Bolsonaro e seus eleitores: a psicologia das massas de Sigmund Freud

O bolsonarismo se diferencia de outros grupos sociais pelo seu flerte com o autoritarismo.

Andressa Martins 28 abr 2020, 17:38

Depois que Jair Bolsonaro apareceu para seus eleitores em uma das carreatas que pediam pelo fim do isolamento social e a volta da ditadura militar, muitos psicanalistas começaram a analisar a postura do presidente da república e de seus eleitores em uma tentativa de burlar as regras da Organização Mundial da Saúde (OMS), bem como destruir a Constituição e os valores que regem a democracia brasileira. A análise foi feita de acordo com a obra de Sigmund Freud, “Psicologia das Massas e Análise do Eu”.

O bolsonarismo – como são chamados os eleitores de Bolsonaro – é um grupo social com ideias em comum, mas que diferem de outros grupos sociais por conta de suas tentativas obscuras de autoritarismos e sua hipocrisia infinita, visto que antes da pandemia do novo Covid-19 não havia solidariedade por parte das autoridades presentes no governo Bolsonaro, mas a partir do futuro incerto da economia do país que pode comprometer com as fortunas de grandes milionários, houve-se de ver grande parte dos mesmos se preocupando com a fome no Brasil, e consequentemente, exigindo o fim do isolamento social.

Um exemplo de grande parte do eleitorado de Bolsonaro é o dono das redes de restaurantes Madero e empresário paranaense, Júnior Durski, cujo reforçou o seu apoio e afirmou o seu voto no atual presidente da república caso o mesmo se reelege nas eleições de 2022. Durski causou grande repercussão após gravar um vídeo onde declarou que o Brasil não poderia parar por conta do novo vírus mesmo que cause 5 ou 7 mil mortes. Depois da polêmica, Júnior Durski fez uma comparação com outros dados de óbitos no Brasil, se referindo as mais de 5 mil mortes por desnutrição no país em 2018, alegando que neste caso, “ninguém fala nada”. Vale ressaltar que a esquerda brasileira sempre se atenta aos casos de fome de pessoas de baixa renda e pessoas em situação de rua no Brasil, planejando intervenções frequentemente através de projetos de lei, mas recebem insultos pela oposição.

O mesmo eleitorado é contra a legalização do aborto, pois se identificam como pró-vida, ou seja, em defesa da vida. Mas em contrapartida, aparentemente não se importam com as vidas perdidas por conta do Covid-19 e apoiam o fim do isolamento social, mesmo que o número de casos confirmados e óbitos aumentem a cada dia. No sábado (18/04), Jair Bolsonaro saiu do palácio para conversar com manifestantes – burlando as regras de isolamento social – e reforçou o seu repúdio pela legalização de aborto nos casos em que a gestante estiver com zika vírus. O presidente da república levantou uma bandeira que dizia “Brasil Vivo! Sem Aborto”. A grande contradição de apoiar o fim do isolamento social e ocasionar mais mortes por conta do novo corona vírus, mas pedir por um Brasil com vida contra casos mesmo que específicos de aborto, mostra a enorme hipocrisia que representa o governo de Jair Bolsonaro e de todo o seu eleitoral.

Mais uma contradição que pode ser mencionado seria a autodenominação que o eleitorado de Jair Bolsonaro tem ao dizer que são grandes patriotas, mas em sua grande maioria são indivíduos que idolatram a cultura estadunidense e que afirmam os seus desejos de “largar tudo e ir morar no exterior”, a não ser que os diversos contextos sociais e econômicos no Brasil sejam do jeito que prezam.

No domingo seguinte (19/04), Bolsonaro mais uma vez saiu para conversar e discursar em ato que pedia pela volta da ditadura militar, ato este que vai contra o que é previsto pela Constituição. Dezenas de simpatizantes – muitos nem ao menos fazendo o uso de máscaras – se aglomeraram para ouvir o presidente da república. Bolsonaro disse: “Nós não queremos negociar nada. Nós queremos é ação pelo Brasil. O que tinha de velho ficou para trás. Nós temos um novo Brasil pela frente. Todos, sem exceção, têm que ser patriotas e acreditar e fazer a sua parte para que nós possamos colocar o Brasil no lugar de destaque que ele merece. Acabou a época da patifaria. É agora o povo no poder”. Os manifestantes gritavam “AI-5”, “Fecha o Congresso”, “Fecha o STF”, entre outros, além de levantarem bandeiras pedindo por intervenção militar. É importante ressaltar que, durante a ditadura militar, milhares de pessoas morreram, inclusive crianças, e o Ato Institucional número 5 (AI-5) foi usado para punir opositores em gesto totalmente antidemocrático.

Apontado na obra de Freud, Le Bon (1895) se refere a “massa psicológica” – podendo ser entendido como um grupo ou multidão – aqueles indivíduos totalmente distintos ou semelhantes em seus mais diversos jeitos, seus estilos de vida, seu caráter ou sua inteligência, mas que a partir do momento que há de ocorrer uma transformação dentro de uma massa, garante-se uma alma coletiva. Algumas ideias ou sentimentos só aparecem em atitudes de pessoas que estão ligadas por um grupo. Tenta-se, ainda, identificar as causas que se dão o grau de diferença entre uma pessoa isolada e uma pessoa que está inserido em uma massa. Le Bon aponta que uma dessas causas passa a ser o sentimento de poder invencível que se é adquirido dentro de uma massa psicológica, que lhe permite entregar-se a ideias e sentimentos que, sozinho, provavelmente não as teria. Isso se dá porque um indivíduo sozinho teria que arcar com as consequências de seus atos, possivelmente atos duvidosos, isoladamente. Muito bem explicado por Freud, ele diz que “as novas qualidades que aparecem no sujeito inserido dentro de uma massa são as suas manifestações inconscientes, que, afinal, contém tudo o que há de malvado na alma humana”.

Analisando o contexto criminoso de Jair Bolsonaro e de seus eleitores, podemos tomar como hipótese que o pedido de uma intervenção militar não aconteceria se não houvesse esse grupo de indivíduos com fenômenos inconscientes em comum. Não poderiam, ainda, tomar como responsabilidade um ato criminoso totalmente contra a Constituição sozinhos, pois interligados por uma massa, o sentimento de responsabilidade desaparece. E os gritos de guerra após cada frase dita por Bolsonaro comprova esta ideia.

Uma das propostas dessa obra está inteiramente tão ligada com o contexto atual em que vivemos, e por vezes, assusta. Não importa a quantidade de indivíduos que estão inseridos na massa, eles precisam ter alguém para obedecer, pois são incapazes de existir senão houver alguém que esteja no comando. Este alguém, inclusive, precisa estar fascinado por uma ideia que rege através de uma fé intensa para despertar, também, fé na massa. Segundo Freud, vale lembrar que esta multidão se torna facilmente influenciável, as suas suspeitas passam a ser certezas irrefutáveis, ela precisa ser dominada e oprimida, completamente conservadora e possui respeito ilimitado pela tradição. A intolerância e os extremos estão também presentes na obra, alegando que para essas massas, ou é uma coisa ou é outra, nunca existindo um caminho do meio. As multidões são feitas de ilusões, não averiguam as fontes confiáveis. Já ouviu falar de fake news? Aparentemente, Freud as previu. No mais, cada indivíduo nesta massa perde a sua personalidade consciente e obedece a todas as sugestões de seu líder – a sugestionabilidade é uma terceira causa – como um hipnotizado por seu hipnotizador. Estão sujeitos ao que chamam de poder verdadeiramente mágico das palavras. Interligando as palavras com o líder, Freud considera que o discurso deste chefe é totalmente verdadeiro aos ouvidos dos membros da multidão e que não se permitem questionar.

Neste caso, podemos analisar diversas situações que fizeram o eleitorado de Bolsonaro parecer contraditório. Podemos citar como exemplo referente à MP que permitia suspender contratos de trabalho por 4 meses durante a crise do novo corona vírus, ou seja, não era necessário pagamento de salário para os trabalhadores. No momento que a medida foi dita por Bolsonaro, mesmo que absurda, os seus eleitores via internet apoiaram o presidente da república por mais que a sua obrigação fosse garantir a renda de todas as famílias, e não cortá-las. Além disso, reforçavam a ideia de que a MP poderia ser negociada entre patrão e empregado. Depois de duras críticas, Jair Bolsonaro voltou atrás e revogou a MP 927 e, em seguida, os bolsonaristas apoiavam novamente, pois “era a melhor decisão”. Não há como negar as contradições que se encontram por toda a internet.

O que se vê em comum entre a obra de Freud e o eleitoral de Jair Bolsonaro é mais do que se poderia escrever neste artigo, e que apenas fazendo a leitura de seu livro poderíamos debater mais a respeito, visto que as semelhanças são muitas. É importante dizer que, não há cunho de zombaria, mas uma preocupação por boa parte dos eleitores que nos encaminham para um futuro incerto, e por vezes, assustador e sombrio.

REFERÊNCIAS

https://veja.abril.com.br/economia/bolsonaro-revoga-trecho-da-mp-que-permitia-suspensao-do-trabalho-por-4-meses/

https://jornalistaslivres.org/joao-torrecillas-sartori-o-lider-e-o-bolsonarismo-em-meio-a-pandemia/

https://g1.globo.com/politica/noticia/2020/04/19/bolsonaro-discursa-em-manifestacao-em-brasilia-que-defendeu-intervencao-militar.ghtml

https://www.semprefamilia.com.br/blogs/blog-da-vida/bolsonaro-participa-de-ato-pro-vida-contra-o-aborto-em-caso-de-zika/

https://paranaportal.uol.com.br/cidades/durski-madero-repercussao-video-voto-bolsonaro/


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