Elite militar e bolsonarista no banco dos réus
Jair Bolsonaro e o núcleo duro do seu governo prestam depoimento ao STF em ação que investiga a tentativa de golpe de Estado
Foto: Alan Santos/PR
Na tarde desta segunda-feira (9), o Supremo Tribunal Federal iniciará os interrogatórios presenciais do que a Procuradoria-Geral da República classificou como o “núcleo crucial” da organização criminosa golpista que tentou sabotar a democracia brasileira. No centro do escândalo está o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), acompanhado de seus principais comparsas – todos figuras de peso da cúpula militar e ministerial de seu governo.
O ministro Alexandre de Moraes, relator do caso, conduzirá as oitivas que vão até sexta-feira (13), com segurança reforçada na sede do STF. Os réus estarão lado a lado na sala da Primeira Turma – um cenário que lembra um tribunal do júri e reforça o simbolismo do que está em jogo: a responsabilização de quem tentou destruir o Estado Democrático de Direito.
O primeiro a depor é Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro e agora delator. Mesmo tendo firmado acordo de colaboração premiada, Cid também foi denunciado. Segundo a PGR, ele atuava como o “mensageiro” de Bolsonaro, repassando ordens, coordenando ações ilegais, armazenando documentos golpistas em seu celular e tratando do plano “Punhal Verde e Amarelo”, que previa até assassinatos de autoridades como Lula e Alexandre de Moraes.
As acusações e o papel de cada golpista
Jair Bolsonaro
Líder da tentativa de golpe, o ex-presidente usou a máquina pública, a estrutura militar e a propaganda oficial para construir uma narrativa fraudulenta de que havia risco de fraude nas eleições. Editou o decreto que serviria de base para a ruptura, pressionou as Forças Armadas e interferiu em relatórios para embasar a tentativa de insurreição. A PGR afirma que ele sabia do plano para assassinar autoridades, como parte do projeto terrorista apelidado de “Punhal Verde e Amarelo”.
Alexandre Ramagem
Ex-diretor da Abin e atual deputado federal do PL, instrumentalizou o aparato de inteligência do Estado para fabricar mentiras sobre as urnas e organizar a estrutura da “Abin Paralela”, que atuava fora dos marcos legais em benefício da conspiração.
Almir Garnier Santos
Ex-comandante da Marinha, colocou a força naval à disposição do golpe em duas reuniões com Bolsonaro. Foi um dos primeiros a aderir abertamente à tentativa de ruptura democrática, assumindo o papel de militar golpista comprometido com a insurreição armada.
Anderson Torres
Ex-ministro da Justiça e ex-secretário de Segurança do DF, deixou de agir para evitar os ataques de 8 de janeiro e guardava em casa uma minuta de decreto de golpe. Tentou bloquear o voto no Nordeste com a PRF e distorceu relatórios da PF para dar aparência de fraude nas eleições.
Augusto Heleno
General da reserva e ex-ministro do GSI, ajudou a montar o discurso golpista e aparece como um dos mentores do gabinete do golpe. Em sua casa, foram encontradas anotações de como sabotar o TSE e planos para desacatar ordens do Judiciário.
Paulo Sérgio Nogueira
Ex-ministro da Defesa, participou de reuniões onde se articulava a adesão das Forças Armadas ao golpe. Endossou o decreto golpista e reforçou a narrativa contra as urnas junto a embaixadores. A PGR aponta que sua conduta escancarou o uso político das Forças Armadas.
Walter Braga Netto
General, ex-ministro e candidato a vice de Bolsonaro. Estava no centro das reuniões golpistas e, segundo a denúncia, financiou e coordenou planos para matar o presidente Lula, o vice Alckmin e o ministro Moraes. Seria o “coordenador do gabinete de crise” pós-golpe.
Roteiro do interrogatório
A Lei exige que o delator (Cid) seja ouvido primeiro, para garantir o direito de defesa dos demais. Depois, os réus prestam depoimento por ordem alfabética, e têm o direito de permanecer em silêncio – o que já é esperado por parte dos mais implicados. Os interrogatórios serão transmitidos pela TV Justiça, e a imprensa progressista acompanhará com lupa os desdobramentos.
Moraes impôs que os réus não podem se comunicar entre si, apesar de poderem se cumprimentar. A ordem serve para evitar a combinação de versões e faz parte das restrições que já vigoram desde a fase de investigação.
Os crimes atribuídos pelo Ministério Público
A Procuradoria-Geral da República denuncia o grupo por cinco crimes gravíssimos:
- Abolição violenta do Estado Democrático de Direito (pena de 4 a 8 anos)
- Golpe de Estado (pena de 4 a 12 anos)
- Organização criminosa (pena de 3 a 8 anos)
- Dano qualificado ao patrimônio da União (pena de 6 meses a 3 anos)
- Deterioração de patrimônio tombado (pena de 1 a 3 anos)
Golpe frustrado, mas não esquecido
O que está em curso no STF não é apenas um julgamento penal – é a resposta institucional contra a maior tentativa de ruptura democrática desde a redemocratização. Bolsonaro e seus aliados militarizaram a política, instrumentalizaram a mentira e chegaram ao ponto de planejar mortes de autoridades públicas. Cabe agora à Justiça confirmar:sem anistia.