O PSOL precisa defender a mudança de rumos na economia
A ruptura com o receituário econômico neoliberal do governo Lula é essencial para combater a extrema direita
Enquanto o cenário político – nacional e internacional – vive turbulências com a posse de Trump e suas primeiras medidas, a maioria da população brasileira sofre com o aumento de preços.
Os problemas que escalam na chamada “economia real” envolvem diretamente as escolhas monetárias do governo. Podemos citar diversas iniciativas, como a manutenção da política de juros altos, por parte do Copom e do BC. Na rápida ida ao supermercado, se evidencia o quanto a alta dos preços se abate sobre os alimentos, pesando para o conjunto das famílias. Alguns itens básicos com carne, café, azeite e tomate tiveram alta considerável, com os dois primeiros acumulando entre 20% e 39% de alta nos últimos 12 meses.
Enquanto isso, o governo – e as direções do movimento de massas ligadas a ele – responsabilizam a anterior “comunicação do governo” pelo desgaste que se nota nas ruas diante da piora das condições de vida.
A hipocrisia da extrema direita é patente, com seu discurso crítico ao governo mas que está alinhada à defesa de um choque ainda maior de neoliberalismo, como se vê em seus aplausos a Trump ou na defesa do legado desastroso de Paulo Guedes.
O papel do PSOL e de sua ala mais crítica ao governo é defender os interesses do povo e articular uma linha política alternativa aos rumos da economia. A reunião do Diretório Nacional que ocorre no final de semana é uma oportunidade para esse debate.
O governo não responde às demandas populares
Enquanto as condições de vida do povo se agravam, a resposta global do governo é mais ajuste. O ano de 2024 se concluiu com um pacote de maldades montado na austeridade. As restrições ao abono salarial e os cortes no BPC foram as mais alarmantes.
As primeiras medidas do ano corroboram a linha do ajuste: a desastrada fiscalização do PIX, a posição de Galípolo a favor do aumento dos juros, além dos ataques desferidos contra categorias importantes como a dos trabalhadores do IBGE.
Parece piada. Foram dois anos nos quais setores ligados ao governo atuaram colocando a responsabilidade da alta de juros (vale sempre registrar que o Brasil é um dos países com a taxa mais alta do mundo), na “herança maldita” de Bolsonaro, ou seja, na gestão de Campos Neto à frente do BC. Agora, o indicado por Lula, Gabriel Galípolo, não só assegura os mesmos parâmetros da gestão anterior, a gosto do capital financeiro, para seguir pagando os títulos da dívida pública, como na primeira reunião aumenta em 1 ponto percentual a taxa Selic.
A questão da inflação dos alimentos envolve escolhas não só conjunturais, senão é decorrência direta do modelo agroexportador que domina a economia brasileira. A alta do dólar conferiu ganhos para os exportadores, encarecendo ainda mais os produtos alimentares na mesa do brasileiro. O agro, hoje parte fundante do capital especulativo, é o responsável central pela desigualdade na distribuição alimentar do Brasil, além de ser um agente político a serviço da destruição do meio ambiente e base de apoio à extrema direita golpista.
O problema não é (só) a comunicação
Para responder ao desgaste, entrando inclusive na seara hipócrita da extrema direita, o governo mudou sua estratégia de comunicação, empoderando a Sidônio Palmeira como ministro e “chefe” da nova política comunicacional. Em que pese a importância da comunicação, o vetor central das debilidades do governo não é um problema na “forma” e sim no seu conteúdo mais central. Tomar medidas simbólicas como novos slogans e memes como forma de disputar a base descontente será insuficiente e ilusório.
O flanco aberto para a extrema direita é a linha do próprio governo quando penaliza os mais pobres para evitar choques com os banqueiros. Quando coloca em modo espera a promessa da isenção do IR para quem recebe até R$ 5 mil mensais e se envolve na polêmica do PIX, tendo como alvo os setores mais informais da economia.
Não bastasse essa orientação equivocada, o governo compra brigas com os setores organizados da classe, atacando a auto-organização sindical dos servidores públicos. O que fez no ano passado com os docentes da educação superior, repetiu agora sobre os servidores do IBGE, quando entrou na justiça contra a associação da categoria, gerando indignação dos trabalhadores.
Uma outra política econômica
Se o governo quisesse mesmo representar os interesses dos trabalhadores, deveria então mudar imediatamente a política econômica. Além de romper o ciclo de altas dos juros, um conjunto de medidas imediatas deve ser elencado, como a isenção do IR e o fim do teto de gastos contido no Novo Arcabouço Fiscal.
Algumas medidas interessantes foram apresentadas no manifesto “É urgente retomar a esperança” , assinado por intelectuais e ex-ministros como Ana de Hollanda, Gilberto Maringoni, Luiz Eduardo Soares, entre vários. Temas com a taxação das grandes fortunas, a defesa de uma reforma agrária e o apoio à agroecologia, à transição energética e à cobrança dos produtos para exportação estão corretamente presentes no texto.
Junto a isso, a pressão para ampliar a luta pela redução da jornada de trabalho, a partir do fim da escala 6×1, que tem tido apelo de massas.
Parte da crise que vive o PSOL, noticiada pela imprensa, é a demissão injustificada, pela maioria da bancada parlamentar, do economista David Deccache, que vem se notabilizando como expoente de uma linha alternativa à orientação social-liberal da Fazenda.
Apenas com a unidade e mobilização poderemos colocar a luta por outra política econômica no centro da agenda nacional. Os bons exemplos de lutas como a dos indígenas no Pará, que derrotaram os ataques do governo Barbalho; dos servidores do IBGE, que fizeram o governo recuar; e da agitação nos locais de trabalho contra a 6×1, ilustram que há disposição para defender nossos direitos e nossas causas.