Basta de violência no campo!

Basta de violência no campo!

A luta da FNL no Pontal do Paranapanema provocou uma escalada de ameaças do latifúndio contra a vida das famílias sem terra.

Nathália Bittencurt 30 mar 2022, 11:02

A região do Pontal do Paranapanema é historicamente reconhecida pela luta pelo direito às terras das enormes fazendas da região. A disputa entre o latifúndio, a grilagem, o Estado e os movimentos campesinos já dura décadas. Com a inércia dos governos e poder judiciário  a reforma agrária necessária permaneceu paralisada. Em 2021, a Frente Nacional de Luta Campo e Cidade provocou novamente a tensão social no oeste paulista, realizando uma série de ocupações em fazendas de Sandovalina, Presidente Bernardes, Euclides da Cunha, Araçatuba, Teodoro Sampaio, Sobradinho e Presidente Prudente, entre outros municípios. Ao todo, a região do Pontal conta com mais de 300 mil hectares de terras reconhecidas como públicas, e portanto, devem ser distribuídas para a reforma agrária. Atualmente a FNL conta com mais de 5 mil famílias acampadas em áreas de terras públicas, resistindo para conquistar seu pedaço de chão para morar e viver da agricultura familiar.

Com o objetivo de destravar o debate público sobre a reforma agrária, apesar de todos os ataques do governo Bolsonaro aos movimentos sociais e seu desmonte das políticas públicas para a preservação ambiental e incentivo de agrotóxicos, a FNL decidiu marchar do oeste paulista até a capital. A tradição das grandes marchas campesinas foi retomada em novembro, reunindo mais de mil trabalhadores percorrendo as rodovias junto a outros movimentos sociais e de juventude. A marcha se fez ouvir, e chegando em São Paulo membros da FNL levaram suas reivindicações e denúncias da repressão que vinham sofrendo à Secretaria de Segurança do estado.

Da perseguição política e jurídica às ameaças de morte

Se a tensão no campo voltou à cena da luta social pelo direito à moradia, a tentativa de criminalização das principais lideranças da FNL também foi intensificada na política e na Justiça. Hoje pelo menos duas lideranças nacionais da Frente são perseguidas por processos ilegais, decorrentes de sua atuação na luta social pela terra: José Rainha e Claudemir Novais. Ambos já foram presos inclusive juntos, em 2011, por consequência de uma operação policial arquitetada para enfraquecer os acampamentos de sem terras em São Paulo.

Agora, em 2022, enquanto os ativistas se defendem judicialmente e seguem militando pela reforma agrária, as ameaças também ganharam novo tom. José Rainha recebeu uma denúncia anônima de que há pessoas contratadas para matá-lo na região onde vive, o Pontal do Paranapanema. Assim como ele, há outros militantes ameaçados no Amapá e no Mato Grosso.

A Frente entende a ameaça de morte à Zé Rainha como parte da postura ofensiva que os latifundiários têm tido nas proximidades dos acampamentos. Em fevereiro, a mobilização do Carnaval Vermelho promoveu 12 novas ocupações, onde quatro delas obtiveram suspensão da ordem de reintegração de posse no Superior Tribunal Federal. Mesmo com a decisão favorável ao movimento, em 21 de março o acampamento da fazenda São Domingos, em Sandovalina, foi ameaçado por homens identificados como policiais, que dispararam tiros para intimidar as famílias acampadas em plena luz do dia. Os supostos policiais se recusaram a apresentar identificação oficial, no entanto deixaram seu recado para as famílias: “Ou vocês saem de um jeito, ou saem de outro”. Os militantes que testemunharam a visita dos policiais tentaram dialogar sobre a decisão judicial que permitia sua presença na região, e após os disparos registraram um boletim de ocorrência em uma delegacia. 

Em Teodoro Sampaio, um dos acampamentos convive com a intimidação de jagunços diariamente nos arredores do local. Os militantes da Frente também relatam tensionamentos em Euclides da Cunha e em Rosana. Em março, a FNL denunciou a escalada de violência para a deputada estadual Mônica Seixas (PSOL), que solicitou uma audiência com a Secretaria de Segurança para expor e investigar as ameaças.

A repressão do estado à serviço do latifúndio

O suposto envolvimento de policiais no disparo de armas de fogo nos acampamentos traz novamente ao debate a relação histórica entre os grandes donos de terra, os grileiros e parte da polícia. Em reportagem publicada hoje na Agência Pública, as conexões pessoais e políticas entre o delegado Nahban Garcia e outros líderes latifundiários mostram como a perseguição aos sem terra é uma prática recorrente há pelo menos três décadas. Outro relato anônimo enviado à FNL, ainda em 2021, denunciou a presença de Nahban Garcia em um encontro informal de fazendeiros e grileiros, onde o delegado foi pressionado a tomar uma atitude definitiva sobre o problema das sucessivas ocupações que vinham sendo construídas por lideranças como Zé Rainha. A resposta teria sido afirmar que só havia uma forma de estancar os acampamentos: “na bala”. A reportagem da Agência Pública também destaca a obsessão de Nahban Garcia com Zé Rainha, perseguindo-o com mandados de prisão preventiva sem fundamentos. Garcia atualmente ocupa o cargo de Secretário Especial de Assuntos Fundiários do governo Bolsonaro.

É urgente parar a violência e investigar todas as ameaças

O agravamento das ameaças de morte, a presença constante de jagunços e homens identificados como policiais nas proximidades das ocupações e o disparo de armas contra as famílias já fazem parte realidade para os acampamentos da FNL. Assim como a perseverança e a resistência são parte fundamental de todos os acampamentos dessas milhares de famílias em busca do direito de morar dignamente. Uma grande campanha de solidariedade e de denúncia para parar violência no campo é urgente, por parte de todos os movimentos sociais, coletivos, sindicatos e partidos progressistas. O estado deve proteção a todas as famílias e lideranças.  A FNL, o Zé Rainha, e os acampamentos de norte a sul não vão parar. 


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