apoio às lutas em curso; a total e irrestrita defesa das liberdades democráticas e o enfrentamento ao rentismo. Devemos desenvolver um programa de emergência que possa fazer o vínculo entre as lutas mais gerais e imediatas, com as necessidades estratégicas, de caráter anticapitalista, democrático, feminista e antirracista.

Elementos de programa 

Apresentamos, assim, uma primeira e sintética proposta de um programa para o debate nas fileiras do PSOL. Trata-se de um esboço a ser desenvolvido no debate e nas lutas em curso:

1. Taxação das grandes fortunas; Combate aos privilégios; Auditoria da dívida pública; Combate ao rentismo e às famílias multimilionárias; Em defesa do salário e da geração de empregos; Redução da jornada de trabalho sem redução salarial; Aumento salarial de emergência! Por um plano nacional de incentivo às obras públicas para combater o desemprego; 

2. Em defesa das liberdades democráticas! Pela prisão dos mandantes e assassinos de Marielle! Contra a perseguição a Glenn! Em defesa da cultura, das artes, da ciência e do patrimônio histórico; Abaixo à criminalização dos movimentos sociais; Basta de perseguição aos defensores de Direitos Humanos;

3. Defesa da Amazônia e do meio ambiente; Por um plano de combate ao aquecimento global e preservação da biodiversidade; Responsabilização pelos crimes de Brumadinho e Mariana e justiça para os atingidos por barragens; Defesa do ecossocialismo;. 

4. Não às privatizações! Em defesa das empresas pública; Em defesa do serviço e dos  concursos públicos;

5. Em defesa da educação pública, da ciência e da pesquisa; 

6. Basta de feminicídios; Em defesa do aborto legal, seguro e pelo SUS; Não é não; Por um feminismo anticapitalista e anti racista!

7. Contra o genocídio da juventude negra! Combate à violência policial e às propostas de “excludente de ilicitude” e de anistia a membros de grupos de extermínio; Por mais direitos à juventude e à negritude; 

8. Em defesa do SUS público, gratuito, estatal e universal!A saúde não é apenas um serviço, mais um campo de luta por emancipação social. Contra qualquer privatização. 

9. Contra a LGBTfobia! Pela vida e em defesa dos direitos da população trans; Pela garantia de acesso digno à população LGBT aos serviços de saúde e educação; Pela promoção da cultura e do orgulho LGBT; 

10. Em defesa da vida, dos direitos e o respeito à cultura dos povos originários; Demarcação das terras indígenas e quilombolas já!

11. Em defesa dos direitos das pessoas com deficiência (PCDs)!

12. Contra a intolerância e a perseguição religiosa; Em defesa do Estado laico;

13. Por uma proposta radical de Reforma Agrária; Em defesa da agricultura familiar, social e ambientalmente sustentável; Pela segurança e soberania alimentar;

14. A periferia é o centro! Contra a criminalização da cultura, da juventude e do povo periférico; Pela auto-organização desses territórios; 

15. Fora Bolsonaro! Contra a corrupção e as castas políticas! 

Construir o PSOL como polo socialista junto ao povo

Para enfrentar Bolsonaro e seu projeto é necessário construir ampla unidade de ação com todos os setores democráticos. A construção da frente única é parte desta tarefa, atuando sem sectarismo, somando forças em prol de melhores condições de ação política e, nesse contexto, levando adiante uma proposição programática e independente que impeça a diluição de nossas posições nesse movimento de ampliação. Junto a isso está a necessidade da afirmação do PSOL como um vetor.

Defendemos a liberdade de Lula como direito democrático, sobretudo porque quem mais ansiou por sua prisão foi um governo criminoso, beneficiado pela exclusão do petista da disputa eleitoral através de uma manobra, desnudada após as revelações de The Intercept sobre a Operação Lava Jato. Porém, o PT insistiu a todo momento na prioridade da linha “Lula Livre”, desagregando setores que não concordavam com essa política, prejudicando assim a construção de uma oposição sólida, e bastante ampla, para o enfrentamento ao governo Bolsonaro. Essa bandeira foi incapaz de mobilizar o povo, pois foi impossível apagar da memória da maioria os casos de corrupção envolvendo o PT, tornados públicos nos últimos anos. 

Portanto, a centralidade dessa bandeira não serviu à organização de uma oposição, mas essencialmente cumpriu o papel de fortalecer a liderança do PT para os próximos processos eleitorais, conforme Lula explicitou em entrevistas. A posição da maioria dos governadores petistas – de apoio à reforma da Previdência nacional e da militarização das escolas públicas –  reitera o fato de que não podemos tecer nenhuma ilusão com este campo, como se explicita no caso da Bahia. 

A situação do Nordeste é todo um tema. É o centro da resistência eleitoral e política ao fenômeno da extrema-direita, dando fôlego aos governos de “oposição”. O que aumenta a necessidade do PSOL firmar-se como uma alternativa real aos trabalhadores, sob pena, como no cenário mais geral, de que a extrema-direita o faça frente à insuficiência estratégica daqueles governos. 

Por sua vez, PCdoB, setores do PSB e PDT, além de outros grupos menores, têm suficientes limitações quanto à estratégia – como se vê na votação das bancadas destes partidos em vários temas fundamentais. Mas têm trabalhado para sair da hegemonia lulista, mesmo que com políticas distintas, enquanto setores do PSOL parecem querer se aproximar deste caminho em diversos gestos. O fracasso da articulação do “Vamos” demonstrou os limites dessa política. 

A ausência de uma direção capaz de forjar uma alternativa é uma das marcas centrais da conjuntura. Nesse cenário complexo, o PSOL mantém-se como uma conquista estratégica da esquerda socialista. As movimentações de diferentes setores da vanguarda e da população em direção ao nosso partido colocam-no hoje num novo patamar, representando as lutas da juventude, mulheres, da negritude e da população LGBT. A intervenção nas mobilizações das ruas e o crescimento das bancadas de parlamentares indicam nosso patamar e as possibilidades do Partido como representante de uma política socialista para o futuro. A expressão política adquirida pelo PSOL na luta pelas liberdades democráticas deu um salto com a truculência de Bolsonaro. A luta pelo legado de Marielle transformou-se numa marca. Precisamos fazer valer ainda a resolução aprovada por consenso no DN sobre colocar no centro das campanhas a questão da Amazônia e dos seus povos, com um giro nacional nas universidades e regionais, encabeçado pela companheira Sônia Guajajara. 

Como foi sugerido por alguns companheiros na última reunião do Diretório Nacional, devemos concentrar esforços para afirmar o PSOL, num calendário onde possamos ter um “dia mensal de mobilização” para levar a agitação partidária para as grandes concentrações de população nas cidades, com nossas bandeiras, identidade, parlamentares e figuras políticas locais e nacionais, formando  uma agitação unificada para apresentar uma saída pela esquerda. 

Enraizar o PSOL para além do discurso 

Nosso desafio partidário é seguir aprofundando a luta social para enraizar-nos junto ao povo. O bloco de oposição tem contribuído para esta construção. Estamos junto à bancada federal do PSOL com Sâmia, Fernanda e David, reconhecemos a importância do trabalho conjunto com Freixo, Erundina, Glauber, Aurea, Ivan, Talíria e Edimilson.

Em todo o país, nossos parlamentares se localizam em apoio às lutas, como Sandro Pimentel no Rio Grande do Norte, Mônica Seixas em São Paulo, Fábio Félix no Distrito Federal, além da força acumulada no Rio Grande do Sul, onde Luciana Genro e Roberto Robaina atuam como modelo de parlamentares. Na Câmara de Porto Alegre, ainda temos a presença do Professor Alex Fraga e, em Pelotas, de Fernanda Miranda. O PSOL tem vários parlamentares com perfil anticapitalista como Renato Roseno, Hilton Coelho, Mariana Conti, Fernanda Garcia, apenas para citar alguns bons exemplos. 

A educação se tornou linha de frente do ataque bolsonarista, que busca liquidá-la através de cortes de verbas e visa combater o pensamento livre, a ciência e a cultura, aliando-se ao criacionismo, ao terraplanismo, à ideologia de Olavo de Carvalho, promovendo a militarização das escolas, a censura e a perseguição a quem pensa diferente da extrema-direita. Seguimos, atuando com força na juventude, com a melhor delegação do Juntos na história de um CONUNE e na atuação em dezenas de DCEs. Estamos na linha de frente da resistência a estes ataques junto aos profissionais da educação ligados ao SEPE (RJ), à APEOESP (SP), SINTEPP (PA), entre outros.  

Consideramos a atuação feminista uma prioridade, por isso construímos uma coluna nacional, diversas referências políticas, elaboração teórico-programática sólida e parte de nós aposta na auto-organização das mulheres através do Coletivo Juntas e também desenvolvemos a experiência da Emancipa Mulher. 

No movimento popular, consideramos a ação da Rede Emancipa um exemplo de construção de movimento social, que cumpre o papel de disputar os bairros, favelas e periferias. Também mencionamos a experiência feita em Porto Alegre com os companheiros do movimento hip hop, através do coletivo EMBOLAMENTO CULTURAL. As vitórias recentes de nossas companheiras nas disputas dos conselhos tutelares são mais demonstrações do que deve ser feito.

Outro campo importante é a luta em defesa da Amazônia. Atuamos para ganhar o PSOL de conjunto para essa batalha, com nossas lideranças em toda a região amazônica (Acre, Amazonas, Pará, Roraima, Maranhão) e com o trabalho de quilombolas, indígenas e camponeses do Maranhão. 

No meio sindical, seguimos construindo de forma mais paciente. Fazemos a experiência dentro da CSP-Conlutas e da Intersindical, atuando para organizar frentes e composições mais amplas. Também devemos seguir atuando sobre as categorias da segurança pública, apoiando sindicatos de referência como o Sinpol-PE e atuando em movimentos como o dos “vigilantes antifascistas”, do Rio Grande do Norte.

O recrudescimento da repressão e as novas condições da luta agrária exigem o aprofundamento da política partidária, bem como o apoio aos movimentos como MST, MLST, FNL, MTST. 

Reafirmar o caráter militante do PSOL 

O Partido deve ter um novo tipo de funcionamento, adequado à procura que ativistas fazem pelo PSOL. É preciso oferecer mais espaços de participação e decisão — núcleos e organismos — para que os filiados se tornem militantes. Sugerimos: 

1. Mais peso organizativo e político para as setoriais partidárias; 

2. Crítica às distorções nos processos congressuais, como o notório caso do Amapá;

3. Funcionamento e envolvimento da militância nas atividades; incentivo à criação de núcleos como via de assegurar o enraizamento do partido; assegurar a existência de organismos de base permitindo a participação democrática da militância na vida partidária; utilização de novas ferramentas para debater a política do Partido; realização de debates e assembleias virtuais; publicação das posições de maioria e minoria; forma interativa de encaminhar as resoluções; organizar uma tribuna aberta, para dar espaço à participação cotidiana dos militantes.

Preparar a disputa eleitoral

A eleição de 2020 deve ser um salto na resistência e na construção de alternativas. Nossa tática eleitoral deve ser orientada pelas duas tarefas prioritárias: derrotar Bolsonaro por um lado e, por outro, postular o PSOL como centro de reorganização da nova esquerda. Como se trata de uma eleição municipal, as táticas para um país continental como o Brasil devem ser variadas. No entanto, devemos adotar critérios objetivos para encarar a disputa.  

Em São Paulo, o forte impacto da pré-candidatura de Sâmia Bomfim mostra a força e a expressão democrática que tem o PSOL, a importância da luta das mulheres e a necessária renovação geracional para nos conectar às necessidades dos novos tempos. A nossa luta em Porto Alegre é parte da batalha pela afirmação do PSOL, fazendo exigências à unidade, enquanto preparamos nossa postulação com a pré-candidatura de Fernanda Melchionna. O Rio de Janeiro é um caso mais particular porque existem elementos de decomposição do regime, tornando prioritária a necessidade do PSOL impor uma derrota à Crivella. No entanto, a unidade eleitoral não pode significar o abandono das posições históricas de nosso Partido, nem nos levar a assumir uma reivindicação falsa e acrítica da liderança lulista em troca do apoio do PT. 

Combinar a unidade para resistir e a postulação de uma alternativa que não se dilua, especialmente no lulismo, são os desafios que se apresentam para nossas direções locais e nacionais. Eis os parâmetros que devem guiar o debate eleitoral de nosso partido, que aparece em condições de fazer uma disputa de setores de massas em várias capitais, além do Rio de Janeiro, como Belém, Florianópolis, São Paulo, Fortaleza, Salvador, Porto Alegre, Recife, São Luiz, Natal, além de cidades importantes como Sorocaba (SP), Santo André (SP), Niterói (RJ), São José do Rio Preto (SP), entre muitas outras. 

No âmbito da disputa proporcional, nosso desafio é dar voz e vez às novas lideranças que vêm surgindo para ocupar nas câmaras municipais o espaço que existe para a esquerda radical. O PSOL deve eleger vereadores em centenas de cidades grandes e médias, superar a cláusula de exclusão em 2022 e postular novas referências políticas para um novo tempo político.

Construir a linha da vitória

Queremos, com essa tese, construir um debate inicial para enriquecer o processo congressual do Partido. O PSOL deve ser o campeão das reivindicações locais, pisando junto ao solo do povo, sem perder sua prática internacionalista, de solidariedade ativa. Temos que concretizar nossa presença junto à classe, sem deixar de falar de socialismo: para tanto, é fundamental apostar mais e mais na formação política, na batalha das ideias, na reconstrução da subjetividade e dos laços associativos. 

A alternativa ao autoritarismo e ao neoliberalismo da extrema-direita é a luta por socialismo e liberdade. Socialismo como a única esperança histórica dos povos em busca de igualdade, do fim da anarquia dos mercados, da concentração de riquezas nas mãos dos bilionários e em defesa da vida. Liberdade como condição inescapável da realização das capacidades humanas e como resposta à barbárie dos campos de concentração de migrantes, do encarceramento massivo de pobres em todo o mundo, da violência crescente nas cidades e no campo, das ditaduras e da perseguição. Queremos construir o PSOL como condição para a disputa política da geração que pode derrotar Bolsonaro e construir uma linha de vitória para uma maioria social! Marielle Vive! 

Assinam:

  1. Luciana Genro, Ex-candidata a presidente, Fundadora do PSOL, Deputada Estadual/RS
  2. Sâmia Bomfim, Deputada Federal/SP
  3. Fernanda Melchionna, Deputada Federal/RS
  4. David Miranda, Deputado Federal/RJ
  5. Sandro Pimentel, Deputado Estadual/RN
  6. Mônica Seixas, Codeputada Estadual Pela Bancada Ativista, São Paulo/SP
  7. Fábio Felix, Deputado Distrital, Presidente do PSOL/DF
  8. Erika Hilton, Codeputada Estadual Pela Bancada Ativista, São Paulo/SP
  9. Aureo Cisneiros Luna Filho, Primeiro Suplente de Deputado Estadual, Dirigente Nacional dos Policiais Antifascismo, Recife/PE
  10. Mariana Riscali, Tesoureira Nacional do PSOL, São Paulo/SP
  11. Leandro Recife, Secretário Geral do PSOL, Recife/PE
  12. Israel Dutra, Secretário de Relações Internacionais do PSOL, São Paulo/SP
  13. Zeneide Nazaré Lima dos Santos, Executiva Nacional do PSOL, Rio de Janeiro/RJ
  14. Roberto Robaina, Presidente Municipal do PSOL e Vereador, Diretório Nacional do PSOL, Porto Alegre/RS
  15. Pedro Fuentes, Direção Nacional do MES, Niterói/RJ
  16. Frederico Henriques, Diretório Nacional do PSOL, São Paulo/SP
  17. Nathalie Illa Longhi Drumond, Coordenação Bancada PSOL na Câmara, Diretório Nacional PSOL, Brasília/DF
  18. Honório Oliveira, Direção do PSOL RJ, Direção Nacional do MES, Rio de Janeiro/RJ
  19. Edinea Matos, Executiva PSOL Salvador, Diretório Estadual Bahia, Diretório Nacional do PSOL, Salvador/BA
  20. Nonnato Masson, Diretório Nacional do PSOL, São Luís/MA
  21. Romer Guex, Comissão de Ética Nacional, Executiva Estadual do PSOL RS, Viamão/RS
  22. Viviane da Costa Reis, Diretório Nacional e Suplente de Deputado Federal, Belém/PA
  23. Nayara Navarro, Diretório Nacional do PSOL, São Bernardo do Campo/SP
  24. Danillo Prisco, Diretório Nacional do PSOL, Natal/RN
  25. Josemar Carvalho, Diretório Nacional do PSOL, São Gonçalo/RJ
  26. Diolinda Alves de Souza, Liderança da luta pela terra, FNL – Pontal do Paranapanema
  27. Ari Areia, Primeiro Suplente de Deputado Estadual, Fortaleza/CE
  28. Camila Goulart, Presidente Estadual do PSOL Rio Grande do Sul
  29. Danniel Alexandro Ferreira de Moraes, Presidente do PSOL Rio Grande do Norte
  30. Leandro Santos Dias, Presidente Diretório Estadual do PSOL Paraná
  31. Alex Fraga, Vereador de Porto Alegre/RS
  32. Fernanda Miranda, Vereadora de Pelotas/RS

Veja a lista completa com 5.306 assinaturas na versão em PDF (349kb, 127 páginas).


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Edição de março traz conteúdo inédito para marcar a memória da luta contra a repressão