Santa Catarina: Adotiva e sua luta pelas crianças e mulheres da Costeira
A Costeira era muito procurada pela população negra, pois conseguiam nesta região comprar terra, garantir a autonomia alimentar e sobrevivência digna
Foto: UFSB
Adotiva foi uma professora negra, descendentes de africanos, assim como Antonieta de Barros, Leonor de Barros, Clotildes Lalau, Maria da Costa Lourdes Gonzaga (Dona Uda), Inésia Rodrigues Alosilla, Altair Lucio Felipe, Maria Terezinha Pinheiro da Silva, entre outras. Adotiva ficou conhecida por ter seu nome na escola de Educação Básica Municipal Adotiva Liberato Valentim, localizada no bairro Costeira do Pirajubaé em Florianópolis-SC.
Naquela época, era comum que muitas pessoas quisessem ser professores, tendo em vista o respeito social da carreira e a sua estabilidade. Além de reconhecerem que era na escola que existia a possibilidade de superação de diversas questões discriminatórias.
A professora Adotiva Liberato Valentim nasceu em 17 de junho de 1931, no bairro Saco dos Limões, também em Florianópolis. Seu pai, Liberato, era lavrador, tinha criação de animais; sua mãe, Ana era dona de casa. Ainda que não tenha frequentado a escola, dona Ana era muito sábia, conhecia muito sobre a cultura local, ervas, comida (que era muito saudável na época), costura e tantos outros saberes.
Os pais da Adotiva moravam em Barreiros, bairro de São José, município vizinho de Florianópolis. Vieram morar na Costeira do Pirajubaé por indicação de uma comadre, pois no local haviam áreas para o cultivo de alimentos e criação de animais.
A Costeira era muito procurada pela população negra, pois conseguiam nesta região comprar terra, garantir a autonomia alimentar e sobrevivência digna. Esse bairro também é famoso porque havia uma relação de camaradagem entre seus moradores, as famílias se ajudavam na construção de casas, cuidados com as crianças, pesca, plantações e colheitas.
Em 1950, a professora Adotiva se casou e teve três filhas: Carmem, Mari e Izilda. Doze anos depois do seu casamento, foi admitida na Escola do Campeche, que ficava na Lagoa da Conceição. Por conta da dificuldade de transporte na época, a professora ia e voltava diariamente a pé, cerca de 8 km de ida e 8 km de volta, pois o único ônibus que saia do centro passava somente no trevo do Rio Tavares e seguia para o Pântano do Sul. Demandando assim que ela fosse do início do sul da ilha até a região leste caminhando no sol e no frio intenso.
Em 1964, Adotiva passou a trabalhar em uma escola na Costeira, bairro onde residia, na Escola Anísio Teixeira. Segundo relato de seus alunos, era comum que a professora, além dos conteúdos previstos, discutisse a importância de tratarmos todos com respeito, principalmente no que consistia a função de ensinar aos seus alunos a convivência em igualdade de condições.
A professora vislumbrava aos seus alunos que conseguissem ascensão econômica através das suas escolhas pessoais e profissionais. Para Adotiva, o acesso à educação e a cultura contribuíram para a formação e a independência financeira de todos da Costeira. Adotiva tinha muito preocupação com as crianças, pois sabia que a estabilidade profissional poderia ajudá-los no futuro, ela dizia que a remuneração não deveria estar ligada a nenhuma outra condição variável, referindo-se assim, principalment,e a experiências das lavadeiras, agricultoras, criadoras de animais e pescadoras do morro, pois entendia que diversas questões, inclusive climáticas poderiam dificultar o sustento dos seus filhos e netos.
O magistério garantiu para Adotiva prestígio e autonomia, pois foi a partir do seu trabalho que conseguiu criar suas filhas e cuidar da sua mãe, uma idosa doente e um irmão deficiente físico, sem contar com o seu companheiro, de quem divorciou-se em 1970 e nunca mais obteve ajuda.
A história da Adotiva Liberato Valentim é marcada por sua luta contra as estruturas de opressão. A professora levou até a morte (precoce) o seu amor pela Costeira, pelas crianças e pela educação. Destacando que esta faleceu, ainda em exercício da sua função.