As baixas no PSOL e a necessidade de definição de rumos
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As baixas no PSOL e a necessidade de definição de rumos

Roberto Robaina analisa as causas das recentes rupturas de parlamentares do PSOL.

Roberto Robaina 1 abr 2022, 20:07

Neste 1 de abril, conhecemos a carta da deputada estadual de Minas Gerais Andreia de Jesus, anunciando sua troca de partido, do PSOL para o PT. As brincadeiras sobre o dia dos bobos deveriam fazer o PSOL refletir. A deputada de Minas não é a primeira baixa. Marcelo Freixo foi a mais conhecida. É verdade que Freixo não foi para o PT, mas seguiu a orientação de Lula e ingressou no PSB para ser candidato a governador com o apoio do ex-presidente. No Rio de Janeiro, algumas lideranças intermediárias saíram do PSOL e foram para o PT neste ano, e antes delas, Jean Willys havia feito o mesmo. Depois de renunciar ao mandato, ele resolveu se candidatar novamente, desta vez pelo PT em SP. Douglas Belquior, outra liderança que havia se projetado no PSOL, recentemente seguiu o mesmo rumo. David Miranda foi um ponto fora da curva: seguiu Ciro, não Lula. Revelou igualmente o custo da diluição do partido, da perda de seu perfil e da ausência de um projeto próprio.

A diluição do projeto do PSOL pode ser resumida no “Boa noite, presidente Lula” com o qual Boulos abriu sua participação no primeiro debate presidencial de 2018. Sabe-se que o resultado eleitoral de Boulos foi muito fraco, não tanto pelo baixo número de eleitores, mas porque sua campanha deixou apenas esta marca: ser um defensor ativo de Lula. E sua escolha pós-eleitoral foi redobrar a aposta: Boulos assumiu como projeto individual a postulação de ser herdeiro de Lula. De lá para cá, a força de Lula só cresceu. Com o trauma nacional experimentado com o governo Bolsonaro, uma parcela da burguesia viu em Lula a opção de governabilidade. Setores de massas, sobretudo os mais pobres, com a memória das medidas sociais dos governos petistas, deram a dianteira para o ex-presidente nas pesquisas eleitorais. As classes médias progressistas se entusiasmaram diante das pesquisas e consolidaram o favoritismo do PT. O ódio a Bolsonaro tende a formar uma onda eleitoral pró-Lula entre agosto e setembro de 2022.

Algumas escolhas do próprio Lula e do PT, como Alckmin de vice e a aliança com Geddel Vieira Lima na Bahia, arrefecem o entusiasmo, mas não mudam o quadro geral de apoio dos setores progressistas das classes trabalhadoras e estratos de renda média a Lula, ainda que em alguns casos (Geddel, por exemplo) animam o bolsonarismo.
O fato é que a aposta de Boulos em Lula deu certo. Assim como Lula apareceu como esperança para Boulos, assim ocorreu nos meses seguintes para milhões. O projeto reformista, com traços do nacional desenvolvimentismo e de negociação com o neoliberalismo encarnado por Lula, tem sido o escolhido eleitoralmente pela maioria dos setores mais conscientes da classe. E este projeto está em contradição com o projeto do PSOL, que tem como marca a construção de uma perspectiva anticapitalista. Essa é a marca que vem se diluindo. Boulos encarna essa diluição.

Sua força atual se apoia em dois fatos: o primeiro é que a necessidade de derrotar Bolsonaro exige o apoio eleitoral a Lula num segundo turno. Esta é a opção de milhões e também a posição correta do ponto de vista do marxismo revolucionário. E se o apoio no segundo turno é uma exigência, é lógico que o apoio no primeiro turno pode se enquadrar nos debates táticos e pode ser posto como uma escolha legítima. Assim, o PSOL pode não ter candidato pela primeira vez em sua história. Tal fato não liquida o partido mas pode enfraquecê-lo se não é capaz de apresentar um projeto próprio. É o que vem ocorrendo. A liderança de Lula se afirmando também como opção do PSOL desde o primeiro turno fortalece o que Boulos defende.

O segundo fato foi o resultado eleitoral do PSOL de SP e de Boulos em 2020. O PSOL experimentou pela primeira vez em SP o que ocorreu desde sempre no Rio de Janeiro: a ausência do PT. A fraqueza do PT no Rio, desde 1998, propiciou um enorme espaço para o PSOL ocupar. Individualmente, Freixo foi o que teve maior capacidade de ocupar. Ironicamente, é o próprio Freixo quem parece ter retribuído a gentileza petista e está reabilitando o espaço eleitoral do PT, embora organicamente isso não irá ocorrer. Em SP, nas eleições de 2020, ocorreu algo semelhante. A candidatura de Gilmar Tatto não foi apoiada nem pelos petistas. Fraco, desconhecido das massas, mais parecia um anticandidato. Era fracasso certo. Não havia aparelho capaz de levantá-lo. E assim foi.

Boulos teve capacidade de aproveitar o vazio. Chegou ao segundo turno e viu seu nome fortalecido como expressão de uma nova esquerda com peso de massas. Foi esse capital que colocou a serviço de Lula e de seu projeto, numa simbiose da nova e da velha esquerda, cujo passo seguinte é a tentativa de ser prefeito de SP, desta vez com o apoio direto de Lula. Lula, de cuja Inteligência ninguém dúvida, disse num evento do MTST que em 2024 a tarefa é eleger Boulos prefeito de SP. Música para os ouvidos do líder do MTST. Ocorre que Boulos é hoje também o principal referente do PSOL. E o fato de o partido registrar ainda uma maioria que tem como centro apoiar a liderança de Boulos, acaba tendo como projeto as aspirações de Boulos, limitadas à disputa de poder local sem vínculo com nenhuma estratégia revolucionária, mas, no máximo, com a conformação de uma ala esquerda de uma aliança com o PT. No caso da vitória de Lula e de Haddad, a concretização dessa aliança se dará na participação do PSOL nos governos dirigidos pelos petistas.

E se por acaso a posição marxista prevalecer no PSOL? E se o partido honrar sua história e decidir que não deve participar de um governo de colaboração de classes como será um governo Lula e Haddad, no caso de vitória?. Se decidir fazer como fizeram os revolucionários da III internacional que votavam algumas vezes nos líderes reformistas mas não aceitavam participar de seus governos burgueses, o que farão lideranças como Boulos que estão claramente defendendo uma aliança com o PT que vai além da eleição presidencial e que passa pela prefeitura de SP, o que pressupõe, obviamente, o apoio aos governos petistas eventualmente conquistados neste ano, notadamente em SP e o governo nacional? Só ingênuos não enxergam essa ligação. É evidente que há muitos oportunistas que querem escondê-la. Mas a verdade é essa.

No caso de o PSOL afirmar seu projeto original, a deputada Andréia de Jesus terá novas companhias em sua decisão de trocar o PSOL pelo PT? Seria precipitado fazer este prognóstico de modo definitivo. No caso de Boulos, nem pretendo ser injusto e declarar que Boulos não é fiel ao PSOL. O que digo é que Boulos está defendendo um projeto incompatível com o projeto original do partido. Assim, para se evitar surpresas futuras desagradáveis e para se armar, é bom deixar claro para onde vamos. Por isso, é muito importante que a conferência eleitoral do partido, em 30 de abril, defina a prioridade da luta para derrotar Bolsonaro, mas afirme, desde já, que não participará de governos de composição entre os reformistas e setores da burguesia.


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