Construir a oposição para resistir à ofensiva contra o povo

O governo de Jair Bolsonaro completa seus primeiros dois meses. Apresentamos as avaliações iniciais da Coordenação Nacional do MES a respeito.

Coordenação Nacional do MES 21 fev 2019, 23:38

O novo governo completa seus primeiros dois meses marcado por desencontros no seu núcleo dirigente e por uma presença crescente dos militares no controle dos postos-chave. Discutimos aqui impressões iniciais sobre os primeiros momentos de Jair Bolsonaro à frente da presidência, balizados pelos documentos que publicamos no final de 2018. A eleição de Bolsonaro consagra uma mudança de regime, no qual a situação política é reacionária e defensiva, apesar de sua permanente instabilidade. Os primeiros meses do ano refletiram episódios que denotam a enorme crise social, como o crime de Brumadinho e a tragédia dos adolescentes no Centro de Treinamento do Flamengo, deixando nítido um mal-estar em amplas camadas do movimento de massas.

Iniciamos com uma importante definição, ainda provisória: há unidade da burguesia na reforma da previdência e nas privatizações, mas divisão na política. A economia acaba tendo peso maior e Bolsonaro tem que aplicar o plano para se manter como chefe do comitê executivo burguês. Ao aplicar seus planos, no entanto, ele inviabiliza a constituição de um movimento de massas de extrema direita, que seja a expressão da classe média e setores pauperizados que deram base para sua ascensão eleitoral, uma vez que estes também são alvos da política ultraliberal de Paulo Guedes.

Por conta disso, não vemos a hipótese, hoje, de emergir um movimento de massas com base em traços fascistas, ainda que o peso dos militares e de sua tutela sobre o governo indiquem a possibilidade de um regime mais autoritário. A própria disputa à sucessão de Bebianno, na qual mais um general – Floriano Peixoto – assumiu cargo no primeiro escalão, indica que os militares buscam ainda mais força no centro do governo, tentando se credenciar como fiadores da unidade ao redor do ajuste e da estabilidade. A exposição ao caso das candidaturas laranjas do PSL, o escândalo dos depósitos e da relação com milicianos de Fabrício Queiroz, ex-assessor de Flávio Bolsonaro, também expõem Bolsonaro diante de sua base, mobilizada pelo discurso do combate à corrupção e à violência.

O poder legislativo segue tendo força, apesar da impopularidade. É preciso estudar a dinâmica que vai cumprir o Poder Judiciário, seja no STF ou nas instâncias inferiores, bem como qual cobrança haverá sobre Sérgio Moro no Ministério da Justiça. O silencio do ministro sobre o caso Queiroz e das candidaturas laranjas expõe suas contradições, ampliadas nos últimos dias com a publicação do projeto criminal capitaneado pelo ministro, abrindo espaço para a ampliação da truculência policial e das mortes em ações de agentes públicos. As diferenças de discurso entre o Moro juiz e o Moro ministro de Bolsonaro ficaram claras com sua recente declaração de que o “caixa 2” não seria tão grave contra casos de corrupção.

Ao mesmo tempo em que as contradições do governo começam a revelar-se, a batalha da reforma da previdência deve, paulatinamente, ampliar o descontentamento popular com o governo, frustrando expectativa de mudanças de parte do eleitorado que apostou em Bolsonaro.

Neste documento, apontamos alguns elementos que marcam a situação política para armar nossa intervenção.


O despreparo do governo é sua face visível

Começamos com a definição da vitória eleitoral de Bolsonaro como resultado da crise do regime: a “crise orgânica”, com a ação consciente de manipulações de várias ordens, tornou possível a vitória de uma coalizão “outsider”, composta, entre outros, por deputados do baixo clero, lideranças religiosas e empresariais poderosas, pastores desqualificados, milicianos, policiais e militares, que se associou ao grande capital para vencer e governar. Este é o aspecto aparentemente “antissistêmico” de Bolsonaro, que de fato deslocou parte do establishment anterior.

Bolsonaro se notabilizou por construir narrativas nas redes sociais, exagerando polarizações, com um discurso agressivo e superficial. Como caracterizamos anteriormente, sua vitória eleitoral também teve como marca a ausência de debates, a falta de discussão sobre projeto e uma linha assentada em uma polarização genérica e negativa “contra tudo que está aí”. Além de ser uma estratégia política, tal postura denotava um aspecto fundamental: a falta de preparo de Bolsonaro e de seu entorno mais imediato para a gestão de um país continental, eivado de gigantescas contradições e complexidades.

Ausente em boa parte das primeiras movimentações por sua internação hospitalar, Bolsonaro, que passou 18 dias internado, operou uma série de desmentidos, nos quais combinou bravatas de seus filhos nas redes sociais com choques de opinião entre os ministros e notáveis como o vice-presidente Mourão. Sua aparição em Davos foi patética, com um discurso breve e um anúncio genérico de que se alinharia ao trumpismo. A visita da delegação de deputados do PSL à China foi outra face do ridículo extremo, rendendo troca de farpas com o guru Olavo de Carvalho, que qualificou tal delegação de “idiotas e caipiras”.

Os setores que se acomodaram no governo operam em quatro núcleos: 1) no âmbito da extrema-direita, o clã Bolsonaro e os ministros “olavistas”, como Ernesto Araújo, Damares Alvez e Ricardo Vélez; 2) o núcleo do comando econômico, de viés ultraliberal, de Paulo Guedes e seus discípulos formados pelas ideias da Escola de Chicago; 3) os militares, que como mencionamos mais adiante, ganharam presença estratégica no novo governo, ocupando posições fundamentais no primeiro e segundo escalões; 4) como parte da composição do governo, ainda há o ministro Sergio Moro, o mais popular dos agentes políticos, que propôs um plano “anticrime” (que, na verdade, é um plano antipovo) e deve enfrentar um cenário muito complicado nas ações relacionadas ao crime organizado. A bancada legislativa do PSL, por sua vez, oscila sobretudo entre os dois primeiros núcleos.

A crise aberta com a possível queda de Gustavo Bebianno – presidente interino do PSL durante a campanha eleitoral de Bolsonaro, da qual foi coordenador político da campanha e estrategista – é a ilustração concentrada do despreparo que a atual coalizão de governo carrega.  Se, no caso do ministro da secretaria-geral da presidência demissionário, o pivô foi o filho Carlos, a outra grande crise do governo tem em Flávio Bolsonaro seu agente ativo. Os gastos e depósitos do motorista Fabrício Queiroz desnudaram irregularidades da família Bolsonaro em sua ação parlamentar e, mais grave, abriram caminho para trazer à tona suas relações com as milícias cariocas. O caso Queiroz é o mais grave indicativo do amálgama de elementos reacionários que compõem o bolsonarismo, com as milícias aparecendo como pilar ilegal e armado, atuando especialmente num estado em decomposição social como o Rio de Janeiro.

A eleição da chefia das casas legislativas deve ser analisada com esse pano de fundo em vista. A vitória da operação do DEM (Onyx Lorenzoni, Rodrigo Maia e Davi Alcolumbre), no Senado e na Câmara, fortalece o Poder Legislativo e seus referentes para aprovar as reformas, deixando os núcleos mais governistas com a responsabilidade de buscar o Congresso para governar.

O despreparo é visto como marca para milhões de pessoas, formadores de opinião, toda a superestrutura jurídica e política, além da comunidade internacional. Isso gera desconfiança e fragiliza a já pequena capacidade de gestão de Bolsonaro e de seu partido neófito, o PSL. Para consolidar o regime mais regressivo, de guerra social contra o povo e restrição de liberdades democráticas, com eixo no ataque à esquerda, Bolsonaro precisaria de maior coesão política e de choque em seu movimento. Seria necessário um movimento político de massas, algo que, por hoje, a extrema-direita não logra unificar sob uma bandeira. A tendência contrarrestante do despreparo governamental e da insuficiência de seus quadros é o fortalecimento dos militares, que, com a ascensão do bolsonarismo, tomaram postos-chave no controle do Poder Executivo e das empresas estratégicas.


A tutela dos militares

À medida que o governo tem se mostrado frágil, cresce a tutela dos militares. São cerca de 45 deles nos primeiros escalões: 7 ministérios, como Secretaria-geral, Minas e Energia, Ciência e Tecnologia, Transparência e a pasta mais importante na articulação governamental de Bolsonaro – o GSI (Gabinete de Segurança Institucional), chefiado pelo general Augusto Heleno, com Villas Bôas como assessor especial.  No âmbito da chefia de empresas estatais e conselhos de administração, são vinte indicações militares. O INCRA ficou o com o General João Jesus Correa. O porta-voz da presidência é o General Octávio Rêgo Barros.

Os militares no Brasil ficaram à sombra do poder durante a Nova República, na qual a falta de uma justiça de transição deixou livres os antigos entulhos da ditadura. Não houve punição para os torturadores e generais que comandaram o processo autoritário. As estruturas militares, como o SNI, as polícias militares e os tribunais militares ficaram intactos.

Durante o governo Lula, a ocupação do Haiti – lamentavelmente apoiada por setores que hoje se dizem de esquerda – trouxe de volta os militares à vida pública cotidiana. Não é uma coincidência que o general Heleno tenha encabeçado a missão brasileira – especializada na ocupação militar de favelas e grandes concentrações populares irregulares, posteriormente utilizada na intervenção no Rio de Janeiro – e agora tenha o papel central como dirigente da fração militar que tutela o governo e o regime.

Mourão tem-se diferenciado do setor mais celerado. Apareceu como “sensato” em temas polêmicos, como suas declarações sobre o exílio de Jean Wyllys e sobre o aborto. Ao que parece, os militares mostram interesses distintos em questões como as relações com Israel e com os países árabes, os vínculos econômicos com a China e outros temas de “interesse nacional”. Podemos definir o presente regime como uma democracia burguesa em crise, tutelada pelos militares, com fortes traços de autoritarismo institucional.

A violência política contra o povo e o ativismo crescem. O novo pacote que Sérgio Moro quer aprovar tem como elemento mais grave o fim das barreiras de controle institucional para a ação policial. Em outras palavras, é quase uma licença para matar, ampliando o genocídio da juventude da periferia, negra e pobre. A ação nas favelas, com a primeira chacina no Rio de Janeiro na semana passada, combina-se com maior violência no campo, contra indígenas, camponeses e ribeirinhos. A nomeação para a Secretaria de Assuntos Fundiários de Nabhan Garcia, chefe da UDR – agora beneficiada pelos intentos de liberalização do uso de armas no campo –, indica a senha para a ampliação da violência.

Um dos temas que devemos seguir é como se relaciona a base do bolsonarismo nas FFAA, nas polícias militares e civis. Este é o principal ativo para a construção de um movimento, militante e militar, de extrema-direita, com capacidade de mobilização de massas. O pacote de Moro, em que pese o apoio popular a medidas como a criminalização do Caixa 2 (agora separada da tramitação das outras medidas) amplia superpoderes para a polícia que mais mata e que mais morre no mundo. Os abusos policiais, da segurança pública e privada, são parâmetros que precisam ser contidos, mesmo na nova etapa do regime. Ganhar legalidade jurídica e legitimidade política para ampliar o extermínio da juventude pobre e negra é uma das batalhas que os setores da extrema-direita necessitam para avançar sua guerra de trincheiras. A naturalização de um crime bárbaro, como o estrangulamento à luz do dia de um jovem negro por um segurança de supermercado no Rio de Janeiro, é um dado alarmante. A resistência do movimento negro e de direitos humanos será uma constante necessária para denunciar diante da sociedade tais absurdos.  

O problema da violência urbana e do enfrentamento ao crime organizado, com as grandes máfias como o PCC e grupos regionais, é outro grave gargalo da situação. O cenário que se desenvolveu no Ceará durante o começo do ano, em represália ao endurecimento com os líderes das facções, gera um ambiente mais propício a soluções de força anunciadas contra o crime, mas que miram, ao final, as camadas populares e o ativismo, com uma parte nutrida da classe média e do povo, aplaudindo a chamada à “lei e ordem”.

Há outras notícias que apontam na direção do endurecimento do regime e na imposição de dificuldades para a organização da oposição, como a revelação da espionagem contra a CNBB; os rumores de endurecimento da lei antiterrorismo contra movimentos sociais; as propostas de militarização das escolas, como um projeto a serviço de avançar o poder da caserna na educação brasileira; a presença de assessores militares no Ministério da Educação para tutelar as universidades; etc.


O problema da relação de forças

A vitória de Bolsonaro foi uma derrota do povo no terreno político-eleitoral. No terreno social, as mobilizações pelo impeachment de Dilma e pela posse de Temer, na forma de golpe parlamentar, representaram a consolidação da ofensiva contra o movimento de massas. A polarização de 2017, com a greve geral de abril, não foi capaz de reverter a dinâmica, com o desmonte da segunda greve e a permanência de Temer no governo até o final, mesmo após as revelações da JBS e do esquema dos portos.

Como em toda derrota, há um custo alto para o movimento de massas e para sua vanguarda política organizada. Ainda que não tenha sido derrotada no terreno da luta de classes, a classe trabalhadora e o povo estão debilitados pela fraqueza de suas direções, pela aprovação da reforma trabalhista e pela precarização crescente do trabalho, com a tendência ao crescimento de novas formas de trabalho, como o Uber e os empregos sem direitos, como os oferecidos em empresas como Rappi e Glovo.

Assim, devemos definir que há um enfraquecimento objetivo da classe e confusão subjetiva – com centrais sindicais burocráticas e distantes da base, que talvez tenham que voltar a se mover, o que é útil para a resistência. No campo da esquerda da esquerda, há um sindicalismo ainda distante do povo e sem laços maiores, com importantes exceções, como os sindicatos da saúde do RS, de metalúrgicos de SJC e de servidores federais.

A aprovação da reforma trabalhista foi um ponto de inflexão na situação política, abrindo espaço para maiores ataques e retirada de direitos. O que prima não é a resistência do movimento operário e não há uma oposição política e social constituída. A aceitação, por parte dos trabalhadores da GM, do acordo imposto pela direção da montadora foi um sintoma dessa incapacidade de resistência.

Outro aspecto para medir a relação de forças é a política internacional. A pressão do imperialismo sobre a Venezuela, ainda que não se materialize por agora uma invasão militar, mostra um ponto de inflexão da direita na América Latina. O desastre que significou o governo de Maduro abriu caminho para um cerco da direita golpista, com Guaidó à cabeça e os governos de Bolsonaro e Duque, na Colômbia, tentando demonstrar servilismo para os interesses de Trump, gerando ainda mais polarização. O desfecho do impasse venezuelano, com um reforço da crise imigratória que já domina a situação nas regiões fronteiriças, deve levar ainda mais à direita o pêndulo imediato da luta de classes no continente.

Por outro lado, o modelo da extrema-direita de Steve Bannon, articulado pelo fórum de Foz de Iguaçu, não tem o caminho livre para impor seus planos. Há resistência. Os atos contra a reforma trabalhista na Hungria golpearam o governo de Orbán (ao qual Bolsonaro sempre refere como exemplo); governos, como os da Itália e da Turquia, também estão envolvidos em nuvens de instabilidade, à luz da dinâmica internacional da economia. Nenhum analista é capaz de prever quais são os rumos da economia no mundo: Lagarde indicou preocupação, quando falou que alguns fatores podem atrapalhar o crescimento, como a guerra comercial, a desaceleração da economia chinesa, os desacertos na política de juros e os efeitos incertos do Brexit.

Trump tampouco consegue impor sua hegemonia de forma plena. A crise política estadunidense ganhou novos contornos com a declaração de emergência para a construção do muro, medida que Trump força para levar a queda de braço com o Congresso e efetivar seu programa mais duro. Do ponto de vista da oposição ao trumpismo, o crescimento do apoio às ideias socialistas, visto no fortalecimento do DSA e de figuras como Ocasio, teve um novo impulso com o lançamento da plataforma de arrecadação de Bernie Sanders, que em pouquíssimo tempo mobilizou milhões em doações para sua nova campanha presidencial.

O governo Bolsonaro quer uma aproximação maior com Israel, também pela representação ideológica que igrejas neopentecostais fazem do Estado sionista. A operação oportunista que o governo fez para trazer o exército israelense para atuar em Brumadinho não obteve o efeito desejado, ficando muito aquém da pretendida idealização de Israel como parceiro prioritário do povo brasileiro. Tal como Trump, que também tem base de massas entre religiões fundamentalistas e neopentecostais, o plano de Bolsonaro envolve uma maior aproximação política e militar com Israel. A polêmica da transferência da sede da embaixada brasileira para Jerusalém, interditada por agora pelo protesto que recebeu dos países árabes, obedece a essa estratégia.

O Ministério Público também deve ser considerado na mudança do regime. Os mecanismos previstos nas propostas de Moro, que dão demasiados poderes aos juízes, a possibilidade de cada vez mais decisões casuístas, em longo prazo, atuam contra a esquerda e os movimentos sociais. O fechamento do regime também pode ser verificado quando as instâncias jurídicas se movem de forma absoluta, com a eliminação de fatores contrarrestantes ou constitucionais.

A instabilidade e as dificuldades também se encontram no terreno da economia, uma vez que os dados do crescimento de 2018 devem ficar abaixo do 1,5% esperado. As previsões para 2019, mesmo com a aprovação da reforma da previdência, também estão aquém dos sonhados 3% que alguns agentes financeiros chegaram a prospectar após a euforia das bolsas com a vitória do candidato do PSL em novembro passado. Alguns analistas já falam em crescimento abaixo dos 2% novamente em 2019, mostrando a dificuldade para reverter a estagnação.

Um governo a serviço dos ricos e poderosos

Os interesses do governo Bolsonaro estão ligados diretamente à reprodução dos privilégios de classe, com a desnacionalização da economia e a ampliação das taxas de exploração de milhões de brasileiras e brasileiros. Sua receita para o movimento de massas é direta: guerra social para impor o tripé do ultraliberalismo: redução de salários, cortes de gastos públicos e privatização do máximo de serviços públicos possível. Os aspectos ideológicos e o endurecimento do regime estão a serviço de impor essa política. Em outras palavras, é um governo sem limites para defender os interesses dos ricos e poderosos do país, em consonância com o rentismo e a especulação financeira internacional.

Para não deixar lugar a dúvidas, Bolsonaro promete intensificar a exploração patronal, num movimento aberto pela reforma trabalhista com Temer. Suas máximas – “Ou se tem emprego ou se tem direitos” e “É difícil ser patrão no Brasil” – deixam clara a orientação do governo. O que se ensaia é uma redução sem precedentes dos direitos do trabalho, talvez liquidando a própria Justiça do Trabalho, em busca da diminuição do chamado “custo Brasil” no linguajar da classe dominante.

A destruição das estatais é o objetivo de médio prazo do governo e seu núcleo econômico. As mudanças estratégicas no BNDES e nos dois bancos públicos – CEF e BB – reduzem a capacidade nacional de intervenção na economia, aceitando as premissas do cassino financeiro internacional e do capital transnacional.

Os grandes proprietários de terra – presentes de várias formas no governo, desde sua ala mais abertamente paramilitar, como a UDR, até sua representação mais institucional com a ministra Teresa Cristina – já começam um pesado ataque contra os pequenos camponeses, povos originários, indígenas, ribeirinhos e quilombolas. Além de validar o plantio em áreas embargadas e a atuação dentro das terras indígenas, as declarações do ministro Ricardo Salles falando que iria “facilitar” todo tipo de licenciamento soam como escárnio depois do ocorrido em Brumadinho. Não à toa o mesmo personagem atacou a honra de um lutador histórico do povo pobre brasileiro, Chico Mendes. A Amazônia será alvo da política predatória e destrutiva do conglomerado de interesses do governo Bolsonaro.

O plano de abertura de capital em áreas estratégicas está em curso: privatizações e desnacionalização por todo o lado, como foram a compra da divisão de jatos comerciais e a joint venture do cargueiro militar da Embraer pela Boeing; a entrega da Eletrobrás e dos campos do pré-sal; a abertura para o capital privado nas universidades, o que, para ser feito, precisa impor um ataque ao que os conservadores chamam de “marxismo cultural”, na verdade as conquistas democráticas da autonomia universitária.

Mesmo questões como a reintrodução do eletrochoque, o viés reacionário da nova política manicomial, ou as mudanças no marco legal do saneamento básico têm por detrás interesses muito concretos de conglomerados transnacionais.

As cenas do crime de Brumadinho são parte do avanço selvagem da mineração na acumulação capitalista. Seu impacto não é apenas ambiental e humano, como mostram as tragédias de Mariana e Brumadinho. As mudanças no Código da Mineração consolidam aspectos regressivos do ponto de vista econômico e compensações à sociedade bem menores do que as presentes em outros países, nos quais a taxação da mineração é bem maior. Ou seja, trata-se de uma atividade de grande lucratividade e com enormes custos humanos e ambientais.

Em resumo, este é um governo diretamente relacionado às grandes corporações, aos grandes proprietários de terra e aos interesses da finança transnacional.


A luta em defesa de direitos civis e democráticos causa fissuras na mídia, na opinião pública e mesmo na burguesia

Ainda que tenha unidade ao redor do ajuste e da perspectiva liberal de aprovação da reforma, a burguesia não tem unidade quanto ao projeto político capaz de viabilizar essas mudanças estruturais. A ruptura com o pacto social que sustentou a Nova República não condicionou uma ação homogênea dos setores majoritários da burguesia e dos aparelhos ideológicos de Estado diante do fenômeno Bolsonaro. Essa caracterização é fundamental para a ação política e para entender a dinâmica do que vem pela frente.

O exemplo mais gritante é o papel que a Rede Globo cumpre. Motivada não apenas por desavenças no terreno comercial, já que a coalizão de Bolsonaro tem clara preferência pela Record do Bispo Macedo e mesmo pelo SBT de Silvio Santos, a Globo diferencia-se em muitas coisas do governo e do novo regime. O traço fundamental é o peso que vem dando às lutas democráticas, o que combina seus interesses, a forma como precisa dialogar com avanços no movimento de massas e com a própria “opinião pública”, também composta por setores médios, artistas e intelectuais, que acabam por pautar a defesa de direitos das mulheres, de LGBTs e direitos humanos. Programas de ampla audiência, como os de Fernanda Lima ou Marcelo Adnet, são tomados por reação por parte dos bolsonaristas, numa imitação da postura do trumpismo contra parte das redes de televisão e da imprensa dos Estados Unidos.

A denúncia que a Globo, apelando para um setor democrático, fez contra as milícias foi decisiva para evitar que se isolasse o tema. Sobretudo no estado do Rio de Janeiro, entender essas contradições agora é crucial para aproveitar as brechas que se abrem na luta política e construir mesmo unidades de ação pontual, sem ilusões, contra os setores mais mafiosos e perigosos do aparelho repressivo de Estado.  No segundo turno de 2016, na capital carioca, um importante setor da imprensa, a Globo aí incluída, já denunciou as relações promíscuas entre Crivella, a Record e uma visão muito atrasada de gestão da sociedade.

No caso das milícias, a partir do relevo que ganhou com o assassinato de Marielle, entender que um setor da grande mídia, vinculado a frações da burguesia, não queira dar suporte a formas paramilitares da vida pública, é decisivo. Além do risco de um movimento de massas da extrema-direita, o problema mais grave da nova etapa política são os grupos milicianos, que chegamos a definir como embriões de certa “mexicanização” da política brasileira. O número de assassinatos políticos crescente contra lideranças do campo e da cidade e casos de violência, como temos assistido, só corroboram a importância de aproveitar tais contradições. A defesa de uma ampla unidade democrática para esclarecer o caso de Marielle, às vésperas de completar um ano de sua morte, é uma das agendas prioritárias para o progressismo no país.  

É preciso levar em conta, na outra ponta, o papel do jornalismo investigativo – veja-se como a Folha de São Paulo revelou o problema dos laranjas do PSL –, que ajuda a defender os espaços democráticos e as liberdades civis. Novamente, usando do exemplo de Trump e de governos autoritários como de Erdogan, o lugar que a imprensa ocupa, e mesmo a grande imprensa, para debilitar os planos mais duros da extrema-direita, é estratégico diante da situação política. O combate contra as fakenews deve envolver diversos atores. Com independência de classe, postulamos a ampla unidade democrática pontual para evitar retrocessos e visões bárbaras, como a dos arautos do criacionismo ou da visão de que a terra é plana, que colocam em risco conquistas elementares da revolução burguesa, como a defesa da ciência, do laicismo e da razão.

No âmbito da crise social, a unidade democrática visa evitar a naturalização de crimes bárbaros contra os direitos humanos, como o jovem negro que foi morto em pleno dia no supermercado Extra por um segurança particular, ou o indígena que teve seu braço decepado em São Carlos, cidade do interior de São Paulo. Alargar esses espaços de denúncia, sem nutrir ilusões pelos grandes meios empresariais de comunicação de massas, passa por compor uma ação política própria no terreno da comunicação, levando no limite a defesa da causa democrática.


Unidade entre a burguesia para aprovar a reforma da previdência e o ajuste

No plano econômico, a burguesia, encabeçada por Maia, seus partidos e os principais meios de comunicação têm como ordem unida aprovar a reforma da previdência, cortar gastos e aumentar a exploração do trabalho. A reforma da previdência é parte da guerra transnacional que os governos e grandes capitalistas querem impor aos povos. Nos últimos anos, houve duríssimas batalhas entre a classe trabalhadora e os governos que querem desmontar o sistema de proteção social construído ao longo do século XX.

No final de 2017, a Argentina viveu intensas jornadas contra a aprovação da reforma previdenciária: quase 300 mil pessoas cercaram a Praça de Maio nesta luta. Apesar de aprovada, o custo político foi o profundo declínio da popularidade, complicando os planos de Macri. Ou seja, o Fundo Monetário Internacional e as grandes consultorias do mercado financeiro sabem que “mexer na previdência” é uma das “reformas” que são difíceis de passar. Essa foi uma das marcas do governo Temer: acossado pela corrupção e pelo descontentamento popular, não pôde aprovar sua reforma.

A proposta que apresentou Bolsonaro é bastante mais dura que a de Temer. Feita sob medida para os banqueiros, tem como principais beneficiários os bancos e fundos de investimento que administram planos de pensão. Com a proposta de aumentar a idade mínima para 62 e 65 anos e com um período de transição curto, a reforma, se aprovada, obrigará os trabalhadores contribuir 40 anos para ter acesso ao benefício integral.

Além disso, Paulo Guedes é entusiasta do modelo previdenciário chileno, imposto por Pinochet, baseado na capitalização, ou seja, nos investimentos que os trabalhadores façam ao longo da vida e da rentabilidade dos fundos em que esta poupança esteja aplicada. Trata-se da financeirização dos direitos previdenciários, que estarão ameaçados caso os fundos quebrem ou tenham baixa rentabilidade. Não à toa, há um contingente de centenas de milhares de aposentados chilenos vivendo em condições de pobreza e miséria por não ter acesso à aposentadoria ou receber valores inferiores a sua subsistência. Na proposta enviada por Bolsonaro ao Congresso na quarta-feira 20/02, ainda não consta o modelo de capitalização, que será apresentado posteriormente, combinado a uma nova rodada de destruição de direitos trabalhistas, impondo à classe trabalhadora – e, sobretudo, à juventude – a “carteira verde e amarela”, que nada mais é do que um contrato de trabalho sem direito a férias, décimo terceiro salário, fundo de garantia, multa em caso de demissão e direito a aposentadoria do INSS. Esta proposta, se apresentada, representará o maior ataque aos direitos dos trabalhadores brasileiros na história.

A reforma da previdência de Bolsonaro e Guedes é parte de um ajuste estrutural mais amplo do Estado brasileiro, envolvendo também governados estaduais e prefeituras. O funcionalismo público e seus supostos “privilégios” são apresentados como bode expiatório para um ataque aos direitos de toda a classe trabalhadora e o povo. Este é, aliás, o sentido do ajuste em andamento promovido pelos governos tucanos nos governos municipais de São Paulo e Porto Alegre.

A falta de um polo opositor de massas dificulta a resistência

A derrota eleitoral desorganizou e custou caro para os setores que hoje estão na oposição a Bolsonaro. O giro eleitoral favoreceu a extrema-direita e pode ser constatado com o crescimento expressivo de militares e de políticos reacionários nos parlamentos. Os ataques que o movimento social vem sofrendo ainda não encontraram resposta à altura. A dinâmica de construção da resistência unitária é lenta, num quadro de uma oposição social e parlamentar desorganizada.

No terreno opositor, o PT é o partido mais forte e, ao mesmo tempo, é o mais frágil, uma vez que enfrentará grandes dificuldades para obter crescimento futuro. O PT não tem condições, nem a médio prazo, de aparecer como alternativa para as massas, já que a frustração com o partido foi muito forte. Ainda assim, é o partido mais forte da oposição. Como o PSOL não pode desconhecer este fato nem a necessidade de unidade ampla contra o governo, o PT acaba sendo também, pela própria política do PSOL, credenciado como parte da oposição. Assim, a oposição não consegue postular-se como alternativa porque carrega esta derrota e este fardo.

O PSOL ainda não tem força – e provavelmente não terá a médio prazo – para ser o carro-chefe de uma oposição capaz de dirigir o movimento de massas. Pode, no máximo, ser chefe de uma oposição eleitoral no terreno local. No entanto, o partido pode e deve ser um polo nas lutas práticas. É neste caminho que pode vir a ser uma alternativa para as massas. Isto, porém, não é imediato. Será uma luta a longo prazo. Disso se aproveitam a burguesia e o governo.

A dinâmica, ainda inicial, da resistência

A situação adversa para os trabalhadores diante do governo Bolsonaro fez surgir polos de resistência já antes das eleições de 2018, como as mulheres que protagonizaram aas gigantescas marchas do “Ele Não!”, que refletiram um movimento democrático espontâneo mais amplo que as iniciativas tradicionais da esquerda. Após a posse, já surgiu, como mencionado, uma sequência de escândalos que dificultam a governabilidade de Bolsonaro.

Nos marcos de uma situação notadamente defensiva, os dois meses do novo governo presenciam uma articulação de unidade democrática contra os ataques econômicos e em defesa das liberdades, posições refletidas tanto no lançamento da Frente por Democracia e por Direitos articulada pelo ANDES como na Plenária Nacional em Defesa da Previdência, ambas realizadas em fevereiro em São Paulo. Enquanto a plenária representa um importante esforço de unidade de todas as centrais sindicais para combater a Reforma da Previdência, o Fórum é uma importante expressão de unidade da esquerda sindical, somando federações e três centrais (CSP-Conlutas, Intersindical – Instrumento da Luta e Intersindical – Central da Classe). As últimas grandes plenárias do funcionalismo público federal, como do SINASEFE e FASUBRA, também se enquadram neste cenário.

 As universidades apresentam-se como mais uma trincheira, sofrendo ataques diretos através do corte de verbas e da perseguição ideológica promovida pelo Escola Sem Partido. A defesa democrática das universidades, realizada em bloco com todos os setores contrários ao desmonte do ensino superior público e aos ataques contra a autonomia universitária, abre uma possibilidade de luta, organizando as multidões de jovens que buscam uma alternativa organizativa para o enfrentamento ao governo. O recente CONEB da UNE, realizado em Salvador, já demonstra esta possibilidade, assim como os massivos encontros de estudantes ocorridos com os candidatos e parlamentares do PSOL nos últimos meses. Na educação básica, as categorias também se mobilizam em resistência às medidas do governo, lutando também contra as mudanças nas previdências estaduais e municipais ao mesmo tempo em que a escola pública sofre sistemática desqualificação por pelos ministros Ricardo Vélez e Damares Alves.

No próximo mês, o conjunto da resistência volta-se para a luta das mulheres, tendo como símbolo máximo nossa companheira Marielle Franco, cuja execução ainda não esclarecida completa um ano. O Carnaval, em que haverá uma homenagem a Marielle pela Escola de Samba Mangueira, o 8 e o 14 de março serão datas muito importantes para a demonstração da resistência popular a Bolsonaro, reunindo multidões de ativistas nas primeiras grandes ações de rua de seu governo. E o PSOL tem o papel de protagonista político destas ações, conquistado através de sua política independente, que hoje é representada pelas parlamentares feministas da bancada e pelo conjunto da atuação do partido, tornando-se cada vez mais uma alternativa de militância para esta vanguarda que se mobiliza.  

O PSOL afirma-se como polo combativo e democrático-radical

Após a grande ampliação da bancada do PSOL nas eleições, a postura da nova bancada nos últimos meses demonstra também uma mudança qualitativa do partido no parlamento burguês. O acerto da tática da candidatura de Freixo como presidente da Câmara, formando um bloco com PSB, Rede e PT dirigidos pela política do PSOL, representou um exemplo de atuação parlamentar combativa e articulada e colocou o PSOL em cena de maneira firme. Os ataques da família Bolsonaro contra o PSOL por meio da utilização de fake news demonstram a postura do governo contra esta alternativa crescente de esquerda.

A posição do PSOL é fruto de seus anos de construção de base, nas lutas dos sindicatos e dos movimentos sociais, na resistência da população nas cidades e nos estados e na atuação independente de diversos vereadores e deputados estaduais, construindo um polo radical e coerente em defesa dos direitos dos trabalhadores.  

É um momento de avançar na construção do PSOL, agitando as posições do partido e debatendo nosso programa para aproximar a grande quantidade de ativistas que despertam para a luta política no contexto atual e constituindo um núcleo alternativo na política do país. Para isso, também é essencial manter a luta democrática contra os elementos burocráticos do partido, presentes hoje em estados como o Amapá e o Amazonas e que conformam parte importante da base partidária da atual direção majoritária.

Nossas tarefas e agenda

O centro de nossa atuação imediata está no conjunto de atividades de luta das mulheres no mês de março, o Dia Internacional de Luta das Mulheres e o marco de um ano da morte de Marielle. O esforço nacional e internacional protagonizado pelas mulheres do MES para a construção destas datas ganha ainda mais importância devido ao fato de que esta será a primeira jornada de lutas contra Bolsonaro, recuperando o caráter amplo dos atos do “Ele Não!” com presença destacada do PSOL e do MES, por meio de nossa intervenção nas ruas, nos movimentos e no parlamento. O chamado para uma Internacional Feminista, realizada por feministas estrangeiras para a articulação desse movimento mundial de mulheres, é outro elemento que destaca a importância dessa construção. Em março, também será lançada uma edição especial da Revista Movimento sobre mulheres, num esforço de elaboração das companheiras de nossa corrente e um veículo muito qualificado de disputa da vanguarda e de formação política para nossa militância.

Nos próximos meses está colocada também a luta contra a reforma da previdência de Bolsonaro. O plano de aprovar a reforma no primeiro semestre, sua apresentação ao Congresso e a futura tramitação serão prioridade para os diversos setores da direita, demonstrando forte unidade do governo para a aplicação de seu programa ultraliberal. Rodrigo Maia acena com a possibilidade de aprovação da reforma no mês de junho, colocando os próximos meses como definidores desta luta.

O aumento da violência política e o fortalecimento das milícias e outras máfias relacionadas às polícias militares também exigem forte atuação, colocando a defesa das liberdades políticas e dos direitos humanos como pauta central que se destaca na exigência da solução do crime de Marielle. Esta execução foi realizada pelo setor ligado ao aparato policial que protagoniza a violência contra a população negra e pobres das periferias e também é ideologicamente ligado à família Bolsonaro, com vínculos diretos cada vez mais aparentes. 

O crime da Vale ocorrido em Brumadinho também coloca a questão ambiental como ponto importante de atuação nos próximos meses, exigindo a punição aos dirigentes desta empresa e lutando pelas populações atingidas por barragens. O problema grave das barragens, muito presentes em Minas Gerais, mas que também estão em todo país, é um exemplo concreto da absoluta falta de bom senso dos capitalistas e pode ter um papel pedagógico importante na disputa ideológica contra a direita bolsonarista. O esvaziamento do IBAMA e dos órgãos fiscalizadores, associados aos interesses predatórios do ministério do Meio Ambiente, tende a aumentar o número de crises ambientais e aprofundar seus impactos na população, principalmente a mais pobre.  

A luta pela criminalização da homofobia também será elemento importante dos próximos meses e representará mais um embate entre o conservadorismo de extrema-direita e os setores democráticos da sociedade, ampliando a luta e o debate ideológico contra os obscurantistas, que é parte essencial do momento atual. A renúncia de Jean Wyllys simbolizou os efeitos da extrema violência contra a população LGBT no Brasil e nosso camarada David Miranda pode cumprir um papel importante nesta luta.  

Enraizamento: o papel estratégico do trabalho de base

Os resultados da última eleição promoveram um salto de qualidade na intervenção do MES, adquirindo uma grande expressão parlamentar. Na esteira da atuação de Luciana Genro durante seus mandatos como deputada federal, expressando diversos exemplos de conexão entre a luta social e a luta política, os parlamentares apresentam-se como caixa de ressonância de diversas lutas sociais e políticas. De acordo com a política leninista de formação de tribunos do povo, Sâmia, Fernanda e David atuam como as expressões da radicalidade das lutas das mulheres, de LGBTs, da negritude, da juventude e dos trabalhadores como um todo, ampliando o alcance de nossa política para muito além dos espaços orgânicos do MES.

Este avanço precisa ser cada vez mais combinado com a disputa e a construção na classe trabalhadora e na juventude tanto em seus setores organizados e em suas camadas mais amplas, nos bairros, nas fábricas, nas escolas, nas universidades, nas ocupações urbanas e rurais, entre outros espaços. Para cumprir esta tarefa, temos importantes ferramentas de intervenção, como Juntos, Juntas, Rede Emancipa e a Plataforma Sindical Mover, entre outras iniciativas locais. Estas ferramentas, que ampliam o trabalho político do MES para um maior âmbito de atuação, serão importantes para um trabalho de enraizamento social que se combine com a amplitude de nossa atuação política.

O trabalho de base em nossas diversas organizações colaterais e frentes deve ser o centro desses trabalhos, utilizando-se dos exemplos do PSOL para politizar nossa atuação nas bases e organizando novos militantes. O Juntos é nossa referência política na juventude, fortalecendo-se na disputa com os setores oportunistas por meio de uma posição independente e na linha de frente dos enfrentamentos da juventude dos últimos anos nas universidades e escolas públicas. A Rede Emancipa é um movimento social que hoje se estabelece em diversos estados, configurando-se como o maior movimento de educação popular do país e organizando jovens nas periferias das grandes capitais e de cidades do interior de todas as regiões brasileiras. Atuando de formas diferentes e em espaços diferentes, as duas iniciativas se complementam em uma construção independente de juventude cujos frutos organizativos podem ser decisivos nas futuras lutas pela educação pública.

O grande espaço aberto pelo movimento combativo de mulheres dá centralidade a Juntas, organizando mulheres contra os retrocessos do governo por meio da luta feminista na base. A referência construída pelas dirigentes do PSOL no movimento de mulheres, através das parlamentares e das organizadoras das lutas, abre possibilidades para a construção de Juntas em todo o país, conforme fica evidente pelos resultados de sua recente política de comunicação. Nossa prioridade na luta feminista no mês de março é mais uma janela de oportunidade para a ampliação desta construção em suas bases sociais.

Formação política e de quadros militantes

A formação de quadros é um dos centros do MES nesta etapa política. A necessidade da formação ideológica do conjunto da militância é imprescindível para o enfrentamento dos desafios colocados pelo momento de instabilidade em que vivemos. A aproximação de novos ativistas e militantes torna cada militante responsável por uma intensa disputa ideológica entre a vanguarda e em meio ao povo, e a teoria marxista é a ferramenta para a ação nesta disputa. Da mesma forma, é necessário aprofundar nosso leninismo teórico e prático, estabelecendo uma política nacional centralizada de comunicação que aprofunde a unidade política e permita a diálogo das distintas experiências. Para isto, a Revista Movimento e seu site devem cumprir um papel fundamental de estimular a formação da militância e a organização de debates, cursos e círculos de leitura em todo o país. Nosso site deve ser apropriado pela militância, que tem a oportunidade de refletir e formular sobre suas experiências de militância, responsabilizando-se também por dar um passo à frente em sua experiência teórica.

O MES desenvolveu-se regionalmente no último período, fortalecendo antigas regionais e construindo trabalho em novas, e temos a tarefa de afirmação dos trabalhos regionais e a consolidação das expressões sociais e políticas desse desenvolvimento. É preciso construir fortalezas nos estados, com um projeto militante orgânico que intervenha no PSOL e nos movimentos sociais, construindo nossas ferramentas de luta e realizando intenso debate e formação.

O internacionalismo é elemento central para esta construção. O desenvolvimento do trabalho internacional do MES destaca-se, como se evidenciou no encontro entre nossas parlamentares federais e as deputadas socialistas norte-americanas Alexandria Ocasio-Cortez e Julia Salazar. Nossa localização no Secretariado Unificado da Quarta Internacional coloca-nos em posição importante de diálogo com outras organizações do mundo, e a política de giros militantes representa o desenvolvimento ativo de nosso trabalho.


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Pedro Micussi