Desenvolvimento desigual e combinado e a atualidade da revolução permanente

É preciso dar um passo firme, consistente, para construir um novo programa a partir do método do programa de transição.

Júlio Câmara 5 jun 2020, 14:07

No mês de abril, celebramos 150 anos do nascimento de Vladimir Ilyich Ulianov, o revolucionário russo Lênin. Celebrar a vida e a obra de Lênin é reivindicar um legado revolucionário e a luta pelo socialismo mundial. Lênin era um grande internacionalista; considerava a classe proletária russa e o seu partido como um destacamento do exército mundial de trabalhadores e do movimento operário internacional e encarava todas as questões essenciais da revolução e da construção do socialismo na Rússia a partir dos interesses do movimento internacional de libertação dos trabalhadores.

Para Lênin e o núcleo dirigente bolchevique, o marxismo era uma bússola. Por isso, sempre tiveram consciência de que a felicidade completa da revolução russa estava relacionada ao avanço da revolução socialista em outros países.

Ao lançar o Manifesto Comunista, Marx e Engels estavam inaugurando um movimento científico capaz de analisar o funcionamento da sociedade com o objetivo de transformá-la. Este documento foi o ponto de partida para o programa defendido pelos comunistas  ao longo da história. A última frase expressa o DNA internacionalista, mundial, do movimento comunista: Proletários de todos os países, uni-vos!

De lá pra cá, o desenvolvimento do capitalismo mundial atestou a veracidade das tendências apontadas por Marx.  Trata-se de um problema internacional que exige uma luta internacional. Mas o programa do partido comunista, suas táticas e estratégias passaram por ferozes polêmicas durante a história.

No calor dos acontecimentos na Rússia, foi aberta a polêmica sobre a revolução. Os mencheviques defendiam um processo por etapas, em que era hora de apoiar a burguesia para derrubar o czar, desenvolver o capitalismo e depois lutar pela revolução socialista. O contraponto defendido pelos bolcheviques, e corretamente escolhido pelos revolucionários, era a teoria da revolução permanente. Foi o próprio Marx que, em 1850, lançou os fundamentos desta teoria, quando disse que o interesse do partido proletário não pode ser satisfeito com a revolução democrática burguesa porque é preciso “fazer a revolução permanente, mantê-la em marcha até que todas as classes proprietárias e dominantes sejam despojadas do poder”.

O revolucionário Leon Trotsky, membro do núcleo dirigente bolchevique com Lênin, aprofunda a teoria da revolução permanente através da lei do desenvolvimento desigual e combinado dizendo que a revolução democrática seria um episódio da revolução socialista. O que quer dizer que a derrubada do czar teria continuidade até a expropriação da burguesia. E foi isso que aconteceu.

A linha etapista, recusada pelos revolucionários russos, foi reciclada por Stalin após a morte de Lênin. Stalin burocratizou o partido e o Estado soviético, atuando a favor da contrarrevolução e perseguindo os revolucionários que seguiram fiéis ao legado de Lenin e à ciência marxista. Com Stalin no comando, foi abandonada a estratégia da revolução mundial e a União Soviética ficou à disposição dos interesses dos burocratas e não mais dos trabalhadores do mundo que Marx apelava para unirem-se.

A juventude que se engaja para construir uma organização revolucionária no Brasil precisa saber que é fundamental que esta organização seja internacionalista e um destacamento de uma organização internacional. Não é possível consolidar o socialismo num só país, como ensinou a experiência russa que teve os caminhos fechados com a derrota da revolução alemã.

Leon Trotsky levou adiante a bandeira da revolução internacional lutando contra a burocracia até ser assassinado a mando de Stalin em 1940 no México. Em certo sentido, os capangas de Stalin chegaram atrasados, pois Trotsky já havia fundado uma nova organização internacional de partidos revolucionários e anti burocráticos: a  IV Internacional.

A fundação da IV Internacional, considerada o maior legado de Trotsky, baseou-se no método do programa de transição, da teoria da revolução permanente e, claro, na tradição internacionalista. O Programa de Transição, em linhas gerais, é um documento que busca fazer a relação entre o programa mínimo (reivindicações imediatas) e o programa máximo (a tomada do poder) para orientar a atividade revolucionária  diante das contradições entre as condições objetivas para a revolução e a imaturidade das condições subjetivas (o nível de consciência de classe e a fragilidade da direção).

O grande feito de Trotsky foi salvar o fio de continuidade da história do partido e do programa revolucionários desde a redação do Manifesto Comunista, passando pelas polêmicas da revolução russa, entre outras, até a sobrevivência durante a contra revolução stalinista.

Para apagar essa história e eliminar este fio de continuidade, a ideologia burguesa insiste em dizer que não existe mais uma classe operária internacional, um proletariado mundial.  Trata-se de uma mentira para desmontar e desmobilizar qualquer entusiasmo com a revolução mundial.

Durante a pandemia do novo coronavírus fica nítida a divisão da sociedade em classes e como os proletários enfrentam os mesmos problemas em maior ou menor medida, são sempre mais explorados pela burguesia e ficam mais suscetíveis à falta de saúde pública.

Hoje não temos uma organização internacional com capacidade de mobilização massiva. Por outro lado, estão evidentes os elementos que internacionalizam a necessidade de lutar por outro futuro, digno, sem exploração do homem pelo homem e da natureza pelo homem. É preciso dar um passo firme, consistente, para construir um novo programa a partir do método do programa de transição. Precisamos conectar as lutas ecológicas, as lutas raciais, a luta das mulheres, dos imigrantes, a luta por direitos humanos e sociais para avançar na unidade das lutas nacionais que só podem ter um fim no cenário mundial.

Artigo originalmente publicado no Jornal do Juntos!.

TV Movimento

Balanço e perspectivas da esquerda após as eleições de 2024

A Fundação Lauro Campos e Marielle Franco debate o balanço e as perspectivas da esquerda após as eleições municipais, com a presidente da FLCMF, Luciana Genro, o professor de Filosofia da USP, Vladimir Safatle, e o professor de Relações Internacionais da UFABC, Gilberto Maringoni

O Impasse Venezuelano

Debate realizado pela Revista Movimento sobre a situação política atual da Venezuela e os desafios enfrentados para a esquerda socialista, com o Luís Bonilla-Molina, militante da IV Internacional, e Pedro Eusse, dirigente do Partido Comunista da Venezuela

Emergência Climática e as lições do Rio Grande do Sul

Assista à nova aula do canal "Crítica Marxista", uma iniciativa de formação política da Fundação Lauro Campos e Marielle Franco, do PSOL, em parceria com a Revista Movimento, com Michael Löwy, sociólogo e um dos formuladores do conceito de "ecossocialismo", e Roberto Robaina, vereador de Porto Alegre e fundador do PSOL.
Editorial
Israel Dutra e Roberto Robaina | 12 nov 2024

A burguesia pressiona, o governo vacila. É hora de lutar!

Governo atrasa anúncio dos novos cortes enquanto cresce mobilização contra o ajuste fiscal e pelo fim da escala 6x1
A burguesia pressiona, o governo vacila. É hora de lutar!
Edição Mensal
Capa da última edição da Revista Movimento
Revista Movimento nº 54
Nova edição da Revista Movimento debate as Vértices da Política Internacional
Ler mais

Podcast Em Movimento

Colunistas

Ver todos

Parlamentares do Movimento Esquerda Socialista (PSOL)

Ver todos

Podcast Em Movimento

Capa da última edição da Revista Movimento
Nova edição da Revista Movimento debate as Vértices da Política Internacional

Autores

Pedro Micussi