Anticapitalismo em rede: como o ativismo digital está desmontando as máquinas de desinformação

Pelo mundo todo eclodem iniciativas que acertam em cheio o financiamento dos portais da extrema direita.

Giovanny Ferreira 25 maio 2020, 14:50

A extrema direita no Brasil e no mundo investiu pesado no desenvolvimento de redes que propagam o ódio e a desinformação pela internet, abrindo espaço para a formação de verdadeiro exército militante de suas posições e disputando o octógono da política, sobretudo através das redes sociais.

Um expoente e mentor dessa estrutura é o estrategista e articulador do protofascismo internacional, Steve Bannon – que coordenou a campanha de Donald Trump à presidência dos EUA e que também contribuiu para a eleição de Jair Bolsonaro no Brasil. A estrutura de Bannon, como já se sabe, envolveu compra ilegal de informações de usuários do Facebook para a eleição estadunidense, e encontrou espaço para se aprimorar em nosso país através da difusão instantânea de conteúdo (via, por exemplo, o WhatsApp), gerenciamento de ‘robôs’ para endossar a veracidade das publicações e orquestrar ataques a opositores, e a sustentação de blogs e portais que plantam notícias falsas, conteúdo conspiracionista/anti-científico ou mesmo discurso de ódio.  E é a este último elemento como mecanismo que financia e alimenta todo o restante da rede que esta breve contribuição vai se atentar.

Funciona assim: um site é criado com nome fantasia semelhante a nomes tradicionais de  jornais, para dar credibilidade. Por ali se veiculam ‘notícias’ fantasiosas ou caluniosas que endossam as posições da extrema direita. Pronto, está montado o mecanismo que alimenta as redes sociais para atacar opositores, difundir mentiras e incitar o ódio. Mas não para por aí: estes mesmos portais conseguem por mecanismos de publicidade paga serem parte do financiamento de todo o sistema de desinformação, utilizando-se, principalmente, da ferramenta de publicidade Google AdSense, onde banners publicitários de diversas empresas cadastradas na ferramenta se espalham do cabeçalho ao rodapé do portal. Cada clique no site é convertido em dinheiro aos donos dos próprios portais e ao Google, que tem nessa ferramenta cerca de 83% de seus rendimentos totais anuais. A lógica gananciosa e capitalista impõe um trato descuidado com o poder algorítmico e fez do maior buscador da rede mundial de computadores parte da equação da desinformação.

Em pesquisa recente realizada pela agência de checagem Aos Fatos, só no mês de abril deste ano no Brasil, 7 sites reuniram cerca de 44 milhões de acessos publicando mentiras ou orientações enganosas sobre a pandemia causada pelo coronavírus ou sobre a crise política no país. Todos tendo o Google Adsense como parceiro para seu financiamento.

Mas o ativismo das redes, potencializado pela condição de isolamento social e a crescente rejeição do governo genocida de Bolsonaro nos brindou com um lembrete: o terreno da internet é espaço que reflete a disputa da política no ‘mundo real’ e deve ser encarado com centralidade na tarefa de derrotar o protofascismo e disputar a consciência do povo. Isso porque é neste mesmo terreno em que, sob distorções e ataques orquestrados, o lado de lá tenta blindar e dar sustentação por meio de robôs a um governo em franca queda de aprovação e popularidade, ao passo que ativistas se mobilizaram para dar uma resposta anticapitalista atacando o coração do mecanismo de desinformação: seu financiamento.

Aqui mesmo no Brasil diversas iniciativas já emparedaram por meio do boicote e constrangimento empresas que burlaram a orientação de liberar os trabalhadores que não fossem dos chamados “serviços essenciais”. Agora fomos além: importamos o método “sleeping giants” de combate à desinformação e ao discurso de ódio.

Em 2016, nos Estados Unidos, um publicitário identificou que diversas empresas faziam publicidade em portais da extrema-direita e se questionou se aquelas empresas o faziam de maneira automática, sem conhecimento, ou se de fato queriam ter sua imagem associada a toda sorte de mentiras e injúrias. Daí surgiu a iniciativa que expunha ao público e às empresas por onde seus anúncios estavam circulando. Em pouco tempo o prejuízo dado, por exemplo, a um site do próprio Steve Bannon (o BreitBart), foi de 8 milhões de euros, e menos 4.500 anunciantes. O Sleeping Giants atuava até bem pouco tempo em onze países, através de células anônimas e independentes de usuários no Twitter, combatendo um inimigo em comum e acertando em cheio seu financiamento. Até que nos últimos dias ativistas anônimos criaram a conta do ‘Sleeping Giants Brasil’.

A conta alcançou o feito de 250 mil seguidores em menos de uma semana, podendo alcançar o que a ‘matriz’ norte-americana levou 4 anos para estabelecer (cerca de 270 mil). Por aqui as denúncias já começaram a surtir efeitos contra sites associados ao chamado “gabinete do ódio”, milícia digital organizada por Carlos Bolsonaro e outros apoiadores do governo. Marcas importantes já anunciaram a desvinculação de anúncios aos sites propagadores de FakeNews, como a empresa de tecnologia Dell, a multinacional Philips e até o próprio McDonald’s. Do lado de lá a reação é instantânea e previsível: o Banco do Brasil havia anunciado que também retiraria os anúncios, mas com intervenção do filho 02 do presidente e intermédio do Secretário de Comunicação, Fabio Wanjngarten, a área de marketing do banco, controlada pelo filho do vice presidente, será obrigada a fazer a manutenção do anúncio. Um absurdo criminoso, é verdade, mas é sintoma do desespero dos milicianos em tentar blindar o próprio esquema digital, que é por si só altamente lucrativo.

O ativismo digital e seus novos métodos de ação apontam para um diagnóstico: é tarefa urgente encararmos a disputa no ambiente das redes com um programa que ataque frontalmente o sistema estruturado pela extrema direita, que fiscalize e enfrente o poder do dinheiro que financia as máquinas de fakenews (seja o privado como o investimento empresarial no Google Adsense, seja o público, como o promovido no Brasil de hoje pelo clã Bolsonaro e sua base). O programa que deve lograr o pleno acesso à internet para todos os brasileiros de maneira alguma deve escantear a batalha contra a desinformação. Ademais, o Sleeping Giants, as iniciativas de arrecadação solidária durante a pandemia, os canais de denúncias das empresas e as demais iniciativas demonstram: há espaço nas redes sociais para construção de pontes de solidariedade entre os despossuídos, para a denúncia do poder da grana que financia a desinformação e para o enfrentamento antifascista. É preciso agir aqui e agora!


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