O Pará arde em chamas
Enquanto isso, o que faz o governador do estado?
Foto: Flickr/Reprodução
Os olhos do mundo estão voltados à Amazônia devido à COP-30 e todas suas potencialidades (ainda que, há muito conhecidas e exploradas) estão em voga no cenário internacional. A atual conjuntura política abraça esse evento e tudo que ele pode trazer de positivo ao país, entretanto, “onde há fumaça há fogo”. Nesse dito popular, que tem se demonstrado literal, onde estão as governanças responsáveis do coração da região Norte?
Os dados são aberrantes acerca das queimadas na Amazônia. Ainda que a quantidade de eventos de fogo ativos esteja abaixo da média com o quadriênio anterior, 9 dos 11 meses deste ano ultrapassaram mil focos de fogo por mês a partir da plataforma do SIPAM (Sistema de Proteção da Amazônia). Em termos de comparação, no governo Bolsonaro cerca de 6-7 meses ultrapassavam os mil focos de incêndio. Até mesmo durante o período de janeiro a abril deste ano, os focos de queimada superaram os meses de comparação dos anos anteriores. E não para por aí, de acordo com a plataforma PurpleAir existe um corredor de fumaça que acompanha as cidades do baixo Amazonas que tem afetado diretamente a população urbana e tradicional. Não coincidentemente, este corredor de fumaça segue o mesmo caminho do Arco do Desmatamento no Pará.
Diversas cidades já apresentam um estado crítico. Em Santarém não é possível ver o rio da sua orla turística, em Marabá o cheiro de fumaça também é presente, em Mosqueiro, distrito próximo à Belém, as queimadas surpreenderam a população em geral, que não haviam presenciado tal fato com a magnitude que tomou em novembro, em Moju algumas escolas tiveram que suspender suas aulas. O Sintepp (sindicato dos trabalhadores da educação pública no Pará) já registra várias regiões com o mesmo pedido: suspenção das aulas devido à fumaça. E com toda urgência desta questão ambiental, o governador Helder Barbalho segue sua agenda política e econômica de vender a “Amazônia Sustentável”. Minimamente, em qualquer meio de comunicação, tal questão ambiental estaria nas primeiras páginas dos jornais e pauta principal em noticiários da região…. Mas além colocar dezenas de parentes e parceiros em diversos cargos políticos eletivos, os Barbalho também cooptam os dois maiores jornais do Pará o que impede qualquer cobrança, ou até conhecimento geral da expressividade do problema, ainda que pose como democrata. Uma aguda contradição que anda na sombra do capitalismo.
Além do desprezo ao meio ambiente, o governo Bolsonaro também popularizou a desinformação enquanto arma política, portanto, devemos ser francos: a coivara e o roçado não são responsáveis por 21 mil focos de incêndio como em setembro de 2021, como podem sugerir de forma desonesta, quem quer eximir o papel do agronegócio na destruição da Amazônia. A coivara é um modo de queimada controlada para transformar campos em pastos agricultáveis era comum entre comunidades indígenas na sua história, herdadas por comunidades tradicionais como ribeirinhos e quilombolas que também usam o fogo para fazer seu roçado.
Essa agricultura tradicional, de baixa produtividade e geralmente voltada para a subsistência afeta pouco ou quase nada a natureza, ao contrário do agronegócio, voltado à exportação, à larga produtividade e a racionalidade capitalista que se assemelha ao crescimento de um câncer. A queimada criminosa, desmatamento de florestas protegidas, invasão de terras indígenas, grilagem de terras, e pistolagem são estratégias conhecidas por latifundiários no Norte do Brasil. São estes os grandes responsáveis pelo desmatamento de uma área do tamanho do México nos últimos 40 anos.
Esse agro-neoliberalismo perverso está intrinsecamente ligado ao passado colonial brasileiro essencialmente agrário e excludente, e que se tomarmos em conta a história econômica amazônica, que foi organizada na exploração e mercantilização da natureza, percebemos um indigesto fato: o agronegócio da soja, do dendê, a pecuária pretendem à Amazônia, o lugar de fronteira perene. Mesmo sendo avidamente destrutivo tanto como é lucrativo, a elite agrária não é, por sua vez, tão racional quanto se pensa, afinal de contas a China que, tem menos terras agricultáveis que o Brasil, produz, ainda assim, mais alimentos que o Brasil. O capitalismo agrário nos leva diretamente às questões de ordem climática, onde o global afeta diretamente a escala nacional e local.
Os dados do Instituto de Meteorologia (INMET) ilustram bem, a quantidade de chuvas no Pará e na região Norte vêm caindo desde 2016, principalmente no período entre julho e novembro (considerados os mais secos da região). O clima equatorial úmido da Amazônia é o mais úmido de todo o Brasil, com chuvas mais concentradas entre dezembro e abril, e períodos menos chuvosos entre agosto e outubro, entretanto, o que se observa com o passar dos anos é o aumento do calor e a diminuição das chuvas, que sem dúvidas tem como responsável o desmatamento agressivo causado pelo agro-neoliberalismo. Quanto menos árvores, menor a quantidade de chuvas e maior a quantidade de CO2 deixando de ser captada, gerando períodos mais secos, mais suscetíveis ao fogo mesmo em meses que eram considerados úmidos. Está chovendo em desertos, picos de montanhas estão sem neve, está chegando dezembro e as chuvas na Amazônia ainda estão escassas, fumaças recobrem os rios… período bem inconveniente para quem é negacionista da crise climática global. E para quem não é, também.
O panorama ambiental da Amazônia vai além das queimadas: garimpos ilegais, rios secando, poluição dos recursos hídricos devido à exploração de minério, perda de biodiversidade… Enquanto isso o governador Helder Barbalho tenta emplacar a ideia da Amazônia Sustentável, atraindo shows faraônicos com Alok e Coldplay, transformando a COP-30 em um Helderpalooza que funciona muito bem como uma cortina de fumaça: encobrir a fumaça real provocada pelas queimadas Pará afora. Como tem as grandes mídias sob seu controle, nada é divulgado e o Governo segue sem ser questionado sobre as queimadas e a fumaça que encobre várias regiões. A verdade é que não restaria muito da Mata de Lobos caso o Rei do Norte de Winterfell, do universo fictício de Crônicas de Gelo e Fogo, fosse o dito “Rei do Norte”, Governador do Pará, Helder Barbalho.
O prognóstico é muito claro, qualquer discussão ambiental para a Amazônia que tente reformar ou racionalizar a lógica capitalista da produção tende à permanência do ciclo de destruição já em curso, não obstante, se faz necessário a compreensão de que um futuro ecossocialista não só é viável, como imprescindível. A Amazônia, devido à sua posição geográfica, não conhece as estações de transição outono ou primavera, apenas um verão chuvoso e um inverno seco. Se não podemos ter acesso a uma primavera geográfica, que possamos sonhar com uma primavera simbólica, uma revolução ecossocialista e na Amazônia.