De onde deveria vir pressão, vem silêncio
Conselhos de Ética da Câmara e do Senado acumulam 19 ações questionando decoro de parlamentares, mas não se reunem para avaliá-las
Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil
Na última quinta-feira (11), o deputado federal e ex-secretário especial de Cultura Mario Frias (PL-SP) foi filmado agredindo verbalmente o jornalista Guga Noblat na audiência na Comissão de Comunicação da Câmara dos Deputados. Irritado, Frias arranca o celular da mão de Noblat.
Nas redes sociais, Noblat disse que começou a filmar o deputado após ser xingado de anão. Frias calou. Independentemente disso, o destempero do parlamentar deveria pautar a reunião do Conselho de Ética da Câmara dos Deputados. Sim, esse colegiado ainda existe – mas parece ser ignorado pelos parlamentares Seguidamente, o plenário é palco de bate-bocas e discursos ofensivos atos que poderiam ser enquadrados como quebra de decoro parlamentar, mas que seguem impunes.
A inação do presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), diante desses episódios também fica evidente, e Noblat aproveitou o episódio da agressão para colocá-la na vitrine
“Sabemos que, na legislatura passada, ele fez de tudo para blindar os bolsonaristas e o próprio Bolsonaro. Ele fez esse trabalho e está junto com essas pessoas. Lira só deu um sermãozinho virtual em Nikolas Ferreira e nada mais. Com Lira à frente da Câmara, não dá para acreditarmos que eles serão punidos ou, de fato, terão que mudar de postura”, disse Noblat ao UOL News, referindo-se ao pastiche homeofóbico do bolsonarista mineiro, que vestiu peruca para zombar da transsexualiadade na tribuna da Câmara, no Dia da Mulher.
Dada a acusação, Lira passou a dizer que orientará o Conselho de Ética da Câmara a aplicar punições mais severas a casos de quebra de decoro, como suspensões com corte de salários. Primeiro terá de convencer o colegiado a se reunir. Desde a posse, há um mês, em 18 de abril, o conselho – formado apenas por deputados do Centrão – reuniu-se apenas uma vez, para eleição da mesa. Em 21 anos, ele aprovou apenas três suspensões: duas de Daniel Silveira e uma de Boca Aberta. Perdas de mandato são levadas para votação em plenário.
O Congresso Nacional está pleno de parlamentares de extrema direita, cujo modus operandi consiste em constranger, humilhar, agredir e ameaçar adversários. Eles faziam isso em suas redes sociais e conquistaram adoradores em seus domicílios eleitorais e até fora. Não por acaso, querem fazer da sede do Legislativo federal picadeiros de seu circo digital. Ocorre que a Câmara e o Senado têm regras e devem fazer cumpri-las para exigir um mínimo de decência no comportamento dos parlamentares.
Na semana passada, o deputado Coronel Chrisóstomo de Moura (PL-RO) bradou “tu não tá em Cuba, não, ô sobrepeso”, para criticar a defesa feita pelo ministro da Justiça, Flávio Dino, à PL das Fake News. Em dado momento, chamou o magistrado para “a porrada”.
Ações como essas deveriam ser rapidamente apontadas e punidas. Porém, os conselhos de Ética da Câmara e do Senado têm 19 casos protocolados à espera de análise e não parecem ter pressa em avaliá-los. Aplicadas, as pedagógicas punições poderiam não apenas coibir essas ações, mas alertar as mentes embotadas sobre o que é inaceitável na prática parlamentar. Porém, de onde deveria vir pressão, vem silêncio.