Apenas a Ponta do Iceberg
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Apenas a Ponta do Iceberg

A fraude no balanço financeiro das Lojas Americanas pode ser somente a ponta do iceberg do problema na economia brasileira.

No dia 11 de janeiro , Sergio Rial até então CEO das lojas americanas divulgou ao mercado que existia “inconsistências” bilionárias nos balanços dos últimos anos das Lojas Americanas. O rombo contanto a dívida financeira já conhecida somando as inconsistências ultrapassa os 40 bilhões de reais. A dimensão desse rombo o transforma em impagável, para termos ideia antes da divulgação o valor de mercado total da empresa era de 10,83 bilhões de reais, no dia 20 de janeiro a empresa valia R$ 641 milhões. O Bradesco e Itaú já se anteciparam e fizeram provisões nos seus balanços para cobrir 100% das dívidas das Americanas, isso significa que esses bancos já contabilizaram que não irão receber nada da dívida bilionária dessa empresa.

Nesse texto iremos trabalhar com a hipótese que a fraude no balanço das Americanas seja somente a ponta do iceberg da crise que ronda a economia capitalista brasileira.

Por que o rombo das Americanas afeta a economia brasileira?

Em primeiro lugar o rombo das Americanas envolve o centro do capitalismo brasileiro. Os principais bancos do país terão perdas bilionárias. O Bradesco (5,15 bilhôes) , o Itau ( 3,04 bilhões) , o Santander( 3,64 bilhôes) , o BTG (3,51 bilhões) e o Safra (2,52 bilhões) totalizando créditos no valor de 17, 88 bilhões. O Bradesco foi o primeiro a refletir isso no seu balanço, tendo queda de 76% no lucro do quarto trimestre de 2022. Não será somente o setor financeiro o afetado, centenas de fornecedores não irão receber seus créditos. Esses fornecedores estão espalhados no longo da cadeia produtiva e envolvem desde grandes industrias até pequenos fornecedores. Outras questões que empresas do varejo terão mais dificuldade para rolar suas dívidas, o crédito vai ficar mais caro e mais escasso. A renúncia do presidente da Lojas Marisas e mais três executivos no meio da dificuldade de renegociar as dívidas do grupo mostram como o rombo das americanas afetam o financiamento das grandes empresas brasileiras. As dívidas do grupo Marisa chegam aos 600 milhões de reais.

As Americanas não é um caso isolado

Em segundo lugar a fraude contábil das Lojas Americanas não é o primeiro caso que afetas grandes empresas nacionais. Pelo menos em outros 5 casos, importantes empresas brasileiras foram afetadas pelas chamadas “inconsistências contábeis “ .Em dezembro de 2019 a “Via Varejo” , um das gigantes do varejo brasileiro, dona do Extra, Casas Bahia e Ponto Frio anunciou fraude contábeis no valor de 1,2 bilhões de reais. Em 2020 a principal empresa de turismo do Brasil, a CVC divulgou que seus balanços contábeis anteriores tiveram erros que produziram um rombo de R$ 362 milhões. Em setembro de 2022 o grupo de Itapemerim que chegou a ser a maior empresa de transporte rodoviário do país teve sua falência decreta. Era o fim de uma longa novela iniciada em 2016 quando o empresário Sidnei Piva comprou o grupo já em recuperação judicial. A novela é recheada de fraudes, propina para o juiz do caso, desrespeito ao consumidor que comprou passagem e não conseguiu embarcar…. O IRB é uma resseguradora que tem liderança no mercado no Brasil e na América Latina, em 2 de fevereiro de 2020, a Squadra, umas das principais gestoras de ações no Brasil divulgou uma carta onde questionava práticas contábeis do IRB. Esse processo levou uma sucessão de crises na empresa, saída de vários executivos, investigação da Comissão de Valores Mobiliários e deterioração nos valores das ações chegando a valer menos de 1 real, em outubro de 2022. Por ultimo o caso envolvendo a Kraft Heinz, a comissão reguladora do mercado de capitais dos EUA apontou distorções nos balanços da empresa envolvendo os anos de 2016, 2017 e 2018 A empresa de alimentos republicou seus balanços fazendo baixas no valor de R$ 57,6 bilhões cotação na época. O interessante que entre os principais acionistas está a 3G Capital, que também é principal investidor das lojas Americanas.

Quem é a 3G Capital?

A 3G Capital é um “holding” de investimentos, fundada em 2004, seus sócios fundadores são Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira. Os três estão na lista dos principais bilionários brasileiros e são conhecidos pelas suas práticas agressivas no mercado. A 3G tem participação expressiva em grandes empresas brasileiras e transnacionais com destaque para AB InBEV , maior cervejaria do mundo, dona da AMBEV, Kraft Heinz , multinacional americana, fabricante de alimentos, líder de ketchup e molhos de tomates e dos Restaurantes Brands International, uma rede canadense de fast-foods formada a partir da fusão do Burguer King e a lojas de cafés e donuts Tim Hortons. Também é dona da rede Popeys outra cadeia de restaurantes. Além das três empresas transnacionais acima, a 3G é dona de outras empresas famosas no Brasil como Submarino, Shoptime, Puket, Imaginarium, Love Brands, Hortifruti Natural da Terra, Ame e Ame Go…. Lemann, Telles e Sicupira segundo o ranking da Forbes são as três pessoas mais ricas do Brasil A fortuna do primeiro é de US$ 15,7 bilhões, do segundo US$ 10,6 bilhões e do terceiro US$ 8,7 bilhões. Os dados acima demonstram como a 3G Capital está no centro do capitalismo brasileiro e faz parte do pequeno setor da burguesia brasileira que conseguiu prosperar com a desnacionalização da economia nacional, crescendo em associação com o capital internacional.

O rombo das Americanas colocam um sinal de alerta para o conjunto das empresas que a 3G participam da gestão. O grupo já teve envolvido em outro escândalo contábil com Kraft Heinz que já descrevemos acima. Agora as suspeitas apontam um rombo tributário bilionário na AmBev. A história parece demonstrar que a ousadia e agressividade da 3G não está marcada na “genialidade” dos seus sócios, mas sim em achar brechas legais e inconsistências nos órgãos de fiscalização para ganhar vantagens no mercado.

Evidências que Reforçam nossa Hipótese

Outro aspecto que nos faz acreditar que não seja uma situação isolada a questão das Lojas Americanas é que o setor das grandes lojas varejo hoje é um mercado oligopolista ou seja poucos grupos dominam a maior parte do mercado. Em uma situação dessas uma fraude do tamanho que ocorreu na Lojas Americanas deveria levar ela ter uma grande vantagem em relação aos outros grandes grupos que compõem esse mercado. Se pegarmos a evolução dos resultados das Lojas Americanas, Magazine Luiza e Via Varejo (dona da Casas Bahia, Extra e Ponto Frio) não existem nenhuma grande discrepância. Além disso a Via Varejo também teve envolvida em inconsistência de balanços como relatamos em um item acima no texto.

Por fim um dos motivos que reafirma a hipótese que a crise financeira das Lojas Americanas é apenas a ponta o Iceberg, os bancos estão encarecendo e restringindo o crédito. Isso é típico de um processo que antecede uma crise grave. Esse processo está acontecendo em um momento em que as grandes empresas têm um alto grau de endividamento, nesse quadro a falta de credito pode levar várias delas a bancarrota.

Qual deve ser a política do governo frente a tempestade que se aproxima?

A política do governo Lula deve ser pautada na defesa dos trabalhadores que são os que mais vão sofrer frente a crise. Nesse sentido a primeira medida deve ser a garantia de estabilidade de emprego para os trabalhadores. No caso de empresas que quebrarem devem ser estatizadas sobre controle dos trabalhadores e os bens dos seus controladores devem ser confiscados. Os bancos públicos devem garantir créditos com juros baixos para o setor estatal, para os pequenos e micro empresários e para os trabalhadores.

O governo e os bancos públicos não devem fornecer nenhum centavo para salvar os grandes grupos privados e seus acionistas. Os bilionários não devem existir.

Os trabalhadores não irão pagar a conta da crise somente se mobilizarem para exigir seus direitos frente ao governo e aos empresários. No momento de crise essa afirmação é mais ainda verdadeira por isso nos do MÊS continuaremos como prioridade zero impulsionar toda a luta das trabalhadoras e dos trabalhadores.


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Pedro Micussi