O tabuleiro eleitoral, a defesa de programas e a candidatura própria do PSOL
Leandro Fontes escreve sobre os impasses no terreno eleitoral e a necessidade da esquerda socialista apresentar um programa anticapitalista nas eleições.
A desidratação de Bolsonaro, exposta pelas pesquisas de opinião, dão o combustível necessário para que frações da burguesia comecem a definir suas peças no tabuleiro eleitoral. Até aqui a tônica estabelecida é o da polarização entre Lula e Bolsonaro, tendo nomes sendo testados para ocupar a vaga ociosa da chamada “terceira via”. Claro, existe o caso de Ciro Gomes, que não é em si um teste. Isso porque Ciro deve concorrer sim ou sim, mesmo tendo sua candidatura esvaziada tanto à esquerda quanto à direita.
Isto ocorre porque Ciro, sem força nas estruturas da classe trabalhadora e sem apoio de grandes capitalistas, propõe um programa “nacional-desenvolvimentista” aliado a frações da burguesia brasileira. Acontece que Lula, sem fazer força, ocupa naturalmente o lugar almejado por Ciro, mesmo que os projetos contenham diferenças, a essência do programa é a mesma.
Todavia, Ciro não perde terreno apenas por conta de Lula. Isso porque, a fração reacionária das elites segue com Bolsonaro e a burguesia liberal não nutre confiança no “coroné” de Sobral. Não é à toa que logo após a derrota de Trump nos EUA, a palavra de ordem nos canais de opinião da burguesia foi: “a procura do Biden brasileiro”. Isto é, um nome liberal, puro-sangue de preferência, que possa canalizar o eleitorado crítico a extrema-direita bolsonarista e, ao mesmo tempo, que seja a negação da esquerda ou centro-esquerda, em especial dos governos sociais-liberais de Lula e Dilma.
De tal maneira, nomes foram sendo testados no decorrer do último ano, desde dissidentes do governo Bolsonaro, como Moro e Mandetta (já descartados), passando pela tentativa de emplacar o nome de Luciano Huck como uma espécie de um novo “outsider” e ainda por figuras como Dória e Eduardo Leite. A rigor, os nomes testados reúnem em seu perfil pontos comuns: não são taxados como representantes da velha política, apoiaram a Lava Jato, votaram em Bolsonaro (pelo menos) no segundo turno, apóiam as pautas privatistas e contam previamente com o endosso do Grupo Globo.
Tudo indica que desse balaio de lebres, como resolução das prévias tucanas, saia o nome de Eduardo Leite como candidato oficial da “terceira via”. Quer dizer, representante da direita liberal que se autodenomina de “centro”. Mas, quem é Eduardo Leite? É um jovem governador do Rio Grande do Sul do PSDB, que iniciou sua carreira política em Pelotas, apoiou Bolsonaro em 2018 e aplicou a reforma da previdência em seu Estado. Porém, Leite, com muitos holofotes midiáticos, se apresenta como um político de roupagem moderna e democrática. Além disso, mostrou coragem – mencionando o nome de Obama – ao assumir sua homossexualidade em rede nacional no programa “Conversa com Bial” da TV Globo. Isto é, Eduardo Leite não passa de uma nova embalagem da velha direita brasileira, neoliberal, entreguista e anti-povo.
De tal maneira, essa “terceira via”, que tem como eixo “nem Bolsonaro, nem Lula” ou como disse a jovem liberal Tabata Amaral no Globo (19/09/2021): “é preciso furar a bolha da esquerda e da direita e chegar ao povo”, será apresentada. Aliás, ao ser perguntada sobre nomes preferenciais para sucessão presidencial, Tabata na generosa entrevista de meia página na edição dominical do jornal da família Marinho, afirmou: “tenho admiração pelos senadores Alessandro Vieira (Cidadania), Simone Tebet (MDB) e pelo governador Eduardo Leite (PSDB)”.
O que isso indica? Indica que essa fração da burguesia, mesmo tendo baixo índice nas pesquisas, terá nome próprio e defenderá seu programa ultraliberal, oferecendo garantias de estabilidade do regime democrático burguês e anunciando apoio superficial aos direitos civis. Essa candidatura terá força suficiente para furar a polarização Lula x Bolsonaro? Provavelmente não. Porém, o patamar de negociação dessa fração da burguesia no segundo turno é outro entre ambos. Além disso, o jogo é jogado. Não está descartada a hipótese de Bolsonaro não ser candidato em 2022.
Diante deste cenário nota-se uma ausência: a esquerda socialista. Isto é, a esquerda que defende claramente um programa de rupturas e anticapitalista. Evidente, numa eleição de dois turnos, tendo como tendência um segundo turno entre Lula e Bolsonaro, com vantagens numéricas para o primeiro, o que em nenhum momento irá ser apresentado para o povo é justamente o programa que inverta as prioridades do Estado, que ataque frontalmente os privilégios dos grandes capitalistas, que defende a taxação das grandes fortunas, a auditoria com suspensão do pagamento da dívida, que faça a reforma agrária, a reforma urbana, que garanta emprego, renda, moradia, privilegiando o serviço público e que coloque o povo mobilizado e em movimento para uma verdadeira refundação da frágil república brasileira. Ora, sem o PSOL concorrendo à disputa presidencial, qual candidato irá pronunciar um programa como esse em nível nacional? Lula, assim como fez os governos de conciliação de classes do PT, constrói a olho nu um arco de alianças com setores burgueses que veda essa possibilidade.
Por essa razão concreta, o 7º Congresso Nacional do PSOL saiu dividido. O campo majoritário não teve aval da base e unidade entre si para bancar apoio ao Lula no primeiro turno. Por isso, a saída mediada foi o adiamento da decisão para uma Conferência Eleitoral em abril de 2022. Entretanto, a proposta de candidatura própria, encabeçada por Glauber Braga, defendida pela oposição de esquerda, teve 44% dos votos dos delegados. Ou seja, o processo está absolutamente aberto e a militância combativa do partido, que está nas ruas para derrubar Bolsonaro, saiu com mais fôlego para virar essa resolução. E irá virar, pois os movimentos de Lula em direção a composição com setores da burguesia são irreversíveis e, no mesmo passo, o PSOL segue sendo um partido vivo, dinâmico e tendo uma ala marxista revolucionária com força e expressão pública.
Portanto, seguiremos em frente, tendo como eixo o Fora Bolsonaro, buscando toda unidade de ação nas ruas para esse objetivo e, ao mesmo tempo, defendendo a necessidade da apresentação de um programa de ruptura e anticapitalista para o povo nas eleições. Essa orientação preserva o PSOL no terreno da independência de classe, mantém o partido como uma alternativa socialista sem máculas no presente e não veda, de modo algum, o voto contra Bolsonaro e a direita liberal no segundo turno das eleições. Por isso, o espaço vago da esquerda socialista no tabuleiro eleitoral só pode ser preenchido pelo PSOL com Glauber presidente.