MP denuncia jornalista perseguido por Carla Zambelli em rua de SP
Luan Araújo pode ser condenado por injúria antes mesmo de bolsonarista ser responsabilizada por ameaçá-lo com arma de fogo
Foto: Conjur/Reprodução
O dramaturgo Nelson Rodrigues, dentre muitos personagens, criou o marcante Sobrenatural de Almeida. Tratava-se de um fantasma a quem o cronista atribuía responsabilidade por qualquer coisa ruim que acontecesse contra o Fluminense, seu time do coração.Eu, cá com meus botões, imagino que haja assombração correlata amaldiçoando certos setores do Judiciário.
Foi o que me ocorreu ontem (15), ao ler a coluna de Rogério Gentile, no UOL, e me deparar com a notícia de que o Ministério Público de São Paulo pediu à Justiça a condenação do jornalista Luan Araújo – aquele contra quem a deputada federal Carla Zambelli (PL-SP) e um de seus seguranças miraram seus revólveres até encurralá-lo em bar dos Jardins, em São Paulo, na véspera do segundo turno da última eleição presidencial.
Ainda que – descumprindo decisão da Justiça Eleitoral, que proibia o porte de arma de fogo no período – a parlamentar de extrema direita tenha ameaçado a vida do rapaz após uma discussão política banal, ele pode ser condenado pelos crimes de injúria e difamação antes mesmo que uma improvável condenação pese contra ela.
Zambelli foi denunciada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) por porte ilegal de arma e constrangimento ilegal com emprego de arma de fogo. Mas ela, por sua vez, decidiu processar o jornalista após se sentir ofendida por um texto publicado pelo rapaz após o episódio. Nele, Luan disse que a deputada “segue uma seita de doentes de extrema direita” e que “segue cometendo atrocidades atrás de atrocidades”. Acrescentou ainda que ela se aproveitara da véspera da eleição para “fazer o picadeiro clássico de uma extrema-direita (sic) mesquinha, maldosa e que é mercadora da morte”.
Na ação, Zambelli disse que as afirmações são ofensivas e irresponsáveis, e minimizou a sua própria ação, dizendo que mesmo “traumatizante, o envolvimento prévio entre as partes [referindo-se à perseguição armada] não garante à suposta vítima um direito imutável de ofender gratuitamente seu suposto ofensor”.
No dia 6 de maio, o promotor Roberto Bacal deu um parecer favorável à condenação do jornalista. Segundo ele, “desde o início do desentendimento, houve uma ofensa gratuita e dolosa contra a deputada” e que “ houve excesso de linguagem” no texto publicado na sequência. Cabe relembrar aqui que Luan é negro e que, no Brasil, a Justiça para quem não é branco corre em uma cadência diferente, acelerada e inclinada a condenação.
Procurado pela coluna, Luan Araújo diz o óbvio: não cometeu crime algum. Disse que apenas exerceu seu trabalho profissional, amparado pela liberdade de expressão – um valor bastante defendido pela extrema direita, mas só quando lhe convém.