MPF reforça exigências para proteger aldeia Xokleng em SC
Governo do Estado invadiu território e fechou comportas de barragem sem garantir rota de fuga aos indígenas
Foto: Ícaro Patté/Wikipédia
A mão pesada da Polícia Militar catarinense, sob ordens do governador Jorginho Mello (PL), está na mira do Ministério Público Federal (MPF). Na manhã de domingo (8), agentes fizeram uma intervenção violenta para fechar duas comportas da Barragem Norte de José Boiteux, localizadas dentro de território indígena do povo Xokleng. A medida visaria evitar novas tragédias em Blumenau em função das fortes chuvas, que causaram alagamentos no Estado.
A intervenção foi autorizada, na noite de sábado (7), pela Justiça Federal. Porém, era pré-requisito para a ação atender a sete exigências da aldeia. Entre elas, a melhorias na estrada que serve de rota de fuga para os 300 indígenas em caso de alagamento, destacamento de uma equipe de saúde 24 horas no território, fornecimento de água potável, doação de três barcos e fornecimento de cestas básicas.
Além de não cumprir as medidas, a PM agiu com violência para adentrar a comunidade, que resistiu à invasão durante a madrugada. Pela manhã, conforme relatos, pelo menos dois indígenas foram vítimas de tiros de balas de borracha disparados por policiais.
Assim, no domingo, o juiz federal Vitor Anderle fez novas exigências ao Estado. A primeira foi a imediata saída da PM da região, que deve ficar sob guarda da Polícia Federal por 10 dias. O magistrado ainda deu prazo de 24h para que o governo catarinense apresente um laudo que comprove a estabilidade da barragem, e concedeu aos indígenas mais 48h para apresentar novas reivindicações em razão dos efeitos do fechamento das comportas.
O povo Xokleng vive a incerteza de que a barragem irá suportar a água represada e pede que o governo execute um plano de contingência para caso a instalação comece a verter, alagando a aldeia, arriscando vidas da comunidade. Em live realizada na noite de sábado, lideranças da juventude Laklanõ-Xokleng denunciaram o estado precário da barragem, que está sem manutenção há 10 anos. O fechamento das duas comportas poderia provocar uma catástrofe como aconteceu em Brumadinho (MG).
Jorginho Mello usou as redes sociais para reafirmar que o fechamento da barragem não traz insegurança para a comunidade, e a decisão “teve base técnica”.
“Consultamos especialistas, técnicos da nossa Defesa Civil, engenheiros da Secretaria da Infraestrutura para entender a real situação”, acrescentando que o fechamento das comportas pode reduzir em cerca de dois metros o volume do rio Itajaí-Açu, 14 metros acima do nível normal.
Hoje, Jorginho voltou às redes e afirmou que atendeu às exigências dos Xokleng. Além de barcos, cestas básicas e água, a comunidade ainda recebeu uma ambulância. Já as obras solicitadas pela aldeia ficarão para o fim do ano.
Marco temporal
O povo Xokleng ficou nacionalmente conhecido por estar no centro da disputa da tese sobre o marco temporal, rejeitada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em setembro deste ano. O marco temporal pleiteia que a demarcação de terras indígenas só ocorra em comunidades que ocupavam seus territórios na data de promulgação da Constituição de 1988. Os indígenas, porém, protestaram contra a proposta, uma vez que muitas comunidades foram forçadas a sair das terras ocupadas tradicionalmente e não tinham a posse delas naquele período.