Derrotar nas ruas a reforma da previdência de Doria!

O governador João Doria busca aprovar a toque de caixa uma Reforma da Previdência do funcionalismo público de São Paulo. É preciso agir rápido para impedir esse absurdo.

Equipe Sâmia Bomfim 28 nov 2019, 13:27

A reforma da previdência nacional aprovada este ano é um dos ataques mais severos aos direitos e à economia do Brasil das últimas décadas. Em dez anos, os trabalhadores perderão cerca de R$800 bilhões em benefícios. Esta tragédia teve como um de seus mais entusiasmados articuladores o governador de São Paulo, João Doria. No ano passado, enquanto ainda era prefeito da capital, Doria propôs uma reforma da Previdência municipal, o Sampaprev. Num primeiro momento, foi derrotado pela mobilização dos servidores. Porém, no fim do ano, seu sucessor, Bruno Covas, conseguiu fazer aprovar o projeto. Agora, como governador, Doria propõe uma reforma da Previdência dos servidores do estado de São Paulo semelhante à reforma da Previdência aprovada em âmbito nacional. Ou seja, Doria, um bilionário que ingressou na política primeiramente como lobista, tornou-se um especialista em destruir a aposentadoria dos trabalhadores.

Sem disfarçar o caráter autoritário e antipopular da medida, o governo estadual apressa a Assembleia Legislativa para que aprove o projeto em velocidade recorde – se possível em 15 dias. Dessa forma, o governo impede que os parlamentares possam estudar e debater seriamente o tema, que especialistas da sociedade civil possam avaliar os impactos das medidas e que a população conheça e reflita a respeito do tema. Isto é proposital, pois, Doria sabe que seu projeto é tão perverso no desmonte dos direitos do trabalhador e tão frágil em embasamento econômico que provavelmente desencadeará forte resistência – da qual ele quer fugir acelerando a tramitação.

Vejamos, então, quais são as alterações propostas:

  1. Aumento da alíquota de contribuição dos servidores estaduais, dos atuais 11% do salário, para 14%. Na prática, isso significa redução dos salários. Trata-se, portanto, de uma manobra para subverter o princípio constitucional da majoração salarial, que prevê que o salário do funcionalismo público deve apenas aumentar e nunca diminuir. Este princípio já é comumente desrespeitado em São Paulo por meio de arrocho salarial (quando não há reajuste salarial de acordo com a inflação, acarretando diminuição do seu valor real). Algumas categorias estão há mais de 5 anos sem receber reajuste. Como consequência, São Paulo, de longe o estado mais rico da federação, é um dos que mais paga mal os seus servidores.
  2. Eliminação dos acréscimos salariais por tempo de serviço (tais como quinquênios, sexta parte, etc.) de todos os servidores pertencentes ao grupo dos “subsidiados”. Além disso, Doria pretende incluir os professores, a maior categoria profissional dentre o funcionalismo público estadual, neste grupo. Ou seja, isso significa acabar com os acréscimos de salário a que os professores têm direito ao longo de sua carreira, desvalorizando ainda mais o magistério.
  3. Aumento da idade mínima necessária para poder se aposentar: de 55 para 62 anos, no caso das mulheres, e de 60 para 65, no caso dos homens. Nota-se, dessa forma, que as mais prejudicadas serão as mulheres, reforçando a desigualdade que já existe na sociedade ao invés de buscar dirimi-la. Os professores terão direito a se aposentar mais cedo, mas a idade mínima também subirá no caso deles. Será de 57 anos, para mulheres, e 60 anos, para homens.
  4. Redução do valor dos benefícios. Em primeiro lugar, o valor da aposentadoria do servidor não será mais igual ao salário da última função ocupada por ele, mas igual à média de todos os salários recebidos ao longo do período em que contribuiu para a Previdência. Por si só, isso já significaria uma redução substancial no valor da aposentadoria. Mas, além disso, o servidor que se aposentar com o tempo de contribuição mínimo (25 anos) terá direito a apenas 60% do valor do benefício. Este percentual é aumentado progressivamente quanto maior for o tempo de contribuição, atingindo a integralidade do benefício apenas com 40 anos de contribuição. As pensões por morte também serão reduzidas a 60% do valor do benefício mais 10% por dependente.
  5. Aposentados por invalidez terão de passar por uma perícia periódica que avaliará suas condições de trabalho. Se for constatado que o trabalhador está apto a realizar determinada função no serviço público, mesmo que diferente daquela a qual o profissional realizava quando na ativa, ele perderá sua aposentadoria e será “readaptado” na nova função. Chamamos este processo de “desaposentadoria”.
  6. Atualmente, o servidor tem direito a gozar de sua aposentadoria em no máximo 90 dias após solicitá-la. A reforma propõe acabar com este prazo, de modo que o servidor só usufruiria de seu direito após autorização expressa do governo. Essa medida obrigará muitos servidores a judicializarem seus pedidos de aposentadoria para que possam usufruir de seu direito.

Não há justificativa plausível para este desmonte dos direitos dos funcionários públicos. Como o próprio governo admite, São Paulo não vive crise fiscal e é um dos estados brasileiros que menos gasta proporcionalmente com folha de pagamento, estando abaixo do limite imposto pela Lei de Responsabilidade Fiscal. Além disso, o aumento proporcional dos gastos do estado com pagamento das aposentadorias dos servidores se deve à redução no número de funcionários contratados. Entre 2010 e 2018, São Paulo perdeu 10,8% de seus funcionários públicos em função da falta de chamamento de concursos públicos e terceirizações. Com menos funcionários ativos, há menos contribuições, e, dessa forma, o governo tem de desembolsar uma quantia maior para manter os benefícios dos aposentados. Portanto, é totalmente implausível afirmar que os gastos com o Regime Próprio de Previdência do Estado de São Paulo são uma “bola de neve descontrolada” pois cabe ao estado, e apenas a ele, garantir o equilíbrio fiscal de sua própria Previdência. Em outras palavras, mesmo se fosse verdadeiro que há um problema fiscal com a Previdência de São Paulo, o responsável seria apenas o próprio governo.

Além disso, mudanças relativas ao funcionalismo público costumam aproveitar-se do preconceito corrente de que esta seria uma categoria de “privilegiados”. Entretanto, cumpre ressaltar, em primeiro lugar, que a maioria dos funcionários públicos, especialmente em âmbito estadual, é composta por trabalhadores nada privilegiados, como professores, policiais e profissionais da saúde. Em segundo lugar, a valorização desses profissionais não é contraditória com a garantia de qualidade dos serviços públicos. Isto é, gastar menos com servidores não significa “sobrar mais dinheiro” para investir nas áreas sociais, mas, ao contrário, a melhor forma de garantir serviços de qualidade é investir nos profissionais que os realizam.

O desafio de derrotar essa atrocidade é grande e o tempo é curto. Mas a mobilização está acontecendo. No dia 26 de novembro, os professores aprovaram a realização de paralisação em todos os dias em que ocorrerem a tramitação do projeto, que devem ser as terças feiras. É preciso agir rápido e energicamente para conscientizar a população e mobilizar os servidores. A reforma da Previdência estadual não pode passar!

Artigo originalmente publicado no site da deputada Sâmia Bomfim.

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