Deputada Vivi Reis: ‘Nossa busca é por justiça em relação aos assassinatos do Bruno e do Dom’
37935109-b44c-41aa-9ae3-2b9915879336

Deputada Vivi Reis: ‘Nossa busca é por justiça em relação aos assassinatos do Bruno e do Dom’

Na entrevista a seguir, a deputada Vivi Reis (PSOL-PA) relata suas impressões sobre as diligências para apuração dos assassinatos dos ambientalistas Bruno e Dom em Atalaia do Norte (AM).

Tatiana Dutra e Vivi Reis 5 jul 2022, 14:32

Passado um mês, os assassinatos do indigenista Bruno Pereira e do jornalista britânico Dom Phillips, resultaram na prisão de três suspeitos, mas o caso está longe de ser esclarecido. Possivelmente imbuída pela filosofia bolsonarista que criminaliza a defesa do meio ambiente, a Polícia Federal tentou sustentar a hipótese de que foi crime sem mandantes e que os suspeitos agiram sozinhos. Hoje, defende as ações de Bruno, funcionário licenciado da Fundação Nacional do Índio (Funai), contra a extração ilegal de pirarucu na região do Vale do Javari, em Atalaia do Norte (AM), tenham provocado a fúria de pequenos pescadores e a morte violenta da dupla.Tais possibilidades são encaradas com descrédito pela deputada federal Vivi Reis, do PSOL do Pará, relatora da Comissão Externa da Câmara dos Deputados que acompanha a investigação do crime.

“Não podemos aceitar apenas esse motivo. A estrutura dessa prática é incompatível com a realidade econômica dos executores.Tem pessoas poderosas por trás”, argumenta a parlamentar.Tal impressão foi reforçada após diligências da comissão que, nos dias 30 de junho e 1º de julho, esteve em Atalaia do Norte. O principal evento da comitiva de deputados e senadores foi um encontro com lideranças indígenas na União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (Univaja).“Fizemos várias escutas com lideranças indígenas, com autoridades e com servidores da Funai. No primeiro dia, a comissão teve a participação de senadores, deputados, consultorias e assessorias. No segundo, quem permaneceu para fazer uma nova etapa dessas escutas fui eu e o deputado José Ricardo (PT), presidente da comissão”, conta.

Conforme Vivi, apesar de a região ter recebido reforços no número de agentes de segurança – com a presença de Polícia Federal, Polícia Militar e Exército -, as tensões na região prosseguem, bem como as ameaças a lideranças indígenas e servidores da Funai, que pedem proteção. Porém, em processo de desmonte pelo governo federal, a fundação se mostra desinteressada em trabalhar pelas populações que nasceu para defender.

Na entrevista a seguir, a deputada dá um pequeno relato sobre as diligências, suas impressões sobre a situação de Atalaia do Norte e os próximos passos da comissão.

Revista Movimento – Como a senhora avalia as investigações das forças de segurança em relação à morte do Bruno e do Dom até agora?

Deputada Vivi Reis – São insuficientes ainda. Primeiro, porque logo que foram encontrados os restos mortais e capturados os executores, a Polícia Federal fez uma nota como se o caso tivesse sido encerrado ali e não houvesse mais o que investigar. E nós acreditamos que ainda há muito a ser investigado, principalmente na questão desse crime ter mandantes. Para nós, não é aceitável a resposta de que o assassinato foi feito apenas pelos executores. Existe uma narrativa – por parte do governo Bolsonaro e que eu mesma escutei de algumas autoridades de Atalaia do Norte – que traz uma visão de que os assassinados ocorreram porque o Bruno tinha confito com pequenos pescadores, já que fiscalizava e coibia a pesca ilegal. Não podemos aceitar apenas esse motivo. A estrutura dessa prática é incompatível com a realidade econômica dos executores. Tem pessoas poderosas por trás.

Revista Movimento – Qual seria essa estrutura?

Vivi Reis – Dentro da terra indigena, já demarcado, não pode ser feita pesca, caça ou garimpo. A área é protegida por lei. Mas esses crimes existem. Pelo que escutamos dos indígenas e servidores da Funai, a estrutura para fazer pesca, conservação e venda, tanto do pirarucu, quanto o tracajá (uma espécie de jabuti), exige um contêiner, uma espécie de freezer para conservação, os barcos precisam ter motores e dimensões específicas, e mesmo a rede de pesca custa muito caro. É toda uma logística, uma estrutura, cujo orçamento vai de R$ 50 mil a R$ 100 mil, o que não é compatível com a realidade dos pequenos pescadores, que vivem em situação de precariedade e, até, de vulnerabilidade. Como ele conseguiria sustentar essa estrutura? Ela precisa de um financiador. Alguém está pagando.Isso nos leva a acreditar que eles não são os responsáveis por essas mortes. Se o Bruno “não os deixava trabalhar” [como sustenta a PF], ele não incomodava apenas o ribeirinho, mas uma estrutura de poder muito maior. É isso que a gente precisa entender para poder fazer uma atuação que seja, de fato, compatível com a realidade local e não só com a narrativa que querem impor ao governo federal, inclusive, de que o Bruno e o Dom faziam expedições aventureiras. Na verdade, era parte de um projeto de proteção da Amazônia, é parte de um projeto de cuidado ao meio ambiente e de fiscalização contra crimes ambientais.Hoje, temos presos executores do assassinato do Bruno e do Dom, mas precisamos investigar a fundo sobre os mandantes. Esses que foram capturados são sujeitos que não têm um poder econômico compatível. Além disso, precisamos fazer a relação desse crime com outros assassinatos, como o caso do Maxciel [Pereira dos Santos, funcionário da Funai morto a tiros em 2019]. Foi um crime ocorrido na região que alarmou muito os servidores, povos indígenas e população local, mas até hoje não se tem respostas concretas.

Revista Movimento – Um mês depois do crime, qual é o clima em Atalaia do Norte?

Vivi Reis – O clima é de total insegurança. Existe um grande medo devido a ameaças que as lideranças indígenas e os servidores da Funai sofrem. Ali há várias coisas acontecendo, Casos de crime ambiental, pesca ilegal do pirarucu na região, tráfico [de drogas] e, ao mesmo tempo, a fragilidade na proteção das lideranças indígenas e servidores da Funai, que vive um processo de desmonte. Ninguém se sente seguro. É um clima muito hostil.

Revista Movimento – Na sua avaliação, a postura do governo federal em relação ao ambiente e aos povos indígenas está na raiz dessa insegurança?

Vivi Reis – O governo federal tem uma narrativa de criminalização dos povos indígenas, um discurso contra o meio ambiente, que se reflete diretamente na prática e nas políticas da Funai hoje. O presidente da fundação, Marcelo Xavier, é uma figura altamente autoritária, é muito criticado pelos povos indígenas, porque não escuta, não dialoga com eles. É um absurdo! A Funai, que deveria ser a fundação que ampara, que garante os direitos, que ajuda na defesa dos territórios, que protege a vida dos povos indígenas, hoje se apresenta como um inimigo deles.E isso é parte de uma política do governo federal, que também multiplica um discurso de ódio contra indígenas. Escutei algumas vezes lá [em Atalaia], por parte de algumas autoridades, que existe um conflito de indígenas contra os ribeirinhos. E, na verdade, isso é uma tentativa do governo Bolsonaro de colocar uns contra os outros, porque existe um interesse econômico por trás. E não se pensa uma política pública que possa atender com excelência a geração de emprego e renda para os ribeirinhos, a garantia dos territórios indígenas… Então, nós precisamos pensar nessa totalidade, em como garantir uma política pública, que a Funai deveria estar fazendo em vez de fazer um processo de criminalização e lutando contra aqueles que visam proteger os direitos dos indígenas.

Revista Movimento – Quais serão os próximos passos da Comissão Externa?

Vivi Reis – Nesta quarta-feira (6), teremos uma reunião da Comissão Externa, na qual vamos apresentar os requerimentos que achamos necessários, como para pedidos de informações a órgãos federais, convocar audiências públicas para que possamos fazer novas escutas no âmbito de Brasília, e apresentar um relatório da diligência. Teremos um período, nos próximos meses, para melhor estudar os resultados desses requerimentos, a realização de audiências públicas para elaborar um relatório final. Isso não será em julho, por causa do recesso parlamentar, mas nesse período, vamos buscar a aprovação desses requerimentos na busca por elementos que possam subsidiar a escrita deste relatório final.

Revista Movimento – O que a senhora espera que resulte desse trabalho?

Vivi Reis – A nossa busca principal é por justiça em relação ao assassinato do Bruno e do Dom. Que a memória deles seja preservada. A gente não pode aceitar nenhum discurso que venha a diminuir a importância da atuação deles em defesa dos territórios. Mas precisamos avançar, também, na garantia de indenizações aos familiares, de apoio psicossocial à família e amigos próximos que estão em sofrimento psíquico; Precisamos, em especial, encontrar esses mandantes e responsabilizá-los pelo crime, bem como ao estado brasileiro por sua negligência em relação ao que aconteceu com Bruno e com Dom e, apontar para o futuro com uma forma de atuação que evite que outras pessoa sejam assassinadas e ameaçadas por proteger a Amazônia. Queremos também proteção para lideranças indígenas e servidores da Funai que estão sendo ameaçados.Para isso, preciso falar da importância de se realizar mobilizações em todo o Brasil e no mundo por justiça; É importante essa unidade externa, essa movimentação que busque exigir providências. O povo brasileiro e a sociedade como um todo vêm protagonizando atos, e isso é muito importante para que nós possamos ter mais forças e seguir buscando construir uma política que vá de fato conquistar justiça e evitar que novas mortes aconteçam.

(Entrevista realizada por Tatiana Dutra)


TV Movimento

PL do UBER: regulamenta ou destrói os direitos trabalhistas?

DEBATE | O governo Lula apresentou uma proposta de regulamentação do trabalho de motorista de aplicativo que apresenta grandes retrocessos trabalhistas. Para aprofundar o debate, convidamos o Profº Ricardo Antunes, o Profº Souto Maior e as vereadoras do PSOL, Luana Alves e Mariana Conti

O PL da Uber é um ataque contra os trabalhadores!

O projeto de lei (PL) da Uber proposto pelo governo foi feito pelas empresas e não atende aos interesses dos trabalhadores de aplicativos. Contra os interesses das grandes plataformas, defendemos mais direitos e melhores salários!

Greve nas Universidades Federais

Confira o informe de Sandro Pimentel, coordenador nacional de educação da FASUBRA, sobre a deflagração da greve dos servidores das universidades e institutos federais.
Editorial
Israel Dutra e Roberto Robaina | 21 abr 2024

As lutas da educação e do MST indicam o caminho

As lutas em curso no país demonstram que fortalecer a classe trabalhadora é o único caminho para derrotar a extrema direita
As lutas da educação e do MST indicam o caminho
Edição Mensal
Capa da última edição da Revista Movimento
Revista Movimento nº 48
Edição de março traz conteúdo inédito para marcar a memória da luta contra a repressão
Ler mais

Podcast Em Movimento

Colunistas

Ver todos

Parlamentares do Movimento Esquerda Socialista (PSOL)

Ver todos

Podcast Em Movimento

Capa da última edição da Revista Movimento
Edição de março traz conteúdo inédito para marcar a memória da luta contra a repressão