Depois de Davos e Rio das Pedras, o crime de Brumadinho

Tragédia é resultado de lógica da economia nacional que põe lucros de empresas acima da vida dos brasileiros.

Israel Dutra e Thiago Aguiar 28 jan 2019, 16:37

A agitada semana que passou foi de crise para o governo. Ao completar um mês à frente do Planalto, Bolsonaro se depara com fortes contradições, após retornar da Suíça, onde participou do Fórum Econômico Mundial. Além de Davos, a prisão de milicianos da localidade de Rio das Pedras no Rio de Janeiro aqueceram ainda mais a desconfiança sobre a rede de negócios ilícitos de seu filho, senador eleito Flávio Bolsonaro, que começou com o laranja Queiroz e parece chegar nas milícias cariocas. A tragédia derivada do crime ambiental em Brumadinho, Minas Gerais, selou a semana do país, com chocantes cenas, centenas de desaparecidos e dezenas de mortos, muitos ainda não identificados, graças à relação promíscua do poder público com as grandes mineradoras como a Vale.

Num momento em que se revelam mais notícias das relações da família Bolsonaro com as milícias e se agrava a crise envolvendo Flávio, como atestou a revista Veja da semana, uma tragédia se abate no país.

O crime de Brumadinho

Quando fechávamos o texto, o número de óbitos confirmados chegava a 58 e, tragicamente, não parava de crescer. Ainda são mais de 300 desparecidos, com informações desencontradas. A dor das famílias é terrível. A grande maioria dos envolvidos são trabalhadores efetivos e terceirizados da Vale S.A.. A ruptura da barragem, na tarde de 25 de setembro, na mina do Feijão no interior de Brumadinho, repetiu tragicamente o crime de Mariana. Há três anos, outra barragem era rompida, com enredo parecido, num dos maiores crimes ambientais da história de nosso país.

Não é coincidência que novamente o principal autor de tal crime social e ambiental seja o mesmo: a Vale. A empresa, que foi privatizada durante o governo FHC a preço de banana, transformou-se em uma das principais vilãs brasileiras quando o assunto é crime ambiental e social. Embora tal resultado pós privatização fosse mais do que previsível, os custos já são altos demais para toda a população brasileira.

Ao ser transferida para a iniciativa privada, a Vale passa a seguir o script das grandes empresas capitalistas, que em seu caótico funcionamento necessita colocar seus lucros acima de tudo, desde o meio ambiente até a vida das pessoas. Essa necessidade por parte do capital é denunciada por todas as comunidades diretamente atingidas, que sabem que suas vidas não valem nada diante dos lucros exorbitantes das mineradoras.

Para garantir tais lucros, e principalmente a impunidade frente a seus crimes, é necessária uma relação orgânica e que beira a promiscuidade com os governos vigentes. Em Minas Gerais esta relação está escancarada e se dá sem nenhuma vergonha. Desde os governos do PSDB até o último governo de Fernando Pimentel (PT), todos sem exceção atuaram como gerentes dos interesses das grandes mineradoras em seu caminho de devastação.

O governo de Fernando Pimentel (PT), aliás, mesmo tendo passado pelo crime social e ambiental que foi Mariana, atuou efetivamente para a flexibilização da legislação ambiental garantindo a ampliação desenfreada da exploração de minas em todo o estado. Já o governador Zema, recentemente empossado, manifestou em campanha e mesmo depois de sua vitória, querer seguir o mesmo caminho. Em janeiro, chegou a se reunir com a Samarco em aceno para o retorno das atividades da empresa em Mariana e dois dias antes da tragédia reuniu com outra empresa que atua em Brumadinho para garantir a expansão das atividades de mineração na cidade.

Porém, não são apenas os governos locais os responsáveis pela carta branca dada à Vale e outras mineradoras para destruir. O governo Bolsonaro já se manifestou diversas vezes sobre suas intenções e de seus aliados em esvaziar os órgãos de licença ambiental. A própria política de não demarcação de terras indígenas aparece no mesmo terreno de liberação para a exploração predatória do capital sobre a natureza. Além disso, a presença de Ricardo Salles no ministério do Meio Ambiente, mesmo após condenação em São Paulo por beneficiar mineradoras paulistas, é inaceitável.

Deve ser também rejeitada pela população as ações teatrais promovidas pelo governo tentando esconder suas culpas e da Vale com este crime. É necessário valorizar o papel solidário de socorristas, psicólogos, assistentes sociais e diversos outros profissionais que se deslocaram inclusive de outros estados para ajudar as vítimas e suas famílias em Brumadinho. Assim como aconteceu em Mariana, a organização da sociedade civil a fim de ajudar as vítimas é uma demonstração de solidariedade e apreço pela vida. Não à toa ainda no primeiro dia após o acidente o governo precisou emitir comunicado afirmando que as doações que haviam chegado eram mais do que suficientes para atender ao desabrigados.

A vale e os governos são responsáveis

Tais demonstrações de solidariedade reforçam a importância da organização popular para exigir justiça para as vítimas, suas famílias e o meio ambiente. Uma nova Mariana em termos de tragédia social e ambiental infelizmente acabou acontecendo apesar de todos os avisos. Não pode ser repetir em termos da impunidade. Neste novo regime mais autoritário e reacionário que tenta se estabelecer no Brasil e no mundo, a luta por justiça em Brumadinho toma um papel central.

A punição para a Vale e os demais responsáveis pela morte de centenas de pessoas e de ecossistemas completos deve estar na agenda dos setores democráticos como mais uma barreira contra o avanço do conservadorismo que está submetido ao lucro das grandes empresas. Nós do PSOL temos a tarefa de atuar ombro a ombro com as famílias das vítimas e com os trabalhadores para exigir tanto justiça como uma legislação mais dura sobre as licenças ambientais. Além disso, deve estar na nossa pauta a revisão geral de todas as barragens de rejeitos do estado.

Por fim, nossos esforços também devem localizar Brumadinho em um contexto mais geral da luta contra o capital aliado ao reacionarismo que matou Marielle, impede a elucidação deste crime e na última semana fez parte do processo de auto exilio de Jean Wyllys. O Papel do PSOL deve ser o de estimular e organizar a resistência do povo. Eis o desafio para encarar Brumadinho.


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