Base silenciada: a condução autoritária da greve pelo SINPRO-DF
Direção do SINPRO-DF decreta o fim da greve da educação contra maioria da base
Na capital do país, a desvalorização dos professores da Rede Pública de Ensino é um processo contínuo, que vem se agravando nos últimos 10 anos em face das conjunturas políticas nacional e local e da sucessão de governos de centro-direita e extrema direita. A categoria não recebe aumento real desde 2013, quando foi aprovado o atual plano de carreira, e cálculos do Sindicato dos Professores (SINPRO-DF) dão conta de uma perda de poder de compra de quase 70% nesse período, agravada pela crise econômica e pela pandemia de COVID-19.
Em 2023, negociações frustradas com o governo de Ibaneis Rocha e Celina Leão levaram à primeira greve docente em seis anos, que se encerrou após votação controversa conduzida pela diretoria do SINPRO-DF, vinculada ao Partido dos Trabalhadores e à CUT. O acordo, firmado sem claro apoio da maioria da categoria, previu a incorporação da Gratificação de Atividade Pedagógica ao vencimento básico, a convocação de todos os aprovados em concurso e a possibilidade de averbação do tempo de trabalho em regime de contratação temporária para progressão na carreira, além da ampliação de alguns direitos aos professores temporários. Apenas o primeiro ponto do acordo foi efetivamente cumprido, mesmo com a manutenção de uma mesa de negociação permanente com o GDF ao longo dos dois últimos anos.
O descumprimento do acordo, bem como a insatisfação da categoria com a condução da última greve pelo Sindicato, levaram ao acirramento das tensões entre a base e a diretoria sindical, e a uma crescente percepção da necessidade de se conseguir avanços mais significativos no ano pré-eleitoral.
A greve dos professores da Secretaria de Educação do Distrito Federal (SEDF), deflagrada no final de maio de 2025, surgiu após duas rodadas de negociação infrutíferas com o governo e três assembleias gerais, uma estratégia já vista na greve de 2023, cujo intuito parecia ser cansar a categoria de professores com mesas de negociação esvaziadas. A base, já esgotada pela inércia da Secretaria de Educação, sentiu a necessidade de paralisar suas atividades para pressionar o governo, o que só ocorreu três meses após a primeira assembleia, devido à ação deliberada e planejada da diretoria do Sindicato.
A assembleia para votar a deflagração da greve foi marcada para o dia anterior às eleições sindicais – movimento claramente instrumentalizado pela direção do sindicato para alavancar votos à chapa da situação, que contava com o apoio declarado do presidente do MDB, partido do governador. Após mais uma rodada de negociação frustrada com o GDF, a diretoria se viu obrigada a admitir a necessidade da greve e, assim, mobilizou sua base nesse sentido.
Após a deflagração oficial da greve e a reeleição da diretoria atual nos dias seguintes, veio o primeiro golpe: uma decisão do TJDFT declarou a greve ilegal e aplicou uma multa absurda de um milhão de reais por dia de paralisação, um claro ataque ao direito de greve dos trabalhadores, à existência do SINPRO-DF e dos sindicatos em geral. Mesmo assim, a primeira ação da greve foi um ato de ocupação da SEDF, que levou ao fechamento de um shopping de elite no centro de Brasília. Essa ação começou a forçar os secretários de governo do DF a se sentarem à mesa de negociação com o sindicato. Ao final dessa primeira semana, a categoria angariou uma vitória no STF, com uma decisão do ministro Flávio Dino suspendendo a multa abusiva e cobrando explicações do TJDFT e do GDF.
Mesmo com uma semana marcada por avanços, a diretoria do sindicato se mostrou disposta a encerrar a greve no primeiro acordo pífio proposto pelo GDF. A proposta, feita ainda nos primeiros dias do movimento paredista e ligeiramente melhorada ao final da greve, abarcou apenas duas das reivindicações da categoria, ignorando as principais: o reajuste salarial e a reestruturação da carreira. O governo ofereceu apenas previsões de aumento dos adicionais para pós-graduação e de convocação de parte dos aprovados no último concurso, a serem cumpridas ao final de 2025, o que foi prontamente aceito pela diretoria do sindicato e propagandeado para a base como uma grande conquista. O acordo, homologado pelo mesmo tribunal que impôs a multa milionária semanas antes, foi considerado insuficiente pela maior parte dos professores, e rejeitado pelo voto popular em assembleia no dia 25 de maio. Contudo, mais uma vez, a diretoria do SINPRO-DF ignorou a vontade da maioria e decretou o encerramento da greve de forma unilateral. Fica evidente que, apesar de manter alguma capacidade de mobilização eleitoral, a atual diretoria perdeu completamente a conexão com a base. Os professores estão revoltados com a condução sindical dos últimos anos, marcada por greves com pouca ou nenhuma conquista relevante – como as frustradas paralisações de 2015, 2017, 2023, e, agora, a greve encerrada em 2025. Isso se reflete na redução das taxas de sindicalização e baixo comparecimento eleitoral das últimas eleições do sindicato.
O encerramento da greve contra a vontade da categoria acirra ainda mais a tensão entre a base de professores e a direção sindical. A indignação acumulada tem se convertido em dois movimentos: um de dessindicalização, guiado por uma angústia e raiva — não sem motivo —, mas que enfraquece a luta dos trabalhadores como um todo; e outro de resistência dentro do sindicalismo, verdadeiramente solidário às demandas dos professores. Nesse sentido, começa a se organizar no PSOL-DF um coletivo de professores que tem como estratégia reavivar o trabalho sindical de base na categoria e demonstrar que o verdadeiro poder nasce das salas de aula e não das manobras de gabinete e cúpula sindical. É necessário converter a indignação da categoria em mobilização e formação política, para que as mudanças na condução da luta dos professores venham de dentro da categoria, do chão da escola, e para garantir a própria continuidade da Carreira Magistério e do movimento sindical no DF.