‘Legado perverso’: diagnóstico da gestão Bolsonaro apresenta um Brasil à beira do colapso
Relatório da equipe de transição relaciona fome, pobreza, além de falta de verbas para remédios, merenda escolar, livros didáticos e vacinas contra a Covid-19 entre os principais desafios do novo governo
Na manhã desta quinta-feira (22), o vice-presidente eleito, Geraldo Alckmin (PSB), apresentou o Relatório Final do Gabinete de Transição. O documento de 100 páginas, é um pequeno raio-x do desmonte promovido por Jair Bolsonaro (PL) em quatro anos de desgoverno, e levanta quais possíveis reflexos os erros da gestão que finda trarão futuramente.
“O resultado é uma fotografia contundente da situação dos órgãos e entidades que compõem a Administração Pública Federal. Ela mostra a herança socialmente perversa e politicamente antidemocrática deixada pelo governo Bolsonaro, principalmente para os mais pobres. A desconstrução institucional, o desmonte do Estado e a desorganização das políticas públicas são fenômenos profundos e generalizados, com impactos em áreas essenciais para a vida das pessoas e os rumos do País. Isso tem tido consequências graves para a saúde, a educação, a preservação ambiental, a geração de emprego e renda, e o combate à pobreza e à fome, entre outras”, diz trecho da apresentação do relatório.
O vácuo de poder do atual governo deixou vários setores à beira do colapso. A fome é realidade para mais de 33 milhões de brasileiros, faltam remédios na Farmácia Popular, esgotam-se os estoques de vacinas contra a Covid-19, as universidades públicas aguardam verbas para poder concluir o ano letivo e, na Educação Básica, não foram previstas verbas para custeio da merenda escolar e mesmo da impressão de livros didáticos. O documento qualifica o momento como um “apagão”.
“A aprendizagem diminuiu, a evasão escolar aumentou, os recursos para essenciais, como a merenda escolar, ficaram congelados em 36 centavos. Tivemos quase colapso dos institutos federais e das universidades. Portanto, temos um grande desafio pela frente”, disse Alckmin.
Principais pontos
O relatório se divide entre uma radiografia do desmonte do Estado e das políticas públicas, um mapeamento das emergências fiscais e orçamento, para consequente apresentação de sugestões de medidas para revogação e revisão a partir de janeiro de 2023 – como as legislações que flexibilizam o controle e compra de armas, o garimpo em terras indígenas e a lei de acesso à informação, entre outras. Por fim, o documento apresenta sua proposta de estrutura ministerial.
Confira a seguir os principais pontos do diagnóstico do Governo de Transição.
- A herança do governo Bolsonaro é a desorganização do Estado e o desmonte dos serviços públicos essenciais. Esses processos foram contínuos, abrangentes e sistemáticos, sendo parte do seu projeto político-ideológico de redução e enfraquecimento institucional do Estado. O desmonte respondeu a uma lógica de menos direitos para a maioria, e mais privilégios para uma minoria
- Durante o governo Bolsonaro, sob a égide da EC 95/2016, exacerbou-se um processo de enrijecimento dos gastos reais primários, no que diz respeito ao desfinanciamento das políticas públicas de saúde, previdência e assistência social, dentre outras. No entanto, para atender suas necessidades de sustentação política, em quatro anos o atual governo furou o teto de gastos por cinco vezes, gerando gastos no valor de cerca de R$ 800 bilhões.
- O legado dos quatro anos do governo Bolsonaro é perverso. Ele deixa para a população o reingresso do Brasil no mapa da fome: hoje são 33,1 milhões de brasileiros que passam fome e 125,2 milhões de pessoas, mais da metade da população do país, vive com algum grau de insegurança alimentar.
- Os cortes no orçamento da saúde para 2023 são da casa de R$ 10,47 bilhões, o que inviabiliza programas e ações estratégicas do SUS, tais como: farmácia popular, saúde indígena, e o programa HIV/AIDS. Isto sem contar a fila dos atendimentos especializados que cresceram de forma vertiginosa após a pandemia.
- Na educação, o governo Bolsonaro mostrou seu descompromisso com o futuro. Cortou deliberadamente recursos, não contratou a impressão de livros didáticos,
- colocando em risco a qualidade do ano letivo em 2023. E contribuindo para ampliar a evasão escolar que cresceu com a pandemia, o governo Bolsonaro congelou durante quatro anos em R$ 0,36 centavos por aluno a parte da União para a merenda escolar.
- Sob o governo Bolsonaro, o Brasil bateu recordes de feminicídios, as políticas de igualdade racial sofreram severos retrocessos, produziu-se um desmonte das políticas de juventude e os direitos indígenas nunca foram tão ultrajados na história recente do país.
- Na estrutura ocupacional no setor público federal, o assédio institucionalizado, a precarização laboral, a redução de pessoal, os sete anos sem reajuste para o funcionalismo tornaram mais precário o serviço prestado à população.
- A falta de planejamento impediu a modernização da gestão pública, com o esvaziamento completo do PPA e suas estruturas e funções de gestão e burocracias correlatas.
- A destruição ambiental nos dois últimos anos foi a maior em 15 anos. Em quatro anos, o governo Bolsonaro destruiu 45 mil km² com desmatamento só na Amazônia.
- O programa de desestatização caracterizou-se por decisões erráticas que implicaram em: desnacionalização patrimonial e perda de soberania nacional; desarticulação dos investimentos públicos indutores e multiplicadores dos investimentos privados e do próprio crescimento econômico
- No tocante às relações federativas, o governo Bolsonaro foi responsável pela maior
- crise do sistema federativo desde a redemocratização. A União provocou desunião.
- Observou-se o enfraquecimento dos elos federativos em torno das principais políticas setoriais da área de Desenvolvimento Social e Garantia de Direitos. O exemplo maior foi o papel desarticulador do Governo Federal no enfrentamento da pandemia da COVID-19.
- No tocante à Política Externa Brasileira, o governo isolou o país de seus vizinhos e dos âmbitos multilaterais, e não pagou cotas a organismos internacionais, deixando o país sem voto nestes fóruns. Sob a égide de Bolsonaro, constata-se um profundo rebaixamento e desprestígio internacional do Brasil no concerto das nações.