Manifesto em defesa do piso constitucional da educação!
Contra os ataques ao piso constitucional da educação e ao princípio da manutenção e desenvolvimento do ensino!
O manifesto abaixo foi lançado por intelectuais, educadores, parlamentares, sindicatos e movimentos sociais, entre outros, contra o artigo 65 da Medida Provisória nº 1.303/2025, que ataca o financiamento da educação pública. Confira abaixo e assine!
MANIFESTO CONTRA O ATAQUE AO PISO CONSTITUCIONAL DA EDUCAÇÃO E AO PRINCÍPIO DA MANUTENÇÃO E DESENVOLVIMENTO DO ENSINO.
(pela supressão do art. 65 da MP nº 1.303/2025)
Nós, educadores, estudantes, pesquisadores, parlamentares, entidades sindicais, movimentos sociais, organizações da sociedade civil, comunicadores populares e todas as pessoas comprometidas com o direito à educação pública, gratuita, inclusiva e de qualidade, denunciamos com veemência o ataque estrutural ao financiamento da educação promovido pelo artigo 65 da Medida Provisória nº 1.303/2025.
A medida altera o artigo 70 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), incluindo entre as despesas passíveis de serem contabilizadas como Manutenção e Desenvolvimento do Ensino (MDE) a “concessão de bolsas de estudo a alunos de escolas públicas e privadas” e o “incentivo financeiro-educacional, na modalidade de poupança, destinado à permanência e à conclusão escolar de estudantes do ensino médio público”. Essa redação foi construída para permitir que os valores transferidos a estudantes pelo programa Pé-de-Meia — política de assistência estudantil criada em 2023 — sejam abatidos do piso constitucional que obriga a União a aplicar, no mínimo, 18% da receita líquida de impostos em educação pública. Na prática, isso equivale a uma redução direta e permanente do patamar mínimo de financiamento da educação pública federal.
A manobra tem consequências devastadoras. Ao flexibilizar o conceito legal de MDE, o governo abre uma brecha para a reclassificação de despesas de natureza essencialmente assistencial e bolsas de estudo como se fossem investimento educacional. Isso distorce a função do piso constitucional e corrói sua base protetiva. O impacto estimado é de pelo menos R$ 12,5 bilhões por ano — cerca de 11,5% do piso constitucional da educação federal. Embora o governo projete um corte inicial de R$ 4,8 bilhões em 2026, a mudança legal rebaixa estruturalmente o piso e permite que perdas ainda maiores se consolidem nos anos seguintes. Não se trata de um ajuste pontual, mas de uma alteração permanente na lógica de financiamento da educação pública.
Além disso, o impacto vai muito além do Pé-de-Meia. Ao modificar a LDB, norma de abrangência nacional, a MP autoriza que estados e municípios sigam a mesma lógica, passando a incluir programas assistenciais e de bolsas de estudos em estabelecimentos públicos e privados em seus próprios pisos constitucionais de 25% ou mais da receita. Trata-se de uma mudança estrutural que redireciona recursos da educação para formatos dispersos e privatizantes, corroendo o financiamento público universal previsto na Constituição. Desse modo, verbas hoje destinadas a salários docentes, formação continuada, material didático, manutenção de infraestrutura escolar, pesquisa e construção de escolas e universidades podem ser trocadas por transferências condicionadas, parcerias com a rede privada, vouchers, compra de vagas e demais mecanismos de privatização e financeirização.
A justificativa apresentada pelo governo — de que a medida compensaria a queda de arrecadação provocada pela rejeição, pelo Congresso, da elevação das alíquotas do IOF — é tecnicamente frágil e politicamente inaceitável. A renúncia de IOF refere-se a ajustes bimestrais de arrecadação para cumprimento de metas fiscais de resultado primário, conforme previsto na Lei de Responsabilidade Fiscal, e não tem qualquer relação estrutural com o piso da educação. A mudança na LDB, ao contrário, é permanente e de longo alcance. Trata-se, portanto, de uma substituição do investimento público direto por transferências individualizadas, incompatíveis com a destinação obrigatória do piso estabelecida na Constituição. O resultado é o enfraquecimento da capacidade do Estado de universalizar o acesso, garantir a permanência e elevar a qualidade da educação pública como política pública universal.
A origem desse ataque, longe de ser episódica ou derivada de um problema pontual de arrecadação, está nas contradições estruturais do Novo Arcabouço Fiscal (Lei Complementar nº 200/2023), que limita o crescimento real das despesas primárias a 70% da variação da receita. Como os pisos de saúde e educação devem crescer 100% com a receita, cria-se um conflito permanente entre o cumprimento do teto e a garantia dos pisos. A resposta do governo tem sido buscar brechas legais para contornar os pisos — e o artigo 65 da MP nº 1.303/2025 é o primeiro movimento de flexibilização formalizada dessa lógica. Se não for barrado, será apenas o início de uma ofensiva mais ampla de desmonte por dentro do financiamento educacional público.
Do ponto de vista constitucional, a medida ainda apresenta grave vício: viola o artigo 213, §1º, da Constituição Federal, que proíbe a destinação de recursos públicos para a rede privada de ensino, salvo situações excepcionais e transitórias, quando não houver vaga na rede pública. Ao autorizar o financiamento de bolsas para estudantes de instituições privadas como despesa regular dentro do piso da educação pública, a MP generaliza a exceção, rasgando um dos principais mecanismos de defesa da escola pública brasileira. A medida também fere o princípio da vedação ao retrocesso social, ao comprometer direitos e garantias já consolidados no campo do financiamento educacional.
Diante da gravidade desse cenário, exigimos a supressão integral do artigo 65 da MP nº 1.303/2025. Manifestamos total apoio à Emenda nº 195, da deputada Fernanda Melchionna (PSOL), à emenda apresentada pela senadora Professora Dorinha Seabra (União Brasil) e a todas as iniciativas legislativas que visem impedir essa ruptura. Mas reafirmamos: a mera defesa do piso atual é insuficiente. Diante das desigualdades e carências históricas da educação pública brasileira, é urgente ampliar o financiamento público estruturante e blindá-lo contra qualquer tentativa de flexibilização, desvinculação ou contabilidade criativa.
Conclamamos educadores, estudantes, pesquisadores, parlamentares, entidades sindicais, movimentos sociais, organizações da sociedade civil, comunicadores populares e todas as pessoas comprometidas com o direito à educação pública, gratuita, inclusiva e de qualidade a se mobilizarem contra esse ataque estrutural. É hora de defender a Constituição, a escola pública e o futuro do país diante do desmonte silencioso disfarçado de neutralidade fiscal.
Piso constitucional da educação não se relativiza. Cumpre-se. Defende-se. Amplia-se.
Pessoas que já assinam
Ricardo Antunes – Professor titular de Sociologia no Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Unicamp
Vladimir Safatle – Professor de Filosofia da USP
Luciana Genro – Presidenta da Fundação Lauro Campos e Marielle Franco e Deputada Estadual do PSOL RS
Luiza Erundina – Deputada Federal do PSOL SP
Sâmia Bomfim – Deputada Federal do PSOL SP
Fernanda Melchionna – Deputada Federal do PSOL RS
Glauber Braga – Deputado Federal do PSOL RJ
Milton Temer – Ex-deputado federal, atualmente filiado ao PSOL
Gustavo Seferian – Professor da Faculdade de Direito da UFMG, presidente do ANDES-SN
Denise Gentil – Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)
Carlos Eduardo Martins – Professor do Departamento de Ciência Política da UFRJ
Roberto Robaina – Vereador PSOL Porto Alegre/RS
Daniel Conceição – Professor do IPPUR/UFRJ
Rede Emancipa de Educação Popular
Observatório do Trabalho Docente da Faculdade de Educação da UNICAMP
Grupo de Estudo Trabalho, Saúde e Subjetividade – NETSS
Professor Josemar Carvalho – Deputado Estadual PSOL RJ
Camila Valadão – Deputada Estadual PSOL ES
Fábio Félix – Deputado Distrital do PSOL DF
Monica Seixas – Deputada Estadual do PSOL SP
David Deccache – Doutor em Economia pela UnB e Diretor do Instituto de Finanças Funcionais para o Desenvolvimento (IFFD)
Jones Manoel, Comunicador e Professor
Juan Pablo Painceira Paschôa – Banco Central do Brasil / SOAS – University of London
Fabiano Dalto – Professor de Economia, UFPR
Evaldo Piolli – Professor da Faculdade de Educação da Unicamp
Nima Spigolon – Professora da Faculdade de Educação da Unicamp
Carolina Catini – Professora da Faculdade de Educação da Unicamp
Vivi Reis – Vereadora PSOL Belém/PA e Executiva Nacional do PSOL
Mariana Conti – Vereadora PSOL Campinas/SP
Bruna Biondi – Vereadora PSOL São Caetano/SP
Alice Carvalho – Vereadora PSOL Santa Maria/RS
Professora Angela – Vereadora PSOL Curitiba/PR
Leandro Sartori – Vereador PSOL Itapira/SP
Maria Lúcia Lopes da Silva – Professora da UnB e Diretoria do ANDES-SN
Annie Schmaltz Hsiou – Professora da FFCLRP/USP e Diretoria do ANDES-SN
Israel Dutra – Executiva Nacional do PSOL
Mariana Riscali – Diretora Executiva da Fundação Lauro Campos e Marielle Franco
Bruno Magalhães – Editor da Revista Movimento
Camila Souza Menezes – Editora da Revista Movimento
Danilo Serafim – Coordenação Nacional da TLS e Executiva CSP/CONLUTAS
Paulo Passarinho – Economista (UFRJ), ex-presidente do Corecon-RJ
Sandro Pimentel – Coordenação Nacional da FASUBRA
Karol Biblio – Coordenação Nacional da FASUBRA
Sara Azevedo – Coordenação Nacional da TLS
João Telésforo – Doutor em Direito Econômico e Financeiro (USP)
Moacyr Américo – Coordenação da TLS e da Intersindical
Ítalo Pires Aguiar – Coordenação Nacional da TLS e advogado do SEPE/RJ
Márcio Vargas – Coordenação Nacional da TLS e oposição no Sindsprev/SC
Ronas Mendes Filho – Coordenação Nacional da TLS e Sindicato dos Metroviários/RS
Etevaldo Teixeira – Coordenação Nacional da TLS
Marcelo Santanna – Secretário de Finanças do SEPE/RJ
Felipe Duque – Direção do SEPE/RJ
Rosimar Pinto – Coordenadora Geral do SEPE/RJ
Aline Couto – Secretária de Imprensa do SEPE/RJ
Heloise Rocha – Coordenação Geral do Sinttep Regional Oeste
Poliana Nascimento – Secretária de Política Sindical da APEOESP
Paulo Neves – Secretário de Formação Adjunto da APEOESP
Eliane Garcia – Diretora da APEOESP
Luiz Horta – Diretor da APEOESP
José de Jesus – Diretor da APEOESP
Zeza Gomes – Diretora da APEOESP
Geraldo César – Diretor da APEOESP
Rita Diniz – Diretora da APEOESP
Rosane de Matos – Diretora da APEOESP
Mario Costa de Paiva Guimarães Júnior – Coordenador de Saúde e Hospitais Universitários da FASUBRA
Líbia Aquino – Rede Emancipa RS
Ana Laura Oliveira – Coordenação Nacional da Rede Emancipa / Emancipa Axé
Vanderleia Aguiar – Rede Emancipa RJ
Tarsila Amoras – Rede Emancipa DF
Rodrigo Nickel – Rede Emancipa RS
Júlio Pontes – Rede Emancipa RN
Elizangela Tiago da Maia – FETEMS/MS
João Pedro de Paula – Diretor da Executiva da UNE
Renata Moara – Diretora de Meio Ambiente da UNE
Ana Paula Santos – Diretora de Universidades Públicas da UNE
Manu Cavalcanti – Diretora da UBES
Rosa Baptista – Diretora do DCE Livre da USP
Davi Lima – Coordenador do DCE da UNICAMP
Thayssa Oliveira – Secretária Geral do DCE da UFABC
Brendo Adryan – Coordenador Geral do DCE da PUC/RJ
Fernanda Torrini – Coordenadora do DCE do IBMR
Mi de Souza Loureiro – Presidente da Associação Gonçalense de Estudantes
Maraya Melo – Diretora do DCE da UFC
Maktus Fabiano – Coordenador Geral do DCE da UnB
Matheus Vasconcelos – Coordenador Geral do DCE da UFAL
Igor Bastos – Coordenador Geral do DCE da UFF
João Victor Ferro – Vice-presidente da UEE/RN
João Ricardo – Coordenador do DCE da UFPR
Malu Martins – Coordenadora Geral do DCE da UEPG
Marcus Vinicius – Coordenador da Executiva Nacional de Estudantes de Serviço Social
Sara Soares – Coordenadora do DA da Faculdade de Ciências Econômicas da UFMG