A uberização do ensino como desvalorização da docência

Professores horistas são seriamente prejudicados durante pandemia.

Kezia Lima 9 jul 2020, 14:08

Antes mesmo do início da pandemia alguns professores já sentiam um efeito terrível da má remuneração e desvalorização da educação: contratos temporários ou seletivos sem garantias e direitos, como horários remunerados para planejamento de aula e correções de trabalho. Contratos que pagam apenas a hora/aula de uma disciplina: carga horária de 60 horas, o professor recebe apenas a aula dada (4 horas por semana/disciplina) e, ao fim do semestre, não há remuneração alguma no período de férias, nem 13º salário, nada. Os efeitos disso vieram mais fortes com a pandemia.

Com as aulas suspensas, esses contratos que pagam apenas a aula lecionada, colocaram os professores horistas em uma situação calamitosa. Muitos, sem ter outra fonte de renda, passaram a não ter renda alguma. É o caso dos professores horistas da Universidade Estadual de Roraima (UERR), que de dezembro de 2019 a julho de 2020, apenas foram remunerados pelas aulas de final de fevereiro e das duas semanas de março.

Com a abertura para a solicitação do auxílio emergencial, alguns professores horistas que se inscreveram para receber o auxílio foram atendidos. Porém, cadastrados como servidores públicos, esses professores horistas agora estão entre os mais de 1.700 servidores de Roraima convocados a devolver o auxílio emergencial de R$ 600,00 e tiveram seus auxílios suspensos.

Um professor horista com mestrado na UERR recebe R$40,60 por hora aula. Uma disciplina com carga horária de 4h semanais rende no final do mês R$ 750,00, ou seja, menos que um salário mínimo por uma disciplina. A situação de desvalorização desses professores vai desde a incerteza de prover as necessidades de suas casas e dependentes a ser convocado pela instituição para prestar esclarecimentos sobre as razões de ter solicitado o auxílio emergencial e, agora, a ter que devolver os valores do auxílio recebidos até o momento.

Nossos professores horistas sempre estiveram sujeitos a essa modalidade de contrato severa e desumana, mas, nesse período da pandemia, vimos a classe ficar desamparada financeiramente. Pelo modelo do contrato, sabiam que não teriam renda nos períodos de férias, mas não durante o semestre letivo 2020.1. No fim das contas, esse modelo de trabalho exime o contratante de qualquer responsabilidade com seus funcionários. São chamados de servidores públicos sem gozar dos direitos inerentes a essa condição, ficando à mercê da própria sorte.

Esse fenômeno que se caracteriza com o sistema de uberização do trabalho é evidenciado quando observamos que os professores horistas arcam sozinhos com todos os riscos de um contrato como esse: não há garantia de salário frente a uma adversidade como a pandemia, não recebe pelos trabalho extra-sala (planejamento, correções de trabalho, orientação de alunos, reuniões de colegiado, etc). A situação é tão desumana que mesmo os professores horistas que não concordam com o ensino remoto, por questões pedagógicas, durante a pandemia precisam se submeter a ele, mesmo vendo graves problemas nesse formato, porque já estão em extrema pressão financeira, emocional e psicológica.

É urgente a revisão desse modelo de contratação dos professores. É necessário que a instituição aprenda com a Pandemia o que tem sido doloroso há muitos anos aos professores horistas: a instabilidade dessa modalidade é desumana. A instituição precisa mostrar à sociedade que a licenciatura deve ser uma interessante e atraente carreira, mas segue na contramão disso quando não valoriza os formadores de novos professores. A lição de casa precisa ser feita, as licenciaturas são os cursos menos procurados nas seleções de vestibular e a lógica é clara: a desvalorização do docente projeta nos alunos um desprezo por uma carreira que é tratada com tanto descaso.


TV Movimento

Balanço e perspectivas da esquerda após as eleições de 2024

A Fundação Lauro Campos e Marielle Franco debate o balanço e as perspectivas da esquerda após as eleições municipais, com a presidente da FLCMF, Luciana Genro, o professor de Filosofia da USP, Vladimir Safatle, e o professor de Relações Internacionais da UFABC, Gilberto Maringoni

O Impasse Venezuelano

Debate realizado pela Revista Movimento sobre a situação política atual da Venezuela e os desafios enfrentados para a esquerda socialista, com o Luís Bonilla-Molina, militante da IV Internacional, e Pedro Eusse, dirigente do Partido Comunista da Venezuela

Emergência Climática e as lições do Rio Grande do Sul

Assista à nova aula do canal "Crítica Marxista", uma iniciativa de formação política da Fundação Lauro Campos e Marielle Franco, do PSOL, em parceria com a Revista Movimento, com Michael Löwy, sociólogo e um dos formuladores do conceito de "ecossocialismo", e Roberto Robaina, vereador de Porto Alegre e fundador do PSOL.
Editorial
Israel Dutra e Roberto Robaina | 12 nov 2024

A burguesia pressiona, o governo vacila. É hora de lutar!

Governo atrasa anúncio dos novos cortes enquanto cresce mobilização contra o ajuste fiscal e pelo fim da escala 6x1
A burguesia pressiona, o governo vacila. É hora de lutar!
Edição Mensal
Capa da última edição da Revista Movimento
Revista Movimento nº 54
Nova edição da Revista Movimento debate as Vértices da Política Internacional
Ler mais

Podcast Em Movimento

Colunistas

Ver todos

Parlamentares do Movimento Esquerda Socialista (PSOL)

Ver todos

Podcast Em Movimento

Capa da última edição da Revista Movimento
Nova edição da Revista Movimento debate as Vértices da Política Internacional

Autores

Pedro Micussi