Entre Egito e Catar: os olhos do mundo dentro e fora dos campos
Seja pela preocupação universal com o clima ou pela paixão popular que o futebol ativa em multidões pelo planeta, os eventos do Egito e do Catar estão no centro dos acontecimentos.
Estamos entre dois grandes acontecimentos internacionais que chamam a atenção de milhões de pessoas: de 6 a 18 de novembro, realizou-se a 27ª Conferência do Clima da ONU, a COP 27. Dias depois de seu encerramento, no Catar, iniciou-se a Copa do Mundo de futebol. Apesar de serem eventos muito diferentes, ambos atraíram os olhares do mundo, despertando uma grande cobertura da mídia. Em ambos, igualmente, a participação do Brasil foi muito aguardada e gerou expectativas.
Seja pela preocupação universal com o clima ou pela paixão popular que o futebol ativa em multidões pelo planeta, os eventos do Egito e do Catar estão no centro dos acontecimentos. No Brasil, além disso, seguem as discussões da equipe de transição e são aguardadas as escolhas de Lula para seu ministério. De qualquer modo, os olhos do mundo presenciaram uma comunidade internacional que respirou aliviada com a a derrota de Bolsonaro. A COP 27 foi marcada pela esperança de um novo momento na diplomacia brasileira, além de uma nova política ambiental e climática, que tome a preservação da Amazônia como prioridade. A celebração dos gols de Richarlison na estreia brasileira na Copa, por sua vez, indicaram outro sinal de alívio e esperança. Virar a página do bolsonarismo é uma tarefa pendente, a mais necessária do momento.
COP 27: a dramática discussão sobre o futuro em jogo
A COP 27 foi marcada pela crescente pressão sobre os governos pela mudança da matriz energética, pela preservação dos biomas e pela redução das emissões de gases de efeito estufa. O evento teve como sede o luxuoso balneário de Sharm-el-Sheik, no deserto do Sinai, conhecido por suas suntuosas lagoas artificias, contrastando com um Egito que está à beira da emergência hídrica.
As manifestações contra a hipocrisia do discurso climático dos governos foram bastante reprimidas, com dezenas de ativistas presos e um forte operativo policial encomendado pela ditadura militar egípcia. O resultado da cúpula ficou aquém das dramáticas necessidades imediatas para proteger o futuro do planeta. Houve presença recorde de lobistas de combustíveis fósseis e discussões difusas sobre o aquecimento global. O acordo final finalmente previu a constituição de um fundo para financiar a transição energética dos países mais pobres, apesar de a definição sobre os aportes dos países ricos ter ficado para a próxima COP.
O secretário-geral da ONU, António Guterres, afirmou que as medidas acordadas são insuficientes e alertou que “o mundo ainda precisa de dar um salto de gigante na questão climática”, reconhecendo que o planeta está na UTI do ponto de vista climático e ambiental.
No Brasil, é evidente a necessidade de uma ampla discussão a respeito do modelo de desenvolvimento, da preservação dos biomas e desmatamento zero, com destaque para a Amazônia, depois de anos de destruição dos órgãos de controle promovida pelo governo Bolsonaro e o estímulo ao desmatamento, à grilagem e ao garimpo. Nos estertores deste governo da destruição, o ministro Joaquim Leite foi flagrado praticando mergulho no balneário egípcio enquanto se desenvolviam as atividades da cúpula. Convidado a falar, Lula mobilizou grande audiência para seu discurso e prometeu uma presidência que tome a preservação ambiental e os compromissos climáticos com prioridade, vinculando-os ao combate à pobreza.
Copa do Catar: exploração do trabalho, mortes e desrespeito aos direitos humanos mancham mais um megaevento internacional
A Copa do Mundo de futebol, por sua vez, é um dos maiores eventos internacionais, mobilizando negócios bilionários e a atenção planetária. A construção da infraestrutura para o Mundial foi marcada, segundo estimativas extraoficiais, pela morte de 6750 operários e, mais uma vez, a corrupção dos dirigentes da FIFA e de diversos agentes políticos escancarou-se. A escolha do Catar como sede do evento deveu-se à compra de votos de dirigentes do futebol, o que levou à queda de Blatter e Platini.
O atual presidente da FIFA, por sua vez, demonstrou honrar a tradição da entidade com suas declarações minimizando as violações de direitos humanos no país árabe, comparando-os a um suposto “bullying” que teria sofrido na escola, quando criança, por ser ruivo. Ao mesmo tempo, a entidade proibiu manifestações das seleções, o que levou a protestos, como dos jogadores alemães, além das marcantes manifestações da seleção e de torcedores iranianos contra a repressão da ditadura teocrática persa. Uma das cenas mais marcantes até aqui foi a invasão de campo de um ativista com a bandeira LGBTQI+ e uma camiseta onde se lia: “respeito às mulheres iranianas”.
O Brasil e uma nova agenda política
A COP 27 foi a primeira reunião internacional após a derrota eleitoral de Bolsonaro. Os compromissos assumidos por Lula no evento devem ser cobrados. Ao mesmo tempo, a luta contra a predação ambiental, a expansão da fronteira agrícola e pela preservação das terras indígenas, quilombolas e de ribeirinhos deve ser central na atuação da esquerda socialista, além da permanente agitação de investigação, punição e reparação dos crimes do bolsonarismo.
Por outro lado, a Copa após a derrota de Bolsonaro abriu espaço para o debate sobre o sequestro da seleção, da bandeira brasileira e da camisa canarinho pela extrema-direita, de que Neymar é o maior símbolo – não é por acaso que atraia tanta antipatia. A nova geração em campo e o novo momento político abrem espaço para a disputa desses símbolos nacionais, junto aos milhões que torcem pelo Brasil na Copa. A celebração de nomes como Vinícius Jr. e Richarlison aponta para essa direção.
Durante as próximas semanas de atenção com a Copa, no entanto, o PSOL travará um importante debate sobre seu papel independente para lutar contra a extrema-direita e pelas nossas demandas. O Diretório Nacional decidirá a localização do partido diante do novo governo numa reunião em 17 de dezembro, véspera da final do Mundial. Acreditamos que o partido, nessa reunião, terá condições de expressar sua posição de independência, sem compor ministérios ou cargos no novo governo. Como parte dessa luta, veio em boa hora a declaração de líder do PSOL, Sâmia Bomfim, após seminário da bancada, de que não o partido não será parte do acordo entre o PT e o bolsonarista Arthur Lira para seguir no comando da casa.
Nas próximas semanas, então, ocorrerão decisões importantes dentro e fora do campo. Seguiremos torcendo e lutando pelos interesses das maiorias populares.