Governo da Nicarágua prende religiosos e Papa se manifesta
Francisco denunciou perseguição a religiosos em mensagem dominical, no Vaticano
Foto: Spencer Platt/Getty Images
O papa Francisco denunciou na segunda-feira (1º) a crescente repressão à Igreja Católica na Nicarágua, onde impera a ditadura do presidente Daniel Ortega. A perseguição a religiosos que pedem o fim das arbitrariedades contra opositores do governo começou ainda em 2018, após as primeiras manifestações populares, mas vem se recrudescendo ano a ano.
Nos últimos dias de 2023, 12 padres e um bispo foram detidos pelo governo centro-americano. Os último quatro detidos – os padres Mikel Monterrey, Gerardo Rodriguez e Raul Zamora, juntamente com o Monsenhor Miguel Mantica, filho de uma das famílias mais ricas da Nicarágua – foram levados de suas respectivas casas na madrugada de sábado (30), Todos pertencem à Arquidiocese de Manágua, informa a agência Reuters.
“Acompanho com preocupação o que está acontecendo na Nicarágua, onde bispos e padres foram privados de sua liberdade”, disse o pontífice em sua mensagem dominical, na Praça São Pedro, no Vaticano. “Expresso minha proximidade em oração a eles, suas famílias e toda a Igreja na Nicarágua. Espero que o caminho do diálogo possa ser seguido para superarmos as dificuldades”, pontuou.
O presidente Ortega acusa os religiosos de orquestrar um golpe contra o seu governo. Em 2023, o governo federal chegou a fechar uma universidade jesuíta na capital do país na expectativa de sufocar atividades subversivas. Dois dos padres presos – Monterrey e Zamora – abriram as portas de sua paróquia para estudantes de duas universidades que foram atacadas pelo governo em 2018.
Crise se prolonga
Desde 2017, a Nicarágua está sob o governo de Daniel Ortega, enfrentando uma crise de direitos humanos que inclui a perseguição de oponentes políticos, a proibição de práticas religiosas católicas e o fechamento de universidades, organizações não-governamentais e veículos de imprensa.
A convulsão social, em si, remonta aos protestos pacíficos contra os cortes nas pensões iniciados em abril de 2018. As manifestações foram reprimidas de maneira severa pela polícia e forças armadas pró-governamentais, resultando em mais de 40 mortes em apenas cinco dias. Essas fatalidades desencadearam um movimento espontâneo de massas que clamava pelo fim do regime do presidente Ortega. Até o final daquele ano, mais de 300 pessoas teriam perdido a vida, os feridos passavam de 2 mil e os exilados, 80 mil.
Sob intensa pressão política internacional, o governo da Nicarágua iniciou um diálogo com a oposição, representada pela Alianza Cívica por la Justicia y la Democracia, em março de 2019. Comprometeu-se a libertar prisioneiros políticos e garantir direitos democráticos básicos ao povo. Como resultado, 492 prisioneiros foram libertados. No entanto, essas libertações ocorreram sob condições que ameaçavam os ex-presos políticos com processos criminais se participassem de manifestações críticas ao governo. Ao mesmo tempo, a lei protegia as forças policiais e paramilitares envolvidas nas medidas repressivas, inclusive as letais, contra qualquer processo jurídico futuro.
Observadores internacionais denunciam desde então o desrespeito a direitos fundamentais, como o de reunião pacífica (combatido com uso desproporcional da força; a liberdade de expressão (com difamação e prisão de jornalistas e ativistas, além de fechamntos de jornais); prisões, tortura e morte de poiticos e militantes oposicionistas, sem ordem da Justiça ou esperança de um julgamento julgamento justo.
Resolução da OEA
Em junho de 2023, a Organização dos Estados Americanos (OEA) aprovou uma resolução que insta à promoção da democracia na Nicarágua. A decisão foi alcançada por consenso durante a sessão plenária da organização, contando com o Brasil como um dos signatários. Um ano antes, Ortega fechou o escritório da OEA em Manágua e retirou antecipadamente seus representantes na organização.
A resolução até agora não teve efeitos práticos e a ditadura sanguinária de Ortega aprofundou sua repressão. No último dia 19 de dezembro, o Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV) anunciou a saída da sua missão humanitária da Nicarágua, atribuída a um “pedido” das autoridades do país.
A missão, iniciada em 2018, se concentrava no trabalho de apoio para restabelecimento de contato entre familiares e fortalecer seu trabalho humanitário em favor das pessoas mais vulneráveis; prevenção e esclarecimento sobre as consequências da privação de liberdade; e atividades de formação sobre o direito internacional humanitário, o quadro jurídico aplicável às tarefas em que participam as forças armadas e de segurança e o direito internacional dos direitos humanos.
Conforme a rede CNN, o CICV manterá sua delegação regional no México e na América Central à disposição para a negociar uma retomarda da missão na Nicarágua.