Acampamentos em solidariedade ao povo da Palestina no oeste estadunidense
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Acampamentos em solidariedade ao povo da Palestina no oeste estadunidense

Longe do epicentro da mídia, acampamentos surgem e mostram a resistência de estudantes pela Palestina

Alice Taylor 27 maio 2024, 18:05

Em meados de abril de 2024, estudantes da Columbia University começaram um acampamento em solidariedade a Gaza, demandando que a universidade retirasse os investimentos nos fundos direcionados ao governo israelense. A presidenta da universidade acionou a polícia que levou preso mais de 100 estudantes. Em seguida, estudantes ocuparam um prédio, homenageando uma menina morta em Gaza, Hind, o que resultou no aumento do número de alunos presos.

A repercussão ao redor do mundo foi imediata, ao mesmo tempo que os acampamentos – mais de cem até o momento – espalharam-se nos Estados Unidos. Dentre estes, destaca-se aqui o de Denver, Colorado, uma cidade no oeste do país rodeada pelas Rocky mountains. O primeiro acampamento foi montado numa grama entre três campi: Metropolitan State University, University of Colorado, Denver, e Community College of Denver. A maioria dos estudantes eram de classe trabalhadora, e permaneceram depois dos primeiros dias de chuva e neve.  

A visita da Angela Davis a uma cidade próxima, encorajou ainda mais os estudantes que juntaram para ouvi-la na chuva. Em sua visita, Davis destacou que – “Este momento marca um divisor de águas… é por isso que tínhamos lutado.” (“This is a moment that marks a breakthrough… this is what we’ve been struggling for”) descrevendo que os acampamentos representam o trabalho que tinha começado nos anos 60. Essa semana, ao conversar em aula com meus alunos/as sobre o capítulo dela “Ferguson nos lembra da importância de um contexto global” em Freedom is a Constant Struggle: Ferguson, Palestine, and the Foundations of a Movement, lembramos do legado do movimento negro e a solidariedade histórica com a liberdade Palestina.

Uns dez quilômetros para o sul da cidade de Denver,  alunos iniciaram o segundo acampamento na University of Denver no dia 09 de maio. Os alunos/as montaram barracas depois de um ato colocando demandas parecidas, exigindo que: os administradores abrissem seus livros para mostrar o orçamento, retirassem os investimentos direcionados a empresas responsáveis pela ocupação e genocídio do povo Palestino, defender a liberdade de expressão sobre o genocídio da palestina, e descolonizar.

Os alunos/as são de graduação e pós-graduação de vários departamentos, e um grupo de professores e trabalhadores universitários que ficam quase 24 horas por dia para apoiar a segurança do acampamento. Em solidariedade tem sido coletivos como Mutual Aid Monday, um grupo que oferece um jantar e serviços para a população de rua, que tem crescido tanto pelas políticas do prefeito quanto com o aumento de refugiados e imigrantes, principalmente no momento, de Venezuela. Militantes das Jewish Voice for Peace (JVP), Socialistas Democratas da America (DSA) como do Partido de Socialismo e Liberdade (PSL) e outros grupos também têm juntado a luta, vindo desde as marchas nas ruas, até o campus universitário.

Depois das ações da presidenta da Columbia, e outras universidades em que policiais foram chamados para remover protestantes – outros administradores observaram e optaram por outras respostas. Em todas, os acampamentos têm colocado uma luz sobre a administração das universidades e suas escolhas fiscais. Em alguns campi (por ex., Brown University, Metropolitan State, Sacramento State), a administração tem divulgado seus orçamentos. No caso da University of Denver, em vez de chamar a polícia, a administração têm seguido medidas de punições institucionais e acadêmicas: colocaram segurança do campus, revistam carteirinhas estudantis, e até então mandaram cartas restringindo 18 alunos a irem ao acampamento, com risco de suspensão se haja uma violação. As lideranças do acampamento que tem mais dialogado com a polícia tem sido alvo das ações punitivas da administração. As medidas, segundo um dos/das nove alunos restringindo a ir ao acampamento, fazem parte de deslegitimar o acampamento.

O reitor – cujo salário gira em torno de milhão de dólares por ano – foi nomeado por um conselho. Uma das respostas da administração contra problemas fiscais, tem sido a terceirização como forma de reduzir o orçamento. Ou seja, anunciou que ia mandar embora todos as trabalhadoras de limpeza do campus – em sua maioria, mulheres latinas – e lhes dar a opção de aplicar para uma empresa terceirizada onde perderiam uma serie de benefícios.

A administração diz estar preocupada com a segurança dos/das estudantes. Vários e-mails foram enviados de uma maneira vaga defendendo a liberdade de expressão, mas sem reconhecer as formas de assédio por parte dos setores contrários aos protestos e sem mostrar uma liderança eficaz de práticas democráticas e coletivas. Em um ato de resistência contra essa prática que os/as alunos consideram uma de vigilância, mostraram carteirinhas de identidade estudantis – mas refeitos colocando imagens de guerra no lugar das fotos deles/as. Segundo o mesmo estudante que recebeu uma medida restringindo ele de ir ao acampamento, as carteirinhas são uma forma de redirecionar o foco, quando a administração tenta desviar a atenção de todas as formas.

“Não se trata de carteirinhas, se trata da Palestina,” explicou. “A administração, a mídia, e outros setores contrários aos protestantes tentam dizer que se trata de outra coisa: antissemitismo (a diferença de antissionismo, que os estudantes defendem) segurança, a complexidade dos orçamentos – e usar cada tática para desviar o foco da violência ocorrendo na Palestina.”  Dia 21 de maio, o reitor anunciou que o acampamento teria que fechar, e uma protesta durou até meia noite que contou com a presença de palestrantes Palestinos/as incluindo uma legisladora local. O acampamento venceu, e a indignação na resposta administrativa aumentou.

Enquanto conversei com um aluno, comentei que acampamentos estão surgindo no Brasil, como no caso da Universidade de São Paulo (USP). Quando perguntei o que diriam para esses novos acampamentos, um aluno ativo desde o início do planejamento destacou novamente, a necessidade de manter o foco na Palestina como o motivo do acampamento. Citou também a importância de criar uma comunidade, e formação política, uma ação para dizer que na história os/as alunos lutaram, e não aceitaram que as universidades sejam cúmplices no financiamento do estado de Israel. “Tem uma solidariedade e simbolismo dos acampamentos ao redor do mundo, contra colonialismo, e um espaço para uma comunidade para lutar para além do acampamento.”

Enquanto punir alunos interrompe a educação na faculdade, várias formas de aprendizagem e educação política tem nascido nos acampamentos, desde aulas nos acampamentos até uma biblioteca. Tais formas de educação nos movimentos sociais segue uma tradição de “estudo e luta” segundo a autora Leigh Patel. Segue tradições de décadas desde Paulo Freire e as escolas itinerantes do MST, até as aulas na rua e formações políticas de movimentos de juventude que fizeram parte do meu trabalho de pesquisa de doutorado, como Juntos! Juntas! Emancipa, e o RUA. Tanto quanto o tempo que passei no trabalho de campo no Brasil, e acampamentos e ocupações como esse, são lugares de aprendizagem e educação política. Segundo o co-fundador do acampamento, que começou a militância dele nesse processo como muitos outros, aprendeu a chegar a decisões no coletivo, e a dialogar.   Desde Ferguson a Palestina, desde São Paulo a Denver – as lutas para a liberdade e os acampamentos universitários continuam na frente da chamada urgente para um cessar fogo na Palestina e em especial transparência sobre os gastos institucionais e desinvestimento; mostram, como no caso brasileiro, a sua disposição a lutar contra instituições que no dia a dia privilegia o lucro acima da aprendizagem e bem-estar dos estudantes e trabalhadores mais precarizados. No caso de Denver, que chama atenção é que por muitos alunos/as, a experiencia marcou a primeira experiencia de militância, dentro de campi sem muita história de luta. E nessa primeira experiencia de mais de duas semanas de ocupações, lutaram pelo desinvestimento e o anti-colonialismo de nível muito local, até a defesa do povo Palestino. Independente da duração da ocupação, está claro que fortaleceu uma geração que aprendeu a amar a luta coletiva pela justiça e os direitos.

Alice Taylor, com revisão da tradução de Luan Brum e Jahde Lopez


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