Eleição na Nigéria: entre o desencanto e a esperança
As eleições recentes demonstraram um espaço à esquerda importante no país africano.
Foto: GPA Photo Archive
A eleição presidencial de 25 de fevereiro na Nigéria está dando lugar ao desencanto porque o candidato do governo, Bola Tinubu, venceu. A oposição está denunciando uma fraude maciça em uma eleição particularmente caótica. Mas também esperança, porque milhões de jovens aproveitaram a candidatura de Peter Obi para expressar seu desejo de mudança.
Bola Tinubu, da governante APC, foi declarado vencedor com mais de 36% dos votos à frente de Atiku Abubakar, do PDP (29%) e Peter Obi, do Partido Trabalhista (25,4%). Apesar dos nove milhões de novos eleitores, incluindo quase sete milhões de jovens, a abstenção continua elevada (73%).
Confusão
As desastrosas condições de votação lançam dúvidas sobre a seriedade da eleição. A oposição contestou os resultados e apresentou contestações legais.
A Comissão Nacional Eleitoral Independente (INEC) havia declarado que a votação de 25 de fevereiro seria impecável. Em um país onde a fraude eleitoral é comum, o uso de equipamentos sofisticados deveria garantir a imparcialidade do voto. Para este fim, a INEC havia implantado o BVAS (Sistema Bimodal de Credenciamento Eleitoral) em todas as 176 000 seções eleitorais, permitindo uma dupla verificação de impressões digitais e rostos. Os resultados de cada mesa de votação deveriam ser centralizados via Internet nos servidores da INEC. A ideia era, portanto, evitar a entrada manual de resultados, uma fonte potencial de fraude.
Entretanto, a realidade era bem diferente. Além do fato de que o BVAS às vezes tinha dificuldade em reconhecer os eleitores, e alguns não podiam votar, não era possível enviar os resultados via Internet. Os resultados eram inseridos manualmente e centralizados em diferentes níveis antes de serem enviados à sede do INEC. Se Abubakar e Obi não apresentarem provas de adulteração, tal confusão só pode alimentar as suspeitas de fraude.
Clientelismo
Muitos questionaram a vitória do candidato da APC, quando o legado do ex-presidente Buhari é catastrófico. Como um político inteligente, Tinubu não hesitou em se distanciar das políticas de seu antecessor. Ele se deu ao luxo de criticar algumas das medidas mais impopulares, como a mudança de moeda, que levou a uma falta de liquidez em todo o país. Suas declarações foram amplamente noticiadas, pois ele tinha uma forte presença na mídia graças a sua fortuna pessoal.
Ele também aproveitou a divisão no campo do seu principal oponente Abubakar. De fato, cinco governadores do PDP se recusaram a apoiar seu candidato e até mesmo um, o do Estado de Rivers, fez campanha por Tinubu.
Sob o slogan iorubá ‘Emi Lokan’ (‘É a minha vez’), Tinubu se referiu ao seu papel de criador de reis, quando conseguiu que Buhari fosse eleito duas vezes através de seu controle dos governadores da APC nos vários estados da Nigéria. É difícil imaginar que ‘É a minha vez’ seja muito mobilizador, exceto no contexto do patrocínio eleitoral. Assim, qualquer um que esteja remotamente dependente de Tinubu, da APC ou dos governadores dos estados, tem a esperança de que será “sua vez” de se beneficiar das rendas do país.
Perspectiva
Omoyele Sowore, jornalista e ativista dos direitos humanos apoiado pela esquerda radical, obteve apenas metade dos votos, cerca de 15.000, em comparação com as eleições de 2019. A maior parte dos votos para a mudança foi para Peter Obi, do Partido Trabalhista, porque ele não conseguiu a indicação do PDP. Jogando em seu histórico como governador do estado de Anambra e sua suposta probidade, ele conseguiu ganhar milhões de votos, principalmente nas áreas urbanas, ganhando nas duas maiores cidades do país – Abuja e Lagos. A campanha muito ativa de Peter Obi capitalizou a grande luta juvenil contra a violência policial, liderada pela Campanha #EndSARS (End Special Anti-Robbery Squad).
Esta mobilização eleitoral é uma grande oportunidade para que os revolucionários construam uma força de mudança real no país. Especialmente porque as lutas dos trabalhadores são ativas, como a greve renovável dos trabalhadores no Estado de Abia.