O primeiro ano de Bolsonaro: autoritarismo e ultraliberalismo em meio à polarização global

Um breve balanço do primeiro ano de governo Bolsonaro.

Revista Movimento 17 dez 2019, 16:13

Encerramos um ano importante para o trabalho de nossa Revista Movimento. Neste 2019, quando o Movimento Esquerda Socialista completou 20 anos, lançamos edições regulares e especiais de nossa revista, editamos novos livros e relançamos nosso site. O esforço para manter uma publicação militante e um espaço para o debate de ideias socialistas é ainda mais importante num momento de enfrentamentos em nosso país e de ampliação da polarização de classes e das lutas no mundo.

O primeiro ano de governo Bolsonaro encerra-se sob a marca do ultraliberalismo e do autoritarismo. Sob comando de Paulo Guedes e apoio unânime da grande imprensa, da burguesia e de seus partidos, foi aprovada neste ano a reforma da previdência, atacando a classe trabalhadora e o povo brasileiro, já expostos ao alto desemprego e à crescente precarização do trabalho. O rebaixamento dos custos do trabalho e a criação de oportunidades lucrativas de investimento para o capital transnacional – como a recente privatização da água e do saneamento – são o grande objetivo deste governo. A entrega do pré-sal, de campos de exploração, refinarias, subsidiárias e da BR Distribuidora mostra a acelerada privatização da Petrobrás, acompanhada pela provável entrega, no próximo ano, da Eletrobrás e dos Correios. Ao mesmo tempo, o governo sinaliza para o aprofundamento da dependência externa e por uma política de abertura comercial que favoreça o agronegócio. Como resultado, segue a estagnação econômica.

Para viabilizar este programa de guerra econômica para garantir a acumulação capitalista, o governo Bolsonaro apresenta-se como uma verdadeira contrarrevolução preventiva, ampliando o autoritarismo como meio para viabilizar o choque contra o povo. Não por acaso, ao longo do ano, membros do clã presidencial e ministros como Paulo Guedes e Augusto Heleno flertaram abertamente com a ideia de um “novo AI-5”, ou seja, a ameaça de instalar uma ditadura caso a mobilização popular cresça. Trata-se, por um lado, de uma ameaça e, por outro, de um sinal explícito à organização da extrema-direita e de seus aliados reacionários no aparelho de Estado, nas forças militares e em milícias, com as quais a família presidencial tem relação intensa, como mostraram o caso Queiroz e as relações entre Bolsonaro e os milicianos envolvidos com o assassinato de Marielle Franco. Ao mesmo tempo, crescem as ameaças contra movimentos sociais no campo e na cidade; órgãos de imprensa ouvem do próprio presidente ameaças a seu funcionamento; as artes, a educação e a cultura são alvo de subfinanciamento, calúnias e censura promovidas pelos agentes reacionários que ocupam as instituições destas áreas.

A destruição florestal e a atuação de milícias no campo, recrudescidas com os sinais de apoio vindos do centro do poder, marcaram o Brasil em 2019, com aumento nos índices de desmatamento em 70% até dezembro, o assassinato de lideranças indígenas, como os defensores Guajajara no Maranhão, e as medidas para legalizar a grilagem de terras recentemente anunciadas por Bolsonaro e Teresa Cristina. A atuação vergonhosa de Ricardo Salles na COP-25 mostrou um país de joelhos aos interesses do ruralismo e, externamente, de Donald Trump e da extrema-direita negacionista internacional, como de resto em toda a política externa brasileira.

A criação da “Aliança pelo Brasil”, partido claramente neofascista, em meio à dificuldade na articulação parlamentar de Bolsonaro, mostra uma opção decidida pela organização política e física da extrema-direita. Ao mesmo tempo, governadores como João Doria e Wilson Witzel buscam disputar este espaço e orientam suas polícias a uma política de extermínio, revelada pelo aumento escandaloso das mortes promovidas por policiais em São Paulo e no Rio de Janeiro e por casos como o assassinato da menina Ágatha Felix e o massacre de nove jovens na favela de Paraisópolis.

Diante de tal cenário, fica clara a necessidade de construir uma oposição sólida no Brasil, que ocupe as ruas, além dos espaços de disputa parlamentares, onde a bancada do PSOL tem enfrentado batalhas importantes. Em 2019, em particular, as tentativas de desmontar a educação brasileira, por meio de cortes bilionários e o aparelhamento dos órgãos da área, foram enfrentadas pelas enormes manifestações de 15 e 30 de maio em todo o país, seguidas por uma jornada de atividades ao longo do segundo semestre. Como resultado, o governo teve que recuar dos cortes e a linha privatista do “Future-se” atrasou-se diante da resistência social e das disputas internas no bolsonarismo.

É preciso organizar a indignação crescente e difusa contra o governo Bolsonaro, que enfrenta as mais altas taxas de reprovação da história em primeiro ano de governo. Não por acaso, o fantasma o Chile é evocado permanentemente. Neste 2019, a polarização política nas ruas foi uma marca, com manifestações multitudinárias no Chile, Equador, Colômbia, Hong Kong, Líbano, Iraque, Egito, entre outros lugares. Com suas múltiplas causas, expressões e demandas, esta poderosa jornada internacional de rebeliões mostrou uma disposição de luta de massas contra a depauperação neoliberal e os ataques dos governos, revelando a instabilidade da dominação do capital transnacional diante de uma crise sem resolução.

Por isso, nosso desafio é construir o PSOL – que, em 2020, realizará seu VII Congresso – como um partido enraizado nas favelas, nas lutas dos trabalhadores pobres do campo e da cidade, da juventude, que consiga fomentar a unidade para derrotar Bolsonaro, mas se postular como uma alternativa independente para o futuro.

O próximo ano reservará novos desafios e lutas. De nossa parte, seguiremos nossos esforços de elaboração a serviço das ideias socialistas e da organização política do povo. Nas próximas semanas, entraremos em recesso, preparando nossas atividades para 2020. Agradecemos a nossas e nossos leitores, colunistas e colaboradores e lhes desejamos boas festas e um bom ano novo!


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Pedro Micussi