Trabalho de base e demagogia
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Trabalho de base e demagogia

Para derrotar o fascismo nos territórios periféricos é essencial combater as tendências oportunistas nos movimentos sociais

Bruno Magalhães 25 maio 2024, 14:08

Foto: Flickr

A ascensão do bolsonarismo demonstrou a capilaridade da extrema direita entre a classe trabalhadora e colocou o trabalho de base como necessidade urgente. Perante a penetração das ideias reacionárias em amplas camadas do mesmo eleitorado que elegeu Lula e Dilma, até mesmo os setores mais burocratizados refletiram (pelo menos nominalmente) a necessidade de voltar à organização popular.

Ficou evidente que uma resposta eficaz aos conservadores e fundamentalistas não seria possível apenas pela via institucional, mas principalmente através da luta ideológica e da ação organizativa nos mesmos locais de trabalho e territórios periféricos onde cresceram as ideologias reacionárias. Os movimentos sociais, sindicatos e organizações combativas com algum nível de enraizamento social reagiram a esta “descoberta” de forma mais qualificada, agitando menos o tema e refletindo mais sobre a complexidade desta construção no momento atual. O diálogo entre a constatação simplista (“temos que voltar para a base!”) e sua  resposta (“nunca saímos daqui!”) teve muita confusão, mas também um saldo positivo em vários esforços de construção militante.

E, imediatamente após ser “redescoberto”, o impulso para o trabalho de base sofreu uma grande pressão de adaptação institucional no contexto do novo governo. A combinação entre o risco da extrema direita e as possibilidades imediatas abertas por um governo social-liberal promovem pressões que convergem no sentido da rápida adaptação (ou lenta aderência) ao governismo, com o risco do fascismo e o parco financiamento estatal para projetos sociais servindo para amenizar as críticas públicas sobre o governo e seus atuais operadores da austeridade fiscal. Agindo através de uma “política de avestruz”, na qual nominalmente se critica a austeridade enquanto na prática se faz pouco para combatê-la, uma parte importante da esquerda e dos movimentos sociais hoje coloca suas fichas nas possibilidades abertas por este financiamento estatal (direto e indireto).   

Esse processo também levou a uma tendência de esvaziamento de significado do trabalho de base, que se expressou em duas formas de demagogia política distintas na origem, mas próximas na prática. A primeira delas foi através da captação exclusivamente simbólica do problema e a segunda foi na transformação do trabalho de base em uma “tendência especial” sob a qual a estratégia geral estaria subordinada.

A primeira forma de esvaziamento de significado foi protagonizada pelo reformismo clássico e seus diversos exemplos de cooptação de termos como “base” e “periferia”. O presidente Lula utilizando o boné do CPX ao mesmo tempo que opera a austeridade fiscal, a Secretaria de Periferias se abrigando no ministério do MDB, a ministra Anielle Franco apoiando o mesmo prefeito que abrigou Chiquinho Brazão, parte do  movimento sindical defendendo o aumento da exploração através da PL do Uber, parte do movimento estudantil defendendo o Novo Ensino Médio, entre tantos outros exemplos que defendem nominalmente determinadas bases sociais enquanto atacam seus interesses concretos. Ao mesmo tempo.

Já a segunda forma desse esvaziamento é mais complexa porque tem origem em ideias radicais contrárias a esta postura reformista, mas possui um erro de concepção que leva a resultados práticos similares. Nesse caso, a “base” e “periferia” mudam de significado político e transformam-se em eixos especiais  que carregam, ao mesmo tempo, enunciados anti-oportunistas e características internas que levam ao mesmo oportunismo. E, para levar adiante essa ação, em certos casos, grupos políticos distantes das tradições programáticas e organizativas dos movimentos procuram diluir-se neles para confundir sua orientação. Esse desvio é bastante contra-intuitivo porque suas motivações têm resultados muito distintos de suas consequências e, na maioria das vezes, é operado por militantes que refletem a questão de forma honesta. A reflexão abaixo é sobre esta segunda forma.

Trabalho de base não é virtude, é obrigação

Um texto de Lênin nos dá um ótimo ponto de partida para este debate. O manuscrito “Sobre a Confusão entre Política e Pedagogia”, infelizmente incompleto, foi escrito em junho de 1905 para responder à conjuntura específica do revés de maio do Ensaio Geral, mas traz lições muito úteis para os dias de hoje. Naquele contexto, o recuo momentâneo da luta (que se consolidaria na derrota dos anos posteriores) desenvolveu uma posição entre os revolucionários que defendia como problema central justamente a falta de trabalho de base. É contra esta tendência que Lênin escreve: 

Nós até temos uns poucos social-democratas que deixam-se levar pelo pessimismo toda vez que os trabalhadores sofrem um revés em batalhas esparsas contra os capitalistas ou contra o governo, e que desdenhosamente abrem mão de qualquer menção aos grandes e elevados objetivos do movimento da classe trabalhadora ao apontar para o inadequado grau de nossa influência sobre as massas. Quem e o que somos nós, dizem eles, para ambicionar tais coisas? É despropositado falar do papel da social-democracia como vanguarda da revolução quando nós nem mesmo sabemos realmente o ânimo das massas, quando estamos impossibilitados de nos misturarmos a elas e despertar as massas trabalhadoras! Os reveses sofridos pelos social-democratas no último Primeiro de Maio intensificaram consideravelmente esse ânimo. Naturalmente, os mencheviques, ou novos Iskristas, aproveitaram essa abertura para levantar de novo o mote especial “Às massas!” – como se apesar, como se em resposta àqueles que pensaram e falaram sobre o governo revolucionário provisório, sobre a ditadura democrático-revolucionária etc.[grifo nosso]1

Apesar dos 120 anos que nos separam deste texto, a atualidade de seu método de análise permanece atual. Tal como naquele momento, as últimas derrotas da esquerda brasileira levaram ao rebaixamento programático e fizeram com que temas como as privatizações, os ataques aos direitos dos trabalhadores, os cortes de verbas da saúde em saúde e educação, etc, fossem escanteados para uma defesa – seja ativa ou envergonhada – do conjunto do atual governo neoliberal. Frente ao perigo atual do fascismo, “quem somos nós para ambicionar tais coisas”? 

Para enfrentar este dilema, parte da esquerda brasileira utiliza da mesma saída dos mencheviques, apontando que a declaração de nossos objetivos é insuficiente e a conquista de uma maioria social é premissa para atingi-los. Esta afirmação está totalmente correta porque não se faz nenhuma mudança na sociedade sem uma força social com poder de combate maior ou equivalente ao das forças contrárias a esta mudança. O problema ocorre justamente quando esta necessidade se transforma em virtude, ou seja, quando tal obviedade substitui o programa político no centro da armação estratégica, tal como no mote “Às massas” citado acima.  Sobre isso, o texto continua:

Não há nada mais enojador do que o otimismo presunçoso. Não há nada mais certo do que a necessidade de atenção para a necessidade constante e imperativa de aprofundar e ampliar, ampliar e aprofundar nossa influência sobre as massas, nossa propaganda e agitação estritamente marxistas, nossa conexão cada vez mais próxima com a luta econômica do país. No entanto, como essa insistência é, em todos os momentos, certa, sob todas as condições e em todas as situações, não deve ser transformada em palavras de ordem especiais, nem deve justificar tentativas de construir uma tendência especial na social-democracia. Existe uma linha divisória aqui; excedê-la é transformar essa necessidade indiscutivelmente legítima em um estreitamento dos objetivos e do alcance do movimento, em uma cegueira doutrinária para as tarefas políticas vitais e cardeais do momento.[grifo nosso]2

Lênin escreve que “não há nada mais enojador que o otimismo presunçoso” fazendo uma crítica direta justamente contra aqueles que enunciam seus objetivos sem considerar as próprias forças nem as situações concretas em que estão inseridos. E, nesse sentido, concorda com as críticas dos mencheviques sobre certa presunção presente em seu próprio grupo. Esta definição não é menor porque admite que o combate contra os oportunistas também pode carregar consigo desvios inversos, tais como o propagandismo e o maximalismo, dando como antídoto a tarefa de aprofundar e ampliar a influência de massas.

Feita esta autocrítica, a próxima frase resume seu argumento central: como o trabalho de base é necessário em todas as condições e em todas as situações, não faz sentido transformá-lo numa tendência especial. Transformar esta “necessidade indiscutivelmente legítima” em um “estreitamento de objetivos” é um movimento particular que permite o rebaixamento oportunista na medida em que substitui os elementos de um programa político radical por uma tarefa difusa de construção na base. Quando o método torna-se, no lugar do programa, o centro organizador de determinada ação política, logicamente toda a atuação que antes estava determinada pelas necessidades do programa passa a ser determinada pelas necessidades do método. Para materializar esse raciocínio, vejamos como dois exemplos de trabalho de base na periferia podem funcionar.

Uma ação política periférica centrada na disputa de um programa radical constrói seu trabalho de base como método indispensável para organizar pessoas através de processos de luta que levem a avanços medidos por diretrizes programáticas, sejam elas objetivas (a conquista de determinada reivindicação) ou subjetivas (a experiência e formação da militância e sua organização). Nesse processo, os representantes da burguesia e do aparato estatal operam de diversas formas no sentido contrário a esses avanços, barrando conquistas ou cooptando/desmoralizando os lutadores envolvidos. Como as necessidades materiais na periferia são muitas, as pressões materiais contra o movimento também são muito grandes. Portanto, independente dos resultados da luta, os avanços que ela proporcionou são necessariamente medidos pela estratégia política ao redor da qual ela se desenvolveu, ou seja, quanto avançou em relação ao programa estratégico dos revolucionários que impulsionaram tal luta.

Já a ação política centrada no método por si mesmo utiliza uma lógica invertida. Nesse caso, o resultado final da ação é medido pela simples análise imediata, cuja relação com alguma estratégia geralmente é só nominal. E, para conquistar tais resultados sob as mesmas pressões do exemplo acima, a saída óbvia é a adaptação aos mecanismos burgueses e estatais justamente porque o critério final de aferição do avanço político é o método, e não o programa. Se os objetivos estratégicos são radicais, basta atenuá-los para conquistar trânsito com setores mais adaptados ao aparato estatal e assim pavimentar um atalho para conquistar vitórias, no geral pequenas e cosméticas, fruto de fontes de financiamento limitadas (emendas parlamentares ou editais públicos e privados). Nesse processo, a pedagogia pela luta, instável por natureza, dá lugar a uma “pedagogia pelo financiamento” bastante previsível.

É interessante notar também como esse processo vai ganhando características performáticas nas quais aquilo que aparece enquanto oriundo da base é sempre mais divulgado do que aquilo que realmente acontece na base. Nessa dinâmica, iniciativas inexistentes são divulgadas, projetos frágeis são “turbinados” pela propaganda, surgem “lideranças comunitárias” que não lideram ninguém, figuras públicas são homenageadas de forma puramente instrumental, entre tantos outros exemplos derivados dessa demagogia oportunista.

Não se trata de defender aqui uma posição purista, ou semi anarquista, sobre as relações do movimentos social com o estado. Ao contrário, uma ampla variedade de táticas é aceitável nas idas e vindas da construção da luta social e a flexibilidade é um valor imprescindível para qualquer construção radical. O problema está na troca do horizonte estratégico pelas necessidades táticas imediatas. Quando se muda determinada posição ou aliança estratégica exclusivamente devido ao tema do financiamento, aí está a marca insuspeita da movimentação oportunista porque a posição política é objetivamente alternada em troca de recursos.

Transformar a necessidade permanente do trabalho de base –  obrigatória para qualquer projeto político – em uma tarefa específica, uma “tendência especial”, esvazia conceitos como “base” e “periferia”, que são então exauridos através da separação entre seus sentidos econômicos e seus sentidos políticos, utilizando-se cada vez mais destes enunciados e, ao mesmo tempo, relativizando cada vez mais os reais interesses dos sujeitos que dão concretude a estes conceitos e, portanto, melhorando cada vez mais as condições de financiamento das direções que imprimem essa política enquanto a base é cada vez mais secundarizada.

Tal desvio é facilmente verificável nos dias de hoje. A combinação entre as formas de financiamento citadas acima e a falta de criticidade perante o governo são duas faces indissociáveis da mesma moeda. Nessa postura de demagogia política perante o trabalho de base, ministérios federais inoperantes são louvados e parlamentares vacilantes são ovacionados simplesmente porque destes surgem possibilidades de financiamento. Porém, o que aparece como solução para hoje transforma-se no problema para amanhã porque o processo lento de adaptação vai acomodando tanto os dirigentes (que, no geral, recebem mais recursos) quanto a própria base social que se forma politicamente na barganha permanente derivada desta política.

Tal postura cobra seu preço. Cada vacilação perante o povo sobre temas polêmicos e cada tergiversação perante os rumos políticos do governo (sejam sobre ministérios progressistas ou neoliberais) abre espaço para a extrema direita entre nossas bases porque seu programa reacionário tem todos os defeitos do mundo, mas não é tão vacilante como esta posição oportunista pode ser. E as mentiras da extrema direita tendem a levar vantagem quando enfrentadas com as inverdades parciais do oportunismo.

Basismo e relação partido-movimento 

Outro problema dessa postura é o paternalismo teórico que tal método impõe. Afinal, quando se deixa de lado o programa político, sua justificativa teórica também é desprezada. Sendo assim, tal política oportunista supervaloriza os conhecimentos empíricos populares de forma demagógica enquanto guarda recursos teóricos imprescindíveis para sua camada dirigente (no melhor dos casos) ou simplesmente recusa o debate teórico (no pior deles). Como bem diz Paulo Freire:

Uma das coisas que, as vezes, os militantes políticos se esquecem e os educadores autoritários sempre, é que o seu aqui e o seu agora são quase sempre o amanhã e o lá do educando. E o educador tem que partir não é do seu aqui e do seu agora, é do aqui e do agora da massa para vir com ela, não para o aqui do educador, mas para um ali também. O que eu quero deixar claro é que a postura elitista recusa definitivamente o aqui dos outros, desdenha e considera como coisa degenerada. Quer dizer, o saber popular é uma degenerência, a postura basista renega a teoria e considera que toda teoria atrapalha a prática. A postura basista, então, hipertrofia o valor que existe na sabedoria popular. A minha postura considera que é absolutamente indispensável o saber teórico, mas considera que não é possível desdenhar e desprezar a sabedoria popular. Mas admite e reconhece que seria uma idealização, por exemplo, da sabedoria popular você pretender que a massa popular fica só nela, enquanto os intelectuais pudessem entender Marx e Hegel e outras coisas. E a massa popular nada, porque o que ela tem que fazer é trabalhar mesmo.[grifo nosso]3

Os defensores do método basista tem como prática “hipertrofiar o valor que existe na sabedoria popular” por dois motivos. O primeiro é objetivo e relacionado à profunda complexidade na relação entre o debate teórico e a educação popular; o segundo é a própria contradição entre esta complexidade e o método de construção oportunista. Os dois motivos estão relacionados à tensão permanente entre a teoria revolucionária e sua ação prática, tema que coloca inúmeros empecilhos frente aos processos de adaptação. No geral, por esse motivo, a prática dos reformistas simplesmente exclui elementos do debate teórico na construção do trabalho de base e aceita como verdades qualquer elemento da sabedoria popular sem disputar, sem tensionar. Daí nasce a lógica paternalista.

As formulações de Paulo Freire tem como objeto principal esta tensão, este enorme desafio de construir a organização popular junto com a classe trabalhadora aprofundando o debate teórico, sem incorrer no basismo nem no dirigismo. O processo de aprendizagem perante esse desafio enorme não tem uma receita pronta, um método em si, é necessariamente construído através de tentativas e erros que se acumulam como experiências coletivas para cada militante e cada território. As vitórias educam, e as derrotas também, desde que haja uma postura autêntica de construção que recuse o fetichismo de base e busque a reflexão teórica conjunta. Caso contrário, todas estas experiências são transformadas em narrativas para terceiros, sejam eles financiadores, redes sociais, etc, e não fazem nenhum sentido enquanto experiência de luta em comum.

A valorização do conhecimento popular é imprescindível para a construção de pontes dialógicas que permitam as sínteses concretas justamente entre este conhecimento e a teoria revolucionária. E aí voltamos ao tema debatido acima porque estas sínteses são materializadas justamente no programa político e nas táticas derivadas dele. O método basista/oportunista não valoriza de fato o conhecimento popular porque, ao hipertrofiá-lo externamente enquanto diminuiu sua necessidade no processo de construção do programa, na prática o abandona como interlocutor privilegiado para a síntese e, ao mesmo tempo, o agita enquanto propaganda pública para a ação momentânea. Por isso tal postura é paternalista, porque infantiliza as ideias oriundas da classe trabalhadora enquanto debate os temas teóricos estratégicos em outro lugar.

O debate sobre a relação partido-movimento também é derivado desse tema porque o método oportunista frequentemente se utiliza das dinâmicas (e dos problemas) desta relação para criar uma confusão premeditada que, no final, colabora com a adaptação estatal.

Os movimentos sociais se formam enquanto organizações independentes para a organização das lutas ao redor de determinadas pautas, tendo programas políticos mais específicos e características de militância mais amplas. Com uma diversidade enorme de conformações e pautas, os movimentos sociais podem surgir de iniciativas mais amplas, quando uma coalizão diversa se reúne ao redor de determinada necessidade ou quando é impulsionado por forças políticas mais específicas. No primeiro caso estão os movimentos mais difusos (como o movimento da saúde, o movimento estudantil, o movimento de moradia, o movimento antiproibicionista, etc), que contém dentro de si grupos específicos que o constroem e disputam sua direção política. No segundo caso estão os movimentos “com bandeira”, com uma direção comum mais centralizada – e inclusive ligada à outros grupos políticos – que normalmente também são parte integrante do primeiro caso como o MST (e a Consulta Popular), o MTST (e a Revolução Solidária), etc.

Vamos tratar aqui do segundo caso. A concepção basista/oportunista trata a relação de direção com movimentos desse tipo de uma forma demagógica similar àquela que trata a própria base: hipertrofiando publicamente a “independência” dos movimentos enquanto constrói frações de direção informais cuja coesão política vem de relações pessoais, necessidades econômicas particulares, etc. Isso forma uma dinâmica de círculos concêntricos nos quais os movimentos declaradamente independentes tem sua direção verdadeira operada através de tendências políticas não declaradas e ligadas, no limite, por “laços de confiança” particulares ao invés de acordos programáticos.

Ao mesmo tempo em que constroem esta política baseada principalmente em critérios subjetivos, denunciam as organizações públicas e declaram suas próprias camarilhas (na falta de uma palavra melhor) como a própria expressão dos movimentos. Nessa ação, tentam fazer com que aqueles que apresentam sua identidade e seus objetivos sobre os rumos do movimento publicamente sejam vistos como elementos externos aos movimentos (afinal são outra organização pública, e não informal), mesmo que tenham muito mais inserção na base.

Isso está diretamente relacionado aos temas acima porque esta utilização dos movimentos de forma instrumental para objetivos financeiros e de propaganda acaba sempre sendo planejada e operada por fora dos movimentos, reproduzindo exatamente aquilo que esta concepção basista/oportunista declara combater. Assim, as ações e deliberações destes grupos políticos “encobertos” são tratadas como ações e deliberações dos próprios movimentos, afastando de forma capciosa a militância do movimento que está fora de tais “laços de confiança” do centro de decisão desses grupos.

Somam-se a isso as iniciativas oportunistas de outras organizações políticas e candidaturas que, mesmo sem qualquer identidade com as pautas levantadas por determinado movimento, buscam capitalizar a experiência coletiva dos movimentos para fins exclusivamente eleitorais. Não são poucos os candidatos e candidatas que tornaram-se, justamente no ano eleitoral de 2024, coordenadores de movimentos sociais ou lideranças comunitárias sem nenhuma definição programática nem relação com a base social dos movimentos. Este é o exemplo final desta crítica.

Combater a demagogia nos movimentos sociais

Todas estas dinâmicas citadas acima são parte de um múltiplo processo de adaptação programática e burocratização de setores da militância dos movimentos sociais que são fruto da nova combinação entre o governo de frente popular e a ameaça da extrema direita, expressando uma demagogia política absolutamente nefasta para a construção de um verdadeira ação revolucionária pela base.

O movimento em que atuamos, a Rede Emancipa de Educação Popular, não está imune e este tipo de pressão oportunista e também é atingido por tais processos. Frente a tal situação, o fortalecimento programático dos movimentos e de suas instâncias deliberativas deve ser a principal ferramenta democrática contra a diluição de nossas lutas perante aqueles que buscam nos comprar ou a ação oportunista de grupos políticos que atuam para nos dividir.

Combater a demagogia política que inverte nossas prioridades, reduz nossa radicalidade perante os governos e coloca as necessidades de financiamento à frente das exigências políticas, é a tarefa central para a construção de qualquer trabalho de base revolucionário entre os movimentos sociais. Enfrentar esta demagogia fundamentada no basismo e no oportunismo é o passo essencial para movimentos combativos que estejam a altura de construir o enraizamento popular necessário contra a ameaça fascista.

Notas

  1. https://www.marxists.org/portugues/lenin/1905/06/confusao.htm ↩︎
  2. Idem ↩︎
  3. https://glossario.paulofreire.org/verbete/44 ↩︎

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