Uma vitória popular – Uma nova etapa se abre no Chile

Ao contrário dos discípulos dos “chicago boys” e apologistas da tortura, reafirmamos que o Chile pode ser uma experiência sim para enterrar o neoliberalismo.

Israel Dutra 26 out 2020, 15:38

A noite pareceu interminável. Os festejos em Santiago, na praça da Dignidade, ainda que oficialmente chamem de Baquedano, expressaram o que sentiu em toda as cidades do Chile: uma alegria imensa por estar sendo enterrrada a constituição herdada da Ditadura e do pinochetismo. O resultado do plebiscito foi consagrador. A maioria aplastante votou pelo “aprovo” e pela “convenção constituinte”. Na maior votação da história recente do Chile, segundo o próprio TSE local, quase seis milhões de chilenos- num universo de 7, 5 milhões de votantes- deram mais 78% para a opção “aprovo”, que significada uma nova constituição, e 79% para que essa constituição seja redigida por uma convenção, com paridade de gênero, exclusivamente para esse fim. Se abre uma nova etapa na vida política e democrática do Chile.

No Brasil, onde Paulo Guedes e Bolsonaro fazem do Chile seu modelo da experimento de autoritarismo e neoliberalismo, os ecos dessa vitória apenas começam a se fazer sentir. Ao contrário dos discípulos dos “chicago boys” e apologistas da tortura, reafirmamos que o Chile pode ser uma experiência sim para enterrar o neoliberalismo. Bolsonaro e seus aliados amargam mais uma derrota, depois da contundente vitória do povo boliviano contra os golpistas no domingo último.

Após anos de agitação, a hipótese de uma nova constituição só se tornou real após a rebelião de 18 de outubro de 2020, onde se iniciou um processo – com traços revolucionários – de profundas transformações no Chile. O Outubro de 2019 foi a maior mobilização do Chile contemporâneo, chegando ao seu estágio superior, na maior greve geral da história do país, em 12 de novembro de 2019. A esquerda da Frente Ampla e o PC não participaram da mesa de negociações que buscou o “cessar-fogo” em 15 de novembro de 2019. Duas heranças dos combates de outubro: se registraram as maiores manifestações da história do Chile, com mais de um 1 milhão de pessoas em Santiago; se colocou para setores de massa o questionamento a ação dos Carabineros, que deixaram com lesões visuais centenas de ativistas, levando a ampla maioria da população chilena repudiar a violência policial. Na aprovação da constituinte, estavam sendo vingados, de algum jeito ou outro, os centenas que perderam a visão no outubro do ano passado, vitimas da violência de estado; os que perderam a vida na mais sangrenta ditadura do continente, chefiada pelo genocida Augusto Pinochet Ugarte.

Esse processo não surgiu agora. A crítica aos acordos de transição, em que a centro-esquerda, através do PS, pactou a manutenção da constituição e de um plano neoliberal, surgiu dos setores mais radicalizados da sociedade, com um enorme caldo de cultura para uma esquerda independente e um movimento social potente.

Surgiram novos embates e atores políticos, que já vinham do ascenso estudantil iniciado em 2011, com muito peso das mulheres em luta, como acúmulo da construção das coordenadoras do 8-M; a bandeira dos mapuches foi o símbolo do levante de outubro, se resgatou a esperança na auto-organização popular.

Vínhamos afirmando que uma nova dinâmica estava se abrindo no continente com as rebeliões do Equador e Chile, ao final de 2019. Com o efeito da pandemia, estes processos ficaram congelados; durante o primeiro semestre cresceu o questionamento a Trump nos Estados Unidos, com o auge da rebelião antiracista e a explosão de lutas da negritude contra a violência policial. Agora os processos voltam a dar saltos: vitória de Arce e do MAS na Bolívia, plebiscito no Chile e quiçá ver a derrota de Trump na eleição dos Estados Unidos.

A nova etapa política no Chile vem acompanhada de esperança e de uma busca por uma esquerda renovada, que seja capaz de fazer a disputa de hegemonia da sociedade, mas possa estar por fora dos cupulismo e dos pactos que marcaram o ciclo anterior, onde o dito “progressismo” abriu caminho para a confusão. Enterrar de vez os entulhos da ditadura chilena é um ponto de inflexão.

Esse é um passo, um grande passo. Agora a disputa é por qual projeto de país passa a nova constituição, que tem travas importantes como a aprovação por 2/3 de temas polêmicos. O movimento social deverá fazer a disputa para as bandeiras que são as da maioria social. Por toda a Cordilheira dos Andes, a luta se aprofunda. Seja na vitória popular boliviana, na retomada da rebelião equatoriana, nas mobilizações que crescem na Colombia, e agora, como ponto alto, o processo estrutural que o Chile responde.

O lugar do PSOL, muito ativo nessas batalhas é ser solidário e fomentar o debate político internacionalista, nesse momento no continente, resgastando o sentimento latinoamericanista e dando nossa contribuição para derrotar a extrema-direita, de Bolsonaro e Trump, nas ruas e nas urnas. Estaremos apoiando o bravo povo chileno em mais essa fase de debate e de luta por controlar seu próprio destino.


TV Movimento

Roberto Robaina entrevista Flávio Tavares sobre os 60 anos do golpe de 1º de abril

Entrevista de Roberto Robaina com o jornalista Flávio Tavares, preso e torturado pela ditadura militar brasileira, para a edição mensal da Revista Movimento

PL do UBER: regulamenta ou destrói os direitos trabalhistas?

DEBATE | O governo Lula apresentou uma proposta de regulamentação do trabalho de motorista de aplicativo que apresenta grandes retrocessos trabalhistas. Para aprofundar o debate, convidamos o Profº Ricardo Antunes, o Profº Souto Maior e as vereadoras do PSOL, Luana Alves e Mariana Conti

O PL da Uber é um ataque contra os trabalhadores!

O projeto de lei (PL) da Uber proposto pelo governo foi feito pelas empresas e não atende aos interesses dos trabalhadores de aplicativos. Contra os interesses das grandes plataformas, defendemos mais direitos e melhores salários!
Editorial
Israel Dutra e Roberto Robaina | 28 abr 2024

Educação: fazer um, dois, três tsunamis

As lutas da educação nos Estados Unidos e na Argentina são exemplares para o enfrentamento internacional contra a extrema direita no Brasil e no mundo
Educação: fazer um, dois, três tsunamis
Edição Mensal
Capa da última edição da Revista Movimento
Revista Movimento nº 48
Edição de março traz conteúdo inédito para marcar a memória da luta contra a repressão
Ler mais

Podcast Em Movimento

Colunistas

Ver todos

Parlamentares do Movimento Esquerda Socialista (PSOL)

Ver todos

Podcast Em Movimento

Capa da última edição da Revista Movimento
Edição de março traz conteúdo inédito para marcar a memória da luta contra a repressão