Lula mantém plano para explorar petróleo na Amazônia
Projeto vai afetar diversas comunidades e enfrenta resistência de ambientalistas e movimentos sociais
Foto: Lula e o novo presidente do Senado Davi Alcolumbre (Fábio Rodrigues-Pozzebom/Agência Brasil)
Em encontro recente com o presidente do Senado Davi Alcolumbre (União Brasil), o presidente Lula deixou explícito pela primeira vez seu apoio à exploração de petróleo na Margem Equatorial do Rio Amazonas, território marítimo que vai do Amapá (estado de Alcolumbre) ao Rio Grande do Norte.
Mesmo com o consenso contrário de ambientalistas sobre a exploração, inclusive da ministra do Meio Ambiente Marina Silva, e a resistência do Ibama sobre o início das pesquisas de prospecção, Lula sempre se posicionou a favor do projeto e agora deu um passo ainda mais decidido nesse apoio. Tal ação se insere no contexto da nova presidência do negacionista Donald Trump nos EUA e seu combate à transição energética, promovendo a indústria dos combustíves fósseis que financiou parte importante de sua campanha. Apesar das enormes diferenças entres os presidentes brasileiro e americano, o slogan trumpista “Perfurar, perfurar, perfurar!” ganha eco no Brasil com as novas declarações de Lula e pode colocar em ainda mais risco o já tão ameaçado bioma amazônico.
A ideia do governo é acelerar ao máximo o processo no começo de 2025 para evitar o desgaste de realizar tal medida mais perto da COP30, que será realizada em Belém no mês de novembro. Com seu aliado Helder Barbalho (MDB), governador do Pará, enfrentando uma grande mobilização indígena contra mudanças no atual sistema de ensino para estes povos, a previsão é de que esse ano seja marcado por mobilizações ambientais aproveitando o destaque internacional do país pela realização da COP.
Por que não devemos explorar petróleo na Foz do Amazonas
São inúmeros os motivos pelos quais todo o movimento ambiental é contra a exploração de petróleo e gás na região. A região abriga uma biodiversidade riquíssima, sendo ocupada por povos indígenas e comunidades ribeirinhas que sofreriam os impactos diretos da medida. Os sistemas costeiros e marinhos no entorno da Foz do Amazonas abrigam uma biodiversidade única no mundo, sendo um território estratégico de perservação no qual se encontram 80% da cobertura de manguezais do país.
Atualmente, a região já conta com quase 100 poços perfurados sem descobertas significativas. Além disso, entre 2011 e 2022, o Brasil teve quase um acidente por ano relacionado à extração de petróleo e derivados. Em 2019, um dos principais desses acidentes atingiu mais de mil localidades em 130 municípios de 11 estados do Nordeste e do Sudeste brasileiros, afetando uma área de 4 mil quilômetros na qual foram recolhidas mais de 5 mil toneladas de resíduos.
O Instituto Mapinguari destaca que as pesquisas para identificação de jazidas de petróleo na Margem Equatorial envolvem a perfuração de poços e coleta de materiais, processos que podem provocar acidentes ambientais irreversíveis. Um dos principais problemas é o tempo de resposta a eventuais vazamentos. Segundo estudos do Instituto, a Petrobras prevê um prazo de 43 horas para conter um vazamento de petróleo, mas em apenas 10 horas, o óleo já teria alcançado águas internacionais, atingindo a Guiana Francesa.
Além do desastre ambiental, o impacto social de tal cenário seria incomensurável e afetaria principalmente as populações tradicionais que perderiam suas condições básicas de subsistência. É preciso lembrar também que as indenizações nesses casos nunca são suficientes para a reparação de tais consequências porque tal impacto já está precificado antecipadamente pelas empresas extrativistas. Se houvesse uma política realmente justa de reparação aos mais atingidos, possivelmente este tipo de exploração não seria viável economicamente.
As perspectivas econômicas da exploração também são incertas. Embora estimativas sugiram a presença de até 30 bilhões de barris de petróleo na região, a história indica um cenário menos otimista. Dos 94 poços já perfurados na Foz do Amazonas, apenas 2% registraram presença do combustível, e em volumes tão reduzidos que a extração não se mostrou viável economicamente. Além disso, diversas tentativas anteriores foram interrompidas por dificuldades técnicas e pelas intensas correntes marítimas, que já chegaram a deslocar plataformas de perfuração.
A quem interessa a exploração de petróleo na Amazônia?
A principal motivação para correr tantos riscos é econômica. Segundo o governo, estimam-se reservas de 30 bilhões de barris de petróleo na Foz do Amazonas que poderiam gerar receitas de R$1 trilhão, valor que supostamente compensaria os riscos e danos colaterais da exploração. Entretanto, tal postura é falaciosa e não só pela incerteza sobre tais reservas levantada acima.
A Petrobrás já tem reservas de petróleo comprovadas suficientes para os próximos 12 anos e possibilidade de ampliar essa produção na já explorada área do pré-sal. Além disso, os recursos dos royalties alardeados como benefício para os locais explorados não são exatamente um “pagamento” para os estados e municípios relacionados, mas uma compensação pelos impactos socioambientais que esta atividade extrativista necessariamente causa. Diversas regiões brasileiras que já recebem o tal “pagamento” sofrem com os problemas ambientais derivados da extração e continuam apresentando baixos índices de desenvolvimento social, como o Norte Fluminense e o litoral norte de São Paulo, enquanto as petroleiras mantém lucros extratosféricos que são destinados majoritariamente aos seus grandes acionistas.
Em meio a uma crise climática global que causa grandes tragédias e afeta cada vez mais a vida cotidiana, o apelo por uma transição energética justa entra na pauta de movimentos sociais das mais diversas origens, reivindicando uma mudança no modelo de produção energética que dependa cada vez menos de combustíveis fósseis. O capitalismo mundial já identificou essa necessidade e busca mercantilizar possíveis saídas para essa crise através de um mercado de créditos de carbono que gera lucros, mas tem pouquíssima incidência prática nas emissões de CO² – a raiz do problema climático. Propondo remuneração aos países que poluem menos, essa proposta funciona principalmente para garantir a manutenção das emissões das economias mais poluidoras e não toca na questão central do aquecimento global.
Mas o que o governo Lula propõe é algo ainda mais atrasado e próximo da política de Trump do que as saídas do assim chamado “capitalismo verde”. E seu impulso principal é satisfazer investidores que lucram não só com a exploração dos combustíveis fósseis, mas também especulando com as possíveis reservas. Dessa forma, Lula reafirma seu compromisso com os interesses da grande burguesia em detrimento de grande parcela da população que o elegeu.
Às vésperas da COP30, é urgente unificar os movimentos sociais e os diversos setores populares com uma política contrária aos novos ataques do capital contra o meio ambiente e as populações mais vulneráveis. A declaração de um estado de emergência climática que garanta metas reais de enfrentamento à crise climática é um passo essencial, assim como a mobilização contra qualquer projeto do extrativismo predatório. Não temos mais tempo e as respostas concretas sobre esse tema só podem partir das comunidades e trabalhadores mais afetados pela mudança do clima.
Matéria realizada com dados do portal ClimaInfo.