É a economia, uma vez mais
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É a economia, uma vez mais

Os impasses econômicos e o ajuste fiscal do governo Lula são temas centrais para a análise da atual conjuntura brasileira

Israel Dutra e Roberto Robaina 28 ago 2024, 10:29

Foto: Galípolo e Haddad (Reprodução)

Já se vão 32 anos do episódio que gerou o conhecido jargão “é a economia, estúpido!”, cunhado durante uma disputa eleitoral estadunidense, e a economia é um tema cada vez mais essencial.

Quando falamos em economia, falamos de algo basilar: as condições de vida do povo, a relação de forças entre as classes, os interesses materiais que informam as decisões políticas. Apenas resgatando essa dimensão podemos pensar os desafios para o Brasil de 2024 e as disputas presentes.

Um mundo em crise

O capitalismo global está em crise desde 2008. Profundas mudanças se desenvolvem, engendrando o que se pode chamar de “policrise”, com uma queda brutal nas condições de vida da humanidade. Mesmo economistas burgueses formados na escola liberal, como Larry Summers, falam em “estagnação secular”, ou seja, indicam que não há perspectiva de melhoras e saída à vista. Mesmo que exista, em alguns momentos e em algumas regiões do globo, crescimento econômico, o que tem primado é a estagnação. Aumenta o chamado desemprego tecnológico, pioram as condições de vida do conjunto da força de trabalho, sejam nos países centrais ou periféricos; crescem as gigantescas dívidas – públicas e privadas – nos Estados Unidos e nas maiores economias.

Além disso, duas questões são inescapáveis. O impacto da brutal crise climática na sociedade e em todos os ramos da produção e os efeitos do desenvolvimento da Inteligência Artificial sobre o capitalismo tardio.

Estudar a dinâmica da economia brasileira é essencial. Um país marcado pela regressão, pela reprimarização, pela hegemonia do capital financeiro e dos que se beneficiam com a dívida pública.

O Brasil fica refém do projeto econômico neoliberal, ainda que pontualmente o governo ensaie críticas e defenda uma maior participação pública na economia. Infelizmente, a orientação econômica atual aceita as chantagens da grande burguesia para realizar o ajuste e garantir o pagamento de juros para a elite financeira.

O ajuste ou as desventuras de Haddad e Galípolo

O que marca a visão da política econômica do governo federal é a continuidade do ajuste, numa linha fiscalista de “comprimir o gasto público”. Um dos debates centrais das últimas semanas envolve a indicação para a presidência do Banco Central após o encerramento do mandato do controverso Campos Neto.

A burguesia atua para enquadrar a política econômica, aplaudindo as medidas contidas no Novo Arcabouço Fiscal. Em breve deve ser confirmada a indicação de Gabriel Galípolo para a nova gestão do BC. Fiel escudeiro de Haddad, Galípolo já afirmou que não haverão “grandes rupturas” na política monetária, ou seja, deve manter a política de juros altos. O Brasil é o segundo país no mundo em altas taxas de juros. Isso já diz tudo.

Por outro lado, a burguesia pressiona por mais e mais ajuste fiscal. A Folha de São Paulo tem sido a porta-voz, junto com banqueiros como o dono do Bradesco e André Esteves (do BTG Pactual), de um ajuste ainda mais severo. Seus últimos editoriais defendem ainda mais cortes sobre o BPC (Benefício de Prestação Continuada) e “aconselham” privatizar as maiores empresas públicas, como a Caixa Econômica Federal e o Banco do Brasil.

No terreno da “política”, há um efeito contraditório. Lula, em que pese ser um “mestre” na concertação de interesses, terá seu “poder de fogo” diminuído para investimentos públicos; já refém de suas próprias alianças parlamentares com o “centrão”, fica limitado do ponto de vista orçamentário ao compactuar com o ajuste contra o povo. É um flanco aberto para a demagogia da extrema direita.

As condições de vida da maioria estão piorando. O trabalho precário, sem registro de direitos e com baixíssimos salários, já é realidade para cerca de 40 milhões de brasileiros. O recente relatório do “Observatório Brasileiro de Desigualdades” traz um dado alarmante, o do crescimento da desigualdade de renda: em 2022, o 1% mais rico da população tinha rendimento 30,2 vezes maior do que os 50% mais pobres, o rendimento dos mais ricos subiu para 31,2 vezes em 2023 em comparação com os 50% mais pobres.

Um programa de urgência

É necessário combater com unidade e independência. Apostar na unidade de ação contra a extrema direita, mas ser o polo antineoliberal dentro das diferentes fórmulas de unidade. Para enfrentar, de forma consequente, o neoliberalismo é preciso formular e defender bandeiras concretas.

Nas lutas, no debate da opinião pública e nas eleições, vamos construindo um programa de urgência de acordo com a gravidade da situação.

Seguimos na defesa dos pisos constitucionais da saúde e educação. Na luta pela manutenção e ampliação do BPC, pelo reajuste da aposentadoria e do Bolsa Família. Pelo aumento do salário mínimo, bem como pela ampliação dos benefícios aos que sofrem com tragédias ambientais.

Lutamos pela redução dos juros; pela auditoria e não pagamento da dívida pública que entrega bilhões aos especuladores. O exemplo do Rio Grande do Sul, onde a dívida foi suspensa em função da catástrofe climática, indica que há recursos. Lutamos pela taxação das grandes fortunas e dos dividendos (em 35 anos, o Brasil saltou de 3 para 62 bilionários na lista da Forbes). Por uma ampla reforma tributária progressiva, que cobre mais de quem tem mais.

Essas medidas “elementares” devem ser acompanhadas de um programa que una às reivindicações populares, que passe por investimentos públicos pesados nas áreas estratégicas (saúde, educação, emprego, habitação, saneamento), pela valorização do serviço público com qualidade, voltado para a maioria do povo (isso significa valorizar sobretudo os servidores), à transição de um novo modelo de sociedade, com outras bases políticas e econômicas, diante da catástrofe ambiental e civilizatória que o capitalismo nos relega.


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Pedro Micussi