Monica Seixas: ‘Que a Justiça faça o que a Alesp não fez’
Denunciado por perseguição e violência contra a ex-esposa, o deputado Lucas Bove (PL) tem prisão preventiva pedida pelo Ministério Público; caso expõe omissão da Alesp e fortalece a luta das mulheres contra a impunidade
Foto: Alesp/Divulgação
O pedido de prisão preventiva do deputado estadual Lucas Diez Bove (PL), feito pelo Ministério Público de São Paulo (MP-SP), reacendeu o debate sobre a impunidade de homens poderosos acusados de violência contra mulheres – e sobre o papel cúmplice das instituições políticas quando escolhem proteger os seus. O órgão denunciou o parlamentar por perseguição, violência psicológica, violência física e ameaça contra a influenciadora digital Cíntia Chagas, sua ex-esposa, e apontou reiterados descumprimentos de medidas protetivas.
A promotoria foi enfática ao afirmar que Bove “demonstrou claro desprezo às restrições impostas” e que sua conduta representa um “alto grau de reprovabilidade”. O MP considerou que nenhuma medida alternativa seria capaz de conter o comportamento do deputado, pedindo sua prisão preventiva para proteger a integridade psicológica da vítima.
A omissão da Alesp
Apesar das graves denúncias, a Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) arquivou, em agosto, o processo por quebra de decoro parlamentar aberto contra Bove. A decisão, tomada pelo Conselho de Ética, foi duramente criticada por parlamentares do campo progressista, que veem o caso como símbolo de corporativismo e conivência com a violência política de gênero.
A deputada estadual Mônica Seixas (PSOL), autora do pedido de cassação do mandato de Bove, não poupou críticas:
“Que a Justiça faça o que a Alesp não fez! Eu fui autora de processo contra ele no conselho de ética por agressão a Cíntia Chagas. A Alesp arquivou e, no momento seguinte, ele partiu pra cima de mim mostrando que a impunidade aumenta a violência.”
Mônica relembrou que o arquivamento da denúncia foi um gatilho para novas agressões.
“Logo que surgiu a primeira denúncia da Cíntia, eu protocolei o pedido de cassação do mandato dele. Não devemos ter agressores de mulheres na política. E a AL arquivou o pedido. O resultado? Ele aumentou a violência, perseguiu as deputadas, gritou comigo e está pedindo a cassação do meu mandato. Que a justiça faça o que a política ainda não tem coragem de fazer, que é punir agressores de mulheres.”
Violência e poder
A investigação da Polícia Civil reuniu provas de que o deputado submeteu Cíntia Chagas a ameaças, chantagens e tentativas de controle sobre sua carreira profissional, além de perseguições após o fim do relacionamento. Mensagens anexadas ao inquérito mostram que o parlamentar ameaçava “acabar com a carreira dela” caso não aceitasse acordos abusivos.
Mesmo com medidas protetivas em vigor, o deputado continuou a publicar ofensas e insinuações sobre a vítima, descumprindo ordens judiciais e revitimizando Cíntia publicamente.
Em nota, a influenciadora afirmou:
“É moralmente inaceitável que agressores de mulheres permaneçam investidos em funções de poder. A violência contra a mulher não se circunscreve à esfera privada: constitui crime e afronta à dignidade humana.”
Vozes da resistência
A repercussão do caso mobilizou mulheres do campo progressista em solidariedade à vítima e em repúdio à cultura da impunidade. A deputada federal Sâmia Bomfim (PSOL-SP) destacou a importância de que a Justiça atue sem privilégios:
“Fundamental essa medida exemplar de punição de um deputado estadual, diante de tantas agressões gravíssimas que fez contra a sua ex-namorada. A gente vai seguir na luta pela responsabilização de todos eles, não importa o poder que aparentemente tenham, e seguir em solidariedade com todas as vítimas de violência.”
Justiça para além das palavras
Enquanto o Ministério Público age para garantir proteção à vítima e responsabilização do agressor, a Alesp permanece omissa – uma postura que, segundo parlamentares feministas, reforça o ambiente de violência e hostilidade contra mulheres na política.
O caso Lucas Bove se soma a uma longa lista de episódios que expõem a distância entre o discurso institucional e a prática efetiva de combate à violência de gênero. A coragem de mulheres como Cíntia Chagas, Mônica Seixas e Sâmia Bomfim revela que, diante da inércia das instituições, a luta por justiça segue sendo uma tarefa coletiva e urgente.