O PSOL deve ser contrário ao novo “arcabouço fiscal”
Foto: Ricardo Stucker/PR

O PSOL deve ser contrário ao novo “arcabouço fiscal”

O PSOL deve votar contra o arcabouço fiscal e combater publicamente a proposta enviada por Lula e Haddad.

Israel Dutra e Thiago Aguiar 22 abr 2023, 18:40

Na última terça-feira (18), foi levado à Câmara, por Lula e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, a proposta do governo de um novo “arcabouço fiscal”. A proposta confirma os anúncios anteriores: um projeto inclinado ao mercado, que limita pesadamente o investimento público, garantindo a continuidade do que chamamos de “ajuste fiscal”.

A Direção Nacional do PSOL reuniu-se no final de semana (15 e 16) para debater, entre outros temas, a proposta de nova regra fiscal. Na oportunidade, sugerimos uma resolução que definisse a posição partidária à luz do caráter neoliberal do arcabouço. Após a discussão, no entanto, aprovou-se uma resolução genérica que remete à bancada a discussão da tática parlamentar relativa ao mérito do arcabouço. Por sua vez, a bancada realizou um seminário com diversos economistas, na quinta-feira (20), ainda sem indicar uma definição sobre voto, mas com um diagnóstico bastante crítico da proposta do governo. Acreditamos que o PSOL deve votar contra o arcabouço fiscal e combater publicamente a proposta enviada por Lula e Haddad.

A natureza do arcabouço fiscal

Como já tratamos em outros textos – por exemplo, na declaração do MES sobre os cem dias de governo Lula –, a regra fiscal limita os gastos públicos a 70% do crescimento da receita, com um teto de 2,5% e um piso de 0,6%, para garantir o superavit primário. Ou seja, restringir o gasto público para seguir o pagamento da dívida. Esse é o problema fundamental, apesar de não ser o único.

Num país onde a educação está seriamente precarizada, onde os hospitais caem aos pedaços, onde os servidores públicos são arrochados, onde pobreza cresceu nos últimos anos, a indicação da prioridade do ajuste sobre os investimentos públicos vai gerar frustração e maiores conflitos. Um prato cheio para extrema-direita angariar bases populares e disputar o descontentamento de setores de massas.

Haddad, com bem reforçou Rogério Ceron, seu secretário de Tesouro, está afiançando um pacto global com a burguesia e com os mercados, tendo como consequência a diminuição dos gastos públicos. Parece-se uma espécie de repetição do pacto de “Fausto”, de Goethe, quando o personagem principal assina um contrato com o diabo, sob a promessa fugaz de uma eterna juventude. Ficamos com a análise certeira de David Decacche, principal assessor econômico da bancada do PSOL:

“Três pontos críticos do arcabouço fiscal e uma ingrata surpresa.

1) O novo teto de gastos – dados os atuais parâmetros – impõe, matematicamente, a necessidade de uma PEC com a alteração dos atuais pisos da saúde e educação, visando reduzir o crescimento dessas despesas para próximo da velocidade máxima do teto. Isso porque o teto cresce na velocidade de 70% da receita (ainda limitado a 2,5% de ganho real) e saúde e educação crescem com base em 100% da receita. A saúde e educação passarão a ocupar crescentemente o espaço das áreas que não têm piso. Cogita-se a adoção de uma correção pelo PIB per capita, que se aplicada desde 1998 teria feito o Brasil perder quase 40% de todos os gastos que realizou (o PIB per capita foi uma possibilidade de indexador divulgada pelo secretário do Tesouro)

2) A mesma lógica da saúde e educação se aplica ao crescimento do salário mínimo, que tende a ser restringido para uma velocidade de ganho real próxima de 70% do crescimento das receitas. A bandeira do governo Lula é garantir ganhos reais maiores, atrelados ao crescimento do PIB.

3) As bandas de 0,6% e 2,5% de crescimento real são comparáveis ao que aconteceu no governo Bolsonaro, que furava o teto do Temer. Em 2019, Bolsonaro cresceu 2,72%.

Importante lembrar que Lula fez uma expansão real de quase 10% em 2009 para sair da crise financeira. Se a regra do Haddad estivesse valendo seria garantido apenas 0,6%. Seria o fim do governo.

4) Uma ingrata surpresa: BNDES e CAIXA dentro do teto.”

Uma armadilha para esquerda

O debate na reunião do Diretório Nacional do PSOL foi interessante, revelando uma maioria dos presentes contrários no mérito à proposta do arcabouço, ainda que alguns dirigentes tenham-na defendido de forma tímida, deixando em aberto a tática parlamentar. Já no seminário da bancada do PSOL, a posição contra o arcabouço foi melhorada e definida de forma mais nítida:

“É preciso desmascarar o discurso da ‘crise orçamentária permanente’ que há anos os neoliberais utilizam para justificar suas tentativas de controlar o destino do fundo público brasileiro. É curioso que nenhum dos defensores da austeridade fiscal nas contas públicas defenda um teto ou limite para os serviços da dívida.

Da forma como foi apresentada, a proposta de novo marco fiscal cria, portanto, uma amarra para o sucesso econômico e social do governo Lula”

(Nota da federação REDE- PSOL).

Não se trata de uma questão menor. A definição sobre o arcabouço é um divisor de águas e sinaliza para ampla vanguarda do ativismo quais as coordenadas fundamentais da luta política no presente período. É necessário construir uma dinâmica de uma política unitária entre os que rejeitam o ajuste, conectando com outras pautas e bandeiras centrais, como a luta contra pela revogação do novo ensino médio. No dia 26/4, há uma nova jornada convocada pelas entidades de educação, onde essa ponte deve ser construída.

Vale repetir que 80% dos brasileiros estão a favor da diminuição dos juros e que estamos diante de uma nova crise econômica internacional, com a Argentina como ponta de lança. É preciso dar um passo adiante na politização do ativismo e dos movimentos sociais.

O PSOL deve votar contra!

A votação no arcabouço será definidora da dinâmica dos próximos meses. A bancada do PSOL deve votar contra, mantida a natureza do projeto. Isso significa construir um polo crítico na sociedade, que não se furte em fazer as necessárias alianças e unidades para enfrentar a extrema-direita, inclusive no terreno eleitoral, mas que mantenha a independência e a liberdade de crítica diante do governo federal.

A luta contra a desbolsonarização passa por seguir acompanhando os desdobramentos dos atos golpistas de 8 de janeiro, como a demissão do ministro Gonçalves Dias e de membros colaboracionistas do GSI; a CPI para criminalizar os golpistas (à semelhança do que está sendo feito no DF, onde nosso deputado Fábio Felix tem se destacado no enfrentamento aos bolsonaristas); e a luta contra as ameaças às escolas pelo terrorismo dos neofascistas.

Por último, consideramos fundamental que a militância do PSOL possa participar do debate sobre o arcabouço fiscal e a posição do partido a respeito, organizando um seminário aberto e on-line de economia. A partir de uma formulação sólida a respeito dos rumos da economia e do Brasil, nosso partido poderá fortalecer sua intervenção, votando contra o arcabouço fiscal, o novo teto de gastos proposto pelo governo.


TV Movimento

Roberto Robaina entrevista Flávio Tavares sobre os 60 anos do golpe de 1º de abril

Entrevista de Roberto Robaina com o jornalista Flávio Tavares, preso e torturado pela ditadura militar brasileira, para a edição mensal da Revista Movimento

PL do UBER: regulamenta ou destrói os direitos trabalhistas?

DEBATE | O governo Lula apresentou uma proposta de regulamentação do trabalho de motorista de aplicativo que apresenta grandes retrocessos trabalhistas. Para aprofundar o debate, convidamos o Profº Ricardo Antunes, o Profº Souto Maior e as vereadoras do PSOL, Luana Alves e Mariana Conti

O PL da Uber é um ataque contra os trabalhadores!

O projeto de lei (PL) da Uber proposto pelo governo foi feito pelas empresas e não atende aos interesses dos trabalhadores de aplicativos. Contra os interesses das grandes plataformas, defendemos mais direitos e melhores salários!
Editorial
Israel Dutra e Roberto Robaina | 28 abr 2024

Educação: fazer um, dois, três tsunamis

As lutas da educação nos Estados Unidos e na Argentina são exemplares para o enfrentamento internacional contra a extrema direita no Brasil e no mundo
Educação: fazer um, dois, três tsunamis
Edição Mensal
Capa da última edição da Revista Movimento
Revista Movimento nº 48
Edição de março traz conteúdo inédito para marcar a memória da luta contra a repressão
Ler mais

Podcast Em Movimento

Colunistas

Ver todos

Parlamentares do Movimento Esquerda Socialista (PSOL)

Ver todos

Podcast Em Movimento

Capa da última edição da Revista Movimento
Edição de março traz conteúdo inédito para marcar a memória da luta contra a repressão