Moradores da Favela do Moinho enfrentam governo Tarcísio para defender direito à moradia
Comunidade histórica no centro de São Paulo sofre com ações violentas do governo estadual e omissão da União; moradores denunciam repressão e seguem mobilizados para permanecer em suas casas
Foto: Reprodução
Em mais um capítulo da política higienista e autoritária adotada pelo governo Tarcísio de Freitas (Republicanos), a Favela do Moinho, uma das últimas comunidades remanescentes no centro de São Paulo, voltou a ser alvo de ações violentas de despejo. Com o respaldo da União, por meio da Secretaria do Patrimônio da União (SPU), o governo estadual tem promovido a descaracterização de moradias já desocupadas para impedir que novas famílias retornem ao local – mesmo com parte significativa da comunidade ainda ocupando suas casas.
Na segunda-feira (12), o superintendente do Patrimônio da União em São Paulo, Celso Santos Carvalho, assinou autorização para que o governo estadual possa modificar essas estruturas, desde que o processo seja “cuidadoso”.
“Recomendamos que a descaracterização das moradias vazias seja feita de forma cuidadosa, para evitar o impacto na estrutura das casas vizinhas e minimizar a interferência nas atividades cotidianas da comunidade”, diz o documento obtido pela Folha de S.Paulo.
No entanto, o que se viu nas ruas da comunidade foi a presença de tratores, policiais armados e agentes da CDHU, num cenário de intimidação e violência que desconsidera a fragilidade das construções e o risco à vida dos moradores.
“Esse tipo de ação pode provocar desabamentos e coloca em risco as pessoas que ainda vivem aqui”, alertou o advogado Vitor Goulart, do Escritório Modelo da PUC-SP, que presta assistência jurídica à associação de moradores.
A vereadora Luana Alves (PSOL) qualifica como corajosa a resistência dos moradores do Moinho e usou suas redes sociais para pedir que o governo federal negocie soluções para o impasse com a comunidade.
“Os moradores da Favela do Moinho mostraram sua coragem de novo. Estão lutando bravamente para não serem jogados na rua por Tarcísio. A área é pública e do governo federal, que até agora não deu uma solução para a questão. Seguimos aguardando a reunião entre o governo federal e o Moinho!”, afirmou.
Comunidade vulnerável
De acordo com reportagem da Folha de S.Paulo, as construções na Favela do Moinho são muito próximas entre si, frequentemente escoradas umas nas outras. A tentativa de demolição arbitrária – como a ocorrida na véspera da autorização – foi interrompida pela resistência dos próprios moradores, que enfrentaram tratores com seus corpos e palavras de ordem.
A justificativa oficial da gestão estadual é que houve violação de unidades lacradas e indícios de tentativa de reocupação irregular, o que, segundo o governo, justificaria a descaracterização total dos imóveis desocupados. Em ofício, a Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Habitação e a CDHU afirmaram que a medida é “mais eficaz para coibir novas ocupações”.
Na prática, trata-se de mais uma investida contra o direito à moradia de famílias vulnerabilizadas – muitas delas há décadas enraizadas no território. A comunidade do Moinho já sobreviveu a incêndios, abandono do poder público e promessas não cumpridas. Agora, enfrenta a militarização e o desmonte promovido por um governo que ignora as políticas sociais em nome de uma suposta “segurança urbana”.
A tensão aumentou na tarde de segunda-feira (12), quando moradores reagiram ao início das demolições promovidas pela CDHU. Após expulsarem os funcionários, bloquearam os trilhos da linha 7-Rubi da CPTM, paralisando a circulação dos trens por cerca de uma hora. Eles atearam fogo em entulhos, num protesto desesperado diante da ameaça iminente de perderem o pouco que têm: suas casas.
A resposta do Estado foi a chegada da Tropa de Choque da Polícia Militar e do Corpo de Bombeiros, reforçando o caráter repressivo da ação. Na terça-feira (13), agentes da CDHU retornaram à comunidade escoltados por policiais, acirrando ainda mais o clima de insegurança e medo.
O terreno da Favela do Moinho pertence à União e está localizado entre duas linhas de trem. A justificativa da gestão Tarcísio é que o local não reúne condições adequadas para moradia – argumento usado repetidamente por governos para legitimar remoções forçadas sem garantir alternativas dignas de habitação.
A remoção gradual das 831 famílias que residem na Favela do Moinho começou na madrugada de 22 de abril. O plano de Tarcísio é construir um parque no local.