Enfermagem gaúcha em luta pelo piso salarial
Greve pelo Piso da enfermagem no Rio Grande do Sul

Enfermagem gaúcha em luta pelo piso salarial

Categoria da saúde luta por valorização e melhores condições de trabalho

Júlio Câmara 3 jul 2023, 10:41

Mobilização intensa pela adesão à greve

A enfermagem gaúcha despertou recentemente para uma luta vigorosa em busca do piso salarial, evidenciada pela adesão em massa dos profissionais à greve nacional. A mobilização, organizada pelo Sindisaúde-RS, surge como resposta ao avanço do desmantelamento da Lei do Piso, aprovada em 2022, porém ainda não cumprida.

Caminhada foi do Sindisaúde-RS, no bairro Santa Cecília até o Hospital de Clínicas de Porto Alegre

Mobilização em Porto Alegre e região metropolitana

Desde o dia 26, era possível antecipar a força da paralisação em Porto Alegre, região metropolitana e no Litoral Norte, onde técnicos e auxiliares de enfermagem são parte integrante da base do Sindisaúde-RS.

A assembleia geral extraordinária convocada pelo sindicato testemunhou a chegada das trabalhadoras, vindas através do transporte público, em corridas compartilhadas por aplicativos ou nos ônibus disponibilizados pela entidade em seus locais de trabalho.

Decisão unânime de paralisação e manifestações nas ruas

Assembleia aprovou adesão à mobilização nacional com paralisação de 24h

A decisão de paralisar as atividades no dia 30 foi tomada de forma unânime em uma assembleia que lotou o centro de eventos da Igreja da Pompéia. Apesar de surgir uma tímida proposta de decretar um “estado de greve” para evitar uma paralisação completa, ela não teve repercussão entre os trabalhadores, que, após a deliberação, marcharam em passeata até a Santa Casa, deixando nítida a disposição de levar a proposta de paralisação para dentro dos hospitais.

Encerrando a assembleia, a enfermagem saiu em passeata até a Santa Casa

A manifestação toma as notícias

Aqueles que duvidavam do vigor da assembleia e apostaram que se tratava de fogo de palha, perderam a aposta diante aa marcante passeata realizada no dia 28, partindo do largo Glênio Peres, próximo ao Mercado Público de Porto Alegre, passando pela Santa Casa, pelo Hospital Presidente Vargas e terminando no Hospital de Pronto Socorro ao final da manhã.

Passeata no dia 28 de junho mostrou o que estava por vir na greve do dia 30

A convocação conjunta da ASHPS (Associação dos Servidores do HPS) e do SIMPA (Sindicato dos Municipários) foi fundamental para ampliar a manifestação em defesa do piso salarial, que se manteve firme até o fim, mesmo com a chuva que caiu durante o trajeto.

O impacto dessa manifestação foi tão expressivo que acabou sendo noticiado por praticamente todos os veículos de imprensa, inclusive por aqueles que, desde o auge da emergência sanitária, não haviam dedicado uma única linha à situação dos heróis da pandemia.

Paralisação de 24 horas na enfermagem

Nas primeiras horas da fria manhã de sexta-feira, 30 de junho, confirmou-se a adesão dos trabalhadores aos piquetes organizados em mais de dez hospitais. Diretores e delegados sindicais formaram duplas ou trios para atender aos piquetes, tendo como primeira tarefa a eleição de um comando de greve para organizar o local de trabalho.

Uma vez mais, as notícias confirmavam: a greve na enfermagem é uma realidade. Ao vivo na RBS TV, Maria Lucia Schaffer, diretora do Sindisaúde-RS com mais de 80 anos, bloqueou a rua em frente à Santa Casa, acompanhada de várias trabalhadoras que cantavam para os telespectadores do Bom Dia Rio Grande: “1, 2, 3, 4, 5, mil… ou paga o piso agora ou paramos o Brasil!”.

Manifestação de grevistas em frente ao Hospital Santa Casa ao vivo no Bom Dia Rio Grande, da RBS TV

Mobilização em diferentes hospitais e estratégias da patronal

As tentativas de última hora da patronal não conseguiram obstruir o êxito da greve. No Hospital São Lucas da PUCRS, a segurança foi acionada para conter o piquete. No Hospital Ernesto Dornelles, o piquete disputou com samba, feijoada e outros agrados oferecidos pela gestão na “festa de aniversário” do hospital.

Houve piquetes consolidados no Hospital Mãe de Deus, na Santa Casa, no Hospital Vila Nova, além dos hospitais de Torres, Osório e Tramandaí.

Em Canoas, grevistas da Fundação Municipal, do Hospital Universitário, Pronto Socorro e Nossa Senhora das Graças se concentraram em frente à prefeitura municipal, e em seguida, participaram de uma grande passeata organizada pelo diretor do Sindisaúde-RS, Arlindo Ritter, utilizando um megafone adquirido às pressas depois que o carro de som foi apreendido pelos guardas municipais. O troco veio com uma manobra da passeata, que avançou para bloquear a rodovia federal, despistando a fiscalização.

Caminhada em direção ao Lula e reivindicação do piso salarial

Aproveitando a presença do presidente Lula (PT) em um evento no Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA), a diretoria do Sindisaúde-RS convocou uma concentração da enfermagem em frente à sede do sindicato para iniciar uma caminhada às 14h em direção ao HCPA.

Desde as primeiras horas da manhã, trabalhadores grevistas de hospitais onde não houve piquetes responderam ao chamado e foram se reunindo na sede do sindicato. Ao longo da manhã, aqueles que estavam nos piquetes se dirigiram à concentração unificada.

Enquanto os corredores e a frente do Sindisaúde-RS enchiam, os funcionários do sindicato se juntaram à força-tarefa para receber os trabalhadores com um almoço e encher milhares de balões pretos, que seriam utilizados durante o protesto.

Por volta das 14 horas, a passeata foi arrancando, coordenada pelo presidente do Sindisaúde-RS, Julio Jesien e o diretor Valmor Guedes, se espalhando pela rua enquanto o corpo do ato se organiza pela avenida enquanto apoiadores se revezavam no uso do microfone, como a deputada federal Fernanda Melchionna (PSOL) e representantes do Juntos!, movimento de jovens que apoiam a luta.

Enfermagem em marcha do Sindisaúde-RS até o Hospital de Clínicas para reivindicar ao presidente Lula uma solução para o pagamento do piso

A passeata seguiu pela Rua Vicente da Fontoura, dobrando na Ipiranga, mantendo-se alinhada ao lado direito, deixando uma faixa livre para o tráfego à esquerda. Com faixas, cartazes, narizes de palhaço e centenas de balões pretos, dobramos na Rua Ramiro Barcellos, onde o caminhão de som foi abandonado por ordem da Brigada Militar.

Trabalhadores da enfermagem na chegada do presidente Lula

Duas quadras adiante, a cavalaria e um pelotão do Choque atravessaram a frente da passeata, estabelecendo o limite na esquina da Ramiro com a Avenida Jerônimo de Ornelas, quase na entrada principal do hospital. O cordão militar, organizado pelo Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República (GSI), não conseguiu esconder a manifestação, e certamente Lula viu com seus próprios olhos, assim como os manifestantes o viram quando a comitiva passou escoltada.

Dentro do hospital, ocorria um evento festivo com demonstrações de apoio ao presidente, onde apenas cartazes e manifestações acríticas eram permitidas. Trabalhadoras do HCPA que entraram para assistir ao presidente tiveram que remover seus adesivos reivindicando o piso salarial.

No evento, apenas discursos de satisfação foram escutados, sem ninguém mencionar a urgente necessidade de valorização dos profissionais da saúde.

O que destoou foi a deputada Fernanda Melchionna (PSOL) levantando o cartaz da greve pelo piso e a deputada estadual Luciana Genro (PSOL) que cumpriu o combinado com os higienizadores do GHC e foi vestida com a camiseta da campanha pela jornada de 180 horas. Nesse cenário, a manifestação dos trabalhadores ganhou ainda mais importância para chamar a atenção para o papel que o governo federal desempenha em relação ao piso salarial da enfermagem.

A notícia comemorada sobre a destinação de um crédito no valor de 7 bilhões de reais para complementar o pagamento do piso não resistiu muito tempo até que sua insuficiência para cobrir os salários em hospitais públicos, filantrópicos e privados que atendem pelo menos 60% pelo SUS fosse desmascarada. Além disso, o governo federal continua segurando a transferência desses 7 bilhões para o pagamento imediato do piso salarial.

O piso salarial da enfermagem é a valorização daqueles que nos salvaram durante a pandemia

O estabelecimento de um piso salarial para a enfermagem é uma forma de valorizar um grupo de profissionais que ultrapassou seus limites ao se dedicar a salvar vidas durante a pandemia, enfrentando o novo coronavírus e o vírus do negacionismo que se instalou durante quatro anos no governo federal.

Sem recomposição salarial há três anos, esses trabalhadores foram esquecidos após tantas homenagens que receberam durante a pandemia.

Atualmente, entre os principais hospitais do Rio Grande do Sul, o menor salário pago a um técnico de enfermagem é de aproximadamente R$ 1.600, e o maior é de R$ 2.767. O valor estipulado pela lei do piso para um técnico de enfermagem é de R$ 3.325,00.

Enquanto as grandes empresas que gerenciam os hospitais aumentaram seus lucros durante a pandemia e agora investem na expansão de seus negócios, as trabalhadoras da enfermagem se veem obrigadas a escolher entre se entregar à exaustão do trabalho e ao endividamento ou lutar para reivindicar melhores condições para trabalhar e viver.

Trabalhadores da higienização do Grupo Hospital Conceição também protestaram

Os trabalhadores da higienização do Grupo Hospitalar Conceição (GHC) se uniram à mobilização, juntamente com a vice-presidente da ASERGHC (Associação dos Servidores do Grupo Hospitalar Conceição) e do Sindisaúde-RS, Graziela Palma.

Eles distribuíram uma carta aberta aos trabalhadores do GHC e aos usuários do SUS, com o objetivo de conscientizar sobre a importância da implementação da jornada de trabalho de 180 horas na higienização, assim como o respeito ao piso salarial nacional da Enfermagem. A carta também foi publicada na imprensa local a pedido das duas entidades.

Uma coluna de trabalhadoras da higienização marcou presença na passeata da tarde, demonstrando solidariedade e apoio à luta da enfermagem e somando as reivindicações da higienização ao presidente Lula.

Metroviários contra a privatização

Outra categoria que se juntou à marcha da enfermagem foram os funcionários da Trensurb, empresa responsável pelo metrô de Porto Alegre e parte da região metropolitana, liderados pelo Sindimetrô-RS. Eles lutam para que seja cumprida a promessa de campanha de retirar a empresa da lista de privatizações do governo federal.

Os metroviários entenderam a importância de se unir à mobilização da enfermagem, percebendo que a luta por melhores condições de trabalho e a resistência à privatização são questões interligadas. Juntos, eles reforçaram a mensagem de que a valorização dos serviços públicos, como a saúde e o transporte, é essencial para a qualidade de vida da população.

Sindimetrô-RS levou o apoio à luta da enfermagem e a reivindicação para que o presidente Lula não privatize a Trensurb
Sindimetrô-RS levou o apoio à luta da enfermagem e a reivindicação para que o presidente Lula não privatize a Trensurb

A presença dos metroviários na marcha evidencia a união entre diferentes categorias de trabalhadores na defesa de seus direitos e na luta contra as políticas que visam enfraquecer o setor público em prol de interesses privados.


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