França, 10 de setembro: construir um movimento de massa para romper com Macron e seu mundo
Uma onda de protestos tomou a França em resposta a nomeação Sébastien Lecornu, que se apresenta como exímio representante das políticas de Macron
Publicamos artigo recém escrito pelo dirigente francês da IV Internacional e editor da Inprecor, Antoine Larrache, sobre a onda de protestos que tomou a França no último dia 10 de setembro. Nos próximos dias 19 a 21 de setembro, em São Paulo, Antoine participará do Encontro Nacional do Movimento Esquerda Socialista.
A mobilização de 10 de setembro foi um sucesso. Um ponto de apoio para construir um movimento de massa por uma mudança radical na França.
Os meios de comunicação franceses e o governo vão fazer questão de minimizar o sucesso do dia, mas é um sucesso que mostra os recursos da classe trabalhadora da França. Segundo o Ministério do Interior, houve 430 ações (em comparação com as duas a três mil dos primeiros dias dos Coletes Amarelos), incluindo 157 bloqueios que mobilizaram 29 mil pessoas. Mas já se pode dizer, neste início da noite do dia 10, que 15 mil pessoas manifestaram em Bordeus, cerca de 30 mil em Toulouse (contra 120 mil no auge da mobilização sobre as aposentadorias), 600 em Belfort, 600 em Lisieux, pelo menos 200 em Angoulême, pelo menos 10 mil em Rennes e 5 mil em Brest. Em Paris, ocorreram várias ações: bloqueios de algumas portas de acesso a capital, concentrações na praça da République, na Gare du Nord, no Châtelet, na Place des Fêtes. Grande parte dos bloqueios parisienses foram desalojados pelo governo, que mobilizou 80.000 gendarmes e policiais, embora alguns piquetes, onde havia um número substancial de grevistas, tenham resistido. Em todos os lugares, destaca-se a presença de muitos jovens. Um total de 175 mil manifestantes (250 mil, segundo a CGT) foi anunciado por Retailleau (Ministro do Interior), que havia “previsto” 100 mil. À noite, assembleias gerais devem ser realizadas para discutir os próximos passos do movimento.
Um dia bem-sucedido
Pode-se dizer que, para um movimento meio-espontâneo, foi um grande sucesso. Ele foi iniciado por indivíduos e correntes muito variadas, depois os setores da esquerda radical se somaram (França Insubmissa e extrema esquerda), algumas federações dos sindicatos CGT e Solidaires e sindicatos locais…), enquanto as grandes confederações sindicais convocam uma jornada de greve para 18 de setembro. No final de agosto e início de setembro, assembleias reuniram centenas de pessoas, com a bandeira do “Fora Macron” e a rejeição da austeridade, especialmente após o anúncio da intenção de repetir o orçamento do ano passado, que terá consequências desastrosas para os serviços públicos e a Previdência Social, e de suprimir dois feriados. Nas manifestações, essas bandeiras se juntaram com à rejeição da extrema direita, da recusa do aumento dos orçamentos militares e à solidariedade com a Palestina.
O governo se deu um verdadeiro tiro no pé na segunda-feira, 8 de setembro, quando o primeiro-ministro Bayrou solicitou um voto de confiança da Assembleia Nacional, que o rejeitou, com apenas 194 votos a favor e 384 votos contra. A nomeação pelo presidente Macron do Ministro da Defesa, Lecornu, para o cargo de primeiro-ministro na terça-feira, 9 de setembro, soa tanto como uma provocação quanto como uma admissão de imensa fraqueza. É uma provocação porque, como se pode nomear para esse cargo alguém que representa tanto a continuidade de todos os governos do Macron quanto a transferência dos orçamentos sociais para o militarismo? É também uma admissão de fraqueza que mostra o quanto Macron está com dificuldades para encontrar políticos dispostos a conduzir sua política.
As próximas semanas serão muito importantes, tudo pode acontecer. Se as classes populares e a esquerda não forem suficientemente determinadas, serão a direita e a extrema direita que sairão ganhando nesta sequência de meia vacância do poder. Talvez haja um acordo entre Le Pen e Macron para governar e acelerar a ofensiva antissocial e racista. Ou um “governo de técnicos” que tocará essa política com um RN (Reagrupamento Nacional) conivente e à espera da sua hora nas eleições presidenciais de 2027.
Construir um movimento para vencer
Por outro lado, o proletariado pode fazer valer seu peso na situação, desde que se posicione de forma ofensiva. Isso requer várias condições.
A primeira é não se contentar com um movimento minoritário e radical. É absolutamente necessário construir o movimento: nos próximos dias, multiplicar a divulgação nos serviços, oficinas, etc., a distribuição de panfletos, a preparação de uma greve em massa. O dia 18 pode permitir dar um passo em direção a uma greve geral contra a política do governo.
A segunda é ter objetivos claros, palavras de ordem que respondam à situação econômica, social e aos desafios atuais: revogar a dívida, aumentar os salários em 400 euros, mais dinheiro para os serviços públicos, voltar à aposentadoria aos 60 anos, proibir demissões, restabelecer os direitos dos desempregados, garantir a liberdade de circulação e de instalação e uma verdadeira igualdade aos estrangeiros, por fim às políticas belicistas e, em particular, a cumplicidade com o genocídio na Palestina.
A terceira é responder à questão do poder. Não basta livrar-se de Bayrou e Lecornu, é o Macron que tem de sair. Isto não pode acontecer no âmbito das instituições atuais, que são antidemocráticas e falharam. É necessário um governo de ruptura, um governo dos trabalhadores, de suas organizações, dos sindicatos e dos partidos de esquerda, para iniciar uma política de ruptura radical com a ordem existente.
É isso que os militantes anticapitalistas defenderão neste movimento. Através dos seus jornais, panfletos e intervenções nas assembleias. Os militantes devem defender a unidade do movimento – ou seja, de toda a esquerda social e política, da base ao topo –, a sua construção com base em objetivos concretos, tanto em termos de reivindicações como de construção democrática e militante (assembleias gerais, piquetes de greve, divulgações…) e uma orientação que permita se preparar para o confronto com uma classe dominante que não recuará diante de nada senão uma mobilização massiva e duradoura. Alguns setores burgueses já veem a extrema direita e a repressão como um recurso contra o movimento social. É preciso vencer para evitar uma radicalização dos ataques antissociais, racistas e belicosos, e para romper com o capitalismo neoliberal.