Sandro Fantinel: o negacionismo ambiental que ‘cola’
Sandro Fantinel

Sandro Fantinel: o negacionismo ambiental que ‘cola’

Vereador de Caxias do Sul (RS) propôs derrubar árvores para conter deslizamentos. “O que é que vale? A vida humana”, disse

Tatiana Py Dutra 17 maio 2024, 14:00

Foto: Bianca Prezzi/Câmara de Caxias do Sul

A catástrofe climática no Rio Grande do Sul vem trazendo a furo os conceitos distorcidos – e na maioria das vezes, mal intencionados – dos negacionistas da extrema direita. As certezas que, desavergonhadamente, se dispõem a propagar desafiam os limites da realidade. 

Exemplo disso foi uma promessa feita pelo vereador Sandro Fantinel (PL), na tribuna da Câmara de Caxias do Sul na última  terça-feira (14). Sua ideia é propor uma lei para derrubar árvores nas margens de estradas – “cinco metros para cada lado” – do município para “evitar desastres”. Em sua avaliação, o solo encharcado não suporta o peso da vegetação, causando deslizamentos.

“Beira de estrada tem que tirar (a vegetação) cinco metros para cada lado. Não interessa se é mata nativa, pinheiro, não interessa o que é”, afirmou. “O que é que vale? A vida humana”, disse.

Fantinel, que é sócio da Elfo Construtora, empresa especializada em instalações hidráulicas, sanitárias e de gás, afirmou que a legislação está “impedindo o desenvolvimento do Rio Grande do Sul por causa do meio ambiente”. O vereador, inclusive, começou sua fala criticando a proposta de criação de uma Frente Parlamentar de Prevenção e Enfrentamento de Crises Climáticas no município, dizendo estar “cansado de bate-papo” e que era preciso “debater soluções”. 

Citando vítimas que estão desabrigadas e “poderiam ser deslocadas para regiões seguras”, o parlamentar questionou o tempo que será preciso esperar para que “o meio ambiente ‘permita’ que se tire uma mata para colocar essas pessoas” no lugar. Segundo ele, “o problema não é nem tanto o Executivo, os projetos”, mas o fato de que as medidas “não passam ‘porque tem a nascente ‘x’, porque tem a mata nativa, não pode mexer’”.

Em seguida, justificou sua proposta genial de desmatamento de uma forma que estupidez a audiência presente na Câmara. Segundo ele, as matas gaúchas recebem a umidade vinda da Amazônia pelo “corredor” criado pelos “Estados que desmataram áreas nativas e criaram um bolsão de ar quente que impede a entrada” das águas em seus territórios. 

A fonte dessa teoria não foi apresentada, mas foi resumida pelo vereador Rafael Bueno (PDT):

“O senhor vê muito videozinho de Whats”.

Bueno, que é geógrafo, ainda tentou esclarecer o colega de que árvores ajudam a segurar o solo em deslizamentos, já que estabilizam e drenam a terra.

“Eu não sei de onde que o senhor tira tanta fake News. Como é que o senhor incentiva o desmatamento? Corta 5 metros de árvore de um lado, corta de outro, o que vai acontecer? Não é uma árvore que vai interferir, é todo o ecossistema”, argumentou. 

“A sua fala condiz 100% com vereadorzinhos de apartamento. Pessoas que moram em apartamento e não têm o mínimo conhecimento do que é viver no interior. O Fantinel não é contra a natureza e muito menos plantar árvores. Plantem árvores em outro lugar”, rebateu Fantinel.

Xenofobia

Caso você tenha achado o nome de Sandro Fantinel estranhamente familiar, não está enganado. Em fevereiro do ano passado, o vereador novamente ocupou a tribuna da Câmara para proferir um discurso escandaloso que ganhou o noticiário nacional.

Ele fez uma declaração xenofóbica contra o povo baiano, após o Ministério Público do Trabalho resgatar mais de 200 trabalhadores contratados por empresas associadas a vinícolas de Bento Gonçalves em condições análogas à escravidão. A maioria delas, era natural da Bahia. Na ocasião, Fantinel aconselhou agricultores, produtores e empresários do setor agrícola a não contratarem pessoas de lá, qualificando-as como um povo “acostumado com carnaval e festa”.

“Gente, só vou dar um conselho: agricultores, produtores, empresas agrícolas que estão me acompanhando, não contratem mais aquela gente lá de cima (estado da Bahia, no Nordeste)”, disse. “Com os ‘baianos’, que a única cultura que eles têm é viver na praia tocando tambor, era normal que tivesse esse tipo de problema (de trabalho análogo à escravidão)”, afirmou. “Que isso sirva de lição. Deixem aquele povo, que é acostumado com carnaval e festa, para vocês não se incomodarem novamente”, completou.

Fantinel ainda sugeriu a contratação de argentinos, “limpos, trabalhadores e corretos”. 

“Porque todos os agricultores que têm argentinos trabalhando hoje só batem palma. São limpos, trabalhadores, corretos, cumprem o horário, mantêm a casa limpa e, no dia de ir embora, ainda agradecem ao patrão pelo serviço prestado e pelo dinheiro que receberam”, disse.

Expulso do Patriotas por causa do episódio, Fantinel se filiou ao PL. O Ministério Público gaúcho denunciou o político à Justiça por crime de racismo. Por pressão de partidos de esquerda como o PSOL, a Câmara Municipal chegou a abrir processo de cassação, que acabou sendo rejeitado por 9 votos a 13. Infelizmente.

“Esse vereador já deveria ter sido cassado quando foi racista contra pessoas baianas, no ano passado. Mais do que nunca, precisamos de educação ambiental nas escolas desde cedo para evitar que mentiras negacionistas como essa se espalhem, pois elas têm graves consequências”, comentou a deputada Luciana Genro (PSOL-RS). 


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