Abaixo o governo genocida de Bolsonaro!

Documento da Executiva Nacional do MES sobre a situação política brasileira.

Executiva Nacional do MES/PSOL 22 mar 2021, 22:10

Chegamos a quase 3 mil mortes por dia, nos registros oficiais, pela Covid-19: uma marca trágica, mórbida, que faz do Brasil o epicentro mundial da pandemia. Superamos a média móvel de casos e óbitos dos Estados Unidos, até então as maiores do mundo. Estamos vivendo uma tragédia sem precedentes. Sem contar as subnotificações, são quase 300 mil vidas a menos.

A crise política está se agravando no país. Não é possível descartar uma nova janela política, na qual esteja recolocada a hipótese do impeachment. Isso nos impõe a retomada do eixo de luta pelo “Fora, Bolsonaro”. O impeachment pode não ser visto, hoje, como provável, mas o tema voltou à pauta e, por isso, devemos estar na vanguarda para lutar pela realização dessa tarefa fundamental.

O cenário internacional traz novas tendências e arrasta algumas incertezas. Como elementos de novidade, podemos assinalar – sem tratar do tema, neste documento, com profundidade – a nova orientação política e econômica do governo Joe Biden nos Estados Unidos. A aprovação de um pacote de estímulo na ordem de US$ 1,9 trilhão e a distância das medidas de Trump, por si só, já conferem um novo momento à política global. Trata-se de uma mudança enorme, sobretudo para o Brasil de Jair Bolsonaro. Também assistimos a uma desigualdade muito grande com relação ao enfrentamento à pandemia no planeta. Em alguns países, a vacina já imuniza parcelas significativas da população, enquanto em outros ainda se nota repique de casos e mesmo o confinamento total, como é a situação da Alemanha e da Itália, respectivamente.

Outro fenômeno notável é a eclosão de revoltas de caráter popular numa série de países, nos quais a gestão da pandemia levou à ira e à indignação da maioria social. Sem nos repetirmos, é possível mencionar Haiti, Argélia, Paraguai, Líbano, Senegal, Jordânia e, no caso mais emblemático, a luta entre revolução e contrarrevolução em Mianmar.

Nosso vizinho Paraguai passa por uma verdadeira revolta contra o colapso sanitário. Já são mais de dez dias de manifestações multitudinárias. As jornadas de março têm uma especial participação da juventude, que toma a capital Assunção e as principais cidades do país, pedindo a queda do presidente Mario Abdo e de seu vice Velázquez. A luta do povo paraguaio é um processo extremamente progressivo, que tem eco na vanguarda e no ativismo do Brasil.

Entre o vírus e a fome

A situação brasileira é de completo descalabro. Na semana em que se anuncia o novo ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, há um recorde de casos e óbitos por Covid-19. O país se transformou num pária para a comunidade internacional. As novas cepas, como a originada em Manaus e a variante britânica, circulam nos estados, ampliando o contágio e sendo mais letais, inclusive, para os mais jovens.

Eduardo Pazuello não deixará saudades no Ministério da Saúde. Em sua gestão à frente da pasta, o general foi um símbolo da incompetência, do desastre e das mortes. A sua troca foi envolvida em mais uma crise palaciana, com Bolsonaro descartando os nomes sugeridos pelo centrão, como a médica Ludhmila Hajjar, que saiu acusando o bolsonarismo de perseguição. O país teve quatro ministros da Saúde até aqui, sendo que Mandetta e Teich deixaram o cargo alegando incompatibilidade com a orientação anticientífica e negacionista de Jair Bolsonaro.

Se em janeiro e fevereiro vivemos o trauma da falta de leitos e de oxigênio em Manaus, agora, verifica-se o caos alastrando-se pelo país. Em muitas regiões, o nível de ocupação das UTIs passa de 100%. Os governos não conseguem responder à altura, alternando omissão, falta de coordenação e dificuldade de oferecer uma saída que leve em conta a necessidade de diminuir significativamente a circulação garantindo uma renda digna para a sobrevivência da população.

Com o necessário fechamento das cidades para o combate à disseminação da Covid-19, a economia também sofre um baque e o desemprego deu um salto. Mais da metade da população não está formalmente ocupada. São centenas de milhares de pequenos e médios negócios que estão fechando ou falindo, gerando desespero, ruína e inadimplência, além de mais uma rodada de concentração de capitais e de aumento da desigualdade.

A inflação escala: a cesta básica teve um aumento de 33% em poucos meses. Mesmo com a demagogia de Bolsonaro sobre a redução de impostos e a substituição do presidente da Petrobrás, os preços dos combustíveis e do gás de cozinha sobem a galope.

Estamos diante de uma realidade dramática que faz com que o país retroceda em décadas: a fome volta a ser uma realidade, um pesadelo real para milhões de brasileiros. Estima-se que dos 16 milhões que vivem em condições de pobreza nas favelas, cerca de 82% não conseguem alimentar sua famílias com duas refeições diárias. Segundo dados do IBGE, são 10,3 milhões de brasileiros que já estão passando fome. Enquanto parcelas expressivas do povo enfrentam a insegurança alimentar, a família Bolsonaro é investigada pelo já famoso esquema de “rachadinhas” em seus gabinetes e por seu enriquecimento desproporcional, do qual o último e mais escandaloso exemplo foi a compra da mansão de luxo de R$ 6 milhões em Brasília pelo senador Flávio Bolsonaro em plena pandemia.

As respostas do governo e do Congresso são uma verdadeira condenação do povo à miséria: o novo auxílio-emergencial terá valores muito inferiores aos de 2020 (R$ 600 nas primeiras parcelas, depois cortados pela metade) e oscilará entre R$ 150 e R$ 375 – um verdadeiro escárnio, já que o novo auxílio não cobrirá sequer 40% do preço da cesta básica nas principais capitais do Brasil.

Bolsonaro atenta contra os interesses populares

A linha básica de Bolsonaro é atentar contra a vida, os interesses populares e o patrimônio nacional. O jovem youtuber Felipe Neto não tinha melhor forma de resumir quem é Bolsonaro: um genocida e responsável pelas centenas de milhares de mortes por sua gestão criminosa da pandemia. Equilibrando-se para manter uma posição competitiva na disputa de 2022, Bolsonaro construiu sua aliança com o que há de pior na política nacional e venceu com o centrão a presidência das duas casas legislativas. Acenando para sua base, agita a liberação cada vez maior do porte de armas, insufla protestos minoritários como o de 14/03 e sustenta a linha de entrega das estatais para manter o ajuste e o plano Guedes. A votação da PEC da austeridade que congela salários do funcionalismo e a MP de venda da Eletrobrás respondem a esse plano. E vem mais por aí: reforma administrativa, venda dos Correios, entrega de novos campos e refinarias da Petrobrás, além da manutenção do arrocho salarial com sua política econômica.

Os efeitos do desastre são sentidos. Apesar de todo poder de governo, Bolsonaro teve um forte revés na opinião pública segundo a última pesquisa Datafolha. As pesquisas de opinião já refletem o enfraquecimento do presidente, que tenta operar uma mudança brusca em seu discurso, como na falaciosa nova postura do governo em relação à vacinação. O número dos que avaliam o governo Bolsonaro como ruim/péssimo chega a 44%, além da reprovação de 54% dos entrevistados quando perguntados sobre o papel do presidente na gestão da pandemia. Bolsonaro ainda conserva o apoio de 30%, sobretudo em sua fiel base evangélica.

Há outros setores que ameaçam desgarrar-se da política do governo. A manifestação de policiais civis em Brasília, descontentes com o tratamento dado à categoria na PEC, evidencia um importante choque. Outra categoria que deve ser acompanhada é a dos caminhoneiros que, junto com os motoristas de aplicativos, sofre as duras consequências da política de preços da Petrobrás (a razão do aumento constante dos combustíveis) a serviço da remuneração do rentismo. Bolsonaro, sabendo que não pode perder sua base, manipula informações para desviar a indignação dos motoristas e caminhoneiros para os governadores estaduais e para a cobrança de ICMS.

O choque com os governadores é flagrante e uma das marcas da situação política. Existe um descontentamento popular com muitos governadores, como é o caso de João Doria em São Paulo. Bolsonaro sabe disso e busca promover-se. Enfrenta-se, também, com os governadores do DF, de estados do Nordeste e do Rio Grande do Sul – o que levou à ruptura recente de um setor do PTB gaúcho com Roberto Jefferson em solidariedade ao vice-governador Ranulfo.

No entanto, há dificuldades para realizar uma linha mais ofensiva de ação. Com as ruas interditadas pela calamidade do caos da saúde; as condições objetivas de setores da classe extremamente golpeados (pelo desalento, desemprego e, nas camadas populares, pela fome), nota-se a falta de uma oposição mais dura contra o governo. Apesar da agitação sistemática da nossa bancada na Câmara, as grandes centrais sindicais e as lideranças da oposição têm sido incapazes, até aqui, de apontar um caminho distinto e um plano de urgência diante da catástrofe. 

As mudanças no tabuleiro político

O restabelecimento dos direitos políticos de Lula é uma vitória democrática que repara uma manobra jurídica realizada com o intuito de retirá-lo das eleições de 2018. Este processo enviesado, explicitado pelas reportagens da “Vaza Jato”, foi determinante para a vitória de Bolsonaro e distorceu o cenário político brasileiro nos últimos anos. Não sabemos o nível da articulação prévia que resultou na ação do ministro Fachin, mas é certo que não se trata de uma simples decisão monocrática. Foi uma decisão planejada e carregada de intenções políticas.

A declaração da nulidade das condenações de Lula decorre da verificação da incompetência jurídica de Sérgio Moro, que não seria o “juiz natural” desta causa. Alega-se, também, que a decisão de Fachin buscaria evitar a continuidade do julgamento sobre a suspeição de Moro nos casos envolvendo Lula. No entanto, apesar de a transferência dos processos para a Justiça Federal do DF não inocentar Lula nem debater o mérito das provas obtidas pelas investigações da Lava Jato, este movimento colocou Bolsonaro na defensiva, enfraquecendo a extrema-direita e melhorando as condições da resistência ao bolsonarismo.

O retorno de Lula ao cenário eleitoral também muda o debate sobre 2022. Sua volta certamente impõe um segundo turno nas próximas eleições, colocando-o como o candidato mais forte para derrotar Bolsonaro. Ciente disso, Lula postula-se hoje como principal a liderança contra a extrema-direita e, ao mesmo tempo, como a melhor alternativa para a conciliação das relações entre o capital e o trabalho (conforme afirmou em seu último discurso). A combinação entre um simbolismo de esquerda e os acenos concretos à direita – ambos apontando para a construção de uma frente ampla com setores da centro-direita em 2022 – é e será a postura de Lula no próximo período.

A oposição liberal, ou direita não bolsonarista, por sua vez, tem dificuldade de construir um nome do autodeclarado “centro democrático”. Huck ainda não definiu se será candidato e Doria, pela primeira vez, assumiu que não descarta concorrer à reeleição para o governo de São Paulo. Inúmeros analistas sugerem a fraqueza das condições de apresentar um nome desse espaço político, seja pela crise do PSDB e do DEM, seja pela instabilidade do centrão. Rodrigo Maia, nome fundamental da direita não bolsonarista, após a derrota acachapante na eleição para a mesa da Câmara, abandonou o DEM e deve buscar abrigo nas fileiras do MDB.

Lula, conhecedor dessa situação, busca costurar uma estratégia que o leve ao segundo turno como favorito. As mais recentes pesquisas de opinião, inclusive, já lhe colocam em primeiro lugar na disputa contra Bolsonaro. O ex-presidente já deixou claro que vai procurar “ampliar” as alianças, cogitando informalmente nomes como Luiza Trajano, controladora da Magalu. A sinalização dada pela Globo, na edição do Jornal Nacional sobre o discurso de Lula, foi evidente, mostrando que pode haver um caminho para uma nova “concertação”. No dia 16/03, Fernando Henrique Cardoso, em entrevista à Folha, declarou que votaria em Lula num eventual segundo turno contra Bolsonaro.

Ainda mais sugestiva é a leitura do artigo de Delfim Netto na Folha a respeito da volta de Lula à cena. Delfim relembra a política macroeconômica dos dois governos de Lula como uma fórmula extremamente vantajosa ao mercado, que não causou desequilíbrio fiscal. Para o “czar da economia” da ditadura: “Não parece razoável, portanto, supor que Lula seria diferente de si mesmo em uma eventual terceira eleição e que se aproximaria do espectro de uma administração econômica para incorporar suas receitas que não deram certo, ainda que tenha sido de um governo do mesmo partido. Ou, até mesmo, que a menção ao seu nome possa suscitar as mesmas dúvidas e a mesma apreensão no mercado que sua presença na corrida eleitoral de 2002 causava”.

Nossa política e orientação

Diante da catástrofe, urge responder aqui e agora. A necessidade de enfrentar Bolsonaro é imediata. Não podemos esperar 2022. Portanto, o centro de nossa tática e agitação é o enfrentamento ao governo de todas as formas possíveis.

Depois da prisão de ativistas em Brasília em 18/03, nossa resposta foi exemplar: dobramos a aposta e saímos com faixas nas principais cidades do país em solidariedade também a Felipe Neto e a todos que consideram Bolsonaro um genocida. A palavra de ordem “Abaixo Bolsonaro Genocida” unifica e organiza a agitação para o movimento de massas.

Tirar Bolsonaro da presidência é a tarefa prioritária, para a qual deve ser realizado todo tipo de atividade: panelaços, carreatas, colagens, projeções e agitações. Qualquer fórmula é melhor do que o governo da morte do genocida Bolsonaro! É preciso retomar a luta pelo impeachment! Para tanto, defenderemos, como método de ação, a necessidade de construir uma greve geral sanitária para sensibilizar o país e dar corpo à indignação contra Bolsonaro e contra os setores burgueses negacionistas que condenam nosso povo à morte e ao sofrimento.

Além disso, é necessário um plano de emergência que garanta vacinas; auxílio-emergencial de, no mínimo, R$ 600; plano de controle do contágio nas cidades; testagem em massa; política de auxílio/crédito para o pequeno e médio comércio; isenção das contas de luz e água para desempregados; congelamento do preço da gasolina e do gás de cozinha; anistia para as dívidas no SPC e Serasa; reconversão da indústria para a produção imediata de insumos a fim de acelerar o plano nacional de imunização; quebra de patentes das vacinas; além da defesa do SUS.

Nesse cenário, é imprescindível reafirmar a luta contra Bolsonaro e a extrema-direita, ao passo que devemos fortalecer o PSOL, seu programa e perfil como um polo anticapitalista. Ambas as tarefas caminham juntas. Munidos da orientação de combinar a unidade necessária para enfrentar a extrema-direita com a postulação do projeto do PSOL, apresentamos nossa linha política na última reunião do Diretório Nacional do PSOL. Baseamo-nos na necessidade de afirmar o partido e seu programa na contramão de nota publicada pelo jornal O Estado de São Paulo, onde se afirma que o PSOL cogita não ter candidato em 2022.

Temos construído uma intervenção comum com diferentes setores partidários que compartilham a visão de que é fundamental, diante da crise, que o PSOL apresente seu programa e uma saída política para a grave crise brasileira. Tal programa deve ter como eixo uma política real de recuperação das perdas e proteção aos mais pobres; combate ao desemprego; amplo investimento em saúde, educação e infraestrutura; combate sem tréguas ao capital financeiro; auditoria da dívida; taxação das grandes fortunas, heranças, lucros, dividendos e do capital bancário; controle de capitais e do câmbio; respeito às comunidades originárias e ao meio ambiente; entre outras medidas.

Na afirmação desse programa, desse perfil e caracterizando que as sinalizações de Lula indicam para uma fórmula de conciliação de classes, devemos defender uma pré-candidatura própria do PSOL para vocalizar a política de nosso partido. As pesquisas indicam que Lula deverá estar no segundo turno. O ex-presidente tem consolidada sua defesa da colaboração de classes com a burguesia, pretendendo tornar-se mais viável. Ainda que haja muito tempo para o pleito de 2022, o fato é que a eleição em dois turnos oferece a hipótese de uma candidatura programática por fora do social-liberalismo no primeiro turno e uma escolha plebiscitária anti-Bolsonaro no segundo. O PSOL precisa ser parte do debate político e do enfrentamento à crise nacional.

Queremos compartilhar a defesa de um programa e da radicalidade do PSOL, reivindicando sua história de combates e sua trajetória como único partido com representação parlamentar que nunca agiu contra os interesses do povo. A luta sem tréguas em defesa da classe trabalhadora, contra os ataques neoliberais e contra a impunidade de burgueses e políticos corruptos tem sido a marca do PSOL desde sua fundação, na luta contra a reforma da previdência de 2003, até hoje e deve seguir norteando suas ações. Ao mesmo tempo, não vacilaremos em lutar em unidade com todas e todos que defendam uma plataforma mínima de superação da emergência nacional pela Covid-19 e pelo caos bolsonarista. Abaixo Bolsonaro genocida! Impeachment, já! Vacinação em massa para todo o povo brasileiro!


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Pedro Micussi