Em São Paulo, o coração de uma batalha política fundamental

Em São Paulo, o coração de uma batalha política fundamental

Uma candidatura própria do PSOL, encabeçada por Mariana Conti, será um passo importante para garantir a independência política do partido.

Israel Dutra e Thiago Aguiar 22 abr 2022, 19:26

O cenário eleitoral começa a dominar o conjunto da situação política: Bolsonaro celebra uma relativa recuperação nas pesquisas, Lula oficializa a aliança com Geraldo Alckmin e a terceira via anda em círculos. Ao mesmo tempo, a situação do povo se agrava. Na cidade de São Paulo, a população de rua cresceu 31% nos últimos dois anos, uma explosão sem precedentes. A inflação corrói os salários, alcançando o índice mais alto em 28 anos, ou seja, desde que foi lançado o Plano Real.

Nesse contexto, a disputa paulista ocupa um lugar decisivo na conjuntura nacional. Em São Paulo, as três principais forças que disputam a hegemonia eleitoral – lulismo, bolsonarismo e “centro democrático” – concentram seus quartéis-generais e seus principais articuladores. Para o PSOL, a discussão paulista também é emblemática. No plano nacional, a maior parte das correntes com voto no Diretório Nacional já indica apoio a Lula na Conferência Nacional de 30 de abril, o que deve consolidar uma tendência de não ter candidatura própria, para a qual apresentamos durante o último período o nome de Glauber Braga. No entanto, há uma diferença entre a disputa nacional e o cenário paulista: se, no primeiro, existe uma corrente objetiva e democrática que se manifesta pela derrota de Bolsonaro no terreno eleitoral – já que no terreno das lutas, com suporte das direções, o processo foi desviado para as eleições –, em São Paulo, uma aliança mais orgânica entre PT e PSOL pode levar a uma perigosa fronteira que diluiria o partido no interior do aparelho de estado, com a busca de Boulos de costurar apoios para seu projeto pessoal de disputar a prefeitura em 2024. Por isso, uma candidatura própria do PSOL cumprirá um papel central na batalha de São Paulo.

O “tucanistão” em crise existencial

A crise da Nova República atingiu em cheio um dos principais pilares de sua sustentação: o PSDB. Se o PT conseguiu se recuperar da crise, ao redor da figura de Lula, o PSDB não teve a mesma sorte, vivendo derrota atrás de derrota. O PSDB é uma expressão orgânica de importantes frações da burguesia paulista, um projeto que uniu essas frações com intelectuais oriundos da USP.

Nos últimos anos, tem-se assistido o naufrágio do partido dos tucanos. Após uma dura disputa interna nas prévias do final do ano passado, João Doria não conseguiu se consolidar como candidato e parece ser apenas uma questão de tempo o anúncio de sua retirada. Os partidos que se proclamam a “terceira via” na eleição de 2022 (União Brasil, PSDB, MDB e Cidadania) anunciaram que 18 de maio é a data-limite para a indicação de um candidato único à presidência. Sergio Moro, por sua vez, foi outra baixa da corrida presidencial, tendo deixado o Podemos após sucessivas crises, como a que levou Arthur do Val a renunciar à disputa ao governo de São Paulo e a seu mandato de deputado estadual. O ex-juiz abandonou a disputa e se filiou ao União Brasil, com a possibilidade de tentar uma vaga como deputado federal por São Paulo.

O derretimento tucano coloca em xeque seu principal reduto e vinte anos de hegemonia, marcados pela defesa dos privilégios dos mais ricos, pelo privatismo e pelo enfrentamento às mobilizações, de que são exemplos a repressão à ocupação Pinheirinho e a demissão de dezenas de grevistas do metrô na greve de 2014. A perda de protagonismo na disputa presidencial é parte da decadência do partido: parece provável uma derrota tucana em São Paulo e a emergência de uma nova configuração eleitoral e política no estado. As pesquisas indicam dois nomes da oposição à frente: Fernando Haddad (PT) e Marcio França (PSB). O candidato bolsonarista ainda pouco conhecido, Tarcísio Freitas, cresce e já chega a 10% nas pesquisas eleitorais. O candidato tucano Rodrigo Garcia, vice-governador de Doria e atual governador, oscila entre magros 4 e 6% nos diferentes cenários.

No coração da concertação nacional

O acordo entre Alckmin e Lula mostra como as negociações em São Paulo definem a concertação nacional ao redor do candidato do PT. A troca de comando na FIESP, com a posse de Josué Gomes Alencar, e as sinalizações à Faria Lima, com os jantares entre representantes do rentismo, a presidente do PT Gleisi Hoffmann e o banqueiro Gabriel Galílpolo, indicado como interlocutor da candidatura lulista, apontam o conteúdo do acordo em curso. Lula caminha ainda mais à direita, enquanto aumenta a pressão sobre a comunicação de sua campanha e suas declarações públicas. Não por acaso, Gleisi afirmou recentemente que o candidato petista não pretende modificar a composição da diretoria do Banco Central.

Em São Paulo, o “custo” da estratégia de concertação nacional é que a campanha de Haddad, tendo Alckmin como cabo eleitoral, evitará a crítica e o balanço dos últimos vinte anos de gestão tucana. A unidade para governar com o PSDB não é um fato novo ou isolado. Há uma onda de greves de servidores municipais em várias cidades paulistas. Em Araraquara, o prefeito Edinho Silva (PT) adota postura antissindical contra os servidores municipais para justificar seu ajuste e o arrocho salarial sobre a categoria. Sem denunciar o tucanato, além disso, não há como ser consequente no apoio às ocupações de terra, retomadas pela FNL no Pontal do Paranapanema e tão reprimidas pelos governos do PSDB. Sem candidato nacional, como defende a direção majoritária do partido, o PSOL tem a obrigação de se apresentar nas principais disputas estaduais do país: São Paulo tem um lugar estratégico na batalha geral.

Mariana Conti, uma candidatura a serviço da independência política do PSOL

O PSOL votou em seu congresso estadual no ano passado, de forma unânime, a candidatura própria a governador, encabeçada por Guilherme Boulos. Organizou-se a pré-campanha, com atividades pelo interior, e Boulos chegou a alcançar o terceiro lugar nas pesquisas. Há algumas semanas, Boulos anunciou que sua retirada da disputa do governo, lançando-se candidato a deputado federal, como parte de seu projeto de disputa da prefeitura da capital em 2024. Prontamente, como resposta, inúmeros coletivos, correntes e ativistas lançaram como pré-candidata Mariana Conti para seguir fazendo a disputa estadual.

Socióloga, servidora pública, lutadora sindical e vereadora mais votada de Campinas, em seu segundo mandato, Mariana é uma construtora do PSOL há muitos, um quadro de referência do partido em todo o estado. Como afirma seu manifesto de lançamento, a pré-candidatura de Mariana Conti pretende unir as lutas contra Bolsonaro e o tucanistão, está em defesa dos direitos dos trabalhadores, da taxação dos milionários, dos recursos para a educação, as universidades e a saúde, e luta contra as privatizações. Esse é o perfil do PSOL de que precisamos! O partido definirá sua tática eleitoral nacional em 30 de abril, mas, em São Paulo, ainda não se sabe como será o processo de escolha da candidatura ao governo estadual. A militância partidária precisa decidir!

Com a palavra, as correntes militantes do PSOL

Sabemos que o PSOL está dividido. O resultado do último congresso nacional mostrou que 44% do partido defenderam candidatura própria presidencial. Na disputa de São Paulo, houve unanimidade na defesa da candidatura própria no congresso e o cenário está muito mais aberto. Na conferência nacional, o Bloco de Esquerda votará junto com o campo Semente (Resistência, Subverta e Insurgência) pelo não ingresso do PSOL num eventual governo Lula. Essa mesma aliança interna pode garantir que nosso partido tenha uma candidatura para lutar contra o tucanistão no primeiro turno. O segundo turno é outro processo e o partido não terá dúvidas de se posicionar contra os representantes do bolsonarismo ou dos tucanos em crise. Um nome do PSOL na disputa pelo governo contribuirá, além disso, para a eleição de uma forte bancada para a Câmara e para a ALESP.

Uma candidatura própria do PSOL, encabeçada por Mariana Conti, será um passo importante para garantir a independência política do partido, articulada com duas outras tarefas necessárias: derrotar Bolsonaro nas ruas e nas urnas; e apoiar as greves, lutas pela terra e todos os processos que defendem direitos para a maioria do povo. A batalha de São Paulo não é apenas decisiva para a situação política nacional, como é fundamental para que o PSOL possa preservar seu espaço, identidade e perfil programático, cada vez mais necessários para as lutas presentes e que se avizinham.


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