O novo governo de Chavez: alguns elementos para uma caracterização
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O novo governo de Chavez: alguns elementos para uma caracterização

Declaração do Movimento dos Trabalhadores e Camponeses da Costa Rica sobre o novo governo do país.

MTC Costa Rica 12 jun 2022, 10:23

Comitê Executivo – Movimento dos Trabalhadores e Camponeses (MTC)
Junho 2022

Em 8 de maio, um novo governo chefiado por Rodrigo Chaves, do Partido do Progresso Social Democrático, tomou posse na Costa Rica.

É muito importante que o MTC tenha uma boa caracterização deste governo a fim de propor políticas que ajudem a alcançar as demandas populares e assim ajudar a recuperar a confiança popular em suas próprias capacidades de luta.

Contexto

  1. A erosão do PAC. Como é sabido, o PAC foi apagado do mapa político nas últimas eleições de 6 de fevereiro (embora não se possa descartar que volte a se recompor). Algumas das razões para a erosão do PAC são as seguintes: a aplicação do chamado combo fiscal, que levou ao desenvolvimento de uma das lutas mais poderosas da história da Costa Rica, as lutas contra o combo, com uma greve de quase três meses no setor magisterial. A pandemia de Covid é outro fator, pois algumas políticas de saúde foram positivas, mas ao mesmo tempo afetaram muito a atividade econômica, provocando desemprego e subemprego. As lutas lideradas pelo Resgate Nacional em outubro de 2021 foram o ponto alto deste descontentamento. O movimento de Resgate Nacional em sua base de apoio social era muito complexo e obscuro: havia forças muito claras como a ANEP e o MTC, por um lado. Houve também muito descontentamento por parte do setor empresarial, principalmente das pequenas empresas que não conseguiram se virtualizarem. Havia outros setores com uma composição mais complexa, como alguns na zona sul, que são anti-indígenas, e até se falava de setores ligados ao tráfico de drogas. A caracterização deste tipo de movimento é extremamente importante, pois poderia ser que no futuro este tipo de movimento complexo pudesse surgir novamente.
  2. A erosão dos partidos políticos tradicionais. Estamos em um momento histórico de crescente desilusão com a política. Isto tem um grande impacto sobre a capacidade de mobilização dos partidos políticos. Praticamente toda a culpa pela situação atual é atribuída aos políticos. O Partido Libertação Nacional, que desde sua vitória na guerra civil de 1948 é o partido com maior “organicidade” (capacidade organizativa), também sofre de desencanto com a política, além do fato de ter como candidato José María Figueres Olsen, personagem que reflete muito bem uma política neoliberal associada à corrupção. Quem ficou em segundo lugar no primeiro turno teve uma boa chance de disputar a presidência devido à má imagem de seu candidato.
  3. Para não esquecer a questão da abstenção. Outro aspecto que deve ser levado em conta para compreender a situação política do país é o abstencionismo. No segundo turno, o abstencionismo atingiu 42,67%, um dos mais altos da história recente. Esta porcentagem aumenta nas províncias costeiras: Guanacaste 50,27%, Puntarenas 52,67% e Limón 53,34% Estas províncias, além de terem dado a vitória a Rodrigo Chaves, são comprovadamente as províncias mais abstencionistas. Como é sabido, as desigualdades sociais são maiores nestas províncias costeiras, e são também as províncias mais negligenciadas pelas instituições, pois devido à questão do “vallecentralismo”, a ação institucional está concentrada no vale central. O abstencionismo é um fenômeno que corrói a credibilidade da ordem “democrática” e da administração estatal. É um terreno fértil para a instabilidade social, pois funciona como descontentamento e descrença em relação à ordem social dominante.

O novo governo

4. O inesperado triunfo do PPSD. Como é sabido, vários candidatos concorreram para desafiar José María Figueres para a cadeira presidencial: Lineth Saborío, Eli Feinzaig, Rodrigo Chaves, e até José María Villalta teve uma chance. Mas a maioria dos eleitores finalmente optou por Rodrigo Chaves. A este respeito, é muito importante notar que a votação nas províncias costeiras de Puntarenas, Limón e Guanacaste foi decisiva para a vitória do PPSD. Vários fatores o ajudaram a alcançar esta vitória: um programa difuso, o discurso anti funcionários públicos, e também a questão das pensões de luxo, que ele utilizou muito bem. Em resumo, Rodrigo Chaves foi visto como o candidato que poderia fazer a ruptura mais frontal tanto com o PAC quanto com o PLN, ou seja, romper com o passado político da Costa Rica e, as pessoas possivelmente pensavam, resolver problemas-chave como a crise econômica, a corrupção e a paralisia institucional.

5. Aspectos para caracterizar um governo. Algumas das variáveis ou dimensões que podem ser consideradas para caracterizar as ações de um governo são: política econômica, política social e a forma de governar (estilo de gestão política). Embora o novo governo só esteja no poder há cerca de 22 dias no momento em que se escreve este texto, já existem alguns elementos que podem ser levados em conta. Analisaremos brevemente as políticas do governo de Rodrigo Chaves, de acordo com as dimensões descritas acima.

6. Política econômica. É claramente um governo de continuidade neoliberal, como todos os governos costarriquenhos têm sido por quase 40 anos. É até mesmo um governo de continuidade do PAC. Os pilares da política econômica continuam a ser o comércio e o investimento estrangeiro, em particular a promoção do investimento estrangeiro direto. No Fórum Econômico Mundial, realizado em Davos de 23 a 26 de maio, o Presidente Chaves, reunido com representantes de grandes empresas, disse: “Na Costa Rica não há obstáculos, apenas tapetes vermelhos”. A outra questão à qual Chaves está dando especial importância e que é a continuidade do PAC e a continuidade neoliberal é o equilíbrio fiscal, que está diretamente relacionado com os acordos com o Fundo Monetário Internacional (FMI). A austeridade fiscal tem muitos aspectos: lei do trabalho público, regra fiscal, cortes no orçamento para gastos sociais, etc. Nos últimos dias, surgiu um aspecto particularmente tenso, a saber, os preços dos combustíveis. Até agora Chaves tem se oposto à redução do imposto sobre combustíveis. Ele provavelmente quer empurrar a tensão ao máximo a fim de pressionar para uma privatização total ou parcial da RECOPE. Outra questão-chave é a política de empréstimos externos e internos para financiar os gastos públicos. É provável que as questões econômicas continuem a ser uma importante fonte de tensão. Como é sabido, a economia internacional está em uma situação muito crítica, primeiro como resultado da pandemia de Covid e, mais recentemente, da invasão russa da Ucrânia. Algumas análises apontam para uma possível recessão internacional. Por enquanto, os problemas inflacionários, a desvalorização acelerada do colón e os altos preços do petróleo são óbvios. Os setores mais pobres da sociedade estão sofrendo e sofrerão ainda mais.

7. Política social. A política social não é clara. No momento, o que se vê é continuidade no PAC, ou seja, cortes nos gastos sociais a fim de alcançar o objetivo principal de equilíbrio fiscal, de acordo com o acordo com o FMI. Na política de cortes, como sabemos por nossa própria experiência, o setor de habitação social é um dos mais afetados. Outro ponto importante a este respeito é o corte de 148 bilhões nos fundos do FODESAC, devido ao cancelamento de dívidas a empregadores inadimplentes. De acordo com a Semanario Universidad, este montante é equivalente ao custo de 22.000 casas Banhvi .

8. Gestão política. O estilo de governo exercido por Rodrigo Chaves é marcadamente presidencialista e personalista. No mesmo dia em que tomou posse, 8 de maio, ele anunciou o fim da obrigatoriedade da vacina Covid e do uso de máscaras, o que não era de sua responsabilidade, pois a Comissão Nacional de Vacinação e Epidemiologia é responsável por decidir sobre estes assuntos. Uma grande parte da população e da imprensa rejeitaram a ideia do presidente, de modo que dentro de uma semana ele estava recuando. Mas ele está de volta ao ataque, pedindo uma justificativa científica para os testes obrigatórios. Mais ou menos no mesmo estilo que ele atuou em questões como nas “provas Faro”. Há muita distância política, em termos de autoridade, entre seu gabinete e o presidente, o que contribui para que as decisões recaiam sobre o próprio Rodrigo Chaves. Mas não se pode dizer que o governo de Chaves seja uma ditadura, pois para que isso aconteça teria que haver uma mudança de regime político, o que ainda não aconteceu, mas existem tendências autoritárias e militaristas. O estilo personalista pode levar a erros graves. Há sinais disso nas primeiras semanas no cargo. Isto não quer dizer que o governo já esteja em crise, pois, como revela uma pesquisa IDESPO da UNA, Rodrigo Chaves começou com uma taxa de aprovação de 67,6%. https://www.elmundo.cr/costa-rica/rodrigo-chaves-arranca-con-una-aprobacion-del-676/. Há até mesmo setores muito populares que apoiam quase fanaticamente o novo governo.

9. Outros problemas emergentes. Há outros problemas que o novo governo de Rodrigo Chaves teve que enfrentar. A este respeito, gostaríamos de destacar os ciberataques. Este é um problema tremendo que tem afetado os programas de computador de 27 instituições públicas. A isto se soma o recente ataque sofrido pelo CCSS que, no momento em que este texto foi escrito, afetou várias plataformas, afetando seriamente os pacientes. Entre os graves efeitos dos ciberataques estão: problemas de pagamento nas folhas de pagamento do setor público, sistemas fiscais e muitos serviços. Na terça-feira, 17 de maio, houve uma mobilização independente das lideranças sindicais dos professores exigindo ao MEP que pagasse os salários devidos, o que levou o próprio presidente a ordenar o pagamento desses salários. Caso contrário, não se sabe quando eles seriam pagos. Mas, segundo as redes sociais, o problema não foi completamente resolvido. O governo criou uma comissão liderada pelo próprio presidente, mas as políticas para lidar com tal situação não são claras.

Situação das lutas sociais e populares

10. Fraqueza das lutas. Após as lutas de outubro de 2020 lideradas pelo Resgate Nacional, a intensidade e a generalização das lutas e resistências populares caíram significativamente. O ano de 2021 foi pré-eleitoral. E no início de 2022, as eleições foram realizadas. As primeiras semanas do governo Chávez foram cheias de expectativas e de apoio importante, especialmente dos setores que votaram por ele. No momento, ainda há muito apoio para o governo. As lutas que aconteceram são setoriais ou específicas. A este respeito, pode-se destacar a própria luta por moradia, onde o Bloco de Moradia e o MTC têm sido muito proeminentes. Isto deve ser parabenizado e aplaudido porque mostra que é possível lutar contra as injustiças do capitalismo e da ordem neoliberal. Outro foco de luta muito importante tem sido a recuperação de territórios indígenas. Nos últimos meses, esta luta tem sido direcionada para defender as terras recuperadas, já que setores não indígenas e proprietários de terras têm procurado usurpar territórios indígenas mais uma vez. Outra luta específica que deve ser destacada foi a de alguns setores da hierarquia e líderes intermediários do sindicato dos professores, que muito oportunamente saíram exigindo o pagamento imediato dos salários devidos.

Algumas das políticas do MTC para o presente momento

11. A luta pela moradia. A grande luta e prioridade do MTC é a luta pela moradia através do Bloco de Moradia. Este é um trabalho que o MTC, através de OB e outros líderes muito proeminentes, tem desenvolvido de forma constante e árdua. Há inúmeras reuniões, assembleias, pressão legislativa e político, marchas, etc. que o Bloco tem realizado. O Bloco é a principal organização nacional no campo da luta pela moradia. A questão da moradia é muito importante porque é um reflexo rude do fato de que as pessoas mais pobres não têm direito à moradia, faz parte das condições de vida de grandes setores da classe trabalhadora costarriquenha e, portanto, é uma manifestação palpável da exploração capitalista. Os cortes no orçamento do BANHVI são parte dos cortes nos orçamentos sociais do Estado; portanto, uma política claramente neoliberal. Recentemente o MTC-Bloco vem desenvolvendo uma importante iniciativa na província de Limón, que consiste em formar uma aliança com outras organizações sociais da província. Uma primeira demonstração acontecerá em 11 de junho. Além da questão habitacional, eles acrescentaram outras questões candentes na província, como o destino dos fundos canônicos JAPDEVA e o estado da Rota 32. Isto pode constituir um salto na força e nas possibilidades do MTC-Bloco. Não há dúvida de que esta é a principal prioridade de trabalho do MTC.

12. Apoio e solidariedade com outras lutas sociais e populares. Como atualmente não há grandes eixos nacionais de luta à vista, a política do MTC seria apoiar cada uma das lutas que estão surgindo, mesmo que elas sejam fragmentadas ou isoladas. Algumas lutas são: a defesa dos territórios e da cultura indígenas, as lutas das mulheres contra os femicídios, a violência patriarcal e pelos direitos sociais das mulheres, como moradia, emprego, etc. Em alguns territórios, as lutas ambientais também são muito significativas.

13. A questão do emprego. Embora a questão do emprego tenha sido o principal foco das eleições passadas, particularmente para o PLN e o próprio PPSD, pouco se vê a este respeito. De acordo com a Pesquisa de Emprego Contínuo do INEC para o primeiro trimestre de 2022, o desemprego se situa em 13,6% da força de trabalho. O desemprego é mais alto entre as mulheres, com 17,5 por cento. “No caso dos homens, 68,4% dos desempregados estão concentrados nas faixas etárias de 15 a 24 anos (63 mil pessoas) e 25 a 34 anos (44 mil pessoas), e no caso das mulheres, 56,9% estão concentrados nas faixas etárias de 15 a 24 anos (53 mil pessoas) e 25 a 34 anos (46 mil pessoas)”. https://www.inec.cr/sites/default/files/documetos-biblioteca-virtual/ece_i_t_2022.pdf

A isto deve ser adicionado o subemprego, atingindo 11,5% da força de trabalho (população empregada). Entre as mulheres, o subemprego é de 15,4%. O desemprego e o subemprego estão, portanto, afetando cerca de um quarto da população empregada. No caso das mulheres, seria cerca de um terço. A única pergunta a ser feita aqui é: Qual deveria ser a política do MTC para combater o desemprego e o subemprego?


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Pedro Micussi