A Resposta somos Nós: Vinte anos de APIB e a Emergência Climática
Foto_-@edinigfekanhgag-3-1080x675

A Resposta somos Nós: Vinte anos de APIB e a Emergência Climática

Leia a Carta Final do 21º Acampamento Terra Livre

APIB 12 abr 2025, 10:42

Foto: Acampamento Terra Livre. (@edinigfekanhgag/APIB)

Via APIB

Nós, povos indígenas, sempre estivemos aqui! Resistimos à invasão de nossos territórios e ao genocídio realizado contra os nossos ancestrais e contra nós nesses 525 anos.

Em 2025, celebramos um marco fundamental para a Aliança e Unidade na Diversidade dos nossos povos: 20 anos da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB). A APIB foi criada em 2005, durante o segundo Acampamento Terra Livre (ATL), como uma instância nacional de articulação e referência do movimento indígena. Desde então, a APIB e o ATL se tornaram expressões vivas de mobilização e resistência na luta pelos direitos fundamentais consagrados na Constituição Federal de 1988: o direito originário ao território, à autodeterminação, à identidade e cultura próprias, bem como às políticas públicas específicas e diferenciadas, como a saúde e educação indígena, além da efetiva proteção às terras indígenas, no intuito de assegurar todos os direitos pétreos mencionados. 

Diante de um cenário global e nacional marcado pelo avanço da extrema-direita e por ataques sistemáticos aos nossos direitos, reafirmamos a importância da resistência e da luta coletiva. Foi com ela que arrancamos conquistas históricas: o reconhecimento constitucional dos nossos direitos originários e o protagonismo indígena em cargos estratégicos no Governo Federal, como o Ministério dos Povos Indígenas (MPI), a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) e a Secretaria Especial de Saúde Indígena (SESAI). Mas representação sem estrutura não transforma realidades. Reivindicamos orçamento, pessoal e autonomia para políticas públicas feitas de parente para parente, respeitando a diversidade de nossos povos e territórios.

O Brasil, que sediará a COP 30 em nossa Amazônia Indígena, ocupa um papel central na agenda climática mundial. O ano de 2024 foi o mais quente da história, com eventos extremos se tornando rotina. Não há mais tempo! A exploração de combustíveis fósseis impacta diretamente nossos povos indígenas, quilombolas, comunidades tradicionais e a própria Mãe Terra. A resposta à crise climática exige uma transição energética justa e sustentável. Seguimos alertando para os impactos do petróleo, do gás, da energia nuclear e até mesmo das chamadas renováveis – eólica e solar – quando desrespeitam nossos territórios.

Além da crise climática, enfrentamos ataques sistemáticos aos nossos direitos constitucionais. A Câmara de Conciliação do STF, criada sem a participação da APIB, representa o maior ataque institucional desde a promulgação da Constituição de 1988. Em vez de declarar a inconstitucionalidade da Lei nº 14.701/2023, o Ministro Gilmar Mendes propôs um novo anteprojeto de lei que fragiliza o direito à consulta livre, prévia e informada, criminaliza retomadas, indeniza invasores e altera profundamente o procedimento de demarcação. Pior: sinalizou a abertura de nova negociação sobre a mineração em terras indígenas.

No Congresso, o cenário também é alarmante. O Parlamento mais conservador da história, dominado por ruralistas, propõe emendas à Constituição como a PEC 48, do Marco Temporal, a PEC 132, da indenização da terra nua, e uma CPI da Demarcação das Terras Indígenas, tentando restringir ou anular nossos direitos conquistados. Por isso, exigimos o arquivamento imediato de todas as propostas legislativas de caráter anti-indígena em tramitação no Congresso Nacional.

Durante o 20º ATL, em abril de 2024, o Ministro Gilmar Mendes sinalizou que abriria uma mesa de negociação dos nossos direitos, relacionada diretamente com o aumento da violência nos nossos territórios. Agora, um ano depois, no 21º ATL, mais um ataque aos povos indígenas se apresenta: a União, o Senado Federal e a Câmara dos Deputados pediram mais um adiamento das discussões da Câmara de Conciliação. Reafirmamos: não aceitaremos manobras que enfraqueçam nossos direitos.

Marchamos, pacificamente, nos dias 8 e 10 de abril. Mais de 8 mil indígenas ocuparam Brasília com corpos, maracás e a Constituição nas mãos. Somos guardiões da Mãe Terra e da Democracia. A estátua da Justiça, agora com cocar, nos acompanha como símbolo da resistência e sabedoria ancestral. Nosso grito coletivo exige: o fim da Câmara de Conciliação e a declaração de inconstitucionalidade da Lei nº 14.701/2023. 

No dia 10 fomos recebidos com repressão violenta por parte da Polícia Legislativa da Câmara dos Deputados e do Senado Federal e da Polícia Militar. Uma violência premeditada, já que no dia anterior um agente público disse em reunião “Deixa descer. Se fizer bagunça, a gente mete o cacete”.  Assim, mulheres, crianças, anciãos e lideranças tradicionais foram brutalmente atingidos por bombas de gás lacrimogêneo e spray de pimenta. Eles também não receberam atendimento imediato por parte do Corpo de Bombeiros. Entre as vítimas está a nossa Deputada Federal Célia Xakriabá, alvo de racismo e violência política. As forças de segurança, que deveriam proteger os povos indígenas, são as mesmas que nos assassinam em nossos territórios e ainda não concebem que indígenas possam ser eleitos para aldear o Congresso Nacional. 

A resposta somos nós! Somos guardiões não apenas da natureza, mas também da Constituição de 1988. Empunhamos a Carta Magna porque ela reconhece nosso direito originário às terras que tradicionalmente ocupamos. A terra é nossa por direito – não invadimos território de ninguém. Confiamos no Supremo Tribunal Federal, que já declarou a inconstitucionalidade do marco temporal e agora tem o dever de proteger novamente nossos direitos.

As crises climática, ambiental, alimentar e civilizatória têm em nossos modos de vida, saberes e práticas tradicionais o caminho para a regeneração do planeta. Nossa ciência e sistema ancestral, expressa na agroecologia, nas economias indígenas, na gestão coletiva dos territórios, na nossa relação espiritual com a Mãe Natureza, preserva a biodiversidade, todas as formas de vida, incluindo os mananciais e sustenta sistemas alimentares saudáveis e equilibrados. Por isso, demandamos a retomada imediata das demarcações de todas as terras indígenas no Brasil, como uma política climática efetiva, e o financiamento direto para a proteção integral dos nossos territórios e nossos modos de vida.

Além disso, é importante mencionar que o lançamento da Comissão Internacional Indígena para a COP-30, durante o ATL 2025,  é a expressão concreta do reconhecimento de um movimento que há séculos resiste, que é a contribuição indígena para o equilíbrio da Terra. Mais do que um espaço institucional, ela é uma conquista histórica dos próprios povos indígenas que há anos cobram por mais reconhecimento e espaço para participação efetiva nos fóruns globais. Formada por organizações representativas de diversas regiões do mundo e articulações globais, a comissão nasce do acúmulo de lutas coletivas e do compromisso de garantir que, na COP-30, os povos originários não estejam apenas à margem, mas no centro do debate climático. A meta de credenciar mil lideranças indígenas na Zona Azul não é um número: é símbolo de um processo de retomada, de presença e de poder. Com sabedoria ancestral, articulação política e coragem histórica, o movimento indígena mostra ao mundo que não há saída para a crise climática sem a demarcação das terras indígenas. 

O movimento indígena celebra a criação da Comissão para a COP30 e a reconhece como uma espaço adicional de articulação global e espera que a Comissão fortaleça a incidência indígena na agenda climática, em consonância, parceria e solidariedade com outros espaços de enorme relevância como o Caucus Indígena, onde temos o orgulho de ter uma representação na Co-presidência em nome de Sineia Wapichana. Celebramos e reconhecemos a legitimidade do espaço do Caucus e contamos com a articulação entre os dois espaços de participação indígena para o avanço das demandas dos povos indígenas do mundo e para a concretização do tão almejado reconhecimento da autoridade indígena e a da importância da garantia de nossos direitos na luta contra as mudanças climáticas.

Nossa luta é pela Vida, pela Mãe Terra, pela Constituição e pelo futuro de toda a humanidade. 

Assinam a presente carta:

Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), formada pelas organizações regionais: 

Articulação dos povos indígenas da região Sudeste (Arpinsudeste)

Articulação dos Povos Indígenas da Região Sul (Arpinsul)

Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo (Apoinme)

Comissão Guarani Yvyrupa

Conselho do Povo Terena

Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab)

Grande Assembleia do Povo Guarani Kaiowá (Aty Guasu)


TV Movimento

Calor e Petróleo – Debate com Monica Seixas, Luiz Marques + convidadas

Debate sobre a emergência climática com a deputada estadual Monica Seixas ao lado do professor Luiz Marques e convidadas como Sâmia Bonfim, Luana Alves, Vivi Reis, Professor Josemar, Mariana Conti e Camila Valadão

Encruzilhadas da Esquerda: Lançamento da nova Revista Movimento em SP

Ao vivo do lançamento da nova Revista Movimento "Encruzilhadas da Esquerda: desafios e perspectivas" com Douglas Barros, professor e psicanalista, Pedro Serrano, sociólogo e da Executiva Nacional do MES-PSOL, e Camila Souza, socióloga e Editora da Revista Movimento

Balanço e perspectivas da esquerda após as eleições de 2024

A Fundação Lauro Campos e Marielle Franco debate o balanço e as perspectivas da esquerda após as eleições municipais, com a presidente da FLCMF, Luciana Genro, o professor de Filosofia da USP, Vladimir Safatle, e o professor de Relações Internacionais da UFABC, Gilberto Maringoni
Editorial
Israel Dutra | 09 abr 2025

A primeira crise da Era Trump II

As consequências da nova guerra tarifária de Trump que derrubou bolsas de valores por todo planeta
A primeira crise da Era Trump II
Edição Mensal
Capa da última edição da Revista Movimento
Revista Movimento nº 55-57
Nova edição da Revista Movimento debate as "Encruzilhadas da Esquerda: Desafios e Perspectivas"
Ler mais

Podcast Em Movimento

Colunistas

Ver todos

Parlamentares do Movimento Esquerda Socialista (PSOL)

Ver todos

Podcast Em Movimento

Capa da última edição da Revista Movimento
Nova edição da Revista Movimento debate as "Encruzilhadas da Esquerda: Desafios e Perspectivas"